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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

David Flusser, Geza Vermes, e o Messiah

Todos os quatro evangelhos se referem, sempre e sempre, a Jesus como o “Cristo”, que é a tradução grega da palavra “Messiah” (Ungido) em Hebraico. Cada vez mais estranho à mente judaica é o fato de todos os autores se referirem a Jesus como o “Filho de Deus”. Juntando estes dois títulos, o evangelista Marcos inicia sua narrativa: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Marcos 1:1). Conforme lemos em Mateus 16:16, o apóstolo Pedro fez o mesmo, quando respondeu a Jesus: ”Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”.

Estas declarações nas narrativas dos evangelhos (bem como nos ensinos de Paulo e de outros escritores sagrados) suscitam uma questão importante ao item da historicidade de Jesus: se os autores dos evangelhos escreveram erroneamente dizendo que Jesus é o Messias, o Filho de Deus e até mesmo o próprio Deus, como podem ser confiáveis para nos dar uma exata descrição do Jesus histórico? Desse modo, devemos discutir se os autores dos evangelhos estiveram ou não errados, quando atribuíram messianismo e divindade a Jesus.

A ideia de que os autores judeus pudessem atribuir divindade a outro ser humano tem gerado muita crítica às narrativas dos evangelhos.

Ian Wilson, em seu livro “Jesus, The Evidence”, tem um capítulo intitulado “How He Became God”, no qual Wilson declara que “nenhum dos evangelhos declara Jesus como Deus e que nem mesmo Paulo fez isto”. Segundo Wilson, a deificação de Jesus foi especialmente um produto do século IV, não a crença dos cristãos primitivos.

Neste capítulo, é necessário, portanto, solucionar os detalhes históricos relacionados aos declarados messianismo e divindade de Jesus. O próprio Jesus achava que era o Filho de Deus? O que Ele queria dizer pelos termos “Filho de Deus” e “Filho do Homem”? O que as pessoas achavam que Ele queria dizer? Antes de responder estas perguntas, devemos entender com o que as pessoas esperavam que o Messias parecesse.

Expectações Messiânicas

Durante uns cem anos, começando em 64 a.C., o povo judeu gozou de independência. O Professor Jim Fleming, refletindo sobre a perda final da soberania judaica nacional, declara:

“Embora esse período tenha terminado abruptamente, com a campanha dos romanos e do General Pompeu (63 a.C.), a esperança de sua restauração jamais desapareceu totalmente. Jesus nasceu num tempo em que o povo antecipava a vinda do Messias (Cantares 2:17) para o libertar do jugo romano.Uma das melhores análises das expectativas messiânicas do Século I foi feita por Geza Vermes. Ele observa que, naquele tempo, havia tanto uma crença popular difundida de como seria o Messias como uma porção de opiniões secundárias fragmentadas: ‘Talvez fosse mais apropriado ter em mente a diferença entre as expectações generalizadas do judaísmo palestino e as peculiares expectações messiânicas características de certas minorias eruditas e/ou esotéricas’.”Para determinar qual o tipo de Messias que as massas judaicas em geral esperavam, Geza Vermes aconselha: “Uma resposta confiável deve ser encontrada na menos acadêmica, porém, ao mesmo tempo, mais normativa forma de oração. Assim, uma das melhores fontes sobreviventes com relação à expectação messiânica durante aquele tempo, está nos Salmos de Salomão, provavelmente escritos logo após a conquista da Judeia (63 a.C.). Estes refletem a visão comum de um Messias reinando com justiça, o Qual iria restabelecer militarmente a soberania de Israel, restaurando um justo governo sobre a nação:‘Contempla, Senhor, e levanta no meio deles o seu Rei, o Filho de Davi... E o cinge de força para que Ele dissipe os governantes injustos... Com sua vara de ferro ele quebrará em pedaços toda a sua substância; Ele destruirá as nações com a palavra de sua boca... Ele juntará todo o povo santo... Terá as nações pagãs sob o Seu jugo... E não haverá injustiça em Seus dias no meio delas, pois todas se tornarão santas e o seu rei, o ungido (do) Senhor“.O Salmo 18 de Salomão fala sobre o Ungido de Deus, o Qual vai usar a Sua “vara de ferro” para instilar o “temor do Senhor” em cada homem, conduzindo todos eles “às obras de justiça”.

Fleming Observa:

“Um livrete popular aceito em uma ou duas gerações, antes de Jesus, reflete os pensamentos dos muitos que correram para Jesus, ao longo da planície de Genesaré... ‘Um rei santo virá reinar sobre o mundo - e depois sua ira cairá sobre o povo do Lácio e Roma será arrasada até o chão... Ó, pobre e desolado que eu sou! Quando chegará o dia do julgamento do Deus eterno, do grande Rei?’”Os zelotes ou sicários encontraram nesta expectação comumente mantida, um solo fértil para o cultivo de sua causa militar. Outros, como os fariseus, contentavam-se em esperar por alguém que se adaptasse mais claramente aos moldes do Rei Davi. “Filho de Davi” era o termo popular tomado do Velho Testamento, para o esperado Messias. A descrição que Filo fez do Messias esperado provavelmente expressa melhor o poderio militar do futuro rei. Em seu livro “Rewards and Punishment”, ele interpreta a profecia de Balaão, em Números 24:7, da seguinte maneira: “Pois há de vir um homem, ‘diz o oráculo’, o qual, liderando suas hostes para a guerra, subjugará as nações grandes e populosas; porque Deus enviou em seu auxilio o reforço que beneficiará o piedoso e que terá intrépida coragem de alma e a totalmente poderosa força do corpo, ambas provocando temor em seus inimigos, quando unidos, sendo quase irresistíveis”.

Vermes termina:

“A antiga oração judaica e a interpretação da Bíblia demonstram inequivocamente, que, se na era intertestamentária, um homem afirmasse ser ou fosse proclamado como “o Messias”, os seus ouvintes, obviamente, teriam assumido que ele estaria ligado ao Redentor davídico e teriam esperado encontrar nele uma pessoa dotada dos combinados talentos de poderio militar, justiça e santidade.Desse modo, é compreensível que, em vista da ocupação romana da terra de Israel, a maioria do povo judeu não visse em Jesus o que esperava ver no Messias”.

Millar Burrows, de Yale, escreveu: “Jesus era tão diferente do que os judeus esperavam que fosse o “Filho de Davi” que até mesmo os Seus discípulos achavam difícil conectar a ideia do Messias entre eles”.

Finalmente, conforme o erudito judeu Samuel Sandmel coloca:

“Qualquer afirmação feita durante o tempo de vida de Jesus, de que Ele era o Messias que os judeus esperavam, seria recebida como puramente em favor de sua crucificação e do colapso de qualquer aspecto político do seu movimento, pela triste constatação de que a Palestina ainda não havia sido libertada do domínio romano”.O conceito popular do Messias reinando como o libertador militar era, então, um empecilho para a maioria da população judaica considerar Jesus como o Messias. A questão é: este conceito popular era correto?É claro que nem todo o povo judeu do tempo de Jesus mantinha a opinião majoritária.

Geza Vermes observa:

“Além do conceito real, a especulação messiânica incluía noções de um Messias sacerdote e profeta e, em alguns casos, de uma figura messiânica, a qual iria combinar todas as funções em uma”.O Testamento de Levi, por exemplo, dizia:“Então, o Senhor levantará um sumo sacerdote... E ele executará um julgamento justo sobre a terra... E sua estrela brilhará no céu como a de um rei... E haverá paz em toda a terra. E o conhecimento do Senhor será derramado... como as águas cobrem os mares... E o espírito de compreensão e santificação repousará sobre ele”.A comunidade de Qumram parece ter esperado três figuras messiânicas. Um dos seus documentos predizia: “Até que venha o profeta e o Messias de Aarão e Israel. O 2 Baruque 30:1 fala do Messias “voltando em glória”, da terra, presumivelmente para o céu. Esdras 14:9 fala do Messias (“Meu Filho”) habitando aparentemente no céu. O 4 Esdras 7:29 fala da morte do Messias, como o fazem outras referências, algumas delas talvez do ano 135 d.C. e, portanto, aludindo à morte de Simon Bar Koch, que o Rabino Akina afirmava ser o Messias.O ponto importante é que nem todo mundo mantinha o conceito popular de como seria o Messias e com o que uma porção de judeus, especialmente os religiosos, achava que o carisma de Jesus combinava, a fim de preencher a descrição do Messias. O fato de que eles também esperavam que o Messias libertasse Israel da opressão romana tornou mais complicada a missão de Jesus. Fleming explica:“As multidões ao longo do “nosso lago” (Mar da Galileia) pressionavam Jesus tão constantemente, que Ele tinha dificuldade para ensinar as pessoas. Sua reputação, como o rabino que curava, precedia o Seu desejo de se tornar conhecido como um Mestre. Quando Jesus está em “nosso lago”, Ele sempre fala às pessoas que Ele cura, dizendo que guardem segredo para que as multidões não se apinhem em busca de sinais e maravilhas. Muitos judeus associavam os dons de cura de Jesus com os do Messias, o Qual poderia governar, depois de Sua revolta contra Roma. Provavelmente, muitos na multidão, estariam curiosos para ver qual a posição que Ele iria assumir com respeito à opressão romana”.Se Jesus desejava ou não, antes de tudo, ser conhecido como Mestre precisa ser questionado. O que está claro é que o conceito popular sobre o Messias não combinava com o conceito de Jesus sobre o Messias.Junto com outro fator, fica absolutamente clara a razão pela qual Jesus não saía por ali, anunciando publicamente: “Eu sou o Messias. Sigam-me!” O grande problema eram os romanos. Eles estavam perfeitamente cônscios das expectações messiânicas do povo. Tácito (escrevendo no Século II d.C.) registra: “Havia uma firme persuasão... de que neste exato tempo o Oriente iria se tornar poderoso e os governantes vindos da Judeia iriam conseguir um império universal”. Pelo mesmo tempo, dissertando sobre a década seguinte à destruição do Templo, no ano 70 d.C., Suetônio escreveu: “Havia se espalhado em todo o Oriente a crença antiga e estabelecida do que iria acontecer naquele tempo, quando homens viriam da Judeia para governar o mundo”.É claro que os romanos estavam preparados para abafar qualquer insurreição messiânica. Não é de admirar, portanto, que Jesus não andasse por ali, alardeando: “Eu sou o Messias”. Como veremos, Ele também tinha maneiras mais efetivas para fazer este anúncio.Os evangelhos revelam, constantemente, as expectações messiânicas do povo. Desde o início da vida terrena, quando Simeão identificou Jesus como sendo o Messias, há muito tempo esperado, até o final de Sua vida, quando muitos O honraram como o Messias, na entrada triunfal de Jerusalém, as narrativas relatam exatamente estas expectações.As expectações messiânicas do povo judeu provêem uma das razões mais fortes para se confiar na exatidão das narrativas do evangelho, as quais descrevem as atividades de Jesus. Geralmente, os cépticos afirmam que a vida de Jesus, conforme é descrita nos evangelhos, é sobrenatural demais para ser acreditada. Contudo, o que é sempre esquecido é que esta foi a grande razão pela qual alguns dos Seus discípulos morreram na cruz. Certamente, Jesus preencheu as exigências messiânicas dos Seus discípulos. Algo teria de acontecer, algo não menos poderoso do que as narrativas dos evangelhos iriam registrar, a fim de motivar homens e mulheres judeus a arriscarem suas vidas, a fim de propagarem esta mensagem, a qual era tão tremendamente oposta à prevalecente opinião messiânica daquele tempo.

Jesus achava que era o Messias?

“De fato, visto como a figura do Messias não parece ter sido o ensino central do ensino de Jesus, e que nenhum registro sobreviveu de qualquer desafio hostil referente ao status messiânico, antes dos Seus últimos dias em Jerusalém, e que, além de tudo, Ele deliberadamente manteve Sua aprovação à confissão de Pedro, em geral Jesus deixou de declarar que era o Cristo. Por isso, existe toda razão para se duvidar se, realmente, Ele achava que era o Messias”.

Nesta declaração, Geza Vermes levanta as quatro objeções seguintes à proposição de que Jesus acreditava ser o Messias:

1. - Que a figura do Messias não era central no ensino de Jesus.

2. - Que não existe registro algum de qualquer desafio hostil, antes dos Seus últimos dias em Jerusalém.

3. - Que Jesus, deliberadamente, recusou (vide item 3 abaixo) Sua aprovação à confissão de Pedro de que Ele era o Cristo.

4. - Que, geralmente, Jesus deixou de se declarar como o Cristo.Avaliemos cada ponto, separadamente:

Objeção 1 - A figura do Messias não era central no ensino de Jesus.

Coloque-se você mesmo no lugar de Jesus. Se você fosse o Messias teria focalizado todo o Seu ensino sobre a correta contextualização do Messias? Considere estes pontos:

a) Seu ministério consiste em viajar e sabe que o tempo todo em que usa a palavra “Messias”, todos irão interpretar erroneamente o que você está falando. Esta é uma palavra perigosa!

b) A partir do seu ponto de vantagem (como o Messias), você sabe que o conceito popular sobre isto não é apenas algo desagradável e que a sua interpretação do Reino de Deus se tornou distorcida. Uma simples leitura do que está grifado em vermelho, no Evangelho de Mateus, vai esclarecer como Jesus devia também ensinar as pessoas como estas deviam ter uma visão correta do Messias.

c) As ações falam mais alto do que as palavras. Se você fosse de fato o Messias, não seria mais efetivo demonstrá-lo, em vez de apenas ensinar sobre isto?d) Jesus esclareceu, de maneira indireta, porém mais efetiva, a verdadeira significação e propósito do papel do Messias, através do que Ele disse. Olhando, novamente, apenas no Evangelho de Mateus, Jesus mostrou que...O Messias devia cumprir toda a justiça (Mateus 3:15).O Messias é o revelador do Reino dos Céus (Mateus 4:17).O Messias transforma homens comuns em pescadores de homens (verso 19).O Messias ensina com suprema autoridade, conforme os capítulos 5-7 de Mateus.O Messias veio cumprir toda a Lei e os Profetas (Mateus 5:17).

Poderíamos prosseguir, mas isto é suficiente. Tudo que Jesus falou apontava para a visão correta do Reino de Deus sendo estabelecido por Ele mesmo, como o Messias. Porém, mais diretamente, Ele tentou esclarecer através do Seu ensino a identidade do Messias.

Todos os três evangelhos sinópticos registram Sua pergunta feita a um grupo de rabinos e Sua consequente explicação: “Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Eles disseram-lhe: De Davi. Disse-lhes ele: Como é então que Davi, em espírito, lhe chama Senhor, dizendo: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés? Se Davi, pois, lhe chama Senhor, como é seu filho? E ninguém podia responder-lhe uma palavra; nem desde aquele dia ousou mais alguém interrogá-lo” (Mateus 22:42-46).

Jesus estava conduzindo o assunto a um ponto além da compreensão dos fariseus. O Messias poderia, certamente, ser o Senhor de Davi, desde toda a eternidade? A resposta é “sem comentários”...

Em meio ao Seu ensino, Ele declarou: “A ninguém chameis Mestre”. Mais tarde, Ele ensinou aos Seus discípulos como estes deveriam reconhecer os falsos messias e também identificar o Filho do Homem, Seu tema favorito de auto-referência como o Messias. A clara indicação de Suas palavras era que o Messias é mais importante do que uma simples figura terrena. Em João 7:25-26, Jesus busca esclarecer a natureza do Messias; desta vez, quando os soldados foram buscá-Lo para prendê-Lo.

Em João 17, na Oração Intercessória, Ele faz declarações surpreendentes, referindo-se, claramente a Si mesmo:

1. - Que Deus Lhe deu autoridade sobre toda a carne (João 17:2).

2. - Que Ele é o doador da vida eterna (verso 3).

3. - Que a vida eterna consiste em reconhecer o Pai como único Deus verdadeiro e a Jesus Cristo por Ele enviado. (verso 3).

4. - Que Jesus estava na glória com o Pai, desde toda a eternidade (verso 5).

5. - Que Jesus saiu do Pai, e é UM com o Pai (verso 8).

6. - Que Jesus voltará para o Pai (verso 13).

7. - Que Deus o Pai está em Jesus.

Tendo em vista estas afirmações, o Messias puramente humano da crença popular seria, simplesmente, uma figura insignificante.

Desse modo, quando Geza Vermes afirma que Jesus não fez do Messias o Seu ensino central, devemos discordar. Ele não fez do Messias uma figura humana em Seu ensino central; porém, à medida em que vemos os procedimentos abaixo, Ele torna Sua identidade superior à de um Messias simplesmente humano.

Objeção 2 - não existe registro algum de qualquer desafio hostil, antes dos Seus últimos dias em Jerusalém.

Se Jesus evitou, especificamente, usar o termo “Messias”, por causa de sua errônea conotação, tendo em vista a ocupação romana, então por que deveríamos esperar qualquer registro de confrontação sobre o item messiânico? Tendo em vista Suas obras e afirmações, as testemunhas que Lhe eram hostis ficaram cônscias de um assunto muito mais sério - o da blasfêmia contra o Espírito Santo. O resultado demonstra que as confrontações quase sempre focalizavam a autoridade de Jesus para ensinar e fazer o que Ele dizia e fazia.

Objeção 3 - (Jesus), deliberadamente, recusou Sua aprovação à confissão de Pedro de que Ele era o Cristo.

Como alguém poderia afirmar que Jesus não aprovou a confissão de Pedro - “Tu és o Cristo” - é inacreditável! Mateus, uma testemunha ocular, registra que Jesus elogiou Pedro em, pelo menos, quatro maneiras específicas:

1. - Ele declarou que Pedro era bem-aventurado por reconhecer nEle o Messias. Será que Jesus [N.T.: a própria verdade] teria chamado Pedro de bem-aventurado, se Pedro tivesse feito uma confissão falsa?

2. - O desafio de todo o ministério de Jesus entre o povo judeu foi o de ajudar a abrir-lhe os olhos sobre um reino terreno, no qual Ele reinaria supremo sobre os gentios; e sobre o reino espiritual, cumprindo a promessa que Deus fizera a Abraão em Gênesis 12:3: “E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra”. [N.T. - Ai dos povos que se voltam contra Israel.]

3.- Quando Pedro reconhece Jesus como o Messias, mesmo sem qualquer conotação militar, Jesus o elogiou, dizendo: “Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque to não revelou a carne e o sangue, mas meu Pai, que está nos céus”. (Mateus 16:17). (Observem a expressão “Meu Pai”. E não “Nosso Pai”, conforme os judeus costumavam se dirigir a Deus.)

4. - Logo em seguida, Jesus declara entregar a Pedro as “chaves do reino” - outro elogio enorme! Isto porque Pedro havia defendido os interesses divinos.Mas, o leitor acha que Jesus não seria capaz de recriminar Pedro, se ele tivesse feito uma declaração falsa? Então vamos ler abaixo, o que Ele disse a Pedro, quando este O tentou a abandonar a missão para a qual o Pai O havia enviado:“Para trás de mim, Satanás, que me serves de escândalo; porque não compreendes as coisas que são de Deus, mas só as que são dos homens”.

Objeção 4 - Geralmente, Jesus deixou de se declarar como o Cristo

As narrativas sobre a vida terrena de Jesus negam totalmente esta objeção. Já declaramos as razões importantes pelas quais Jesus, em geral, evitava declarar que era o Messias e também admoestava os discípulos a não revelarem, a pessoa alguma que Ele era o Cristo (Mateus 16:20). Isto é bem diferente de não se declarar como o Messias. De maneiras sempre muito mais sutis e poderosas, Jesus declarava ser o Messias, conforme constatamos em cada página dos evangelhos.Até mesmo na idade de 12 anos, Ele se referiu a Deus como “Meu Pai”, tendo continuado a usar este termo até os Seus dias finais, pelo menos 40 vezes. O Dr. Robert Lindsay explica a significação deste termo:

“As orações nas sinagogas contêm a expressão “Nosso Pai" (Avinu) que está no céu e muitas vezes Jesus ensinou os Seus discípulos a fazerem a oração que assim principia [N. T. - Por exemplo, a Oração do Senhor]. Mas “Meu Pai” (avi) era imprópria aos judeus, nesse período. Somente uma vez na Escritura Hebraica Deus é chamado “Meu Pai”, no Salmo 89:26, que fala da vinda do Messias. O Messias tem o direito exclusivo de chamar Deus de “Meu Pai”, mas o povo só poderia usar “Nosso Pai”.

A 2 Samuel 7:14-b contém uma profecia sobre o Messias: ‘Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho; e, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos de homens.’” Este verso trata do Messias vindouro, o Filho de Deus.

Conhecida através do Salmo 89-26, 2 Samuel 7:14 e do Salmo 2:7: ‘Proclamarei o decreto: o SENHOR me disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei’ era a maneira pela qual se expressava a esperança do Messianismo. E foi esta a maneira pela qual Jesus falou, conforme o Espírito Santo.

Jesus também se declarava como o Messias, pelas coisas que fazia. Quando João Batista estava preso por ordem de Herodes, João mandou os seus discípulos para saber se Jesus era de fato Aquele que os judeus estavam esperando. A resposta de Jesus foi clara: ‘Ide, e anunciai a João o que tendes visto e ouvido: que os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e aos pobres anuncia-se o evangelho. E bem-aventurado é aquele que em mim se não escandalizar’. (Lucas 7:22-23).

Estas palavras Ele retirou de dois versos de Isaías 35:5 e 61:1: “Então os olhos dos cegos serão abertos, e os ouvidos dos surdos se abrirão”.

“O ESPÍRITO do Senhor DEUS está sobre mim; porque o SENHOR me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” .

Obviamente, João Batista entendeu perfeitamente o que Jesus havia respondido, como sendo: “Sim, eu sou o Messias” e também: “Aqui estou para provar-te, que ninguém mais pode fazer esta afirmação, que é verdadeira”. Então cada vez que Jesus curava alguém ou operava um milagre comprovado, Ele estava afirmando ser o Messias.

Já mencionamos antes como Jesus declarou ser o Messias em Sua entrada triunfal em Jerusalém. Um verso no Talmude babilônico - Menaroth 78-b - mostra o Rabino Yoanan explicando que, “fora do muro” de Jerusalém significa “não muito longe de Betfagé”. Quando Jesus montou numa cria de jumenta em Betfagé, indo para Jerusalém, Ele estava declarando, definitivamente, que sabia ser o Messias. Ali, Ele pretendia, claramente cumprir Zacarias 9:9: “Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém; eis que o teu rei virá a ti, justo e salvo, pobre, e montado sobre um jumento, e sobre um jumentinho, filho de jumenta”.

O povo entendeu claramente a intenção de Jesus. Fleming declara: “A palmeira havia se tornado um símbolo do nacionalismo judaico. Mas, naquele Domingo de Ramos, a população pobre de Jerusalém estava sentindo o peso do exército romano sobre ela. Havia uma compreensão popular, no tempo de Jesus, de que o Messias ia chegar na época da Páscoa. (Vocês se lembram da narrativa de Jesus alimentando 5.000 pessoas, quando o povo quis proclamá-Lo Rei, porque era Páscoa?). O papel do Messias na esperança popular é que Ele iria libertar o povo da opressão... como o havia feito no Êxodo do Egito. Ao levar folhas de palmeira, o povo estava querendo dizer: ‘Jesus, estamos contigo...Vê que tens muito a fazer contra o domínio romano em Jerusalém!’”

Foram cinco os incidentes registrados nas narrativas dos evangelhos, citados por Geza Vermes como sendo muitíssimos importantes, devendo ser usados para demonstrar como Jesus declarou ser o Messias. O primeiro (aliás, o único) que Geza Vermes aceita como autenticamente de Jesus é a ocasião da pergunta referente a Davi e ao seu filho como “Senhor”. Este ele descreve simplesmente como os fariseus costumavam usar métodos incorretos para interpretar as Escrituras, não que houvesse concordado que o “filho de Davi” era uma espécie de Senhor super-humano. Contudo, Jesus está mais definidamente expressando a natureza do Messias, quando inicia a conversa indagando: “Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Eles disseram-lhe: De Davi”. É como se Ele lhes tivesse dito: “Vocês ainda estão esperando por ele, mas se Davi o chama Senhor, então o Messias deve ter existido antes do início da história humana”. Ele diz: “Eu vim de Ti (Deus)”.

As outras quatro passagens são descartadas por Geza Vermes, como não autênticas, sem razão alguma, exceto que ele não crê que Jesus tenha dito o que os autores dos evangelhos escreveram. Este é o recurso favorito da alta crítica, quando as evidências são contra suas crenças. Estas passagens são: 1. - Jesus anunciando Sua Segunda Vinda; 2. - Jesus prometendo recompensa a quem der um copo dágua em Seu nome; 3 e 4.- Jesus ensinando aos dois discípulos no caminho de Emaús sobre a vinda do Messias, Sua morte e ressurreição, conforme predito nas Escrituras. Pelo menos, Geza Vermes deveria ter descartado as duas últimas, como não constantes da vida terrena de JESUS. Mas todas as quatro referências, vistas no contexto, são declarações definitivas de Jesus de que Ele se considerava o Messias.

Em João 4, Jesus falou à mulher samaritana, fora de Sicar. [N.T.: Leiam a passagem]. Aqui vemos que não existe qualquer razão para se afirmar que Jesus não sabia que era o Messias.
Outra declaração de Jesus, afirmando ser o Messias é vista em Seu julgamento diante do sumo sacerdote Caifás, quando este Lhe perguntou: “És tu o Cristo, Filho do Deus Bendito? E Jesus disse-lhe: Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu”.Aqui “Filho do Homem” é como Jesus costumava se referir a Ele mesmo, conforme Daniel havia profetizado, após ter recebido suas visões...Que Jesus afirmava ser o Messias é confirmado pelo registro que Pilatos deve ter enviado ao Sinédrio. Norman Anderson explica:

“A crucificação fornece uma prova convincente sobre a qual tantos eruditos do Novo Testamento têm se dividido e sobre a qual uma referência anterior já foi feita, ou seja, Jesus acreditava ser o Messias? A verdade é que Ele não fez muitas afirmações, explicitamente, em sua pregação - parcialmente, sem dúvida, por razões políticas, mas amplamente por causa das expectações que estas poderiam gerar entre os ouvintes.Mas [Sua pregação] era, claramente, uma ameaça em potencial a Roma, tanto que Pilatos e seus servidores O entregaram à morte amplamente reservada aos assaltantes armados e aos políticos dissidentes. Isto está implícito na inscrição colocada sobre a cruz: “Jesus Nazareno, o Rei dos Judeus” (João 19:19), a qual parecia frisar, no registro dos evangelistas, que parte da conversa entre Pilatos e Jesus fora sobre assunto político. (Mateus 27:11; Marcos 15:2; Lucas 23:3 e João18:33-37). E esta [conclusão], por sua vez, deve ter sido obtida pelo fato de que foi por “blasfêmia” que o Sinédrio o condenou, quando ‘O sumo sacerdote lhe tornou a perguntar, e disse-lhe: És tu o Cristo, Filho do Deus Bendito? E Jesus disse-lhe: Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu. E o sumo sacerdote, rasgando as suas vestes, disse: Para que necessitamos de mais testemunhas? Vós ouvistes a blasfêmia; que vos parece? E todos o consideraram culpado de morte’. Esta foi uma resposta que levou o Sinédrio à conclusão de que Jesus era um agitador político”.Embora uma porção de eruditos, no passado, tenha tentado negar que Jesus achava que Ele era o Messias, outros hoje apoiam Sua conscientização disto. Um deles é Samuel Sandmel, reconhecido como uma autoridade em Novo Testamento e Cristianismo Primitivo, no Judaísmo americano. Ele foi professor em Yale, depois no Hebrew Union College, em Cincinnatti, até sua morte, em 1979. Sandmel concluiu: “Eu creio que Ele acreditava que era o Messias e os eruditos que o negam estão errados”.

David Flusser, professor de Religião Comparada na Universidade Hebraica em Jerusalém, vê, como outros eruditos judeus vêem, algumas passagens nos textos dos evangelhos como não autênticas. Contudo, ele apoia que “outras afirmações aparentemente autênticas de Jesus devem ser entendidas apenas se Ele tivesse assumido ser o Filho do Homem. Para Flusser, o conceito de Jesus de ‘Filho do Homem’ era tanto messiânico como divino”.

E já que estamos tratando deste assunto, façamos uma pausa para considerar a significação do termo “Filho do Homem”.

Filho do Homem Quem é Ele?

Pela expressão “Filho do Homem”, temos um simples, mas profundo conceito, que se tornou terrivelmente confuso entre os modernos eruditos. Geza Vermes escreve:

“A erudição contemporânea do Novo Testamento tem feito um esforço enorme, gastando erudição e tinta, para, finalmente, sem quase resultado algum, ter concordado que ‘Filho do Homem’ é um título vitalmente importante”. Mas, o próprio Geza Vermes chega ao ponto de confundir mais o assunto, afirmando que o termo não contém um ‘uso titular’, conforme usada por Jesus...“Vamos propor uma simples definição, para ver se o termo combina com o uso dos termos bíblicos usados. Na mais ínfima conotação do termo, ‘filho do homem” é alguém nascido ... da raça humana. No VT ele é usado quase sempre nesta maneira. Por exemplo, no salmo 144:3, lemos: ...Geralmente o termo acontece em paralelismo conforme vemos neste verso, isto é, ‘filho do homem” no VT, sempre se referindo a alguém nascido na humanidade ou a um representante da humanidade. Muito raramente ele se refere a um específico indivíduo. De suas 106 ocorrências, 91 aparecem em Ezequiel e uma em Daniel.” Que em apenas uma de suas ocorrências ela seja usada para descrever alguém de proporções aparentemente superiores às humanas, é verdade. O texto é Daniel 7:13, citado acima. Este ser foi citado como semelhante a um filho do homem, tendo forma de homem. Daniel conta: “Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e o fizeram chegar até ele... Mas os santos do Altíssimo receberão o reino, e o possuirão para todo o sempre, e de eternidade em eternidade.... Até que veio o ancião de dias, e fez justiça aos santos do Altíssimo; e chegou o tempo em que os santos possuíram o reino... e o reino, e o domínio, e a majestade dos reinos debaixo de todo o céu serão dados ao povo dos santos do Altíssimo; o seu reino será um reino eterno, e todos os domínios o servirão, e lhe obedecerão. (Daniel 7:7, 13,22,27).Estes santos, obviamente, serão os Seus súditos. Não é de admirar que este título fosse comumente aceito como o do Messias vindouro. Das mais de 80 referências ao Filho do Homem encontradas no Novo Testamento, todas, exceto uma, se referem a Jesus. E apenas três delas são encontradas fora dos evangelhos. Hebreus 2:6 cita o Salmo 8:4, referindo-se a alguém nascido na humanidade. Todas as outras se referem a Jesus, de algum modo. Algumas O mostram apenas em Sua humanidade, tais como “não tem onde reclinar a cabeça” (Mateus 8:20; Lucas 9:58), comendo e bebendo com os coletores de impostos e os pecadores (Mateus 11:19; Lucas 7:34), passagens nas quais o Filho do Homem é identificado com a Sua humanidade. Mas, na maioria dos textos dos evangelhos, Filho do Homem é identificado como tendo mais do que meras dimensões humanas. Ele tem autoridade para perdoar pecados; é chamado o Senhor do sábado; prediz Sua ressurreição; tem autoridade para executar julgamento, oferece alimento imperecível e deve ser glorificado.Contudo, a observação mais notável é que pelo menos 27 referências ao Filho do Homem aludem, de algum modo, a Daniel 7:13-14. As tentativas da alta crítica no sentido de descartar estas passagens são quase cômicas. Para Jesus e Seus discípulos, Filho do Homem foi a completa figura humana de alguém que assumiu a dimensão messiânica e as expectações messiânicas dos Seus dias.

Jesus era o Messias?

No Velho Testamento, existem centenas de alusões e profecias referentes ao Messias vindouro. O brilhante erudito do século 19, Prof. Henry Lindsay, encontrou 32 predições distintas, as quais foram literalmente cumpridas em Jesus.

Por exemplo, Daniel 9:25-26 indica que o Messias viria antes do segundo templo ser destruído (70 d.C.). Miquéias 5:2 fala sobre o lugar de nascimento como sendo Belém, Efrata, a cidade onde Jesus nasceu. Isaías 35:5-6 fala dos paralíticos e mudos sendo curados. Zacarias 9:9 prediz a entrada do Messias em Jerusalém, montado numa cria de jumento. O Salmo 22 provê a descrição gráfica de alguém sofrendo por crucifixão (embora o salmista não conhecesse este tipo de morte) e Jesus citou este verso, quando estava na cruz. Zacarias 12:9-10 menciona uma passagem onde se entendem as duas vindas distintas do Messias: “Mas sobre a casa de Davi, e sobre os habitantes de Jerusalém, derramarei o Espírito de graça e de súplicas; e olharão para mim, a quem traspassaram; e pranteá-lo-ão sobre ele, como quem pranteia pelo filho unigênito; e chorarão amargamente por ele, como se chora amargamente pelo primogênito”.

Existem centenas de outras profecias no VT que ainda não se cumpriram em Jesus. Uma destas foi que o Messias deveria sofrer e morrer e, mais tarde, reinar num reino eterno, o que deixa entendido que o Messias teria de morrer, ressuscitar dos mortos, voltar ao céu e vir, novamente...

Os cristãos e os críticos, hoje em dia, tanto focalizam a ressurreição de Jesus que esqueceram a outra parte da pregação dos apóstolos. Pedro pregou no Templo: “.... Mas, alcançando socorro de Deus, ainda até ao dia de hoje permaneço dando testemunho tanto a pequenos como a grandes, não dizendo nada mais do que o que os profetas e Moisés disseram que devia acontecer, isto é, que o Cristo devia padecer, e sendo o primeiro da ressurreição dentre os mortos, devia anunciar a luz a este povo e aos gentios” (Atos 26:22-23).

Os apóstolos não estavam pregando novidade alguma. O próprio Jesus havia sempre declarado que iria a Jerusalém para ali sofrer, morrer e ressuscitar. Mas, onde no Velho Testamento isto foi profetizado? Em Isaías 53:1-15:
“QUEM deu crédito à nossa pregação? E a quem se manifestou o braço do SENHOR? Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum. Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo seu caminho; mas o SENHOR fez cair sobre ele a iniqüidade de nós todos. Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a sua boca; como um cordeiro foi levado ao matadouro, e como a ovelha muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a sua boca. Da opressão e do juízo foi tirado; e quem contará o tempo da sua vida? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; pela transgressão do meu povo ele foi atingido. E puseram a sua sepultura com os ímpios, e com o rico na sua morte; ainda que nunca cometeu injustiça, nem houve engano na sua boca. Todavia, ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom prazer do SENHOR prosperará na sua mão. Ele verá o fruto do trabalho da sua alma, e ficará satisfeito; com o seu conhecimento o meu servo, o justo, justificará a muitos; porque as iniqüidades deles levará sobre si. Ele o despojo; porquanto derramou a sua alma na morte, e foi contado com os transgressores; mas ele levou sobre si o pecado de muitos, e intercedeu pelos transgressores.”

Durante mais de 1.700 anos, os rabinos interpretaram esta passagem, quase unanimemente, como se referindo ao Messias. Este fato é inteiramente documentado na obra “The Fitfty-Third Chapter of Isaiah According To The Jewish Interpreters”, de S.R. Driver e Adolf Neubauer. Eles citam vários rabinos durante este período, os quais equiparam Isaías 53 com o Messias.
Não antes do século 21 d.C., sem dúvida por causa do sofrimento dos judeus nas mãos dos cruzados, os intérpretes judeus começaram a interpretar Isaías 52:13 e 53:12 como se referindo a toda a nação de Israel. Mesmo depois que o Rabino Rashi (Rabino Salomn Yaschaki) propôs primeiro esta interpretação, muitos outros intérpretes judeus têm mantido, até hoje, a interpretação tradicional do Talmude de que Isaías 53 fala do Messias. Um dos mais respeitados intelectuais judeus de toda a história, Moses Maimonides (1135-1204 d.C.), rejeitou a interpretação de Rashi, ensinando que esta passagem se refere ao Messias.

Rashi e outros intérpretes judeus não estão necessariamente errados, quando sugerem que o servo é a nação de Israel. Isaías 43:10 diz ao povo de Israel: “Vós sois minhas testemunhas, diz o Senhor e o meu servo a quem escolhi. Certamente, portanto, o servo deve ser Israel”.

Que esta interpretação está em erro, logo se vê em Isaías 52:14, onde vemos que é a Jesus que a passagem se refere:“Como pasmaram muitos à vista dele, pois o seu parecer estava tão desfigurado, mais do que o de outro qualquer, e a sua figura mais do que a dos outros filhos dos homens”. Em Isaías 53:8, o servo (Jesus) recebe o castigo que deveria ser recebido pelo “meu povo” (obviamente Israel). Não faz sentido que a nação de Israel seja a substituta de sua própria punição. Desse modo, Israel não pode ser o servo mencionado em Isaías 52:13 e 53:12. Mas, o que dizer sobre Isaías 49:3: “E me disse: Tu és meu servo; és Israel, aquele por quem hei de ser glorificado”? Interessante! Foi bom vocês terem trazido este assunto. A chave para se identificar o servo em Isaías 52:13 e 53:12 é ver quem ele é, nas anteriores “canções do servo” de Isaías 42:1-9; 49:1-12 e 50:4-9. Visto como estas passagens falam do servo, como por exemplo, estabelecendo justiça na Terra, (Isaías 42:4) e resgatando o povo judeu do exílio em todo o mundo (Isaías 49:8-13), os intérpretes judeus têm, tradicionalmente, mantido as canções do servo como falando que o servo (Messias) é o verdadeiro Israel. Nos versos 49:5 e 6, vemos: “E agora diz o SENHOR, que me formou desde o ventre para ser seu servo, para que torne a trazer Jacó; porém Israel não se deixará ajuntar; contudo aos olhos do SENHOR serei glorificado, e o meu Deus será a minha força. Disse mais: Pouco é que sejas o meu servo, para restaurares as tribos de Jacó, e tornares a trazer os preservados de Israel; também te dei para luz dos gentios, para seres a minha salvação até à extremidade da terra”. O caso é que Israel (Jacó) apostatou, especialmente na comissão que Deus lhe deu, conforme Gênesis 28:14: “E a tua descendência será como o pó da terra, e estender-se-á ao ocidente, e ao oriente, e ao norte, e ao sul, e em ti e na tua descendência serão benditas todas as famílias da terra”. Agora, o servo (Messias) devia tomar o lugar de Israel, para realizar duas coisas: 1. Levar a nação de Israel de volta a Deus (Isaías 49:5); 2. ser luz aos gentios, conforme vemos no verso 6: “Pouco é que sejas o meu servo... também te dei para luz dos gentios, para seres a minha salvação até à extremidade da terra”.

Se vocês entenderem o que acontece aqui em Isaías, provavelmente vão verificar, agora mesmo, porque o servo Jesus tanto apelava e citava este profeta. O servo é o Messias. O Messias teria de sofrer e morrer por muitos. Ele também deveria ressuscitar dos mortos (Salmo 16:10). Quando o monumental evento da ressurreição aconteceu e os discípulos foram cheios do Espírito Santo, no Dia de Pentecoste, eles saíram pregando esta mensagem em toda parte: “O Messias morreu pelos nossos pecados, conforme as Escrituras; Ele foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, conforme as Escrituras”. A julgar pela literatura cristã mais antiga, a 1 Tessalonicenses, eles também pregavam que o Messias iria vir novamente.

Filho de Deus

Geralmente, os cristãos logo interpretam este termo significando divindade. Mas existe uma porção de ocorrências da expressão “Filho de Deus” nos evangelhos e no resto da Bíblia, onde este termo, provável e definitivamente, não significa “divindade” a quem usa ou então escuta o mesmo. Colin Brown declara, pela evidência dos evangelhos, que “Filho de Deus” apenas sugere uma série de conotações não necessariamente divinas. É simplificar demais afirmar que o título “Filho de Deus” expressa a divindade de Jesus e “Filho do Homem”, Sua humanidade.

De fato, devemos ir mais longe e dizer que quase ninguém no mundo judaico do tempo de Jesus escutou ou usou o termo ‘Filho de Deus’ no sentido de divindade. Após pesquisar o VT e a literatura intertestamentária, Geza Vermes concluiu o que achamos bem exato: “De todos os modos, parece que os palestinos do primeiro século d.C. quando escutavam a expressão ‘filho de Deus’ iriam pensar: primeiro, que se tratasse de seres angelicais ou celestes, e segundo, quando a conexão humana fosse esclarecida, de um homem santo”.

Até mesmo nas narrativas dos evangelhos, a conclusão de Geza Vermes é bem exata. Lucas chama Adão “o filho de Deus”, mas ninguém iria achar que Adão fosse divino. [N.T. - Exceto os Mórmons, claro]. Quando o centurião, ao pé da cruz, exclamou: ”Verdadeiramente, este era o Filho de Deus” (Mateus 27:54; Marcos 15:39), ele quis dizer no mesmo sentido em que Lucas o registrou”: ’Na verdade, este homem era justo”. Até mesmo Pedro, quando Jesus lhe indagou quem os homens achavam que Ele era, respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mateus 16:16), poderia, naquele tempo, não ter entendido perfeitamente o sentido divino do termo e ainda tivesse em mente um reino messiânico terreno, conforme a mensagem de Davi a Salomão: “Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho; e, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos de homens” (2 Samuel 7:14).

Este mesmo verso de Samuel prediz a queda de Salomão na iniquidade e o resultante castigo que aconteceu com a divisão do reino. Mas, dois versos, imediatamente precedentes, falam de um reino eterno estabelecido através da semente de Davi. Então, mesmo que Pedro tivesse visto Jesus como o Messias de um reino terreno, poderia haver em sua mente a indagação de como o Messias iria continuar o Seu reinado “para sempre”. Existem lampejos no VT de que o Messias seria mais do que um simples homem mortal. Por exemplo, em Isaías 9:6, uma clara passagem messiânica deve ter causado algumas dores de cabeça aos judeus: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz”.

O Dr. Norman Geisler, professor de Filosofia da religião no Seminário Teológico de Dallas, declara, com referência ao VT que:

“O Messias é identificado como Yavé ou Divindade, em muitas passagens. Ele é chamado Deus poderoso, em Isaías 9:6 e Yavé, em Zacarias 12:10 e 14:3-9. O Messias é chamado “Senhor” (Adonai) no Salmo 110:1, e Deus (Eloim), no Salmo 45:6. (conforme Hebreus 1:8). Segundo Miquéias 5:2, Ele preexistia antes de Belém. E Ele é identificado como o Anjo de Yavé no VT (Isaías 63:7-10), o qual é o “EU SOU” de Êxodo 3:14.

Sem dúvida, o firme monoteísmo dos rabinos judeus conduzia-os a outras interpretações destas passagens, em vez de lidar com a questão de como atribuir divindade ao Messias, enquanto mantendo o claro ensino do VT da existência de um só Deus. Para a maioria dos judeus, no tempo de Jesus, Messias significava Rei - mas não certamente Deus.

Por causa de passagens messiânicas como 2 Samuel 7:14 e Salmo 2:7: “Tu és meu filho, eu hoje te gerei”, o termo “Filho de Deus” naturalmente foi associado ao Messias. Por isso, Caifás exigiu de Jesus: “És tu o Cristo, Filho do Deus bendito?”. Caifás não estava perguntando se Jesus era Deus, apenas se Ele era o Messias. Mas Jesus deu a Caifás, e a todo o Sinédrio, mais do que eles poderiam desejar. Quebrando o silêncio mantido nas perguntas anteriores, Jesus resumiu os mais importantes aspectos do Seu ensino e crença sobre a Sua identidade: “... Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu”.

Lembrem-se que, apenas alguns dias antes, Jesus havia destruído as operações comerciais no pátio do templo. Agora, os membros do Sinédrio escutavam aquele rebelde galileu afirmando:*

Que o Messias, Filho do Deus bendito e o Filho do Homem eram a mesma Pessoa e se referiam a Ele.*

Que Ele se assentaria à direita do poder de Deus, governando sobre os Seus inimigos (Salmo 110:1-2)*
Que Ele era um Sacerdote, governando para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque (Salmo 110:4).*

Que Ele havia feito tudo com autoridade e poder (Salmo 110:5-7).*

Que Ele seria visto vindo sobre as nuvens do céu...

E o mais importante:* Que Ele era, de fato, Yavé, Deus.

John Buel e Quentin Hyder explicam:
“As palavras de Jesus, embora tranquilas, são chocantes em sua audácia. “Ani hu” nesta passagem é entregue como “EU SOU”, em muitas traduções, como uma resposta à pergunta de Caifás: ‘És tu o Cristo, Filho do Deus bendito?’. É a mesma usada na frase ‘Eu sou o que sou’. Certamente, Jesus verificou que Sua audiência, ansiosa na busca de provas contra Ele, iria interpretar Suas palavras na exata significação teofânica. Foi uma deliberada afirmação de Sua divindade e, se não foi a exata resposta que Caifás esperava, foi uma ‘blasfêmia’ bem maior aos ouvidos dele”.

Jesus Acreditava Realmente que Ele era Deus?

Os que escreveram as narrativas históricas da vida terrena de Jesus eram todos judeus. As próprias narrativas fornecem o claro testemunho de que a tendência natural das testemunhas era ver Jesus numa postura messiânica inquebrantável e não numa postura messiânica divina. Até mesmo na noite de Sua prisão, os discípulos lhe trouxeram espadas. Como devotos adoradores de Yavé, teria sido muito difícil para eles entender as coisas que Jesus havia falado e feito, as quais Lhe atribuíam divindade. Geza Vermes declara, com referência à alegada divindade de Jesus, que “a identificação de uma figura contemporânea e histórica com Deus era inconcebível para um judeu palestino do século 1 d.C.” A forte convicção de Geza Vermes é que o próprio Jesus jamais havia imaginado ser Deus. Mas, vejamos as evidências:

Em Mateus 12:6, Jesus diz aos fariseus:

“Pois eu vos digo que está aqui quem é maior do que o templo”. Ao referir-se a Si mesmo, Jesus declara ser “o Senhor do sábado”.

Como poderia alguém ser o Senhor do sábado, exceto Deus, que o havia instituído? Esta foi uma afirmação direta de Sua divindade.

Em Mateus 23:37, Jesus fala como se Ele tivesse, pessoalmente, testemunhado a história de Jerusalém: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas, e apedrejas os que te são enviados! quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e tu não quiseste!”

Em Marcos 2:1-2, Jesus diz a um paralítico: “Perdoados são os teus pecados. E estavam ali assentados alguns dos escribas, que arrazoavam em seus corações, dizendo: Por que diz este assim blasfêmias? Quem pode perdoar pecados, senão Deus?”

(Marcos 2:6-7). Então Jesus falou: “Por que arrazoais sobre estas coisas em vossos corações? Qual é mais fácil? dizer ao paralítico: Estão perdoados os teus pecados; ou dizer-lhe: Levanta-te, e toma o teu leito, e anda? Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma o teu leito, e vai para tua casa” (versos 8-11).
O paralítico foi curado e a implicação foi óbvia. Ninguém poderia perdoar pecados, senão Deus; portanto, Jesus estava afirmando claramente a Sua divindade.

O preletor John Buell e o autor O. Quentin Hyder escrevem:

“Não existe um só verso no VT (ou em qualquer literatura judaica) que dê ao Messias o poder de perdoar pecados, embora a mesma literatura dê este poder a Jeová. Desse modo, ao perdoar pecados, Jesus estava afirmando o Seu poder como Deus e não como o Messias”.

Antes, no Sermão do Monte (Mateus 7:21-23), Jesus fala de Si mesmo como o Juiz final, com autoridade para proibir a entrada no Reino do Céu. No parágrafo seguinte, em vez de “cada pessoa que ouve as palavras de Deus na torá, edificará um sólido fundamento em sua vida”, Jesus declara: “Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras” (Mateus 7:24).

David Biven, pesquisador da origem hebraica dos evangelhos conclui:

“Não era a maneira dEle ensinar, nem mesmo o conteúdo geral do Seu ensino que tornou Jesus único entre os rabinos. O que era exclusivo em Jesus era o que Ele afirmava ser e Ele raramente ensinava sem afirmar que era, não apenas o Messias de Deus, porém, admiravelmente, que Ele era o próprio Emanuel (Deus conosco).”

É surpreendente como os críticos tentam rejeitar as constantes referências de Jesus à Sua própria divindade. Ian Wilson, por exemplo, escreve:
“No Evangelho de Marcos, o que apresenta mais consistentemente a humanidade de Jesus, um homem é apresentado correndo até Jesus e a Ele se dirigindo com estas palavras: “Bom Mestre”.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

A familiaridade de Jesus com as ciências da magia. Parte III

Continuando, além da passagem em Sanhedin 43a, Professor Geza Vermes cita algumas outras que provavelmente aludem aos ensinos de Jesus, indiretamente, bem como em curas efetuadas em seu nome por um díscipulo Jacó (Tiago) de Kfar Secaniah:

"Uma máxima do Rabi Abbahu de Cesaréia, contemporâneo do século III de Orígenes, refere-se quase com certeza a Jesus: - Se um homem lhe diz "Eu sou Deus, ele esta mentindo. Eu sou o filho do Homem [um ser humanõ] , no final ele vai lamentar [pois como todo ser humano, vai morrer] . Eu vou subir aos céus, terá, mas não vai cumprir (yTaan 65 b). A segunda citação de Jesus aparece no Talmude Babilônico (b Abodah zara 16b-17a) atribuídas a rabis ou Taanaim da passagem do primeiro ao segundo século. O famoso R. Eliezer ben Hircano recorda que um cristão judeu, chamado Jacó de Kfar Seranaya, interpretou "Não trarás a casa de (...) teu Deus o salário de uma prostituta, no sentido de que tal dinheiro só seria adequado à construção de uma latrina para o Sumo-Sacerdote. Quando Eliezer confessou que era incapaz de compreender a explicação Jacó apresentou-lhe uma exegese atribuida a Jesus que aparentemente vinculou Miquéias 1:7 (já que elas [ todas as suas estátuas] foram ajuntadas com o salário da prostituição, tornar-se-ão de novo salário de prostituição", a Deuterônomio 23:19 para chegar a explicação: "De um lugar de corrupção elas vieram, e ao lugar de corrupção elas retornarão". Eliezer ficou impressionado com o talento interpretativo de Jesus, e, por causa disso, foi acusado de heresia e excomungado pelos outros rabis." [1]

Jacó de Quefar Secania (ou Quefar Sama) foi um carismático curandeiro judeu-cristão citado diversas vezes na literatura rabínica. As personalidades os quais ligado sugere que esse Jacó atuou na virada do século I para o século II DC. Jacó prometia realizar curas em nome de Jesus de Nazaré e transmitia seus ensinamentos. Uma história o liga ao Rabino Eleazar Ben Dama e seu tio Ismael ben Elisha. Jacó, em nome de Jesus, quis curar Eleazar, que tinha sido picado por uma cobra venenosa. O Rabi Ismael vetou a oferta. Eleazar, desejando ser curado, tentou argumentar com seu tio, mas morreu antes de conseguir faze-lo [2]

Além dessas prováveis referências a Jesus, existem algumas outras, mais incertas, citadas pelo Professor Craig Evans, Acadia University (Canadá) [3]:

"Rabi Meir costumava ensinar 'Qual o significado (do verso), "Aquele que for pendurado no madeiro é maldito de Deus" (Dt 21:23)? Havia dois irmaos gêmeos que eram parecidos. Um reinava sobre o mundo todo e outro se tornou um ladrão. Após um tempo, o que era bandido foi pego e então crucificado em um madeiro. Todos que passavam e viam, diziam "parece que o Rei foi crucificado" (bTalmude, Sinédrio 9:7).

Evans acredita, contra a opinião do célebre talmudista Morris Goldstein, que o texto acima possivelmente alude a Jesus, a cena da crucificação e o "Titulus Crucis" ("Jesus Nazareno Rei dos Judeus"). Evans cita Marcos 14:48 ("Disse-lhes Jesus: Saístes com espadas e varapaus para me prender, como a um salteador?), o termo utilizado para ladrão ou salteador nesta passagem do Talmude teria uma conotação de agitação politica e revolucionária ou rebeldia, semelhante a encontrada na descrição de Flavio Josefo "A Judéia estava infestada de salteadores ... qualquer um podia se proclamar Rei" (Antiquidades 17:285). Essa passagem, juntamente a referência de Jesus como próximo ao governo (ou realeza) em Sinédrio 43a, sugere Evans, seriam uma resposta sarcástica a alegada descendência davídica de Jesus [4]

Prof. Mahlon H Smith [5], da Universidade Rutgers (New Jersey State University), apresenta uma possível alusão a Jesus, encontrada no Talmude Babilônico, Tratado Sinédrio, 106 b. Aqui um minim (ou herege, termo frequentemente usado para designar os cristãos) pergunta ao Rabi Hanina Bar Hama (220-260 DC) qual era a idade de Balaão quando ele foi morto. Hanina diz que os registros não mencionavam essa informação, mas que, no entanto, ele achava que ele teria morrido com 33 ou 34 anos de idade pois "homens de sangue e de traição não viverão metade dos seus dias" (Salmos 55:23). O Minin responde que Hanina devia estar certo, pois no relato sobre Balaão estava escrito que "Balaão, o coxo, tinha 33 anos de idade quando foi morto por Finéias, o ladrão" (bTalmude, Sinédrio, 106b). O Professor Smith observa que Balaão, o falso profeta citado no livro de Números que levou Israel a pecar, seria um codinome utilizado por alguns rabis para se referir a Jesus (em virtude da censura exercida pela Igreja). Da mesma forma 33 anos, seria a idade de Jesus, somando os 30 anos que ele tinha quando iniciou seu ministério (Lc 3:23), com as três páscoas mencionadas no evangelho de João. Ainda segundo Smith, Finéias, o Ladrão, seria também o codinome para Pôncio Pilatos, porque ele se apropriou dos fundos do Templo, incidente mencionado por Josefo (Antiguidades 18:60-62).

Um pouco mais hesitante que Mahlon D Smith, Travis Herford acredita que o codinome Balaão se aplicava a Jesus. Evans é cético quando a essa identificação, assim como Bruce Chilton, Morris Goldstein e Joseph Klausner. Chilton observa que dificilmente os rabinos dariam um nome tão respeitável a alguém como Pôncio Pilatos [6] Entretanto, poderíamos objetar que independente da identificação com Pilatos, o Talmude já usa o termo Finéias, o Ladrão, que é no mínimo estranho se o objetivo era se referir ao venerável sacerdote Finéias, neto de Arão.

Por fim, Jonh.P. Meier cita Klausner, e o julgamento deste quanto as tradições encontradas no Talmude:

Klausner (Jesus of Nazareth, 46) faz o seguinte resumo das afirmações confiáveis na tradição rabínica (1) Yeshu de Nazaré praticava a feitiçaria, istoé, fazia milagres e desencaminhava Israel; (2) Ele zombou das palavras dos sábios (istoé, dos mestres reverenciados de Israel). (3) Interpretava as escrituras da mesma forma que os fariseus (4) Tinha cinco discípulos (5) Dizia que não viera para tirar nada da Lei ou acrescentar algo (6) Foi enforcado (ou seja, crucificado) como falso mestre. Como é facil de ver temos aqui apenas uma imagem invertida e polêmica de várias afirmações dos quatro evangelhos [7]

Assim, o Talmude conteria tradições que compartilhariam a perspectivas básicas das atividades de Jesus, milagres, crítica a religião tradicional, o compartilhamento das crenças básicas dos fariseus, como anjos e ressureição dos mortos, seu relacionamento com Lei, ter discípulos e sua morte violenta. Geza Vermes [8] observa que, provavelmente, os rabinos reinterpretaram antigas tradições populares de Jesus como homem sábio e realizador de milagres, correntes na Palestina, atribuindo esses feitos a prática de feitiçaria. Assim, a imagem popular de Jesus retratada nos evangelhos e reavaliada sob um prisma negativo.

"Quando essas duas acusações são examinadas, elas se tornam uma representação pejorativa do retrato Josefano de Jesus. Pois desencaminhador/falso profeta e "feitiçeiro" são equivalentes deturpados de "homem sábio" e "milagreiro" [8]

O ponto levantado por Vermes, da reinterpretação de antigas tradições sobre Jesus é relevante, principalmente quando comparamos a parte reputada autêntica do polêmico "Testimonium Flavianum", escrita por Flavio Josefo no século I. Josefo diz que Jesus fazia feitos paradoxais ou incríveis, sendo a palavra paradoxa ambigua, isto pode significar tanto maravilhoso quanto controverso. O Talmude (e Celso) diz que Yeshu praticava feitiçaria (o que torna implícito que praticava feitos "controversos", explicados pela suposta prática de magia). Josefo diz que Jesus "era mestre de homens que recebem a verdade com prazer. Ele atraiu muitos judeus e muitos gentios". Os rabis dizem que Yeshu era uma ameaça, pois "levou Israel a pecar" e "o fez apóstata", dando a entender uma popularidade razoável , aliciando e desencaminhando um grande número de díscipulos. Dizem também que um processo foi iniciado, e um arauto saiu a covocar as testemunhas de defesa. Josefo afirma que "os principais homens entre nós o denunciaram". Por fim, no Talmude Jesus é executado e "levantado" (no madeiro), talvez por ordem de "Fineias, o Ladrão" (codinome para Pôncio Pilatos), enquanto Josefo diz que Pilatos o crucificou. É ainda possível que haja uma recordação dos motivos que levaram a execução (algo que Josefo não declara abertamente), de que Jesus foi acusado de ser um insurgente que ameaçava a ordem estabelecida, "O Rei dos Judeus".

Graham Stanton também compatilha da percepção de Geza Vermes ao observar que as acusações imputadas a Jesus nessa passagem do Talmude - que ele praticou feitiçaria e levou Israel a pecar - também são encontradas em Dialogo com Trifo, de Justino, já mencionado.Para Stanton essa tradição rabínica é de dificil interpretação, e mais complicado ainda é data-la com segurança. No entanto, acrescenta que não fora a grande correspondência com a acusação que circulava em circulos judaicos, na metade do século II, de que "Jesus era um mágico e enganador do povo" (Dialogo com Trifo 69:7), seria tentador descartar essa passagem do Talmude como resultado de polêmicas do terceiro século, ou mesmo posteriores, entre judeus e cristãos.Entranto, a terminologia semi-técnica encontrada no grego de Dialogo com Trifo é muito próxima do hebreu das tradições rabínicas. Assim, conclui Stanton, essas tradições teriam raízes profundas.[9]

Em resumo, quais são as informações que podemos obter do Talmude (se é que alguma informação pode ser obtida)?

Além de Johannes Maier, Edgard Leite é bastante cético em relação ao Talmude, "que não parece conter referências claras ao Jesus histórico" [10]

Por outro lado, Professor R. T. France, de Oxford, conclui que, pelo menos a partir do início do segundo século, Jesus era conhecido e abominado como alguém que realizava feitos incríveis e que tinha conquistado tão grande número de seguidores que foi devidamente executado como "aquele que levou Israel a pecar". Embora depreciativo, pelo menos é, de uma maneira distorcida, evidência para o impacto razoável dos milagres de Jesus e de seus ensinos. A conclusão de que isto é inteiramente dependente da pregação cristã, e que "judeus do segundo século adotaram de forma acrítica o pressuposto de que ele realmente existiu " é certamente resultado do ceticismo dogmático. Tal polêmica, frequentemente utilizando "fatos" completamente distintos do que os cristãos acreditavam, muito dificilmente teria surgido em menos de um século em torno de uma figura inexistente." [11]

Também Geza Vermes, observa que histórias como a de Jacó de Kfar Secaniah "indicam que um judeu cristão palestino no final do século I DC estava se dedicando, como os apóstolos e seus seguidores imediatos nos Atos dos Apostolos, a curar e pregar em nome de Jesus. Ainda, os textos rabínicos mostram que o mundo oficial rejeitava essas práticas, mas que judeus e até mesmo rabinos não necessariamente se opunham a elas na sociedade judaica palestina do fim do século I" [12]

Da mesma forma, Max Wilcox, Professor da Universidade de North Wales, avalia que o Talmude e outros escritos da literatura rabínica embora mencionem Jesus de forma muito esporádica, e devam ser utilizados pelo historiador de forma muito cautelosa e criteriosa, acabam por endossar as afirmações evangélicas de que Jesus curava e operava milagres, ainda que atribuindo esses feitos a feitiçaria. Além disso, preservam uma memória de que ele era um mestre, tinha discipulos, e de que pelo menos no início do período rabínico nem todos os rabinos tinham se convencido totalmente de que ele era um herege e enganador. [13]

Assim, em vista do exposto, podemos dizer que passagens sobre Jesus no Talmude devem ser avaliadas com cautela, reconhecendo que mais provavelmente trazem um "eco" de informações e tradições antigas, frequentemente de forma âmbigua, não devendo ser tomadas ao "pé-da-letra". Analisando em conjunto com o Dialogo com Trifo (69:7), e Celso, podemos dizer que o Talmude reforça a percepção de alguns fatos da vida de Jesus, encontrados nessas e em outras fontes, sua execução violenta em conflito com as autoridades, sua fama de realizador de milagres e feitos extraordinários (atribuidos por alguns rabinos a atos de feitiçaria), de que ele conseguiu alcançar um grupo razoavel de discipulos ("pois levou Israel a pecar e fez apóstata"), ainda que, por vezes, apareçam alguns sinais de que a hostilidade não é completa, de que, como já disse Geza Vermes, judeus e até mesmo rabinos não necessariamente se opunham a elas na sociedade judaica palestina do fim do século I .

Desta Forma, em vista das observações de Klausner, Vermes e Wilcox, acima, concluimos que as tradições populares sobre Jesus na Palestina, (provavelmente) teriam sido conservadas pelos rabinos por várias gerações, e não eram necessariamente hostis. Com o tempo, a medida que os caminhos de cristãos e judeus foram se afastando, essa memória foi sendo reinterpretada de forma cada vez mais polêmica e hostil.
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Referências bibliograficas:

[1] Geza Vermes, O Autêntico Evangelho de Jesus , fl.19, nota 33[2] Geza Vermes, Quem é quem na época de Jesus, fls. 152-153[3] Craig Evans; Jesus in Non Christians Sources in Bruce Chilton & Craig Evans; Studying the Historical Jesus, fl. 447[4]Craig Evans; Jesus in Non Christians Sources in Bruce Chilton & Craig Evans; Studying the Historical Jesus, fl. 449[5] Mahlon H. Smith, Into His Own, Jesus and Christians in non Christians sources, 191http://virtualreligion.net/iho/jesus.html, acessado em 23.12.2009[6] Craig Evans; Jesus in Non Christians Sources in Bruce Chilton & Craig Evans; Studying the Historical Jesus, fl. 449, nota 16[7] John P. Meier, Um Judeu Marginal, Vol. I fl. 115, nota 62[8] Geza Vermes, Jesus in His Jewish Context fl. 98[9] Graham Stanton, Gospel Thuth?New Light on Jesus and the Gospels, fl. 157[10] Edgard Leite, Yeshu Ha Notzri e sua viagem ao Egito: Uma Parábola Talmudica in Chevitarese, Corneli & Selvatici; Jesus de Nazaré, Uma outra História, fl. 291.[11] R T France The Evidence for Jesus, fl. 39[12] Geza Vermes, Quem é quem na época de Jesus, fls. 154[13] Edwin Yamaguchi, Jesus Outside the New Testament: What is the Evidence, in Wilkins & Moreland; Jesus Under Fire, fls. 214)

sábado, 22 de maio de 2010

As origens do messianismo de Jesus

O Messianismo Catastrófico e as Origens do Cristianismo

O presente estudo tem como objetivo apontar a precedência do chamado “messianismo catastrófico” em relação às tradições cristãs, enfatizando que a crença no messias filho de José/Efraim possui antiguidade pré-cristã e que não se trata de uma concepção messiânica derivada do cristianismo.

Acreditava-se, até recentemente, que os judeus da Palestina judaica da época de Jesus concebiam a vinda de um só messias, o messias “filho de Davi”, que restauraria a realeza. No entanto, novas descobertas - e com elas novas interpretações sobre o imaginário judaico-cristão primitivo - têm mudado essa visão. Mediante essas descobertas, os pesquisadores se tornaram cada vez mais dispostos a conceberem o messianismo judaico da época de Jesus como pluriforme e variado, existindo não só uma ou duas, mas inúmeras concepções sobre o messias. O presente trabalho traz alguns apontamentos sobre o chamado “messianismo catastrófico”, sua antiguidade e sua relação com as tradições cristãs. Esperamos contribuir também para apagar os mitos de que os judeus do primeiro século não foram capazes de conceber um messias que morre e que a concepção messiânica na época de Jesus era homogênea.

1. Repensando o Messianismo

Não foram poucos os estudiosos que alegaram que a ideia de um messias sofredor, cujo destino era ser humilhado e assassinado, era uma ideia estranha às tradições messiânicas existentes na Palestina judaica do século I d.C. Rudolf Bultmann (apud, KNOHL, 2001: 16) talvez tenha sido o estudioso que mais contribuiu para a disseminação dessa visão: “a ideia de um Messias, ou filho do Homem, sofredor, morrendo e ressuscitando era desconhecida no judaísmo”. Geza Vermes (2006: 215), por sua vez, não deixa dúvidas de que o modelo de messias que morre é posterior à escrita dos Evangelhos bíblicos:

A representação do Messias assassinado da tribo de Efraim, ocasionalmente mencionado na literatura rabínica [...] é de pouca valia para o estudo dos Sinóticos. [...] Como nenhum texto fale do Messias assassinado anterior à segunda revolta judaica contra Roma durante o reino de Adriano (132-5 d.C.), é provável que a figura tenha sido moldada a partir do líder derrotado daquela rebelião, Simon bar Kosiba, que foi morto na batalha de Betar em 135 d.C. Assim, ele não se qualifica cronologicamente como modelo potencial para o Messias dos Evangelhos.

Com freqüência a literatura rabínica faz menção a um messias chamado “Messias ben Efraim”, também chamada de “Filho de José” ou “Filho de Efraim”, que deveria morrer para salvar Israel. O Talmude Babilônico, Sukka 52a, que geralmente é concebido como a primeira referência ao messias filho de José na literatura rabínica, traz o seguinte texto:

“E a terra pranteará, família por família à parte. A família da casa de Davi à parte e suas mulheres à parte” (Zc 12:12). [...] Qual é a causa do luto? Rabi Dosa e os rabinos diferem. Um diz: “É por causa do Messias ben José que foi assassinado”; [...] por isso é que está escrito: “e eles olharão para mim. Quanto àquele que eles transpassaram, eles o lamentarão como se fosse a lamentação de um filho único; eles o chorarão como se chora um primogênito (Zc 12,10) [...] Nossos rabis nos ensinaram: O Santo, Bendito seja Ele, dirá ao Messias filho de Davi (que ele possa se revelar o mais breve possível em nossos dias!): “Peça-me qualquer coisa e eu lhe darei” (Salmos 2) [...] Mas quando ele perceber conta de que o Messias Filho de José está morto, ele dirá: “Senhor do universo, peço de você somente o dom da vida” (cf. MITCHELL, 2006: 77, 83).

No entanto, a escritura do Talmude só começou nos séculos posteriores ao cristianismo e, portanto, conforme o exposto por Geza Vermes, o Messias Filho de José pode ser uma invenção judaica criada a partir de Jesus para competir com o cristianismo. Em todo caso, tal modelo de messias era concebido pelos estudiosos como bastante tardio para ser capaz de trazer alguma contribuição aos estudos sobre o cristianismo primitivo, e foram muitos os especialistas que viram na figura messiânica de Efraim, ou Messias filho de José, uma “cópia” deliberada da figura messiânica de Jesus apresentada nos Evangelhos, e por isso não lhe deram crédito e muito menos antiguidade.

No entanto, como ressalta Scardelai (1998: 120): “O caráter da doutrina messiânica no tempo de Jesus é marcado pela fluidez e espontaneidade, além da quase total ausência de princípios doutrinários cristalizados”. Em outras palavras, não se deve esperar que o messianismo palestino-judaico do primeiro século apareça com uma só forma. Um desses modelos seria o do “servo sofredor”, tal como apresentada no texto do profeta Isaías (53.3-5) que o retrata como justo, manso e humilde:

Era desprezado e abandonado pelos os homens, homem sujeito à dor, familiarizado com o sofrimento, como pessoa de quem todos escondem o rosto; desprezado, não fazíamos caso nenhum dele. E, no entanto, eram nossos sofrimentos que ele levava sobre si, nossas dores que ele carre-gava. [...] Mas ele foi trespassado por causa das nossas transgressões, esmagado por causa das nossas iniqüidades. O castigo que havia de trazer-nos a paz, caiu sobre ele, sim, por suas feridas fomos curados.

Flusser (apud, SCARDELAI, 1998: 299), erroneamente, afirma que a ideia do messias como o “servo sofredor” de Isaías foi exclusiva do cristianismo:

A exegese cristã privilegiou o significado vicário do sofrimento de Jesus, à luz da figura do “servo”, retratado por Isaías, uma abordagem rejeitada pelo judaísmo normativo. A exegese judaica não aplica a imagem do “servo de Isaías” às qualificações pessoais messiânicas, exceto se aí estiver presente a figura do próprio Israel coletivo, o “servo de Deus” por excelência.

No entanto, essa visão é equivocada. Knohl (2001: 38) afirma que: “[...] a interpretação messiânica de Isaias 53 [sobre o “servo sofredor”] não foi descoberta na igreja cristã. Ela já havia sido desenvolvida pelo Messias de Qumrã”. O movimento de Qumrã, de acordo com Knohl (2001: 28, 31), já trazia a ideia de que o messias iria padecer, mas que também seria glorificado, que consta nos “Hinos Messiânicos dos Manuscritos do Mar Morto”:

“[Quem] foi desprezado como [eu? E quem] foi rejeitado [pelos homens] como eu? Quem, como eu, suport[ou todas as] aflições? Quem se compara a mim [na resistência do mal? [...] [Q]uem foi considerado desprezível como eu e, no entanto, quem é igual a mim em minha glória?”

Tendo essa ideia sido explorada, juntamente com a do messias levítico, antes mesmo do cristianismo vir a existir, é lógico conceber que vários movimentos messiânicos e apocalípticos dos primeiros séculos compartilhavam dessas mesmas crenças.

De acordo com Mitchell (MITCHELL, 2008 [online]), esse modelo de “servo sofredor” foi o principal inspirador de um tipo de messianismo diferente do messianismo real e sacerdotal, e que podemos encontrar indícios da existência da crença nesse messias nos Manuscritos de Qumrã. Esse modelo foi chamado de “messianismo efraimita-josefita”, ou “Messias filho de Efraim/José”.

Para provar a existência desse messias, Mitchell (2008: 03 [online]), compara as afirmações do Talmude Sukka 52b, que faz menção a quatro personagens escatológicos, chamados de “Os Quatro Artesãos”, com o manuscrito de Qumrã de 4Q175 (4QTestimonia), uma antologia messiânica e coleção de textos bíblicos fundamentais ou “testemunhos”, relacionadas com a crença messiânica. O Talmude Sukka 52b (In: MITCHELL, 2008: 03 [online]) traz a seguinte passagem:

E o Senhor me mostrou quatro chifres (Zac 2.3 [1.18]). O que são esses quatro chifres? R. Hana B. Bizna cita o R. Simeon Hasida que responde: O Messias filho de David, o Messias filho de José, Eliahu (Elias) e o Sacerdote Justo. R. Shesheth objetou…, estes quatro personagens estão relacionados com o exílio diaspórico.

Desse modo, esses “quatro artesãos” se referem a: 1) o “Messias filho de Davi”; 2) o “Sacerdote Justo”, ou “Melchizedek” (Melquisedeque); 3) Elias; 4) o “Messias da Guerra”, que se refere ao “Messias filho de José”.

Segundo Mitchell (2008: 06 [online]), de modo surpreendentemente idêntico, o manuscrito de Qumrã de 4Q175 (4QTestimonia), traz uma menção dos “Quatro Artesãos” apresentados na mesma ordem: o profeta, o rei, o sacerdote e o guerreiro, como libertadores escatológicos, começando suas correspondentes referências bíblicas: (1) Deut. 18.18-19, que discorre sobre o profeta como Moisés (profeta), (2) Num 24.15-17, que alude à estrela que sai de Jacó (rei); (3) Deut. 33.8-11, que menciona a bênção dos Levitas (sacerdote); (4) Josué 6.26, que menciona a maldição de Josué a Jericó, seguido de uma passagem do “Apócrifo Josué”, também chamado de “Salmos de Josué” (4Q379) outro documento encontrado em Qumrã.

Comparação entre Os Quatro Artesãos da literatura rabínica e 4Q175
4Q175 (Qumrã)
Profeta
Rei Messias
Sacerdote
Josué, Messias da Guerra (filho de José)

Os Quatro Artesãos da tradição rabínica
Profeta
Rei Messias
Sacerdote
Messias da Guerra filho de José

De acordo com Mitchell (2008: 02, 03 [online]), as implicações messiânicas que surgem no quarto depoimento a respeito de Josué não devem ser desprezadas:

Não é clara a razão pela qual a figura de Josué tem sido tão esquecida. Todos os quatro testemunhos são idênticas em sua estrutura: a figura do herói, o versículo bíblico e maldição. Se os três primeiros representam libertadores escatológicos, então o caso do quarto deveria ser tomado a priori da mesma forma. Isto não apenas explicaria a figura de Josué em si, mas faria sentido em todo o documento em vez de apenas os seus primeiros três-quartos. Mas, por algum motivo isso não tem sido sugerido. No entanto, proponho que a interpretar o quarto depoimento de uma forma coerente com os três primeiros é perfeitamente razoável e produz um resultado bastante aceitável, isto é, um Josué escatológico. Esta figura, como o Josué bíblico, seria um conquistador bélico e da ascendência de José e Efraim. Poderíamos com razão chamá-lo de Messias da Guerra ben Efraim ben Joseph (filho de Efraim filho de José).

De fato, Josué foi homem de guerra e sucessor de Moisés, da tribo de Efraim, filho de José. Ele é, sem dúvida, o heroi do quarto depoimento, assim como Moisés, a Estrela de Jacó, e os Sacerdotes Levitas são os herois dos três primeiros (MITCHELL, (2008: 01 [online]). Desse modo, Mitchell prova não apenas que a tradição rabínica do Messias filho de Efraim/José é pré-rabínica, como também pode ter influenciado a formação da imagem de culto cristã.

2. O Apocalipse de Gabriel: repensando Jesus

Knohl (2001: 41) propôs a hipótese de que a crença no messias que morre e ressuscita ao terceiro dia era uma representação imaginária bastante comum na Palestina do primeiro século – até mesmo muito tempo antes de Jesus ter nascido. Essa hipótese foi confirmada em julho de 2008, pela descoberta do texto recém publicado chamado “Apocalipse de Gabriel”, em que, de acordo com as restaurações textuais de Israel Knohl e de Ada Yardeni, também traz a ideia do messias ressurrecto. Esse texto data do final do século I a.C., o que significa que se trata de um documento pré-cristão (YARDENI, 2008 [online]).

Nas linhas 16-17 há a frase “Meu servo Davi, peça a Efraim [que ele coloque o sinal...” (YARDENI, 2008 [online], p. 01). Infelizmente, a natureza do sinal não é especificada, mas, segundo Knohl (2009 [online]), parece ser o sinal de salvação. No entanto, o fato de Davi ser enviado por Deus para fazer um pedido a Efraim para colocar o sinal pode atestar que Efraim está em uma posição superior. Ele, e não Davi, é a pessoa-chave que é convidada a colocar o sinal; Davi é apenas o mensageiro.

Na linha 80 desse escrito, Gabriel determina ao “príncipe dos príncipes” (o messias) que: “Depois de três dias, viva (ressuscite)!” (YARDENI, 2008 [online],. linha 80, p. 02). Essa passagem - tal como a tradição que serviu de base para Apocalipse de João, cap. 11, como o Apocalipse de Zerubabel, e como o Oráculo de Histaspes – mostra que, em uma época anterior ao cristianismo, existiam expectativas messiânicas ligadas a crença de que o messias morreria e ressuscitaria no terceiro dia.

2.1 “Jesus” antes de Jesus

Tais considerações levaram os especialistas a repensarem o que já sabiam sobre Jesus e procurarem sinais em sua tradição literária que constituísse um paralelo entre essas duas concepções. Por exemplo: ao confrontarmos a imagem evangélica de Jesus com a imagem do messias filho de José, surge uma pergunta: Se o modelo de messias “filho de José” influenciou Jesus, não seria muita coincidência que o nome do pai civil de Jesus seja “José”? De fato. Embora Jesus, como qualquer outro ser humano, tenha realmente tido um pai, é muito provável que a filiação de Jesus a José, o carpinteiro, seja uma “historização” de um título messiânico – o título de messias “filho de José” (o patriarca bíblico).

Desse modo, o título messiânico “filho de José”, originalmente usado para designar o modelo de messias que Jesus representava, transformou-se mais tarde no nome de Jesus e no nome de seu pai terreno.

O mesmo questionamento pode-se fazer em relação ao nome “Jesus”. De acordo com o Livro bíblico de Josué, Josué foi a pessoa que cumpriu a profecia de José e de Jacó, feitas no Livro de Gênesis, de que conquistaria a terra de Canaã para os filhos de Israel. Josué (cuja grafia em hebraico é a mesma de Jesus), que foi considerado o sucessor de Moisés e que encabeçou a Conquista de Canaã, pertencia à tribo de Efraim, filho de José. A proeminência da figura de Josué como um tipo messiânico pode ser deduzida pelo fato de que, na época da dominação romana, boa parte da crença messiânica estava vinculada a ideais de guerra, em que o messias venceria os inimigos de forma belicosa. No imaginário judaico e na tradição bíblica, Josué foi tido como um dos maiores guerreiros da história de Israel, protótipo de qualquer guerreiro que lutasse pela liberdade de Israel. Desse modo, é inevitável que a figura de Josué seja elevada ao status de messias guerreiro e libertador de Israel.

Flávio Josefo (In: WHISTON, 2008 [online]) nos oferece um exemplo da aspiração messiânica em torno de Josué quando relata que, durante o reinado de Nero, um autodenominado profeta aparecera no Monte das Oliveiras e previram que, como Josué, ele iria fazer cair as muralhas da cidade em seu comando. Uma vez que o Monte das Oliveiras era reconhecido, de acordo com Zacarias 14.4, como o lugar onde o Messias apareceria, Josefo vê esse profeta como um aspirante messiânico de Josué. Desse modo, temos Josué, além de Davi, Elias, Aarão e Moisés, entre outros, como modelo bíblico de proclamação messiânica.

Na literatura samaritana, o livro denominado “Segredos de Moisés” ou “ASATIR” (In: KRAFT, 2008 [online]), o qual foi compilado em torno do final do século III a.C., faz algumas observações sobre os Oráculos de Balaão (Num 10,45 a 24,17), e afirma que: “ „Uma estrela procederá de Jacó‟ - esta refere-se a Finéias, e um cetro procederá de Israel‟ - este se refere a Josué” (tradução nossa).
Na literatura tardia dos samaritanos, Fineias e Josué como figuras escatológicas, são substituídos por Tahab, o profeta-messias que irá construir o templo no monte Gerizim (KRAFT, 2008 [online]). Sendo que Jesus é procedente da terra imediatamente próxima à Samaria, ou seja, a Galileia, é possível que sua autoconsciência messiânica girasse em torno das ideias nortistas.

Kraft (2008 [online]) também comenta que uma versão latina de 4 Esdras 7.28f traz a figura do Messias vitorioso denominado “Josué”, o qual morre na transição para o novo mundo e cita uma tradução grega de Habacuque 3.13 que traz: “Tu sais para salvamento do teu povo, por Josué o teu ungido” ao invés de “Tu sais para salvamento do teu povo, para salvar o teu ungido”.

A passagem de Habacuque 3.13 em hebraico traz as seguintes expressões: ישע (yesha`) חישמ (mashiyach). Yesha` significa “salvação”, enquanto mashiyach significa “ungido”. No entanto, a palavra “yesha`” também pode ser traduzida por “Jesus”, ou “Josué” (ישע = yeshua` = Jesus/Josué) (MENDES , 2000; ALAND, 1988).

Os Oráculos Sibilinos 5.256-259 (In: KRAFT, 2008 [online]), que datam do ano de 140 a.C., traz a seguinte passagem messiânica: “[...] uma vez que deve vir do céu, um homem de pré-eminente […] o mais nobre dos Hebreus [...] que em seu tempo fez o sol parar” (tradução nossa). O único personagem bíblico que fez o sol parar foi Josué, na batalha de Aijalon (Js 10.12-14). Desse modo, esse homem “pré-eminente” configura um novo e escatológico Josué.

Desse modo, também podemos questionar se o nome de Jesus de Nazaré não é mais que um título messiânico. Crossan (2004: 558) nos oferece uma luz para essa questão, ao afirmar que a história de Barrabás nos evangelhos bíblicos é simbólica: foi criada porque a multidão de Jerusalém tinha escolhido os salvadores errados, do tipo rebeldes-bandidos (Barrabás), ao invés do salvador correto (Jesus), na guerra contra Roma que começou em 66 d.C. Desse modo, dois “salvadores” se justapunham. Sendo que vários manuscritos gregos de Marcos 15.7 trazem a designação “Jesus” antes de “Barrabás” (literalmente, “Jesus filho do Pai”), é possível que “Jesus” fosse mais que um simples nome, e que originalmente era concebido como uma designação messiânica, já que “Jesus” significa “salvador” = a função do messias.

2.2 O messias efraimita na tradição cristã

O Evangelho de João, que traz materiais tradicionais bastante antigos sobre Jesus, muitas vezes faz alusão a uma ideia diferente de messias, que se coaduna muito mais ao modelo messiânico efraimita que ao modelo davídico. Pietrantonio (2008 [online]) apresenta algumas indicações, no Evangelho de João, da influência do messianismo efraimita:

O EvJn [Evangelho de João] 11,54 relata que Jesus permaneceu três meses, segundo sua cronologia, em uma aldeia chamada Efraim. No NT [Novo Testamento] essa é a única vez e o único lugar em que se recorre a esse nome. [...] A razão histórica dada pelo EvJn é que sacerdotes e fariseus (11,47) decidiram matá-lo (11,53). [...] A retirada a Efraim geográfica, na redação do EvJn, requer uma compreensão teológica, profundamente cristológica, enraizada em uma das expectativas messiânicas daquele tempo, a do Messias ben/bar Efraim/José.

O Evangelho de João 11.50 também faz uma alusão explícita à tradição efraimita, quando afirma que o sumo-sacerdote José Caifás profetizou que Jesus deveria morrer “pela nação e não somente pela nação, mas também para reunir em um só corpo os filhos de Deus, que andam dispersos”.

Os “filhos de Deus”, que andam “dispersos” se referem às Doze Tribos dispersas na época do Exílio Babilônico, que ocorreu no século VII a.C. Reunir as doze tribos e as duas casas de Israel, a saber: a Casa de Judá e a Casa de José, era uma das prerrogativas do messias. Historicamente, os descendentes de Efraim, pertencentes à Casa de José, se separaram da Casa de Judá, fundando um reino independente chamado de “Israel”. Estes viviam ao norte, longe do reino de Judá no sul, mas que logo foi destruído pela Assíria (ano de 722 a.C.) e os que restaram foram chamados de “samaritanos”, por causa da antiga capital desse reino, Samaria. Desse modo, Jesus, ao morrer, estaria não apenas cumprindo esperanças judaicas, mas também samaritanas ao reunir as casas de Judá e de José. A alusão a “morrer pela nação... e para reunir em um só corpo os Filhos de Deus” também é significativa, pois possui um significado claramente redentor, e, portanto, um significado “catastroficamente” messiânico.

Outro indício da presença efraimita na tradição antiga de Jesus está na passagem de João 7.41,42 que, ao narrar indagações messiânicas sobre Jesus realizadas por alguns indivíduos que pareciam conhecê-lo desde a infância, apresenta a seguinte indagação: “Porventura, o Cristo virá da Galiléia? Não diz a Escritura que o Cristo vem da descendência de Davi e da aldeia de Belém, donde era Davi?”. Tais indagações eram, de fato, perguntas retóricas: que razão teria o povo para realizar tais perguntas se Jesus tivesse realmente nascido em Belém e fosse da descendência de Davi? A despeito do que dizem os Evangelhos de Mateus e Lucas sobre a genealogia davídica de Jesus, o evangelho de João deixa implícito que Jesus era natural da Galiléia, e não de Belém, e que se silencia diante da tradição que considera Jesus como da descendência de Davi. Por isso, é provável que os demais evangelhos tentam apenas adequar, post hoc, Jesus ao modelo messiânico davídico, mas que originalmente Jesus fosse concebido como “filho de José”. Outras passagens dos evangelhos também desafiam a ideia vigente de um messias davídico, deixando transparecer que Jesus não se encaixava dentro desse modelo de messias. De acordo com Knohl (2009: 05 [online]), Jesus rejeita a ideia de que o Messias seja filho de Davi, quando afirma que: “Como podem os escribas afirmarem: "o Cristo é o filho de Davi‟, se Davi chama o messias de filho?” (Marcos 12.35).

Dada a natureza “catastrófica” do messianismo de Jesus, é mais correto afirmar que a figura e missão de Jesus se adequa muito melhor ao modelo de messias efraimita que ao modelo davídico.

3.3 A “ressurreição” do messias

A tradição existente por trás do Talmude Babilônico Sukka 52a apresenta paralelo com o Apocalipse de Zerubabel, o Oráculo de Histaspes e o Apocalipse de João, fundamentando biblicamente o destino trágico do messias sofredor “filho de José” na passagem de Zacarias 12.10, que traz o seguinte texto:

Derramarei sobre a casa de Davi e sobre todo habitante de Jerusalém um espírito da graça e de súplica, e eles olharão para mim a respeito daquele que eles transpassaram, eles o lamentarão como se fosse a lamentação por um filho único; eles o chorarão como se chora sobre o primogênito.

A tradição cristã, desde cedo, se utilizou dessa passagem bíblica como fundamento profético para a morte de Jesus, como atesta o Evangelho de João 19.31-36:

Como era a Preparação, os judeus, para que os corpos não ficassem na cruz durante o sábado – porque esse sábado era grande dia! – pediram a Pilatos que lhes quebrassem as pernas e fossem retirados. Vieram, então, os soldados e foram e quebraram as pernas do primeiro e depois do outro, que fora crucificado com ele. Chegando a Jesus e vendo-o já morto, não lhe quebraram as pernas, mas um dos soldados traspassou-lhe o lado com a lança e imediatamente saiu sangue e água. [...], pois isso aconteceu para que se cumprisse a Escritura: Nenhum dos seus ossos será quebrado. E uma outra Escritura diz ainda: Olharão para aquele que traspassaram.

No entanto, é bastante provável que os antigos judeus e cristãos soubessem a identidade desse “primogênito” por meio das Escrituras hebraicas:: “[...] [deu-se o direito de primogenitura aos filhos de José, filho de Israel; [...] Judá suplantou seus irmãos e obteve que um príncipe nascesse dele, mas o direito de primogenitura pertencia a José”. (1Crônicas 5.1-2).

Da mesma forma, o profeta Jeremias (31.9) chama “Efraim” (se referindo a um dos dois reinos separados, mas que a literatura rabínica e possivelmente os judeus messiânicos do século I entenderam como uma referência ao messias filho de José) de “primogênito: “Em lágrimas voltam, em súplicas eu os trago de volta. Conduzi-los-ei às torrentes de água, por caminho reto, em que não tropeçarão. Porque sou pai para Israel e Efraim é o meu primogênito”. Sendo que o “primogênito” de Deus são os filhos de José (Efraim), seria óbvio que o Talmude Babilônico Sukka 52a associasse o messias filho de Efraim à passagem de Zacarias 12.10. Os adeptos do messianismo efraimita poderiam entender essa expressão como uma referência ao messias filho de José. Da mesma forma, o cristianismo entendeu essa expressão como uma referência ao messias Jesus Cristo (Hb 1.6; Lc 2.7; Rm 8.29; Cl 1.19).

O fato é que a ideia de primogenitura poderia ser facilmente confundida como um atributo do messias filho de José, sendo que o messias filho de José “viria primeiro” que o messias filho de Davi e, portanto, ser o primogênito. De acordo com o Talmude Sukka 52a (cf. MITCHELL, In: AVERY-PECK, 2006: 83), quando o messias filho de Davi pede o “dom da vida” para que possa ressuscitar o messias filho de José, que foi morto pelas forças de Gogue e Magogue, o messias filho de José é o “primeiro da ressurreição dos mortos”: não somente o messias filho de José é ressuscitado, mas também se realiza a esperança da ressurreição geral de todos os mortos profetizada em Daniel 12.2. Da mesma forma que Jesus Cristo foi o “primeiro da ressurreição dos mortos” (1Cor 15.20; Atos 26.23), o messias filho de José seria o primeiro a ressuscitar no evento da ressurreição geral de todos os mortos justos.

As duas principais passagens das Escrituras hebraicas que justificariam a ressurreição de Jesus, isto é, Oséias 6.2 e Ezequiel 37.1-10, foram escritas em um contexto efraimita: Enquanto a descrição do vale dos ossos secos Ezequiel é metáfora para a reunião das Casas de Judá e de Efraim, a ressurreição “ao terceiro dia” de Oséias 6.2 reflete a união entre Efraim e Judá e a dispersão de Israel, que será restaurada, ou “revigorada” no segundo dia e “ressuscitada” no terceiro dia. Desse modo, a ressurreição do messias de efraim, e provavelmente a ressurreição de Jesus, era um símbolo da “ressurreição” da nação de Israel através da união da Casa de Judá com a Casa de José/Efraim.

Conclusão

Diante dos fatos e indícios apresentados, somos capazes de compreender que não somente a Revelação de Gabriel, mas também o Evangelho de João e outros indícios esparsos na literatura judaica e cristã antiga nos fornecem subsídios para repensarmos uma nova visão a respeito da figura de Jesus e de sua ligação com o judaísmo e o messianismo de sua época, principalmente o messianismo efraimita. Vimos que a imagem de Jesus foi, de fato, influenciada pela tradição do messias efraimita, apesar de não podermos afirmar com precisão o quanto dessa influência foi deletada e o quanto ainda persiste na tradição sobre Jesus e nem o quanto essa influência foi apagada pela necessidade de se conceber Jesus como o messias davídico – o messias esperado dos judeus. Seja como for, esses dados poderão abrir novas possibilidades de leitura e interpretação dos textos bíblicos, da tradição judaica e das origens cristãs, contribuindo, assim, para uma maior compreensão da influência que a figura histórica de Jesus de Nazaré exerceu sobre a mente de seus ouvintes e seguidores, bem como seu real papel no cenário judaico do século I da Era Cristã.
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