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sábado, 30 de julho de 2011

John P. Meyer, E.P. Sanders, Paula Fredriksen, e os quadros mais diversos sobre o "Filho do Homem"

Saber quem foi Jesus, o que ele fez e qual o significado de sua passagem pelo mundo sempre foi uma espécie de obsessão das pessoas. Além do que está escrito sobre aquele que os cristãos consideram como o Salvador nas páginas da Bíblia, muitos estudiosos têm-se debruçado sobre os registros acerca do homem que viveu na Palestina do século I – alguém tão importante que foi ele mesmo que estabeleceu, com seu advento, essa contagem do tempo. A partir dos anos 1980, o interesse acadêmico sobre o Jesus histórico deu um salto. Na América, pesquisadores como Ben F. Meyer, E. P. Sanders, John Dominic Crossan, Marcus Borg, Paula Fredriksen, e N. T.Wright começaram a traçar quadros os mais diversos do chamado Filho de Deus. Alguns destes estudos pareciam bizarros; outros aproximavam-se um pouco mais da ortodoxia e dos evangelhos canônicos.

Mas a quê a expressão ‘Jesus histórico’ de fato se refere? Para início de conversa, Jesus – o rabi galileu que viveu, respirou, comeu, conversou e chamou discípulos, sendo ao fim de 33 anos crucificado – é um personagem cuja existência gera hoje pouca controvérsia. Mesmo fora do registro bíblico, já há evidências suficientes de sua trajetória: um homem pobre, nascido na Judeia sob a dominação romana, que exerceu ofícios manuais ao lado da família até iniciar seu trabalho de pregador itinerante, por volta dos trinta anos. Através de diversos estudos históricos, esse Jesus tem sido inserido em seu contexto judaico. Podemos chamar esse Jesus de o “Jesus judeu”. Já os quatro evangelistas e outros autores do Novo Testamento, que levam em conta o que está desvendados nas Escrituras, interpretam Jesus com o uso de termos com “Messias”, “Filho de Deus”, e “Filho do Homem”, entendendo-o como o agente da redenção de Deus. Podemos chara esse Jesus de o “Jesus canônico”. Outro aspecto precisa ser observado: a Igreja ampliou seu entendimento de Jesus, uma vez que o interpreta à luz de conceitos teológicos. Esse seria o “Jesus ortodoxo”, a segunda pessoa da Trindade.


Mas o Jesus histórico é alguém ou algo à parte. Ele é o Jesus que os estudiosos reconstruíram com base nos métodos históricos, tanto o Jesus canônico do Novo Testamento como o Jesus ortodoxo da teologia da Igreja. O Jesus histórico parece mais com o Jesus judeu do que com o ortodoxo ou o canônico. Fazer distinções entre estas visões é importante para entender o que acontece no cenário acadêmico. Em primeiro lugar, o Jesus histórico é o Jesus que os acadêmicos reconstruíram com base nos métodos. Visto que os estudiosos são diferentes uns dos outros, suas reconstruções também o são umas das outras. Os métodos também são distintos, o que diferencia ainda mais a reconstrução. A maior parte deles toma os evangelhos como pouco confiáveis – mesmo assim, não os abandonam, tentando ver o que eles dizem. Outros critérios foram desenvolvidos, criticados, rejeitados e modificados, mas todos têm isso em comum: estudiosos do Jesus histórico reconstruíram Jesus com base em seus métodos históricos para, então, determinar o que, nos evangelhos, deve ser crido.

O critério essencial usado, ainda que cheio de falhas, é chamado de dissimilaridade dupla. De acordo com ele, os únicos ensinos ou ações de Jesus que podem receber crédito são os que são dissimilares tanto para o judaísmo dos dias de Jesus quanto para seus primeiros seguidores. Um dos principais exemplos é sua forma característica de chamar Deus de Abba, expressão raramente encontrada no judaísmo ou cristianismo primitivo como referência a Deus e que significa “pai”, ou, ainda, “paizinho”. Em segundo lugar, a palavra reconstruir precisa receber mais atenção. A maioria dos estudiosos do Jesus histórico entende que os evangelhos excederam nas imagens que construíram de Jesus, e que a teologia trinitariana da Igreja maximiza tudo o que Jesus pensou acerca de si mesmo, e tudo no qual os evangelistas acreditavam. Estes estudiosos construíram um Jesus que é diferente daquele ensinado pela Igreja e pelos evangelhos.


Novo Jesus – Não há razão para fazer estudos sobre o Jesus histórico – provar quem ele realmente era – se os evangelhos estão corretos e se as crenças da Igreja são justificáveis. Há apenas duas razões para se engajar na busca do Jesus histórico: a primeira, ver se a Igreja o entendeu de forma correta; e a segunda, caso a igreja não o tenha feito, é a de achar um personagem que seja mais autêntico do que o que a Igreja apresenta. Isso leva à conclusão necessária de que os acadêmicos do Jesus histórico construíram, na verdade, um quinto evangelho. A reconstrução apresenta um Jesus que não é idêntico ao canônico nem ao ortodoxo. Ele é o Jesus reconstruído; isto é, um novo Jesus. E os acadêmicos realmente acreditam no Jesus por eles construído. Durante o que ficou conhecido como a “primeira busca” pelo Jesus histórico, no começo do século 20, Albert Schweitzer entendeu que Jesus era apocalíptico. Nas mais recentes busca, temos diversos perfis: o Jesus de Sander é um profeta escatológico; o de Crosan, um camponês mediterrâneo cínico e cheio de perspicácia; o de Borg é um gênio místico; já Wright o aponta como um profeta messiânico do fim do exílio, que acreditava ser Deus voltando a Sião.

O terceiro ponto, e que precisa ser reforçado nos dias de hoje, é de que os acadêmicos do Jesus histórico construíram um Jesus em contraste com as categorias que os evangelistas e a Igreja primitiva apresentam. Wright é o mais ortodoxo dos conhecidos estudiosos dessa área. Eles partem do princípio que os evangelhos exageraram, e que a Igreja absorveu o profeta galileu nas categorias da filosofia grega. A busca pelo Jesus histórico é uma tentativa de ir além da teologia e estabelecer a fé no Jesus que foi – é preciso dizer desta forma – muito mais do que o Jesus que gostaríamos que ele fosse.


Há quem pense se o que está por trás desse movimento de busca histórica não seja uma descrença, a priori, na ortodoxia, mais do que uma genuína busca histórica ou interesse pelo que aconteceu. As conclusões teológicas daqueles que buscam o Jesus histórico simplesmente correlacionam de forma muito forte com suas próprias predileções teológicas para sugerir o contrário. A pergunta que muitos de nós devemos fazer é a seguinte: podem a teologia, a cristologia ou, até mesmo, a fé, estar conectadas com as vicissitudes da busca histórica e de seus resultados? A academia espera que nós descubramos o Jesus verdadeiro. Um a um, quase todos fomos convencidos de que não importa o quanto tentemos: alcançar o Jesus não interpretado é praticamente impossível. Além disso, um Jesus descoberto é apenas a versão de um pesquisador. E o detalhe é que é incomum que pessoas, que não o próprio estudioso e alguns de seus seguidores, sejam realmente convencidas por suas descobertas.

O teólogo alemão Martin Kähler convenceu sua geração que fé em Jesus não poderia nem deveria estar baseada nas conclusões históricas sobre o que aconteceu ou não. Precisamos, então, nos perguntar: em qual Jesus devemos confiar? Será no dos evangelistas e apóstolos? Será no da Igreja – aquele dos credos? Ou no Jesus ortodoxo? Será na mais recente proposta de um historiador brilhante? Será em nosso próprio consenso baseado nas pesquisas modernas? Ou tudo deve ser somente balizado pela fé?

“Produzimos o que queremos” – Diante de tantos descaminhos, temos presenciado a morte dos últimos estudos sobre o Jesus histórico. Não completa, é verdade, porque alguns ainda estão ocupados tentando reconstruir Jesus para eles mesmos e para os que os ouvirem. Ainda assim, o entusiasmo se foi, e as propostas parecem-se cada vez mais com teses vagas do que com uma esperança de um verdadeiro encontro da história de Jesus. Dois estudiosos recentes leram o obituário dos estudos nessa área. James Dunn argumenta em suas obras que o mais longe que podemos chegar além dos evangelhos é compreender a figura de Jesus com base no que seus primeiros seguidores disseram. Isso é o máximo que podemos fazer. Esse é o Jesus que deu vida à fé cristã, e o Jesus que é digno de ser seguido. Na perspectiva de Dunn, o Jesus relembrado contém a perspectiva de seus discípulos – e além dela não podemos ir.

Dale Allison, um dos mais bem preparados acadêmico do Novo Testamento nos Estados Unidos, é menos sanguíneo e mais cínico que Dunn em seu recente livro. Depois de três décadas de trabalho nessa área, Allison esboça a variedade de percepções sobre o Jesus histórico e a suposta teoria moderna de que, se unirmos nossas mãos, chegaremos a conclusões firmes. Ele apresenta essa conclusão deprimente: “O progresso não abrangeu todos os assuntos, e seja qual for o consenso existente, ele permanecerá excessivamente chato”. Em uma única sentença, ele diz tudo: “Usamos nossos critérios para produzir o que queremos”. E ele admite isso em relação a um de seus próprios livros sobre Jesus: “Abri meus olhos para o óbvio: criei um Jesus à minha própria imagem. Talvez tenhamos transformado a sua biografia em nossa próprio autobiografia”, conclui.

Quando dois estudiosos desse porte, ambos altamente dedicados à busca do Jesus histórico por ângulos distintos, chegam a conclusão similar – a de que não chegaremos ao Jesus original por esses caminhos –, uma mensagem é transmitida. Podemos provar que Jesus morreu e que ele pensou em sua morte como uma expiação. Podemos estabelecer que a tumba estava vazia e que a ressurreição é a melhor explicação para tal fato. Contudo, algo que nossos métodos históricos não podem provar é que Jesus morreu por nossos pecados e ressuscitou para nossa justificação.


Em um determinado ponto, métodos históricos encontram seus limites. Estudos acadêmicos sobre Jesus não podem nos levar a lugares nos quais o Espírito Santo nos leva. O homem curado por Jesus da cegueira sintetizou tudo magistralmente a dizer que não sabia quem era o homem que o curou; disse apenas: “Sei que outrora estava cego, e que agora posso ver”. De maneira análoga, os métodos históricos, a despeito de seu valor, não são capazes de nos fazer enxergar com clareza o Filho de Deus. A fé não pode ser completamente baseada no que a história é capaz de provar. A busca pelo verdadeiro Jesus, árdua e longa, tem provado exatamente isso.

A busca pelo Jesus Histórico é um empreendimento acadêmico do período moderno e deste nosso tempo que tenta apresentar um Jesus a partir do uso de instrumentos científicos da moderna pesquisa histórica. Desde o século XVIII, o cristianismo e a figura de Jesus Cristo – sua identidade e significado – tem sido desafiados pelas incursões desta busca.

Como a temática é atualíssima, apesar de suas origens serem seculares, resolvemos, a seguir, apresentar, sucintamente, um percurso historiográfico da busca pelo Jesus Histórico. O que é descrito logo a frente está dividido em três períodos chamados de antiga busca do Jesus Histórico, nova busca do Jesus Histórico e terceira busca do Jesus Histórico. Na sequência é destacada, através de uma pequena explanação, à chamada crítica à busca.

Sigamos nosso trajeto.
1. A Antiga Busca do Jesus Histórico (“Old Quest”)

A antiga busca pelo Jesus histórico começou em sua forma clássica com Herman Samuel Reimarus (1694-1768). Reimarus era docente de línguas orientais de Hamburgo e foi durante sua vida um pioneiro literário da religião da razão do deísmo inglês. Ele foi o primeiro a desenvolver uma imagem de Jesus diferente da do Cristo apresentado nos Evangelhos. Ele submeteu a Bíblia aos padrões da crítica racionalista. Raymond Brown (2004) diz que Reimarus via Jesus como um revolucionário que falhou em sua tentativa de estabelecer um reino messiânico na Terra, ao passo que o Cristo não passava de uma projeção fictícia daqueles que teriam roubado o corpo de Jesus e que proclamavam fraudulentamente a sua ressurreição.

A obra de Reimarus, An Apology for the Rational Worshipper of God não fora publicada. Porém, depois de sua morte, esse seu texto caiu nas mãos de Gotthold Ephraim Lessing (1729-1781) que a publicou sem dizer o nome do autor. No conteúdo da obra havia um forte ataque à historicidade da ressurreição de Jesus (MCGRATH, 2007).

Depois de Reimarus vieram outros estudiosos importantes como F. C. Baur (1792-1869), David Friedrich Strauss (1808-1874) e Johannes von Weiss (1863-1914).

As grandes contribuições da “Old Quest” foram:

*a diferenciação entre os sinóticos e João como fontes históricas;
*a escolha de Marcos como o mais antigo evangelho;
*o posicionamento de Jesus dentro do contexto escatológico da sua época.

Esse período encerrou-se no ano de 1953 quando o teólogo luterano Ernst Kasemann (1906-1998) proferiu uma palestra sobre o Jesus Histórico em outubro de 1953. É nesse momento que há a transição da Antiga Busca do Jesus Histórico para a Nova Busca.

2. A Nova Busca do Jesus Histórico (“New Question”)

Essa nova busca distingue-se da antiga. Ao passo que esta última trabalhava para desacreditar a imagem do Cristo do Novo Testamento, dado como uma figura mitológica, a primeira se preocupou em “linkar” a pregação de Jesus Cristo com a pregação dos primeiros cristãos sobre Jesus Cristo. Com isso, a Nova Busca Pelo Jesus Histórico consolidou a imagem neotestamentária. No entanto, é necessário entendermos que não é tudo o que dizem os textos neotestamentários sobre Jesus que não é mitológico. A questão para Kasemann é que existe sim uma relação entre o Jesus da História e o Cristo da Fé e isso é possível de ser constatado a partir do discernimento do que é o kerygma nas ações e na pregação de Jesus, o nazareno.


Kasemann identificou a ligação existente entre o Jesus histórico e o Cristo kerigmático na declaração de ambos da vinda do reino escatológico de Deus. Tanto na pregação de Jesus quanto no kerigma cristão primitivo, o tema da vinda do reino é de suma importância. (MCGRATH, 2007, p. 301)

Nessa nova busca o interesse no Jesus Histórico relaciona-se com a prédica escatológica de Jesus e a cristologia ensinada pela igreja.

A síntese do pensamento de Kasemann é a seguinte:

*Os sinópticos são documentos teológicos;
*Suas declarações teológicas são expressas dentro da forma histórica;
*Os autores dos sinópticos acreditavam ter acesso a informações históricas sobre Jesus;
*Há nos evangelhos sinópticos tanto a narrativa histórica como o kerygma.


Outros teólogos como Joachim Jeremias, Gerhard Ebeling, Gunter Bornkamm trataram do kerygma cristão primitivo a partir de posições distintas.

Superada a Nova Busca Pelo Jesus Histórico, entramos no período chamado de Terceira Busca.

3. Terceira Busca do Jesus Histórico (“Third Question”)

Alguns teóricos como o Dr. Alister Mcgrath, professor de Teologia Histórica na Oxford Univesity, afirmam que esse movimento é deficiente porque os estudiosos envolvidos com ele e suas respectivas obras não possuem elementos em comum em número suficiente para serem categorizados como Terceira Busca, ou seja, sua multiplicidade de hipóteses de trabalho depõe contra. No entanto, eles admitem que tal movimento tem recebido uma aceitação considerável e que o mesmo ainda receberá destaque nas discussões sobre esse assunto importante.

A “Third Question” iniciou-se nos anos 70 e perdura até os dias atuais. Suas principais metas são:
*Examinar fontes arqueológicas, históricas e textuais do primeiro século e aplicar os descobrimentos da sociologia e antropologia a estas fontes para tentar entender a Jesus;
*Enfatizar o judaísmo de Jesus e a necessidade de sua compreensão no contexto do primeiro século.

Alguns nomes de estudiosos de destaque desse movimento são: Burton L. Mack, Marcus L. Borg e John Dominic Crossan. Para esses teóricos – principalmente Crossan – o Jesus Cristo dos Evangelhos é um Jesus mítico. Destacamos o Dr. Crossan porque ele é o representante atual de mais notoriedade, nos meios acadêmicos, do chamado Jesus Seminar. Para ele Jesus era um homem normal que foi mitologizado e divinizado, posteriormente, pelos evangelistas. Ele diz: “Isso tudo diz respeito à mitologia grega e à romana, e o que eu posso fazer? Devo acreditar em todas essas histórias, ou devo dizer que todas elas são mentiras, exceto a nossa história cristã?”

Fazendo um percurso diferente dos estudiosos do Jesus Seminar, mas incluídos na chamada Terceira Busca, temos importantes estudiosos como Geza Vermes, E. P. Sanders, John Paul Meier, Raymond E. Brown, entre outros. As pesquisas sobre o Jesus histórico nesses últimos anos têm recebido diferentes enfoques: o Jesus mestre da sabedoria; o Jesus profeta do cumprimento das expectativas dos últimos tempos; estudos sobre o contexto histórico-social da Palestina do I séc. d.C. – a Galiléia; a guerra judaica; o movimento de Jesus; as influências helênicas no movimento de Jesus, etc.

A relação entre essas buscas é encontrada na crença dos estudiosos de que o Jesus Histórico, por definição, não é um ser sobrenatural. O que os evangelhos apresentam é o Cristo da Fé, um ser mítico. Usando de um tom provocativo, os teóricos do Jesus Seminar afirmam que observar essa distinção é a primeira coluna da sabedoria acadêmica.

4. A Crítica à Busca

Entre os anos de 1890 a 1910 A Crítica à Busca emergiu a partir do pensamento de importantes estudiosos como Albert Schweitzer (1875-1965), William Wrede (1859-1906) e Martin Kahler (1835-19120). Depois, temos o proeminente teólogo alemão Rudolf Bultmann (1884-1976) que considerava essa busca pelo Jesus Histórico um beco sem saída. Reveste-se de grande valor falarmos um pouco sobre Rudolf Bultmann e o seu afastamento da História.


Bultmann era cético quanto a possibilidade de alcançar o Jesus histórico por meio de métodos históricos. Ele também “estava convencido de que o erro destas tentativas anteriores (as buscas pelo Jesus histórico) estava intimamente conectado com suas pressuposições filosóficas, que as levaram a rejeitar a possibilidade de um evento salvador” (GONZALEZ, 2004, p. 450).

Para Bultmann:
"Jesus Cristo vem ao nosso encontro somente no kerigma, da mesma maneira como confrontou o próprio Paulo e o levou a tomar uma decisão. O kerigma não proclama verdades universais ou uma idéia eterna – seja ela uma idéia de Deus ou do redentor – mas um fato histórico… Portanto, o kerigma não é um veículo para idéias eternas nem o mediador de informações históricas; o fato de importância decisiva é este: o kerigma é o “que” de Cristo, seu “aqui e agora”, um “aqui e agora” que se torna presente no próprio discurso. (apud MCGRATH, 2007, p. 299)"

Bom, é preciso explicar algumas coisas. Primeiro: Bultmann considera como fato histórico aquilo que ocorre dentro da história humana. Aqui encontramos a presença do existencialismo do filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976) que fora colega de Bultmann na Universidade de Marburg.

Segundo Gilbert Durand, as idéias de Bultmann são típicas do círculo em que mergulha todo pensamento que busca um sentido enquanto se satisfaz em dar voltas lineares, prisioneiro da temporalidade histórica; em que a tradição passada remete à existência presente e vice-versa, indefinidamente. (1995, p. 233)

Segundo, a compreensão de Bultmann de que o kerygma não é mediador de informações históricas implica na admissão de que enxergar o que está por detrás do kerygma para reconstruir o Jesus histórico é um erro, pois esse procedimento leva ao não mais existente “Cristo segundo a carne” que em hipótese alguma é o Senhor, diferentemente do Jesus Cristo que é pregado. Dessa perspectiva bultmaniana, duas perguntas emergem:

*Como era possível ter certeza de que a cristologia estava fundamentada corretamente na pessoa e obra de Jesus Cristo?
*Como verificar a cristologia se a história de Jesus era irrelevante?

Em linhas gerais, pode-se dizer que a busca pelo Jesus Histórico foi, e é, até certo ponto, baseada no racionalismo, no naturalismo e criticismo. Dito isso, destacamos a seguinte crítica de Paul Tillich a essas tentativas de busca do Jesus histórico:
Os que nos falam sobre Jesus de Nazaré são os mesmos que nos falam sobre Jesus como o Cristo, ou seja, as pessoas que o receberam como o Cristo. Portanto, se tentarmos encontrar o Jesus real que está por trás da imagem de Jesus como o Cristo, é necessário separar criticamente os elementos que pertencem ao lado factual do evento e os elementos que pertencem à recepção. Ao fazer isso, esboça-se uma “Vida de Jesus” – e fizeram-se muitos desses esboços. Em muitos deles colaboraram a honestidade científica, a devoção amorosa e o interesse teológico. Em outros são visíveis o distanciamento crítico e inclusive a rejeição malévola. Mas nenhum deles pode reivindicar ser uma imagem provável em que tenha desembocado o tremendo esforço científico dedicado a esta tarefa durante 200 anos. No máximo, eles são resultados mais ou menos prováveis, incapazes de fornecer uma base para a aceitação ou para rejeição da fé cristã. (2005, p. 396)

Conclusão:
Terminando essa nossa curta jornada historiográfica, vale ressaltar uma conclusão de John P. Meier, professor da cadeira de Novo Testamento na Universidade Católica da América em Washington, D.C. sobre toda esta tentativa acadêmica de encontrar o Jesus Histórico. Em seu livro Um Judeu Marginal, repensando o Jesus Histórico, vol. 1, página 35, Meier diz:
"Não podemos conhecer o Jesus “real” através da pesquisa histórica [...] No entanto, podemos conhecer o “Jesus histórico” [...] o Jesus da história é uma abstração e constructo modernos [...] O Jesus histórico não é o Jesus real, e vice-versa [...] O Jesus histórico pode nos proporcionar fragmentos do indivíduo “real”, e nada mais. (1992)".