sábado, 20 de julho de 2013

Em Busca do Jesus Histórico entrevista: André Leonardo Chevitarese

JH - Como surgiu a ideia de escrever uma trilogia sobre como o cinema retratou Jesus?
AC - Ela tem haver com meu atual projeto de pesquisa no Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Vale lembrar, ao mesmo tempo, que há um campo específico de estudo que analisa de forma intensa a relação cinema e Jesus desde os anos setenta do século XX. Uma pessoa interessada poderá conhecer parte dessa extensa produção historiográfica consultando a bibliografia do livro “Jesus no Cinema. Um Balanço Histórico e Cinematográfico entre 1905-1927”.
 
JH - Você aborda o período entre 1905 e 1927. Qual filme você poderia destacar e por quê?
AC - Para esse período, há bons filmes, mas, se for para destacar um deles, eu citaria “Intolerância” de Griffith.
Esse diretor foi o responsável por instaurar uma linguagem específica para o cinema, que a distinguia, por exemplo, do teatro. Ele também foi o responsável por inserir os cortes nos filmes, bem como estabelecer um diálogo entre o Jesus do século I, com aquele de sua própria época.
 
JH - Na sua concepção como Jesus deveria ser, de fato, abordado no cinema?
AC - Não acho que exista uma abordagem e/ou um tratamento específico para Jesus no cinema. Ao contrário, acho que a polifonia e a polissemia, acompanhadas de retratos multifacetados, dizem muito sobre a nossa recepção acerca do Nazareno do século I.
 
JH - Algum dos filmes analisados chegou mais perto dessa sua análise (referente à terceira pergunta)?
AC - Em se tratando dos filmes mudos, é flagrante a forma como as recepções acerca de Jesus variam de maneira significativa, especialmente quando comparamos as leituras de Alice Guy, Robert Weine e Griffith. Por se tratar de uma mulher, a francesa Guy trouxe um olhar muito original, ao fazer das mulheres discípulas de Jesus. Já alemão Weine enfatizou dramaticamente um Jesus racializado, sisudo, avesso às questões terrenas. O norte-americano apresenta um Jesus bastante humano, próximo das pessoas, com um comportamento abertamente liberal.




quarta-feira, 17 de julho de 2013

Jesus no cinema: Um Balanço Histórico e cinematográfico entre 1905 e 1927

Olá, você já conhece o novo lançamento da Editora Kliné? Então não perca tempo. Conheça o novo livro do historiador André Chevitarese (UFRJ). Ele está lançando o primeiro volume da trilogia Jesus no Cinema. O livro vai mostrar como o cinema construiu a imagem de Jesus.
Leia, abaixo, um pequeno trecho do livro.
Advertência ao Leitor Desavisado
Convém deixar claro o propósito deste livro, enquanto estas primeiras linhas estão sendo lidas: ele é estritamente acadêmico e tem por objetivo entender, a partir da produção fílmica restrita às três primeiras décadas do século XX, como Jesus foi apropriado pelo cinema, especialmente no que se refere à sua estética, história e teologia. Ele busca compreender, portanto, como esta personagem foi construída pelos diretores de filmes, como eles a fizeram interagir com os seus interlocutores, fossem eles amigos ou inimigos.
Apesar da filmografia sobre Jesus, neste período, ser extensa (ver abaixo Tabela 1), uma parte dela não resistiu à ação do tempo e desapareceu, enquanto que a outra tem alguns filmes distantes do grande público, especialmente porque eles não estão mais à venda (Lang, 2007: 13). É uma pena que essas primeiras experiências fílmicas, datadas ainda dos últimos anos do século XIX, que dialogavam com “Paixão de Cristo de Oberammergau”, não existam mais, ou películas alemães, como “Der Galiläer” e “I.N.R.I.”, tenham, nos dias atuais, uma circulação restritíssima, demandando muita persistência por parte dos pesquisadores para obtê-las ou, simplesmente, vê-las. Como consolo a essas ausências ou às dificuldades de acesso, vale destacar o papel fundamental desempenhado pela historiografia, na medida em que ela proporciona todo um conjunto de informações, absolutamente imprescindíveis, sobre quase toda essa filmografia.
Por fim, mas não menos importante, o leitor vai observar a opção feita em comentar detalhadamente cada filme contido no livro. O seu propósito foi metodológico, de um lado, e o de tornar possível a elaboração da crítica, por outro. É claro que um maior ou menor destaque a uma dada cena tem a ver com interesse e formação específica de quem critica uma obra. Esta ênfase varia de forma considerável, de pessoa para pessoa, especialmente se a temática do filme for “Jesus”. O destaque, neste caso, é ainda muito mais evidente, já que uma boa parte deste público tem não só conhecimento das histórias que cercam o Nazareno, se superficial ou não, pouco importa, como também costuma ter fé. Este último aspecto não deve ser desprezado, nem tomado no seu sentido genérico, sob o rótulo de “uma fé cristã” ou “um público cristão”. Esta generalização tem por base um equívoco bastante comum cometido pelos críticos de cinema, na medida em que eles não levam em consideração a existência de um extenso espectro de teologias cristãs que acabam por determinar, para quem vê um filme sobre a “vida de Jesus”, onde recairá o maior ou o menor destaque sobre o que está sendo mostrado na tela.
Um abraço
Vitor Orlando Gagliardo
Depto. de Imprensa Editora Klíne

segunda-feira, 15 de julho de 2013

O Êxodo hebreu no Egito: mito ou realidade?

O mito do êxodo hebreu no Egito é provavelmente um dos temas mais complicados a ser abordado pela a Arqueologia, isto porque fala justamente de crença religiosa de muitas pessoas da atualidade, e este assunto deixa os ânimos extremamente sensíveis. Infelizmente, apesar de abortar crenças modernas, ele tem sido tratado de forma tão pouco rigorosa que acaba sendo alvo de documentários e matérias esdrúxulas que criam um cenário bizarro.

Conheço a história do êxodo hebreu desde que me entendo por gente, meus pais sempre tiveram em casa matérias sobre Arqueologia. O meu pai, em especial, era aficionado em ver documentários e a maioria na época se não falasse das expedições de Jacques-Yves Cousteau falavam das chamadas cidades santas, logo, não demorou muito para que eu acabasse pegando a mania de ver filmes clássicos bíblicos (provavelmente se eu não me interessasse por Arqueologia Egípcia iria acabar parando na Arqueologia Bíblica ou do Oriente Próximo). Foi nesta época que conheci sobre um dos capítulos do Velho Testamento que fala dos principais acontecimentos da vida de um filho de escravos (afastando-se agora do mito, aos arqueólogos e egiptólogos, é importante citar que a definição de “escravidão” para a força trabalho na sociedade faraônica é um termo que precisa ser reavaliado) hebreus que, após ser lançado no rio Nilo, é adotado pela a filha do faraó. O nome da criança seria então Moisés.
Este nome no mundo ocidental praticamente não carece de apresentações, mas o que se conhece sobre a história de Moisés só pode ser vista na Bíblia (livro sagrado do cristianismo) que traz o Antigo Testamento (Tanakh).
O que torna a narrativa do êxodo hebreu tão polêmica é que, apesar de toda a manifestação em volta desta história, em termos de cultura material ou outros escritos que não sejam bíblicos não existe nada que fale da ocorrência de um êxodo da magnitude demonstrada no Velho Testamento que tenha ocorrido no Egito, ou mesmo que se tenha existido uma comunidade israelita na época em que apontam a ocorrência do êxodo. Embora a afirmação de que os egípcios jamais narravam suas derrotas seja válida em termos teóricos, na prática, a Arqueologia trabalha não só com documentos escritos, mas também com a cultura material (artefatos). De acordo com a Bíblia, desde os filhos de Israel (pai de José) até Moisés, gerações de hebreus floresceram até que um dado momento seu número superavam aos dos egípcios na região. As pessoas sempre estão usando e abusando de cultura material, e não seria tão difícil encontrar vestígios de uma sociedade com pontos tão diferenciados das dos egípcios em seu próprio território. Usemos a cidade de Akhetaton como exemplo: ela teve somente dezessete anos de atividades e após breve período foi abandonada e desmontada para se esconder a religião rival da do deus Amon em Tebas. No século XIX seus restos (estruturas de casas, restos de estátuas para uso privado, restos de imagens parietais, cemitérios, etc) foram encontrados e passíveis de serem estudados.
Entre Arqueólogos e Egiptólogos quase existe um consenso de que não existiu o êxodo bíblico no Egito, e nem sequer bairros israelitas, no entanto, a “Estela de Merenptah” (ou como presunçosamente é chamada de “Estela de Israel”), que fala sobre as vitórias deste faraó contra os inimigos do Egito, faz uma listagem dos países derrotados por Merenptah, faraó da XIX Dinastia. Nesta declaração, dentre muitos hieróglifos está um conjunto que pode estar falando de Israel. Por este hieróglifo estar acompanhado pela a imagem de um homem e uma mulher (e não dos símbolos que indicam um país), acredita-se que estaria falando de um povo nômade ou uma tribo, mas não existe certeza quando ao seu significado. Esta estela foi encontrada no templo mortuário de Merenptah e originalmente pertencia a Amenhotep III da XVIII Dinastia. Hoje ela pode ser visitada no Museu Egípcio, no Cairo.
  
Estela de Merenptah. Retirado de Merneptah Stele. 
Com a existência da “Estela de Merenptah” foi sugerido que o faraó do êxodo seria Ramsés II, já que ele, quando subiu ao trono, ordenou a construção da cidade de Pi-Ramsés no Delta do Nilo. Quando Ramsés chegou ao fim da vida o seu primogênito Amunherwenewmef já estava morto. Merenptah, seu sucessor, era seu décimo terceiro filho. Como Ramsés ordenou a criação de uma nova capital no Delta (de certa forma próximo ao Mar Vermelho, o caminho de escape dos hebreus na fuga do Egito) e seu primogênito morreu muito antes do faraó especulou-se que este seria o governante egípcio que teria enfrentado Moisés e o seu sucessor teria lutado e derrotado os israelitas marcando então sua vitória na estela. Mas pelos motivos já citados anteriormente no texto não há nada que comprove a vivência hebreia no Egito.
 O que é o Êxodo
A palavra “êxodo” significa “saída” e no caso desta parte da Bíblia a ideia central é a liberdade do povo e a aliança então estabelecida entre o deus dos hebreus e os homens que, por sua vez, recebem diretamente da divindade as leis que transformaria a relação entre as pessoas.
A bíblia narra que após a morte de José (que foi vendido por seus próprios irmãos como escravo para os egípcios) e de toda sua geração, os filhos de seus filhos se multiplicaram e tornaram-se numerosos e poderosos nas terras do Egito. Por já ter passado anos da morte de José (que tinha sido amado pelo o faraó e sua família já que previu uma seca de sete anos que, se não fosse seu aviso prévio, teria matado a população de fome), o novo faraó não conhecia sua história e vendo que os filhos de Israel eram muitos e com o medo de que em caso de guerra eles se aliassem com os inimigos do Egito, foram transformados em escravos e obrigados a construir as cidades-armazéns de Pitom e Ramsés. A bíblia ainda fala que o faraó ordena, em um dado momento, que todos os meninos que nascessem de uma hebreia fossem jogados no Nilo, mas as meninas poderiam viver. Porém, uma das hebreias conseguiu esconder o filho por três meses, e vendo que não era mais capaz de manter oculta a criança lacrou um cesto com betume. Feito isto colocou dentro o bebê, e o deixou boiar no Nilo. Descendo o rio, o cesto acabou sendo encontrado pela a filha do faraó e sua comitiva que a preparava para o banho. A princesa adotou o menino e deu para ele o nome de Moisés.
Quando crescido e após ter visto o seu povo escravizado, Moisés se compadeceu e matou um egípcio que maltratava um hebreu. Sabendo do ocorrido o faraó ordena a morte de Moisés, mas este foge e após receber um chamado divino retorna ao Egito para tentar libertar os hebreus - que já eram mais numerosos que os próprios egípcios da região – da escravidão.
Ao se encontrar com o faraó, Moisés e seu irmão Aarão tentam convencê-lo a libertar os escravos, mas estes eram numerosos e praticamente a força de trabalho do país, assim, o faraó não os deixa ir e ainda os castiga retirando a palha pronta para que fizessem os tijolos e os sobrecarrega de trabalho para que não pensassem em seu deus.
Em uma tentativa de mostrar os prodígios do deus dos hebreus e assim convencer o faraó, Moisés e Aarão foram tentar mais um diálogo com o regente egípcio, mas desta vez transformou sua vara (que carregava desde o início de sua jornada) em uma cobra, o faraó não se impressionou e ordenou que os seus sacerdotes fizessem a mesma coisa, os mesmos o fizeram e também com sucesso. Na manhã seguinte Moisés e Aarão procuram o faraó às margens do Nilo e não conseguindo mais uma vez convencê-lo transforma a água do rio, reservatórios, canais e vasilhames em sangue. Os sacerdotes egípcios realizaram o mesmo truque e assim o faraó não se convence.
As pragas do Egito retratadas por Joseph Turner em 1800.
Outras tentativas são feitas, mas o faraó não sede, e assim o deus dos hebreus vai lançando pragas no Egito, estando na ordem: transformar água em sangue, rãs, piolhos, moscas, peste nos animais, chagas, chuva de pedras e raios, gafanhotos, eclipse e morte dos primogênitos.
Morte do primogênito do faraó por Rifa’a el-Tahtawy.
A última praga levou a vida do primogênito do faraó, que então resolve deixar os hebreus partirem. Mas o regente volta atrás em sua decisão e persegue os seus então ex-escravos até chegar ao Mar Vermelho, onde Moisés abre um caminho entre as águas deixando o exército do faraó para atrás.
Após vagar por três meses eles chegaram ao Sinai e levantaram acampamento onde se deu início a aliança em que Moisés recebe os 10 Mandamentos, armazenados então na Arca da Aliança. Entender o Êxodo é entender alguns dos princípios da fé judaica e cristã e a comiseração de deus com o homem, além de que este é um dos capítulos mais importantes do Velho Testamento.
Êxodo na cultura atualmente
◘ O cinema fez muito uso de temas como as das 10 Pragas do Egito, Os 10 Mandamentos e A Arca da Aliança, esta última bate lado a lado, em termos de popularidade, com o Santo Graal, ambos transformados em ícones do mundo da “Arqueologia Pop” idealizada por George Lucas e Steven Spielberg nos filmes do Indiana Jones.
◘ A banda Metallica gravou e lançou entre 1983 e 1984 a música “Creeping Death” que fala sobre o clamor do deus hebreu pedindo para que o faraó liberte seu povo da escravidão e a última praga.
◘ Em 1998 a DreamWorks lançou o filme em desenho animado O Príncipe do Egito, um dos primeiros a tratarem Ramsés II como o faraó do Êxodo.
◘ No filme “Todo Poderoso”, de 2003, o ator Jim Carrey faz uma analogia a abertura do Mar Vermelho com uma tigela de leite.
◘ No show “Hermanoteu na terra de Godah”, de “Os Melhores do Mundo” ocorre uma sátira ao Êxodo.