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terça-feira, 23 de agosto de 2011

Celso, Tácito e o Talmude judaico: fontes anticristãs.

No ano 66 d.C., os judeus da Palestina iniciaram uma revolta contra o governo romano que, para dizer o mínimo, não agradou aos romanos. O imperador enviou tropas lideradas pelo general Vespasiano para conter a rebelião e retomar o controle das áreas rebeldes. Em 67, Vespasiano liderou um cerco à cidade rebelde de Jotapata, na Galiléia. No 47º dia daquele cerco, um jovem revolucionário judeu optou por entregar-se ao exército romano, muito superior, em vez de cometer suicídio — um destino que muitos de seus compatriotas haviam escolhido. Aquele jovem recebeu o favor de Vespasiano e, depois, foi levado a Roma pelo general Tito, filho de Vespasiano; mais tarde, Tito destruiu Jerusalém e o templo judeu no ano 70 d.C.

Aquele jovem era Flávio Josefo (c. 37-100 d.C.) que, por fim, tornou-se o maior historiador judeu de sua época. Josefo começou a escrever documentos históricos em Roma, enquanto trabalhava como historiador do imperador romano Domiciano. Foi ali que escreveu sua autobiografia e duas obras históricas importantes. Uma dessas obras é sua atualmente famosa Antiguidades dos judeus [publicada em português pela CPAD], concluída por volta do ano 93. No livro 18, capítulo 3, seção 3 dessa obra, Josefo, que não era cristão, escreveu estas palavras:

Nessa época [a época de Pilatos], havia um homem sábio chamado Jesus. Sua conduta era boa e [ele] era conhecido por ser virtuoso. Muitos judeus e de outras nações tornaram-se seus discípulos. Pilatos condenou-o à crucificação e à morte. Mas aqueles que se tornaram seus discípulos não abandonaram seu discipulado, antes relataram que Jesus havia reaparecido três dias depois de sua crucificação e que estava vivo; por causa disso, ele talvez fosse o Messias, sobre quem os profetas contaram maravilhas.

Essa não foi a única menção feita a Jesus por Josefo. Em outra passagem das Antiguidades dos judeus, Josefo revelou de que maneira o novo sumo sacerdote dos judeus (Ananus, o jovem) valeu-se de um hiato no governo romano para matar Tiago, o irmão de Jesus. Isso aconteceu no ano 62, quando o imperador romano Festo morreu repentinamente durante seu ofício. Três meses se passaram até que seu sucessor, Albino, pudesse chegar à Judéia, abrindo um grande espaço de tempo para que Ananus realizasse seu trabalho sujo. Josefo descreve o incidente da seguinte maneira:

Festo está morto, e Albino está a caminho. Assim, ele [Ananus, o sumo sacerdote] reuniu o Sinédrio dos juízes e trouxe diante deles o irmão de Jesus, que era chamado Cristo, cujo nome era Tiago, e alguns outros [ou alguns de seus companheiros] e, quando havia formulado uma acusação contra eles como transgressores da lei, ele os entregou para que fossem apedrejados.

Temos aqui não apenas outra referência do século I feita a Jesus, mas a confirmação de que tinha um irmão chamado Tiago que, obviamente, não era benquisto pelas autoridades judaicas. Poderia ser o caso de Tiago ter sido martirizado por ser ele o líder da igreja de Jerusalém, como o NT deixa implícito?

Quantas fontes não-cristãs fazem menção a Jesus? Incluindo Josefo, existem dez outros escritores não-cristãos conhecidos que mencionam Jesus num período de até 150 anos depois de sua morte Por outro lado, nesses mesmos 150 anos, existem nove fontes não-cristãs que mencionam Tibério César, o imperador romano dos tempos de Jesus. Assim, descontando todas as fontes cristãs, em relação ao imperador romano existe uma fonte a mais que menciona Jesus. Se você incluir as fontes cristãs, os autores que mencionam Jesus superam aqueles que mencionam Tibério numa proporção de 43 para 10!

Algumas dessas fontes não-cristãs — como Celso, Tácito e o Talmude judaico — poderiam ser consideradas como fontes anticristãs. Embora essas obras não tenham uma testemunha ocular sequer que contradiga os fatos descritos nos documentos do NT, foram escritas por autores claramente anticristãos. O que podemos aprender nos baseando neles e nas fontes não-cristãs mais neutras? Aprendemos que admitem certos fatos sobre o cristianismo primitivo que nos ajudam a formar uma narrativa que é surpreendentemente congruente com o NT. Reunindo todas as dez referências não-cristãs, vemos que:

1. Jesus viveu durante o tempo de Tibério César.

  1. Ele viveu uma vida virtuosa.
  2. Realizou maravilhas.
  3. Teve um irmão chamado Tiago.
  4. Foi aclamado como Messias.
  5. Foi crucificado a mando de Pôncio Pilatos.
  6. Foi crucificado na véspera da Páscoa judaica.
  7. Trevas e um terremoto aconteceram quando ele morreu.
  8. Seus discípulos acreditavam que ele ressuscitara dos mortos.
  9. Seus discípulos estavam dispostos a morrer por sua crença.
  10. O cristianismo espalhou-se rapidamente, chegando até Roma.
  11. Seus discípulos negavam os deuses romanos e adoravam Jesus como Deus.

À luz dessas referências não-cristãs, a teoria de que Jesus nunca existiu é claramente injustificável. De que maneira escritores não-cristãos poderiam juntos revelar uma narrativa congruente com o NT se Jesus nunca tivesse existido?

Mas as implicações vão muito além disso. O que isso nos fala sobre o NT?

Diante de tal fato, as fontes não-cristãs confirmam o NT. Embora os autores não-cristãos não digam que acreditam na ressurreição de Jesus, eles relatam que os discípulos certamente acreditavam nela.

Uma vez que a existência de Deus e a possibilidade de milagres são firmemente estabelecidas por meio da revelação natural — como já demonstramos e a história geral de Cristo e da igreja primitiva é confirmada por meio de fontes não-cristãs, será que os milagres de Cristo realmente aconteceram como os discípulos afirmam? Os documentos do NT registram a história real? Poderia ser o caso de esses documentos não serem textos religiosos puramente tendenciosos, cheios de mitos e fábulas — como muitos em nosso mundo moderno afirmam — mas, em vez disso, documentos que descrevem eventos que realmente aconteceram cerca de 2 mil anos atrás? Se é assim, estaremos na direção certa na nossa busca para saber qual religião teísta é verdadeira.

Para verificar se o NT é um registro fidedigno da história, precisamos responder a duas perguntas em relação aos documentos que compõem o NT:

  1. Temos cópias precisas dos documentos originais que foram escritos no século I?
  2. Esses documentos falam a verdade?

Para que se possa acreditar na mensagem do NT, essas duas perguntas precisam ser respondidas de maneira afirmativa. Não basta simplesmente apresentar evidências de que possuímos cópias precisas dos documentos originais do século I (pergunta 1), porque tais documentos poderiam contar mentiras. Devemos ter uma cópia precisa dos documentos e termos razões para acreditar que esses documentos descrevem aquilo que realmente aconteceu cerca de 2 mil anos atrás (pergunta 2). Vamos começar com a pergunta número 1.

Temos certeza de que você se lembra da brincadeira infantil chamada “telefone sem fio”. Era uma brincadeira na qual uma criança recebe uma mensagem verbal para passar à próxima criança, que passa aquilo que ouviu à criança seguinte, e assim por diante. Quando a mensagem chega à última criança na seqüência, ela é uma péssima representação daquilo que a primeira criança ouviu. Para o observador comum, esse parece ser o mesmo tipo de distorção que poderia ter infectado documentos que foram transmitidos de geração a geração num espaço de 2 mil anos.

Felizmente o NT não foi transmitido dessa maneira. Uma vez que não foi contado a uma pessoa, que o contou a outra, e assim por diante, a brincadeira do telefone não se aplica. Várias pessoas testemunharam acontecimentos do NT de modo independente, muitas das quais os registraram em sua memória, e nove dessas testemunhas oculares/contemporâneas registraram suas observações por escrito.

Neste momento, precisamos esclarecer um conceito errado muito comum sobre o NT. Quando falamos dos documentos do NT, não estamos falando de um único texto, mas de 27 textos. Os documentos do NT são 27 documentos diferentes, escritos em 27 rolos diferentes, por nove autores, num período de 20 a 50 anos. Esses textos específicos desde então foram reunidos em um único livro que hoje chamamos Bíblia. Desse modo, o NT não é uma fonte única, mas uma coleção de fontes.

Existe apenas um problema: até agora, nenhum dos documentos escritos originais do NT foi descoberto. Temos apenas cópias dos textos originais, chamados manuscritos. Isso pode nos impedir de saber o que diziam os originais?

De modo algum. De fato, toda literatura significativa do mundo antigo é reconstituída à sua forma original ao se comparar os manuscritos que sobreviveram. Para reconstruir-se o original, é muito útil termos um grande número .de manuscritos produzidos não muito tempo depois do original. Maior quantidade de manuscritos e manuscritos antigos normalmente nos dão um testemunho mais confiável e geram condições para uma reconstrução mais precisa.

Como os documentos do NT se saem nesse aspecto? Muito bem, melhor do que qualquer outro material do mundo antigo. De fato, os documentos do NT possuem mais manuscritos, manuscritos mais antigos e manuscritos mais abundantemente apoiados do que as dez melhores peças da literatura clássica combinadas. Veja a seguir o que queremos dizer com isso.

Mais manuscritos. De acordo com a última contagem, existem cerca de 5.700 manuscritos gregos do NT escritos à mão. Além disso, existem mais de 9 mil manuscritos em outras línguas (e.g., siríaco, copta, latim, árabe). Alguns desses quase 15 mil manuscritos são bíblias completas, outros são livros ou páginas, e somente alguns são apenas fragmentos. Como mostrado na figura 9.1, não existe nada no mundo antigo que sequer se aproxime disso em termos de apoio a manuscritos. A obra mais próxima é a llíada, de Homero, com 643 manuscritos. A maioria das outras obras antigas sobrevive com pouco mais de uma dúzia de manuscritos. Contudo, poucos historiadores questionam a historicidade dos eventos que essas obras registram.

Manuscritos mais antigos. O NT não apenas desfruta de um amplo apoio dos manuscritos, como também possui manuscritos que foram escritos logo depois dos originais. O mais antigo e incontestável manuscrito é um segmento de João 18.31-33,37,38, conhecido como fragmento John Rylands (porque está na Biblioteca John Rylands, em Manchester, Inglaterra). Os estudiosos datam esse documento como tendo sido escrito entre 117 e 138 d.e, mas alguns dizem que ele é ainda mais antigo. O fragmento foi encontrado no Egito próximo ao mar Mediterrâneo, e seu provável local de composição foi a Ásia Menor — demonstrando que o evangelho de João foi copiado e levado a lugares distantes logo no início do século 11.

Existem nove fragmentos discutíveis, ainda mais antigos que o fragmento John Rylands, que datam do período que vai do ano 50 ao 70 d.e, encontrados com os Manuscritos do mar Morto. Alguns estudiosos acreditam que esses fragmentos são parte de seis livros do NT, incluindo Marcos, Atos, Romanos, 1 Timóteo, 2Pedro e Tiago. Embora outros estudiosos resistam a essa conclusão (talvez porque admitir isso seria uma afronta à sua inclinação liberal de que o NT foi escrito posteriormente), eles não encontraram nenhum outro texto que não fosse do NT ao qual esses fragmentos pudessem pertencer.

CONFIABILIDADE DO NOVO TESTAMENTO QUANDO COMPARADO COM OUTROS DOCUMENTOS ANTIGOS

Os fragmentos foram encontrados numa caverna que, anteriormente, fora identificada como uma que possuía material cuja datação variava de 50 a.C. a 50 d.C. O primeiro estudioso a identificar esses fragmentos antigos como livros do NT foi José O’Callahan, um destacado paleógrafo espanhol. O New York Times reconheceu as implicações da teoria de O’Callahan ao admitir que, se eles fossem verdadeiros, “então provariam que pelo menos um dos evangelhos — o de S. Marcos — foi escrito apenas alguns anos depois da morte de Jesus”.

Mas mesmo que não fossem fragmentos verdadeiros do NT e se o fragmento John Rylands fosse realmente o mais antigo, o espaço de tempo entre o original e a primeira cópia ainda existente é muitas vezes menor do que qualquer outro do mundo antigo. A Ilíada tem o segundo menor espaço, que é de cerca de 500 anos. A maioria das outras obras antigas está distante mil anos ou mais do original. O espaço do NT, de cerca de 25 anos, pode ser menor (isso não significa que não tenha havido outros manuscritos entre o original e a primeira cópia; eles certamente existiram. Isso simplesmente significa que esses manuscritos deterioraram-se, foram destruídos ou até mesmo não foram descobertos ainda).

Qual é a idade do mais antigo manuscrito de um livro completo do NT?

Manuscritos que formam livros inteiros do NT sobreviveram a partir do ano 200 d.C. E quanto aos mais antigos manuscritos do NT completo? A maioria dos manuscritos do NT, incluindo os quatro evangelhos, sobrevive desde o ano 250, e um manuscrito do NT (incluindo um Antigo Testamento em grego), chamado Códice Vaticano, sobrevive desde o ano 325. Vários outros manuscritos completos sobrevivem desde aquele século. Esses manuscritos possuem ortografia e pontuação características que sugerem ser parte de uma família de manuscritos que pode ter sua origem entre 100 e 150 d.C.

Se esses numerosos e antigos manuscritos fossem tudo o que os estudiosos possuíssem, poderiam reconstruir o NT original com grande precisão. Mas eles também possuem abundantes evidências de apoio do mundo antigo que fazem a reconstituição do NT ser ainda mais precisa. Vamos analisar isso a seguir.

Grande quantidade de manuscritos de apoio. Começando em fevereiro do ano 303 d.C., o imperador romano Diocleciano promulgou três editos de perseguição aos cristãos porque acreditava que a existência do cristianismo estava rompendo a aliança entre Roma e seus deuses. Os editos pediam a destruição das igrejas, dos manuscritos e de livros, assim como a morte dos cristãos.

Centenas, se não milhares, de manuscritos foram destruídos por todo o Império Romano durante essa perseguição, que durou até o ano 311. Mas mesmo que Diocleciano tivesse sido bem-sucedido em varrer da face da Terra todos os manuscritos bíblicos, ele não poderia ter destruído nossa capacidade de reconstruir o NT. Por quê? Porque os pais da igreja primitiva — homens dos séculos 11 e 111 como Justino Mártir, Ireneu, Clemente de Alexandria, Orígenes, Tertuliano e outros — fizeram tantas citações do NT (36.289 vezes, para ser exato) que todos os versículos do NT, com exceção de apenas 11, poderiam ser reconstituídos simplesmente de suas citações. Em outras palavras, você poderia ir até a biblioteca pública, analisar as obras dos pais da igreja primitiva e ler praticamente todo o NT simplesmente com base nas citações que eles fizeram! Desse modo, nós não apenas temos milhares de manuscritos, mas milhares de citações desses manuscritos. Isso torna a reconstrução do texto original praticamente precisa.

Mas quão precisa? Como os originais são reconstruídos e quão preciso é este NT reconstruído?

Como o original é reconstruído?

Esses três fatos — manuscritos em quantidade, antigos e de apoio — ajudam os estudiosos a reconstruírem os manuscritos originais do NT de maneira bem fácil. O processo de comparar muitas cópias e citações fornece uma reconstrução extremamente precisa do original, mesmo que erros fossem cometidos durante a cópia. Como isso funciona? Considere o exemplo a seguir. Suponha que tenhamos quatro diferentes manuscritos, os quais possuem quatro erros diferentes no mesmo versículo, como Filipenses 4.13 (“Tudo posso naquele que me fortalece”). Vejamos as quatro cópias hipotéticas:

  1. Tudo posso naquele que me fortalece
  2. Tudo posso naquele que me fortalece
  3. Tudo posso naquele que me fortalece
  4. Tudo posso naquele que me fortalece

Há algum mistério em relação àquilo que o original dizia? De modo algum.

Pelo processo de comparação e de verificação cruzada, o NT original pode ser reconstruído com grande precisão. A reconstrução do NT é ainda mais fácil que isso, porque existem muito menos erros nos manuscritos verdadeiros do NT do que os que foram representados nesse exemplo.

Vamos presumir por um instante que o NT seja realmente a palavra de Deus.

Os céticos podem perguntar: “Bem, se o NT é realmente a palavra de Deus, então por que Deus não preservou o original?”. Só podemos especular aqui, mas uma possibilidade é porque sua palavra pode ser melhor protegida por meio de cópias do que por meio de documentos originais. Como assim? Porque, se o original estivesse de posse de alguma pessoa, essa pessoa poderia alterá-lo. Mas, se houvesse cópias espalhadas por todo o mundo antigo, não haveria maneira de um escriba ou sacerdote alterar a palavra de Deus. Como vimos, o processo de reconstrução permite que variantes e alterações nas cópias sejam identificadas e corrigidas de maneira bastante simples. Desse modo, ironicamente, o fato de não existirem originais pode preservar a palavra de Deus de uma maneira melhor do que se eles existissem.

Quão precisa é esta reconstrução?

Com o objetivo de abordar a questão da precisão, temos de esclarecer alguns mal-entendidos de muitos críticos em relação a “erros” nos manuscritos bíblicos. Alguns já chegaram a estimar que existem cerca de 200 mil erros nos manuscritos do NT. Primeiro de tudo, eles não são “erros”, mas leituras variantes, a maioria das quais de natureza estritamente gramatical (i.e., pontuação e ortografia). Segundo, essas leituras estão espalhadas por cerca de 5.700 manuscritos, de modo que a variação na ortografia de uma letra de uma palavra em um versículo em 2 mil manuscritos é considerada 2 mil “erros”.

Os especialistas em texto Westcott e Hort estimam que apenas uma em cada 60 dessas variantes tem significância. Isso levaria a um texto com grau de pureza de 98,33%. Philip Schaff calculou que, das 150 mil variantes conhecidas em seus dias, somente 400 mudaram o significado da passagem, apenas 50 foram de real importância e nem mesmo uma sequer afetou “um artigo de fé ou um preceito de obrigação que não seja abundantemente apoiado por outras passagens indubitáveis ou pelo sentido geral do ensinamento das Escrituras”.

Nenhum outro livro antigo é tão bem autenticado. O grande estudioso do NT e professor da Universidade de Princeton, Bruce Metzger, estimou que o Mahabharata, do hinduísmo, foi copiado com apenas 90% de precisão e que a Ilíada de Homero, com cerca de 95%. Por comparação, ele estimou que o NT é cerca de 99,5% preciso. I? Mais uma vez, o 0,5% em questão não afeta uma única doutrina da fé cristã.

Fredric Kenyon, autoridade em manuscritos antigos, resumiu muito bem a situação do NT quando escreveu:

Não se pode afirmar com plena firmeza que, em substância, o texto da Bíblia seja inquestionável. Em especial, essa é a situação do Novo Testamento. O número de manuscritos do NT, de traduções antigas dele e de suas citações pelos antigos autores da igreja é tão grande que é praticamente certo que a verdadeira leitura de toda passagem dúbia esteja preservada em uma ou outra dessas autoridades antigas. Não se pode dizer isso em relação a nenhum outro livro antigo do mundo.

Desse modo, sabemos que possuímos o mesmo NT que foi escrito 2 mil anos atrás. Mas a pergunta seguinte é ainda mais importante: Temos uma cópia precisa da verdade — ou uma mentira? Em outras palavras, o NT é historicamente confiável?

O NT É HISTORICAMENTE CONFIÁVEL?

Quando fazemos a pergunta “O NT é historicamente confiável?”, estamos procurando descobrir se os principais fatos descritos nos documentos do NT realmente aconteceram. Especificamente, houve realmente um homem judeu, há cerca de 2 mil anos, chamado Jesus que ensinou profundas verdades, realizou milagres, foi crucificado pelas autoridades romanas e judaicas por se dizer Deus, que apareceu a muitas testemunhas depois de ter ressuscitado três dias após sua morte?

É importante manter em mente que, nesse ponto, não estamos buscando saber se o NT não possui erros ou se ele é a “palavra de Deus”. Estamos simplesmente tentando descobrir se a narrativa básica é fato, e não ficção. Com o objetivo de descobrir isso, precisamos averiguar que tipos de registros compreendem o NT. Eles são documentos escritos por testemunhas oculares (ou por aqueles que entrevistaram testemunhas oculares) logo depois dos acontecimentos, ou são documentos escritos muito depois, por seguidores tendenciosos que simplesmente embelezaram detalhes sobre a vida de uma personagem histórica real?

Com o objetivo de descobrir isso, nos capítulos seguintes vamos testar os documentos do NT pelo critério que os historiadores freqüentemente usam para determinar se devemos acreditar ou não em determinado documento histórico. Vamos nos referir a esse critério como “testes históricos”. São eles:

  1. Temos um testemunho antigo? De modo geral, quanto mais antigas as fontes, mais preciso é o seu testemunho.
    1. Temos o depoimento de testemunhas oculares? O depoimento das testemunhas oculares normalmente é o melhor meio de estabelecer o que realmente aconteceu.
    2. Temos o depoimento de testemunhas oculares múltiplas e independentes? Testemunhas oculares múltiplas e independentes confirmam que os fatos realmente aconteceram (eles não são ficção) e dão detalhes adicionais que uma única fonte poderia perder (fontes verdadeiramente independentes normalmente contam a mesma história básica, mas com detalhes diferentes. Os historiadores às vezes chamam isso de “coerência com dissimilaridade”) .
    3. As testemunhas oculares são dignas de confiança? Devemos acreditar nelas? O caráter é muito importante.
    4. Temos evidências corroborantes da arqueologia ou de outros autores? Isso traz confirmação adicional.
      1. Temos algum testemunho de algum oponente? Se os oponentes das testemunhas oculares admitem certos fatos que as testemunhas afirmam ser verdadeiros, então tais fatos provavelmente são verdadeiros (se a sua mãe diz, por exemplo, que você é corajoso, isso pode ser verdadeiro; contudo, é provavelmente mais digno de crédito se o seu arquiinimigo disser a mesma coisa).
      2. O testemunho contém fatos ou detalhes que são embaraçosos para os autores? Uma vez que a maioria das pessoas não gosta de registrar informação negativa sobre si mesmas, qualquer testemunho que faça o autor parecer ruim é provavelmente verdadeiro.

Na maioria dos casos, os documentos que satisfazem a maioria ou todos esses testes históricos são considerados confiáveis ainda que com pequena margem de dúvida. Como se saem os documentos do NT? Vamos descobrir neste capítulo e nos três seguintes. Contudo, antes de começarmos o teste histórico número 1 (testemunho antigo), precisamos esclarecer algumas objeções que impedem muitos céticos de até mesmo considerarem a confiabilidade do NT.

Objeções comuns à confiabilidade

A história não pode ser conhecida. O mais recente argumento gerado contra a possibilidade de se considerar a confiabilidade dos documentos do NT é a afirmação de que a história não pode ser conhecida. Ironicamente, essa objeção normalmente vem das mesmas pessoas que dizem saber que a primeira vida foi gerada espontaneamente com base em elementos químicos inorgânicos e que toda a vida subseqüente evoluiu daquela primeira vida, sem nenhuma intervenção inteligente. Eles estão absolutamente seguros sobre essa história a despeito do fato de que não existem testemunhas oculares ou dados corroborantes desses acontecimentos. Contudo, afirmam que a ressurreição de Jesus Cristo — um acontecimento do qual existem testemunhas oculares e dados corroborantes não pode ser conhecida!

A afirmação de que a história não pode ser conhecida vai na direção contrária do bom senso. Não temos certeza de que George Washington foi o primeiro presidente dos Estados Unidos? Que Lincoln foi o 162? Que o Japão atacou Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941? Que o New York Mets venceu a série mundial de beisebol em 1969? É claro que sim. O cético está errado. Nós podemos conhecer e realmente conhecemos a história. De fato, se não pudéssemos conhecer a história, então não poderíamos detectar o revisionismo histórico ou a propaganda histórica, linhas que assumem existir uma história objetiva que pode ser conhecida.

Por que alguém não poderia ter conhecimento de um fato passado? O cético pode dizer: “Porque você não tem acesso a todos os fatos!”. A isso, responderemos: “Então os cientistas não podem saber coisa alguma, porque não têm acesso a todos os fatos”. Isso é obviamente absurdo. Embora não possamos ter acesso a todos os fatos, podemos ser capazes de reunir uma quantidade suficiente deles para estarmos razoavelmente certos daquilo que aconteceu.

Parte da confusão envolve uma falha em definir aquilo que significa “conhecer”. Uma vez que não podemos voltar no tempo e testemunhar os fatos históricos outra vez, nosso conhecimento histórico está baseado na probabilidade. Em outras palavras, usamos o mesmo padrão que um júri usa para determinar se um acusado cometeu um crime: o de dúvidas justificáveis. Se a história não pode ser conhecida, então nenhum júri poderia chegar a um veredicto! Além do mais, um júri faz um julgamento sobre a culpa ou a inocência de alguém baseado no conhecimento de algum fato passado. Os historiadores precisam descobrir fatos passados do mesmo modo que a polícia ou a equipe de criminalística faz: reunindo evidências e entrevistando testemunhas. Quando fazem isso, freqüentem ente usam os sete testes históricos que acabamos de identificar.

Por último, se não podemos conhecer a história, então os céticos não podem afirmar que o cristianismo não seja verdadeiro. Para dizer que o cristianismo não é verdadeiro, o cético precisa conhecer a história. Por quê? Porque toda negativa implica uma afirmação. Para dizer que Jesus não ressuscitou dos mortos (a negação), o cético precisa saber o que realmente aconteceu a ele (a afirmação).

No fim de tudo, os céticos são pegos num dilema. Se disserem que a história não pode ser conhecida, então não podem dizer que a evolução é verdadeira e que o cristianismo é falso. Se admitirem que a história pode ser conhecida, então precisam enfrentar as múltiplas linhas de evidência histórica favorável à criação e ao cristianismo.

Os documentos do Novo Testamento contêm milagres. Os céticos normalmente fazem a seguinte acusação: “O NT contém milagres; portanto, uma grande parte dele só pode ser lenda!”. Já respondemos a essa objeção. Uma vez que Deus existe, os milagres são possíveis. Como veremos no capítulo 13, os eventos do NT estão num contexto em que os milagres não são apenas possíveis, mas foram preditos. Desse modo, a inclusão de milagres não nega a historicidade dos documentos do NT, mas, na verdade, a fortalece (porque registram fatos que foram preditos).

Os autores do Novo Testamento eram tendenciosos. O grande cético David Hume disse que, se vamos considerar as testemunhas dignas de crédito, então elas não devem ser tendenciosas. Desse modo, quando os céticos olham para os documentos do NT, freqüentemente perguntam: “Como você pode dizer que eram confiáveis, uma vez que foram escritos pelos convertidos? Esses são relatos tendenciosos escritos por pessoas tendenciosas”.

É verdade que os autores do NT eram tendenciosos e convertidos. Mas isso não significa que mentiram ou que exageraram. Na verdade, sua conversão e seu viés podem realmente tê-las levado a serem mais precisos. Vamos ver por quê.

Alguns anos atrás, o assim chamado documentário sobre Jesus, transmitido por um canal de televisão, começava com o seguinte comentário do narrador: ”A maior parte daquilo que pensamos saber sobre Jesus vem dos evangelhos do NT:

Mateus, Marcos, Lucas e João. Mas não podemos confiar que esses livros apresentem uma informação precisa, porque foram escritos pelos convertidos.

Bem, o que há de errado com essa lógica? O que há de errado com a lógica é que deixa de fazer a pergunta mais importante: Por que eles se converteram? De fato, a primeira e mais importante pergunta não é “Qual era a crença dos autores do NT?”. A primeira e mais importante pergunta é: “Por que eles se converteram a essas novas crenças?”. Em outras palavras, por que os autores do NT repentinamente abandonaram seu meio de ganhar a vida e suas valiosas tradições religiosas em favor dessas novas crenças?

Eu [Frank] fiz essa pergunta a um casal de negros muçulmanos19 durante um debate no rádio há não muito tempo. Tal como os muçulmanos tradicionais, os negros muçulmanos não acreditam que Jesus tenha sido crucificado, e, assim, não há maneira de ele ter ressuscitado. Tendo isso em mente, perguntei:

— Por que os autores do NT repentinamente se converteram do judaísmo para acreditar que Jesus ressuscitara dos mortos?

— Porque eles queriam ter poder sobre as pessoas! — disse um deles.

— Que poder os autores do NT ganharam ao afirmar que Jesus ressuscitara

dos mortos? — perguntei. — A resposta é “nenhum”. De fato, em vez de ganhar poder, eles receberam exatamente o oposto: submissão, servidão, perseguição, tortura e morte — disse eu. Eles não responderam nada. Então, fiz a pergunta de uma maneira diferente:

— Que possível motivo teriam os autores do NT para fabricar a história da ressurreição se ela não era verdadeira?

Mais uma vez, não tiveram resposta. Por quê? Porque começaram a perceber que os autores do NT tinham todos os motivos naturais para negar a ressurreição, em vez de proclamá-la. Não havia motivação ou incentivo para fabricar a narrativa do NT. Desde a última vez que pensamos nisso, a promessa de submissão, servidão, perseguição, tortura e morte não motivaria ninguém a inventar tal história.

Os autores do NT certamente não tiveram razão para inventar uma nova religião. Devemos nos lembrar de que todos eles (com a possível exceção de Lucas) eram judeus que acreditavam firmemente já possuírem uma religião verdadeira. Aquela religião de quase 2 mil anos afirmava que eles, os judeus, eram o povo escolhido de Deus. Por que os judeus que se converteram ao cristianismo se arriscariam a sofrer perseguição, morte e, talvez, condenação eterna para começar alguma coisa que 1) não era verdadeira e 2) elevou os não-judeus ao mesmo relacionamento exclusivo que eles afirmavam ter com o Criador do Universo? A não ser que a ressurreição realmente tivesse acontecido, por que deixariam, de maneira quase imediata, de observar o sabá, a circuncisão, a lei de Moisés, a centralidade do templo, o sistema sacerdotal e outros ensinamentos do AT? Os autores do NT precisavam ter testemunhado alguma evidência muito forte para abandonar as crenças e as práticas antigas que haviam definido quem eles e seus ancestrais eram por cerca de 2 mil anos.

Pessoas convertidas não são objetivas. Nesse ponto, o cético pode protestar:

“Mas, uma vez que os autores do NT eram convertidos, eles não podem ser objetivos”. Absurdo. As pessoas podem ser objetivas mesmo que não sejam neutras. Um médico pode fornecer um diagnóstico objetivo mesmo que tenha uma grande afeição pelo paciente. Ou seja, pode ser objetivo embora não seja neutro. O fato é que sua paixão pelo paciente pode fazê-lo ser ainda mais diligente ao diagnosticar e tratar a doença de maneira adequada.

Ao escrever este livro, embora certamente não sejamos neutros, estamos apresentando fatos objetivos. Do mesmo modo, os ateus não são neutros, mas também podem apresentar fatos objetivos se optarem por fazê-lo. Os autores do NT poderiam ter feito o mesmo.

A verdade sobre essa questão é que todos os livros são escritos por uma razão, e a maioria dos autores acredita naquilo que está escrevendo! Mas isso não significa que aquilo que eles escrevem seja errado ou não possua um elemento objetivo. Como mencionamos no prefácio, os sobreviventes do Holocausto que escreveram suas experiências certamente não foram observadores neutros. Acreditavam apaixonadamente no propósito de registrar esses fatos, de modo que o mundo jamais se esquecesse do Holocausto, e esperam que ele nunca se repita. Enquanto a paixão pode fazer algumas pessoas exagerarem, ela pode levar outras a serem ainda mais meticulosas e precisas de modo a não perderem a credibilidade e a aceitação da mensagem que desejam comunicar.

A distinção entre a neutralidade e a objetividade dos autores do NT é uma questão extremamente importante. Com muita freqüência, os documentos que compõem o NT são automaticamente considerados tendenciosos e indignos de confiança. Isso é irônico, pois aqueles que sustentam essa visão são freqüentemente tendenciosos. São tendenciosos porque não investigaram primeiramente os documentos do NT ou o contexto no qual eles foram escritos, com o objetivo de fazer uma avaliação isenta de sua probidade.

Como veremos logo a seguir, os documentos do NT não são “propaganda da igreja” ou um monólito de escritos planejados para promover uma teologia construída pela própria igreja. Então, o que são? Essa é a pergunta que vamos abordar no restante deste capítulo e nos três seguintes.

Sendo assim, vamos começar. Sabemos que temos uma cópia precisa do que foi escrito pelos autores do NT. Mas esses documentos são fidedignos? Nossa primeira pergunta lida com o teste histórico número 1: Os documentos do NT são antigos?

OS DOCUMENTOS DO NOVO TESTAMENTO SÃO ANTIGOS?

Sim, mas quão antigos?

Todos os livros do NT foram escritos antes do ano 100 d.C. (cerca de 70 anos depois da morte de Jesus). Como mostra a tabela 9.1, em cartas escritas entre os anos 95 e 110 d.C, três pais da igreja primitiva — Clemente, Inácio e Policarpo — citaram passagens de 25 dos 27 livros do NT. Somente os pequenos livros de Judas e 2João não foram citados, mas certamente já tinham sido escritos (Judas teria escrito sua pequena carta nessa época porque, sendo o meio irmão de Jesus, muito provavelmente já estava morto no ano 100; 2João fora escrita porque ela é anterior a 3João, que é um dos 25 livros citados).

Uma vez que Clemente estava em Roma e Inácio e Policarpo estavam a centenas de quilômetros de distância, em Esmirna, os documentos originais do NT precisariam ter sido escritos muito tempo antes, caso contrário não poderiam ter circulado por todo o mundo antigo daquela época. Portanto, é seguro dizer que todo o NT já havia sido escrito por volta do ano 100 e pelo menos todos os livros que constam na primeira coluna da esquerda foram escritos vários anos antes de 95.

Mas essa é simplesmente a data mais posterior na qual eles poderiam ter sido escritos. A maioria deles foi provavelmente escrita muito tempo antes. Quando? A maioria, se não todos, antes do ano 70 d.C

A maioria desses livros, se não todos, foi escrita antes do ano 70 d.C (cerca de 40 anos depois da morte de Jesus). Imagine isto. Você é um judeu religioso do século I. O centro de sua vida nacional, econômica e religiosa é Jerusalém e, em especial, o templo. Essa tem sido a vida de sua nação, de sua família e de praticamente toda a família judaica por milhares de anos, desde que Salomão construiu o primeiro templo. A maior parte do novo templo, construída pelo rei Herodes, foi completada quando você era criança, mas porções dele ainda estão em construção, iniciada no ano 19 a.C Por toda a sua vida, você freqüentou os cultos e trouxe sacrifícios ali para expiar os pecados que cometera contra Deus. Por quê? Porque você e seus compatriotas consideram esse templo como a habitação terrena do Deus do Universo, o Criador do céu e da terra, a própria Divindade cujo nome é tão santo que você nem ousa pronunciar.

Sendo jovem, você começa a seguir um judeu chamado Jesus, o qual afirma ser o tão esperado Messias predito nas suas Escrituras. Ele realiza milagres, ensina verdades profundas e repreende e confunde os sacerdotes encarregados do templo. De maneira incrível, prediz sua própria morte e ressurreição. Prediz que o próprio templo será destruído antes do fim de sua geração (Mc 13.2,30).

Isso é escandaloso! Jesus é condenado por blasfêmia pelos sacerdotes do seu templo e crucificado na véspera da Páscoa, um dos seus feriados mais sagrados. Ele é enterrado num túmulo judeu, mas, três dias depois, você e os outros seguidores vêem Jesus vivo tal como ele havia predito. Você toca nele, ouve o que diz, e ele continua a realizar milagres, sendo o último deles a sua própria ascensão ao céu. Passados 40 anos, o seu templo é destruído tal como Jesus havia predito, juntamente com toda a cidade e milhares de compatriotas seus.

Pergunta: se você e seus colegas seguidores escrevessem relatos de Jesus depois de a cidade e o templo terem sido destruídos no ano 70 d.C, você não faria pelo menos uma menção da tragédia nacional, humana, econômica e religiosa sem precedentes em algum lugar dos seus escritos, especialmente uma vez que esse Jesus ressurreto havia predito que tudo isso aconteceria? É claro que sim! Bem, aqui está um problema para aqueles que dizem que o NT foi escrito depois do ano 70 d.C: não existe absolutamente nenhuma menção do cumprimento dessa tragédia predita em lugar algum nos documentos do NT. Isso significa que a maioria, se não todos os documentos, deve ter sido escrita antes do ano 70 d.C

Alguns podem levantar uma objeção: “Esse é o argumento do silêncio, e isso não prova nada”. Contudo, na verdade esse não é um argumento do silêncio, pois os documentos do NT falam de Jerusalém e do templo, ou de atividades associadas a eles, como se eles ainda estivessem intactos na época da composição dos textos. Mas mesmo que esse fosse um argumento extraído do silêncio, não significa que esteja errado. Considere estes paralelos modernos. Se um ex-marinheiro a bordo do USS Arizona escrevesse um livro relacionado à história daquele navio e o livro terminasse sem nenhuma menção do navio sendo afundado e do fato de 1.177 marinheiros terem sido mortos em Pearl Harbor, você teria alguma dúvida de que o livro fora escrito antes de 7 de dezembro de 1941? Ou se um morador do World Trade Center escrevesse um livro relatando a história daqueles prédios e o livro terminasse com as torres ainda em pé — sem haver absolutamente nenhuma menção das torres sendo destruídas e de cerca de 3 mil pessoas sendo mortas por terroristas muçulmanos — você teria alguma dúvida de que o livro fora escrito antes de 11 de setembro de 2001? É claro que não.

Bem, o desastre no ano 70 d.C., em termos de vidas, propriedade e abrangência nacional, foi muitas vezes maior do que Pearl Harbor e o Onze de Setembro. Ele marcou o fim da terrível guerra que Josefo — que se rendeu aos romanos no ano 67 — chamou de “a maior” guerra de todos os tempos. Os judeus não perderam apenas um navio ou dois prédios importantes — perderam todo o país, a capital e o templo, que fora o centro da sua vida religiosa, política e econômica por pelo menos 2 mil anos. Além disso, dezenas de milhares de compatriotas foram mortos e centenas de vilas foram queimadas totalmente.

Desse modo, se esperamos que tragédias como Pearl Harbor e o Onze de Setembro sejam mencionadas em escritos relevantes de hoje, certamente deveríamos esperar que os acontecimentos do ano 70 d.C. fossem citados em algum lugar do NT (principalmente pelo fato de esses acontecimentos terem sido previstos por Jesus). Contudo, uma vez que o NT não menciona esses acontecimentos em qualquer lugar que seja, sugerindo que Jerusalém e o templo ainda estavam intactos, podemos concluir com grande grau de certeza que a maioria, se não todos os documentos do NT, deve ter sido escrita antes do ano 70 d.C.

Mas quanto antes?

Muitos dos livros do Novo Testamento foram compostos antes do ano 62 d.C. (cerca de 30 anos depois da morte de Jesus). Imagine o seguinte: você é um médico do século I que resolveu fazer um projeto de pesquisa para registrar os acontecimentos da igreja primitiva. Essa pesquisa vai exigir que você entreviste testemunhas oculares da igreja primitiva e que viaje com o apóstolo Paulo enquanto ele visita novas igrejas por todo o mundo antigo. Você registra fatos importantes da vida da igreja, como o trabalho inicial de João e Pedro, assim como os martírios de Estevão e de Tiago (irmão de João). Na vida de Paulo, você registra tudo, desde sermões, espancamentos e julgamentos até naufrágios e prisões. Você também registra o debate teológico que ele teve com Pedro e Tiago, que é irmão de Jesus e líder da igreja de Jerusalém.

À medida que você descreve muitos desses fatos, sua narrativa torna-se tão rica em detalhes que todo leitor informado saberá que teve acesso ao depoimento das testemunhas oculares ou então que você mesmo foi uma testemunha ocular. Ao seguir Paulo em suas viagens, por exemplo, você deixa de usar o pronome “eles” e passa a usar “nós”, registrando corretamente os nomes de políticos locais, aspectos da linguagem local, padrões meteorológicos do local, topografia local e práticas comerciais locais. Você até mesmo registra a profundidade correta da água a cerca de 400 metros da ilha de Malta, conforme seu navio está prestes a afundar durante uma tormenta! De fato, você registra pelo menos 84 detalhes desse tipo na segunda metade de sua narrativa.

Pergunta: uma vez que está claro que você considera importante registrar todos esses detalhes menores, se o apóstolo Paulo — seu assunto principal fosse executado pelas mãos do imperador romano Nero, você não registraria isso? Ou se o irmão de Jesus, o líder da igreja de Jerusalém, fosse morto nas mãos do Sinédrio, o mesmo corpo jurídico judaico que sentenciou Jesus à morte, você não registraria isso? Claro que sim! Se você deixasse de registrar tais fatos importantes, nós corretamente presumiríamos que você escreveu sua narrativa antes dessas mortes.

Esta é a situação que encontramos no NT. Lucas, o médico, registra meticulosamente todo tipo de detalhes no livro de Atos dos Apóstolos, que é uma crônica da igreja primitiva (você encontrará uma lista de 84 detalhes historicamente confirmados no capítulo seguinte). Lucas registra a morte de dois mártires cristãos (Estevão e Tiago, o irmão de João), mas seu relato termina tendo dois de seus principais líderes (Paulo e Tiago, irmão de Jesus) ainda vivos. Atos termina abruptamente quando Paulo está numa prisão domiciliar em Roma, e não há menção de Tiago ter morrido. Por meio de Clemente de Roma — escrevendo no final do século I — e de outros pais da igreja primitiva, sabemos que Paulo foi executado em algum momento durante o reinado de Nero, que terminou no ano 68 d.C. Sabemos por meio de Josefo que Tiago foi morto no ano 62 d.C. Assim, podemos concluir, acima do que se considera dúvida justificável, que o livro de Atos foi escrito antes do ano 62 d.C.

Se você ainda não está convencido, considere este paralelo moderno: suponha que alguém escreva um livro registrando os fatos que cercaram as principais personagens do movimento pelos direitos civis na década de 1960. O livro começa com o assassínio do presidente John Fitzgerald Kennedy e inclui a lei dos Direitos Civis de 1964, as marchas e os protestos de Martin Luther King Jr., incluindo sua prisão e o seu grande discurso “Eu tenho um sonho” nos jardins de Washington, D.C. Pergunta: se o livro terminasse com Martin Luther King Jr. — o grande líder desse movimento — ainda vivo, você concluiria que o livro foi escrito em qual data? Obviamente em algum momento antes de seu assassinato em abril de 1968. Essa é a mesma situação que encontramos na narrativa de Lucas. Seu livro termina tendo os principais líderes ainda vivos, o que significa que ele foi escrito não depois do ano 62 d.C. (Colin Hemer, historiador e pesquisador clássico, mostra 13 razões adicionais pelas quais o livro de Atos foi escrito por volta do ano 62 d.C.).

Se Atos foi escrito por volta do ano 62 d.C., então o evangelho de Lucas foi escrito antes. Como podemos saber isso? Porque Lucas lembra ao destinatário original do livro de Atos, Teófilo (que provavelmente era um importante oficial romano), aquilo que lhe escrevera anteriormente. O primeiro versículo de Atos diz: “Em meu livro anterior, Teófilo, escrevi a respeito de tudo o que Jesus começou a fazer e a ensinar … “. O “livro anterior” deve ser o evangelho de Lucas, porque Lucas também o endereçou a Teófilo (Lc 1.1-4, v. citação a seguir).

O evangelho de Lucas foi escrito quanto tempo antes? Pareceria plausível dizer que Lucas foi escrito antes ou por volta do ano 60 d.C. Por quê? Porque o ano 62 d.C. é a última data para Atos ter sido escrito, e seria necessário algum tempo entre o primeiro texto de Lucas enviado a Teófilo e o segundo texto. Se Atos não poderia ser escrito depois de 62 d.C. (e muito possivelmente antes disso), então Lucas está corretamente colocado no ano 60 d. e. ou antes.

Essa data também faz sentido à luz da citação que Paulo faz do evangelho de Lucas. Escrevendo em algum momento entre os anos 62 e 65 d.C., Paulo cita Lucas 10.7 e o chama de “Escritura’ (1Tm 5.18). Portanto, o evangelho de Lucas deve ter circulado tempo suficiente antes dessa época para que tanto Paulo quanto Timóteo conhecessem o seu conteúdo e o considerassem Escritura (a propósito, o fato de Paulo ter dito isso não é pouca coisa. Com efeito, ele estava afirmando com ousadia que o evangelho de Lucas era tão inspirado quanto a santa Bíblia judaica — o AT que ele tanto valorizava!).

Se Lucas foi escrito por volta do ano 60 d.C., então Marcos deve ter sido escrito da metade para o fim da década do ano 50 d.C., se não mais cedo. Por quê? Porque Lucas diz que ele obteve conhecimento dos fatos confrontando-os com as fontes das testemunhas oculares:

Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram entre nós, conforme nos foram transmitidos por aqueles que desde o início foram testemunhas oculares e servos da palavra. Eu mesmo investiguei tudo cuidadosamente, desde o começo, e decidi escrever-te um relato ordenado, ó excelentíssimo Teófilo, para que tenhas a certeza das coisas que te foram ensinadas (Lc 1.1-4).

A maioria dos estudiosos acredita que o evangelho de Marcos foi uma dessas fontes de testemunhas oculares. Se aqueles fragmentos dos Manuscritos do mar Morto que mencionamos são realmente do período que vai de 50 a 70 d.C., então certamente Marcos é anterior. Contudo, mesmo que Marcos não fosse anterior a Lucas, o próprio fato de sabermos, ainda que com pequena parcela de dúvida justificável, que Lucas é anterior ao ano 62 d.C. (e provavelmente ao ano 60 d.C.) realmente significa que aquilo que temos meticulosamente registrado são depoimentos de testemunhas oculares do sepultamento e da ressurreição de Jesus, escritos num período de 25 a 30 anos depois da morte dele. Isso é cedo demais para ter-se tornado uma lenda. Também significa que a fonte das testemunhas oculares aponta para mais cedo ainda. Quanto mais cedo?

Alguns livros do Novo Testamento foram escritos nas décadas de 40 e 50 d.C., com base em fontes da década de 30 d.C. (apenas alguns anos depois da morte de Jesus). Tão certo como podemos datar os escritos de Lucas, ninguém duvida — nem mesmo os estudiosos mais liberais — que Paulo escreveu sua primeira carta à igreja de Corinto (que está hoje na Grécia moderna) em algum momento entre os anos 55 e 56 d.C. Em sua carta, Paulo fala sobre problemas morais da igreja e, então, continua, discutindo controvérsias sobre línguas, profecias e a ceia do Senhor. Isso certamente demonstra que a igreja em Corinto estava experimentando algum tipo de atividade miraculosa e já estava observando a ceia do Senhor 25 anos depois da ressurreição de Cristo.

Contudo, o aspecto mais significativo dessa carta é que ela contém o mais antigo e mais autenticado testemunho da própria ressurreição. No capítulo 15 de 1 Coríntios, Paulo escreve o testemunho que recebeu de outros e o testemunho que foi autenticado quando Cristo apareceu-lhe:

Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, segundo as Escrituras, e apareceu a Pedra e depois aos Doze. Depois disso apareceu a mais de quinhentos irmãos de uma só vez, a maioria dos quais ainda vive, embora alguns já tenham adormecido. Depois apareceu a Tiago e, então, a todos os apóstolos; depois destes apareceu também a mim, como a um que nasceu fora de tempo (1Co 15.3-8).

Onde Paulo obteve aquilo que ele “recebeu”? Ele provavelmente o recebeu de Pedro e de Tiago, quando os visitou em Jerusalém, três anos depois de sua conversão (GI1.18). Por que isso é tão importante? Porque, como destaca Gary Habermas, a maioria dos estudiosos (até mesmo os liberais) acredita que esse testemunho era parte de um antigo credo cuja origem remonta à própria ressurreição de Jesus — 18 meses a oito anos depois, mas alguns dizem que foi ainda mais cedo. Não há possibilidade de tal testemunho ser descrito como lenda, porque ele tem sua origem exatamente no momento e no lugar do fato em si. Se havia um lugar onde uma ressurreição lendária não pudesse acontecer, era Jerusalém, porque os judeus e os romanos estavam por demais ansiosos para esmagar o cristianismo e poderiam facilmente tê-la feito apresentando o corpo de Jesus por toda a cidade.

Além disso, perceba que Paulo cita 14 testemunhas oculares cujos nomes são conhecidos: os doze apóstolos, Tiago e o próprio Paulo (o termo “Cefas” é a palavra aramaica equivalente a Pedro) e depois faz referência a uma aparição a mais outras 500 pessoas de uma só vez. Dentro desse grupo, havia um cético, Tiago, e um inimigo declarado, o próprio Paulo. Ao citar os nomes de tantas pessoas que poderiam verificar o que Paulo estava dizendo, ele estava, com efeito, desafiando seus leitores de Corinto a verificar o que dizia. O especialista em Bíblia William Lillie expõe a questão da seguinte maneira:

O que concede uma autoridade especial à lista como evidência histórica é a referência ao fato de a maioria dos 500 irmãos ainda estarem vivos. Com efeito, S. Paulo diz: “Se você não acredita em mim, pergunte a eles”. Tal declaração, numa carta comprovadamente genuína, escrita cerca de 30 anos depois do acontecimento, é praticamente uma evidência tão conclusiva quanto alguém poderia esperar obter de algo que aconteceu cerca de 2 mil anos atrás.

Se a ressurreição de Jesus não tivesse acontecido, por que Paulo daria uma lista de supostas testemunhas oculares? Ele teria perdido imediatamente toda a credibilidade diante de seus leitores da cidade de Corinto ao mentir de maneira tão descarada.

Além de 1 Coríntios, existem diversos outros documentos do NT que foram escritos na década de 50 d.C. ou antes. Gálatas (48 d.C.), 1Tessalonicenses (5054 d.C.) e Romanos (57 e 58 d.C.) encaixam-se nessa categoria. De fato (e sabemos que podemos ficar sozinhos nessa posição!), todas as obras de Paulo precisariam ter sido escritas antes que ele morresse, o que aconteceu em algum momento na década de 60 d. e.

Mas não são apenas os estudiosos conservadores que acreditam nessas datas tão antigas. Até mesmo alguns críticos radicais, como o ateu John A. T. Robinson, admitem que os documentos do NT foram escritos logo. Conhecido por seu papel no lançamento do movimento “a Morte de Deus”, Robinson escreveu um livro revolucionário intitulado Redating the New Testament [Refazendo a datação do Novo Testamento] no qual postula que a maioria dos livros do NT, incluindo os quatro evangelhos, foram escritos em algum momento entre os anos 40 e 65 d.C.

Depois de ver quão bem o NT encaixa-se com os dados arqueológicos e históricos, o grande e outrora liberal arqueólogo William F. Albright escreveu: “Já podemos dizer enfaticamente que não há mais nenhuma base sólida para considerar que algum livro do NT tenha sido escrito depois do ano 80 d.C.”. Em outro lugar, Albright disse: “Na minha opinião, todos os livros do NT foram escritos por um judeu batizado entre os anos 40 e 80 do século I (muito provavelmente em algum momento entre os anos 50 e 75)”.

Desse modo, sabemos, acima do que se considera dúvida justificável, que a maioria dos documentos do NT, se não todos, é antiga. Mas os céticos ainda têm algumas objeções.

Os documentos não são suficientemente antigos

Alguns céticos podem pensar que um período de 15 a 40 anos entre a vida de Cristo e os escritos sobre ele é um período grande demais para que o testemunho seja confiável. Mas estão errados.

Pense nos fatos que aconteceram entre 15 e 40 anos atrás. Quando os historiadores escrevem sobre eles, não dizemos “Oh, isso é impossível! Ninguém pode se lembrar dos fatos que se passaram há tanto tempo!”. Tal ceticismo é claramente injustificável. Os historiadores de hoje escrevem com precisão sobre fatos das décadas de 1970, 80 e 90 consultando suas próprias lembranças, a lembrança das testemunhas oculares e qualquer fonte escrita daquela época.

Esse processo é o mesmo que os autores do NT usaram para registrar seus documentos. Tal como um bom repórter, Lucas entrevistou testemunhas oculares. Como veremos no capítulo seguinte, alguns autores do NT foram eles mesmos testemunhas oculares. Eles podiam lembrar-se de fatos acontecidos 15 a 40 anos antes, assim como você pode. Por que você pode se lembrar de certos fatos de maneira tão viva, mesmo que eles tenham acontecido 15 a 40 anos atrás (se você possui idade suficiente) ou até mais para trás? Você pode ser capaz de se lembrar de certos fatos porque eles causaram um grande impacto emocional sobre você (de fato, aqueles de nós de idade provecta às vezes podem lembrar-se de fatos ocorridos 30 anos atrás melhor do que aquilo que aconteceu há 30 minutos!).

Onde você estava e o que estava fazendo quando o presidente Kennedy foi assassinado? Quando a nave Challenger explodiu? Quando o segundo avião atingiu a torre em Nova York? Por que consegue lembrar-se tão bem desses fatos? Porque eles provocaram um profundo impacto emocional em você. Uma vez que um fato como a ressurreição de Jesus certamente teria causado um profundo impacto emocional nos autores do NT e nas testemunhas oculares que eles podem ter consultado, é fácil entender por que a história de Jesus pôde ser lembrada tão facilmente muitos anos depois, especialmente numa cultura com uma confiança estabelecida no testemunho oral (leia mais sobre isso a seguir).

Além do mais, se as maiores obras do NT são relatos de testemunhas oculares, escritos dentro de um período de duas gerações depois dos fatos, então é muito provável que não sejam lendas. Por quê? Porque a pesquisa histórica indica que um mito não pode começar a se sobrepor aos fatos históricos enquanto as testemunhas oculares ainda estão vivas. Por essa razão, o historiador romano A. N. Sherwin-White chama a visão mitológica do NT de “inacreditável”. Willian Lane Craig escreve: “Os testes mostram que mesmo duas gerações é um período muito curto para que tendências legendárias apaguem o cerne dos fatos históricos”. Dentro dessas duas gerações, as testemunhas oculares ainda estão por perto para corrigir os erros dos revisionistas da história.

Estamos vendo essa tendência exatamente agora com respeito ao Holocausto.

No começo do século XXI, começamos a ver algumas pessoas afirmarem que o Holocausto nunca aconteceu. Por que os revisionistas estão tentando isso agora? Porque a maioria das testemunhas oculares já morreu. Felizmente, uma vez que temos o testemunho escrito das testemunhas oculares do Holocausto, os revisionistas não estão sendo bem-sucedidos em passar adiante suas mentiras como se fossem verdades. O mesmo se confirma com relação ao NT. Se o NT fosse escrito 60 anos depois dos fatos que ele registra, é altamente improvável que os fatos pudessem ser lendários. Como já vimos, todos os documentos do NT foram escritos dentro de um período de 60 anos após os fatos narrados, considerando-se que muitos deles foram escritos antes desse período.

Por que não antes?

Neste momento, o cético pode dizer: “O.k., tudo bem. O NT é antigo, mas ele não é tão antigo quanto eu esperaria. Por que eles não escreveram seu testemunho ainda antes? Se eu visse o que eles disseram que viram, não esperaria 15 a 20 anos para escrevê-lo”.

Existe um número de razões possíveis para a espera.

Em primeiro lugar, uma vez que os autores do NT estavam vivendo numa cultura em que a grande maioria das pessoas não sabia ler, não havia necessidade inicial ou utilidade em fazer-se um registro de forma escrita. Por pura necessidade, as pessoas da Palestina do século I desenvolveram forte capacidade de memorização com o objetivo de lembrar e passar adiante uma informação. Craig escreve:

Numa cultura oral como a da Palestina do primeiro século, a habilidade de memorizar e reter grandes textos de tradição oral era algo altamente valorizado e bastante desenvolvido. Desde os primeiros anos, as crianças no lar, na escola fundamental e na sinagoga eram ensinadas a memorizar corretamente as tradições sagradas. Os discípulos teriam exercido cuidado similar com os ensinamentos de Jesus.

Numa cultura oral como essa, os fatos sobre Jesus podem ter sido colocados numa forma fácil de ser decorada. Existem boas evidências disso. Gary Habermas identificou 41 pequenas sessões do Novo Testamento que parecem ser credos frases compactas que poderiam ser facilmente relembradas e que provavelmente eram passadas adiante de maneira oral antes de serem colocadas em forma escrita (já mencionamos um desses credos — 1Co 15.3-8).

Em segundo lugar, uma vez que alguns dos autores do NT podem ter tido grandes esperanças de que Jesus estava para voltar durante a sua vida, eles não viam uma razão imediata de escrever. Contudo, conforme foram ficando mais velhos, talvez tenham pensado que seria sábio registrar suas observações no papiro.

Em terceiro lugar, à medida que o cristianismo se espalhava por todo o mundo antigo, a escrita tornava-se um meio mais eficiente de se comunicar com a igreja, que se expandia rapidamente. Em outras palavras, o tempo e a distância forçaram os autores do NT a escrever.

No entanto, pode não ter havido um espaço de tempo com relação a pelo menos um dos evangelhos. Se aqueles fragmentos dos Manuscritos do mar Morto são realmente do evangelho de Marcos (e existe uma grande possibilidade que sejam), então esse evangelho pode ter sido escrito nos anos 30 d.C. Por quê? Porque os fragmentos são das cópias, e não do original. Se temos cópias dos anos 50 d.C., então o original deve ser anterior.

Além disso, muitos estudiosos acreditam que realmente havia fontes escritas anteriores aos evangelhos. De fato, nos primeiros quatro versículos de seu evangelho, Lucas diz que verificou outras fontes, aparentemente algumas delas podem ter sido evangelhos mais antigos (e.g., Mateus e Marcos). O evangelho de Marcos teria sido uma dessas fontes? Não sabemos com certeza. Certamente parece que Lucas está falando de várias outras fontes escritas, porque ele diz:

“Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram entre nós … ” (Lc 1.1). Lucas pode ter se referido ao evangelho de Marcos e a outros depoimentos escritos, incluindo registros públicos do tribunal que julgou Jesus.

Por fim, realmente não importa se havia ou não outras fontes escritas anteriores ao NT. Também não importa se Marcos foi escrito na década de 30 d.C. Por quê? Porque os documentos dos quais realmente temos conhecimento são antigos o suficiente e contêm material-fonte antigo. Como veremos no capítulo seguinte, muitos, se não todos os documentos do NT, foram escritos por testemunhas oculares ou por seus contemporâneos num período de 15 a 40 anos depois de Jesus, e alguns contêm testemunho escrito de origem oral ou outros escritos que aponta diretamente para a sua ressurreição. Em outras palavras, a verdadeira questão não é tanto com relação à data dos escritos, mas à data das fontes usadas nos escritos.

Por que não mais?

Os céticos podem dizer: “Se Jesus realmente ressuscitou dos mortos, não deveria haver mais coisa escrita sobre ele do que realmente existe?”. A resposta é que nós realmente temos mais testemunho do que poderíamos esperar e certamente mais do que suficiente para estabelecer, acima do que se considera dúvida justificável, o que aconteceu. Como já vimos, Jesus é citado por muito mais autores do que um imperador romano de sua época (Jesus é citado por 43 autores, enquanto Tibério é citado por dez, num período de 150 anos após a morte de cada um). Nove desses autores foram testemunhas oculares ou contemporâneos dos acontecimentos e escreveram 27 documentos, dos quais a maioria menciona ou deixa implícita a ressurreição de Jesus. Isso é mais do que suficiente para estabelecer historicidade.

Para aqueles que ainda acham que deveria haver mais material escrito sobre Jesus, o estudioso do NT Craig Blomberg apresenta quatro razões que explicam por que essa idéia não é plausível: 1) o início humilde do cristianismo; 2) a localização remota da Palestina, na fronteira oriental do Império Romano; 3) a pequena porcentagem de obras de historiadores greco-romanos que sobreviveu (devido provavelmente a fatos como perda, degradação, destruição ou as três alternativas juntas) e 4) a falta de atenção dada aos documentos históricos sobreviventes por parte de personagens judaicos em geral.

Todavia, alguns céticos ainda podem pensar que deveria existir o testemunho de alguma daquelas 500 pessoas que supostamente viram o Cristo ressurreto. O cético Farrell Till é um deles. Durante um debate sobre a ressurreição de Jesus que eu [Norm] tive com ele em 1994, Till exigiu: “Mostre-me uma dessas 500 testemunhas ou nos dê alguma coisa que elas tenham escrito, e nós aceitaremos isso como uma prova confiável ou como evidência”.

Essa expectativa não é plausível, por diversas razões. Em primeiro lugar, como já destacamos, a Palestina do século I era uma cultura oral. A maioria das pessoas não sabia ler e lembrava-se das informações e passava-as adiante de maneira oral.

Em segundo lugar, quantas dessas testemunhas oculares predominantemente analfabetas teriam escrito alguma coisa, ainda que soubessem escrever? Mesmo hoje, com uma taxa de analfabetismo muito menor e todas as conveniências da escrita moderna e das ferramentas de pesquisa, quantas pessoas você conhece que já escreveram um livro ou até mesmo um artigo sobre um assunto qualquer? Quantas você conhece que já escreveram um livro ou um artigo sobre um fato histórico contemporâneo, até mesmo algo tão significativo quanto o Onze de Setembro? Provavelmente não muitas e certamente muito menos do que 500 (será que o próprio Farrell Till já escreveu um artigo sobre um fato histórico importante que ele testemunhou?).

Em terceiro lugar, mesmo que alguma daquelas cerca de 500 pessoas tivesse escrito aquilo que viram, por que os céticos esperariam que seu testemunho sobrevivesse por 2 mil anos? O NT sobrevive intacto por causa dos milhares de manuscritos copiados por escribas para uma igreja em crescimento durante vários séculos. Obras históricas de grandes historiadores antigos como Josefo, Tácito e Plínio possuem apenas algumas poucas cópias restantes, e essas cópias distam centenas de anos dos originais. Por que os céticos acham que qualquer coisa poderia ter sido escrita — muito mais que tenha sobrevivido — por um grupo antigo de camponeses galileus analfabetos?

Por fim, sabemos o nome de muitos daqueles 500, e seu testemunho está escrito no NT. Dentre eles, estão Mateus, Marcos, Lucas, João, Pedra, Paulo e Tiago — além de outras nove que são citados em outras lugares como apóstolos (Mt 10 e At 1).

Desse modo, não devemos esperar mais testemunho do que aquilo que temos sobre Jesus. E isso é mais do que suficiente para estabelecer a historicidade.

CONCLUSÃO

Temos muito mais para investigar no que concerne à historicidade do NT.

Mas podemos tirar duas grandes conclusões neste momento:

  1. Temos uma cópia precisa dos documentos originais do NT:

a) Embora os documentos originais do NT não tenham sobrevivido ou ainda não tenham sido encontrados, temos muitas cópias precisas dos documentos originais — muito mais do que as dez melhores peças da literatura antiga combinadas. Além do mais, uma reconstrução praticamente perfeita dos originais pode ser realizada ao comparar-se os milhares de cópias manuscritas que sobreviveram. Descobrimos fragmentos manuscritos do século 11 e alguns talvez tão antigos quanto o material da segunda metade do século I. Não existem obras do mundo antigo que sequer cheguem perto do NT em termos de apoio de manuscritos.

b) A reconstrução também é autenticada por milhares de citações feitas pelos pais da igreja primitiva. De fato, todo o NT, com exceção de poucos versículos, pode ser reconstruído simplesmente das citações que eles fizeram.

  1. Os documentos do NT são antigos e contêm uma fonte ainda mais antiga:

a) Uma vez que os documentos do NT são citados por outras autores por volta do ano 100 d.C., é necessário que tenham sido escritos antes deles.

b)Uma vez que os documentos do NT falam como se o templo e a cidade ainda estivessem em pé na época em que foram escritos — e não há menção do ataque da guerra judaica ou da destruição do templo de Jerusalém -, a maioria dos documentos do NT é provavelmente anterior ao ano 70 d.C.

c) Temos fortíssimas evidências de que o livro de Atos foi escrito por volta do ano 62 d.C., o que significa que o evangelho de Lucas é ainda mais antigo.

d) Temos fontes que chegam até os anos 30 d.C. Praticamente todos os estudiosos concordam que o testemunho da morte, do sepultamento e da ressurreição encontrado em 1 Coríntios 15 vem do tempo desses acontecimentos ou de poucos anos depois deles. Além do mais, existem pelo menos outros 40 credos no NT que parecem possuir uma origem bastante antiga.

Portanto, os documentos são antigos, e as fontes são ainda mais antigas. Mas isso não é suficiente para provar historicidade acima do que se considera dúvida justificável. Para provar historicidade, precisamos ter certeza de que esses documentos realmente contêm o testemunho das testemunhas oculares. Será que eles contêm?

quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

David Flusser, Geza Vermes, e o Messiah

Todos os quatro evangelhos se referem, sempre e sempre, a Jesus como o “Cristo”, que é a tradução grega da palavra “Messiah” (Ungido) em Hebraico. Cada vez mais estranho à mente judaica é o fato de todos os autores se referirem a Jesus como o “Filho de Deus”. Juntando estes dois títulos, o evangelista Marcos inicia sua narrativa: “Princípio do Evangelho de Jesus Cristo, Filho de Deus” (Marcos 1:1). Conforme lemos em Mateus 16:16, o apóstolo Pedro fez o mesmo, quando respondeu a Jesus: ”Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”.

Estas declarações nas narrativas dos evangelhos (bem como nos ensinos de Paulo e de outros escritores sagrados) suscitam uma questão importante ao item da historicidade de Jesus: se os autores dos evangelhos escreveram erroneamente dizendo que Jesus é o Messias, o Filho de Deus e até mesmo o próprio Deus, como podem ser confiáveis para nos dar uma exata descrição do Jesus histórico? Desse modo, devemos discutir se os autores dos evangelhos estiveram ou não errados, quando atribuíram messianismo e divindade a Jesus.

A ideia de que os autores judeus pudessem atribuir divindade a outro ser humano tem gerado muita crítica às narrativas dos evangelhos.

Ian Wilson, em seu livro “Jesus, The Evidence”, tem um capítulo intitulado “How He Became God”, no qual Wilson declara que “nenhum dos evangelhos declara Jesus como Deus e que nem mesmo Paulo fez isto”. Segundo Wilson, a deificação de Jesus foi especialmente um produto do século IV, não a crença dos cristãos primitivos.

Neste capítulo, é necessário, portanto, solucionar os detalhes históricos relacionados aos declarados messianismo e divindade de Jesus. O próprio Jesus achava que era o Filho de Deus? O que Ele queria dizer pelos termos “Filho de Deus” e “Filho do Homem”? O que as pessoas achavam que Ele queria dizer? Antes de responder estas perguntas, devemos entender com o que as pessoas esperavam que o Messias parecesse.

Expectações Messiânicas

Durante uns cem anos, começando em 64 a.C., o povo judeu gozou de independência. O Professor Jim Fleming, refletindo sobre a perda final da soberania judaica nacional, declara:

“Embora esse período tenha terminado abruptamente, com a campanha dos romanos e do General Pompeu (63 a.C.), a esperança de sua restauração jamais desapareceu totalmente. Jesus nasceu num tempo em que o povo antecipava a vinda do Messias (Cantares 2:17) para o libertar do jugo romano.Uma das melhores análises das expectativas messiânicas do Século I foi feita por Geza Vermes. Ele observa que, naquele tempo, havia tanto uma crença popular difundida de como seria o Messias como uma porção de opiniões secundárias fragmentadas: ‘Talvez fosse mais apropriado ter em mente a diferença entre as expectações generalizadas do judaísmo palestino e as peculiares expectações messiânicas características de certas minorias eruditas e/ou esotéricas’.”Para determinar qual o tipo de Messias que as massas judaicas em geral esperavam, Geza Vermes aconselha: “Uma resposta confiável deve ser encontrada na menos acadêmica, porém, ao mesmo tempo, mais normativa forma de oração. Assim, uma das melhores fontes sobreviventes com relação à expectação messiânica durante aquele tempo, está nos Salmos de Salomão, provavelmente escritos logo após a conquista da Judeia (63 a.C.). Estes refletem a visão comum de um Messias reinando com justiça, o Qual iria restabelecer militarmente a soberania de Israel, restaurando um justo governo sobre a nação:‘Contempla, Senhor, e levanta no meio deles o seu Rei, o Filho de Davi... E o cinge de força para que Ele dissipe os governantes injustos... Com sua vara de ferro ele quebrará em pedaços toda a sua substância; Ele destruirá as nações com a palavra de sua boca... Ele juntará todo o povo santo... Terá as nações pagãs sob o Seu jugo... E não haverá injustiça em Seus dias no meio delas, pois todas se tornarão santas e o seu rei, o ungido (do) Senhor“.O Salmo 18 de Salomão fala sobre o Ungido de Deus, o Qual vai usar a Sua “vara de ferro” para instilar o “temor do Senhor” em cada homem, conduzindo todos eles “às obras de justiça”.

Fleming Observa:

“Um livrete popular aceito em uma ou duas gerações, antes de Jesus, reflete os pensamentos dos muitos que correram para Jesus, ao longo da planície de Genesaré... ‘Um rei santo virá reinar sobre o mundo - e depois sua ira cairá sobre o povo do Lácio e Roma será arrasada até o chão... Ó, pobre e desolado que eu sou! Quando chegará o dia do julgamento do Deus eterno, do grande Rei?’”Os zelotes ou sicários encontraram nesta expectação comumente mantida, um solo fértil para o cultivo de sua causa militar. Outros, como os fariseus, contentavam-se em esperar por alguém que se adaptasse mais claramente aos moldes do Rei Davi. “Filho de Davi” era o termo popular tomado do Velho Testamento, para o esperado Messias. A descrição que Filo fez do Messias esperado provavelmente expressa melhor o poderio militar do futuro rei. Em seu livro “Rewards and Punishment”, ele interpreta a profecia de Balaão, em Números 24:7, da seguinte maneira: “Pois há de vir um homem, ‘diz o oráculo’, o qual, liderando suas hostes para a guerra, subjugará as nações grandes e populosas; porque Deus enviou em seu auxilio o reforço que beneficiará o piedoso e que terá intrépida coragem de alma e a totalmente poderosa força do corpo, ambas provocando temor em seus inimigos, quando unidos, sendo quase irresistíveis”.

Vermes termina:

“A antiga oração judaica e a interpretação da Bíblia demonstram inequivocamente, que, se na era intertestamentária, um homem afirmasse ser ou fosse proclamado como “o Messias”, os seus ouvintes, obviamente, teriam assumido que ele estaria ligado ao Redentor davídico e teriam esperado encontrar nele uma pessoa dotada dos combinados talentos de poderio militar, justiça e santidade.Desse modo, é compreensível que, em vista da ocupação romana da terra de Israel, a maioria do povo judeu não visse em Jesus o que esperava ver no Messias”.

Millar Burrows, de Yale, escreveu: “Jesus era tão diferente do que os judeus esperavam que fosse o “Filho de Davi” que até mesmo os Seus discípulos achavam difícil conectar a ideia do Messias entre eles”.

Finalmente, conforme o erudito judeu Samuel Sandmel coloca:

“Qualquer afirmação feita durante o tempo de vida de Jesus, de que Ele era o Messias que os judeus esperavam, seria recebida como puramente em favor de sua crucificação e do colapso de qualquer aspecto político do seu movimento, pela triste constatação de que a Palestina ainda não havia sido libertada do domínio romano”.O conceito popular do Messias reinando como o libertador militar era, então, um empecilho para a maioria da população judaica considerar Jesus como o Messias. A questão é: este conceito popular era correto?É claro que nem todo o povo judeu do tempo de Jesus mantinha a opinião majoritária.

Geza Vermes observa:

“Além do conceito real, a especulação messiânica incluía noções de um Messias sacerdote e profeta e, em alguns casos, de uma figura messiânica, a qual iria combinar todas as funções em uma”.O Testamento de Levi, por exemplo, dizia:“Então, o Senhor levantará um sumo sacerdote... E ele executará um julgamento justo sobre a terra... E sua estrela brilhará no céu como a de um rei... E haverá paz em toda a terra. E o conhecimento do Senhor será derramado... como as águas cobrem os mares... E o espírito de compreensão e santificação repousará sobre ele”.A comunidade de Qumram parece ter esperado três figuras messiânicas. Um dos seus documentos predizia: “Até que venha o profeta e o Messias de Aarão e Israel. O 2 Baruque 30:1 fala do Messias “voltando em glória”, da terra, presumivelmente para o céu. Esdras 14:9 fala do Messias (“Meu Filho”) habitando aparentemente no céu. O 4 Esdras 7:29 fala da morte do Messias, como o fazem outras referências, algumas delas talvez do ano 135 d.C. e, portanto, aludindo à morte de Simon Bar Koch, que o Rabino Akina afirmava ser o Messias.O ponto importante é que nem todo mundo mantinha o conceito popular de como seria o Messias e com o que uma porção de judeus, especialmente os religiosos, achava que o carisma de Jesus combinava, a fim de preencher a descrição do Messias. O fato de que eles também esperavam que o Messias libertasse Israel da opressão romana tornou mais complicada a missão de Jesus. Fleming explica:“As multidões ao longo do “nosso lago” (Mar da Galileia) pressionavam Jesus tão constantemente, que Ele tinha dificuldade para ensinar as pessoas. Sua reputação, como o rabino que curava, precedia o Seu desejo de se tornar conhecido como um Mestre. Quando Jesus está em “nosso lago”, Ele sempre fala às pessoas que Ele cura, dizendo que guardem segredo para que as multidões não se apinhem em busca de sinais e maravilhas. Muitos judeus associavam os dons de cura de Jesus com os do Messias, o Qual poderia governar, depois de Sua revolta contra Roma. Provavelmente, muitos na multidão, estariam curiosos para ver qual a posição que Ele iria assumir com respeito à opressão romana”.Se Jesus desejava ou não, antes de tudo, ser conhecido como Mestre precisa ser questionado. O que está claro é que o conceito popular sobre o Messias não combinava com o conceito de Jesus sobre o Messias.Junto com outro fator, fica absolutamente clara a razão pela qual Jesus não saía por ali, anunciando publicamente: “Eu sou o Messias. Sigam-me!” O grande problema eram os romanos. Eles estavam perfeitamente cônscios das expectações messiânicas do povo. Tácito (escrevendo no Século II d.C.) registra: “Havia uma firme persuasão... de que neste exato tempo o Oriente iria se tornar poderoso e os governantes vindos da Judeia iriam conseguir um império universal”. Pelo mesmo tempo, dissertando sobre a década seguinte à destruição do Templo, no ano 70 d.C., Suetônio escreveu: “Havia se espalhado em todo o Oriente a crença antiga e estabelecida do que iria acontecer naquele tempo, quando homens viriam da Judeia para governar o mundo”.É claro que os romanos estavam preparados para abafar qualquer insurreição messiânica. Não é de admirar, portanto, que Jesus não andasse por ali, alardeando: “Eu sou o Messias”. Como veremos, Ele também tinha maneiras mais efetivas para fazer este anúncio.Os evangelhos revelam, constantemente, as expectações messiânicas do povo. Desde o início da vida terrena, quando Simeão identificou Jesus como sendo o Messias, há muito tempo esperado, até o final de Sua vida, quando muitos O honraram como o Messias, na entrada triunfal de Jerusalém, as narrativas relatam exatamente estas expectações.As expectações messiânicas do povo judeu provêem uma das razões mais fortes para se confiar na exatidão das narrativas do evangelho, as quais descrevem as atividades de Jesus. Geralmente, os cépticos afirmam que a vida de Jesus, conforme é descrita nos evangelhos, é sobrenatural demais para ser acreditada. Contudo, o que é sempre esquecido é que esta foi a grande razão pela qual alguns dos Seus discípulos morreram na cruz. Certamente, Jesus preencheu as exigências messiânicas dos Seus discípulos. Algo teria de acontecer, algo não menos poderoso do que as narrativas dos evangelhos iriam registrar, a fim de motivar homens e mulheres judeus a arriscarem suas vidas, a fim de propagarem esta mensagem, a qual era tão tremendamente oposta à prevalecente opinião messiânica daquele tempo.

Jesus achava que era o Messias?

“De fato, visto como a figura do Messias não parece ter sido o ensino central do ensino de Jesus, e que nenhum registro sobreviveu de qualquer desafio hostil referente ao status messiânico, antes dos Seus últimos dias em Jerusalém, e que, além de tudo, Ele deliberadamente manteve Sua aprovação à confissão de Pedro, em geral Jesus deixou de declarar que era o Cristo. Por isso, existe toda razão para se duvidar se, realmente, Ele achava que era o Messias”.

Nesta declaração, Geza Vermes levanta as quatro objeções seguintes à proposição de que Jesus acreditava ser o Messias:

1. - Que a figura do Messias não era central no ensino de Jesus.

2. - Que não existe registro algum de qualquer desafio hostil, antes dos Seus últimos dias em Jerusalém.

3. - Que Jesus, deliberadamente, recusou (vide item 3 abaixo) Sua aprovação à confissão de Pedro de que Ele era o Cristo.

4. - Que, geralmente, Jesus deixou de se declarar como o Cristo.Avaliemos cada ponto, separadamente:

Objeção 1 - A figura do Messias não era central no ensino de Jesus.

Coloque-se você mesmo no lugar de Jesus. Se você fosse o Messias teria focalizado todo o Seu ensino sobre a correta contextualização do Messias? Considere estes pontos:

a) Seu ministério consiste em viajar e sabe que o tempo todo em que usa a palavra “Messias”, todos irão interpretar erroneamente o que você está falando. Esta é uma palavra perigosa!

b) A partir do seu ponto de vantagem (como o Messias), você sabe que o conceito popular sobre isto não é apenas algo desagradável e que a sua interpretação do Reino de Deus se tornou distorcida. Uma simples leitura do que está grifado em vermelho, no Evangelho de Mateus, vai esclarecer como Jesus devia também ensinar as pessoas como estas deviam ter uma visão correta do Messias.

c) As ações falam mais alto do que as palavras. Se você fosse de fato o Messias, não seria mais efetivo demonstrá-lo, em vez de apenas ensinar sobre isto?d) Jesus esclareceu, de maneira indireta, porém mais efetiva, a verdadeira significação e propósito do papel do Messias, através do que Ele disse. Olhando, novamente, apenas no Evangelho de Mateus, Jesus mostrou que...O Messias devia cumprir toda a justiça (Mateus 3:15).O Messias é o revelador do Reino dos Céus (Mateus 4:17).O Messias transforma homens comuns em pescadores de homens (verso 19).O Messias ensina com suprema autoridade, conforme os capítulos 5-7 de Mateus.O Messias veio cumprir toda a Lei e os Profetas (Mateus 5:17).

Poderíamos prosseguir, mas isto é suficiente. Tudo que Jesus falou apontava para a visão correta do Reino de Deus sendo estabelecido por Ele mesmo, como o Messias. Porém, mais diretamente, Ele tentou esclarecer através do Seu ensino a identidade do Messias.

Todos os três evangelhos sinópticos registram Sua pergunta feita a um grupo de rabinos e Sua consequente explicação: “Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Eles disseram-lhe: De Davi. Disse-lhes ele: Como é então que Davi, em espírito, lhe chama Senhor, dizendo: Disse o Senhor ao meu Senhor: Assenta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos por escabelo de teus pés? Se Davi, pois, lhe chama Senhor, como é seu filho? E ninguém podia responder-lhe uma palavra; nem desde aquele dia ousou mais alguém interrogá-lo” (Mateus 22:42-46).

Jesus estava conduzindo o assunto a um ponto além da compreensão dos fariseus. O Messias poderia, certamente, ser o Senhor de Davi, desde toda a eternidade? A resposta é “sem comentários”...

Em meio ao Seu ensino, Ele declarou: “A ninguém chameis Mestre”. Mais tarde, Ele ensinou aos Seus discípulos como estes deveriam reconhecer os falsos messias e também identificar o Filho do Homem, Seu tema favorito de auto-referência como o Messias. A clara indicação de Suas palavras era que o Messias é mais importante do que uma simples figura terrena. Em João 7:25-26, Jesus busca esclarecer a natureza do Messias; desta vez, quando os soldados foram buscá-Lo para prendê-Lo.

Em João 17, na Oração Intercessória, Ele faz declarações surpreendentes, referindo-se, claramente a Si mesmo:

1. - Que Deus Lhe deu autoridade sobre toda a carne (João 17:2).

2. - Que Ele é o doador da vida eterna (verso 3).

3. - Que a vida eterna consiste em reconhecer o Pai como único Deus verdadeiro e a Jesus Cristo por Ele enviado. (verso 3).

4. - Que Jesus estava na glória com o Pai, desde toda a eternidade (verso 5).

5. - Que Jesus saiu do Pai, e é UM com o Pai (verso 8).

6. - Que Jesus voltará para o Pai (verso 13).

7. - Que Deus o Pai está em Jesus.

Tendo em vista estas afirmações, o Messias puramente humano da crença popular seria, simplesmente, uma figura insignificante.

Desse modo, quando Geza Vermes afirma que Jesus não fez do Messias o Seu ensino central, devemos discordar. Ele não fez do Messias uma figura humana em Seu ensino central; porém, à medida em que vemos os procedimentos abaixo, Ele torna Sua identidade superior à de um Messias simplesmente humano.

Objeção 2 - não existe registro algum de qualquer desafio hostil, antes dos Seus últimos dias em Jerusalém.

Se Jesus evitou, especificamente, usar o termo “Messias”, por causa de sua errônea conotação, tendo em vista a ocupação romana, então por que deveríamos esperar qualquer registro de confrontação sobre o item messiânico? Tendo em vista Suas obras e afirmações, as testemunhas que Lhe eram hostis ficaram cônscias de um assunto muito mais sério - o da blasfêmia contra o Espírito Santo. O resultado demonstra que as confrontações quase sempre focalizavam a autoridade de Jesus para ensinar e fazer o que Ele dizia e fazia.

Objeção 3 - (Jesus), deliberadamente, recusou Sua aprovação à confissão de Pedro de que Ele era o Cristo.

Como alguém poderia afirmar que Jesus não aprovou a confissão de Pedro - “Tu és o Cristo” - é inacreditável! Mateus, uma testemunha ocular, registra que Jesus elogiou Pedro em, pelo menos, quatro maneiras específicas:

1. - Ele declarou que Pedro era bem-aventurado por reconhecer nEle o Messias. Será que Jesus [N.T.: a própria verdade] teria chamado Pedro de bem-aventurado, se Pedro tivesse feito uma confissão falsa?

2. - O desafio de todo o ministério de Jesus entre o povo judeu foi o de ajudar a abrir-lhe os olhos sobre um reino terreno, no qual Ele reinaria supremo sobre os gentios; e sobre o reino espiritual, cumprindo a promessa que Deus fizera a Abraão em Gênesis 12:3: “E abençoarei os que te abençoarem, e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; e em ti serão benditas todas as famílias da terra”. [N.T. - Ai dos povos que se voltam contra Israel.]

3.- Quando Pedro reconhece Jesus como o Messias, mesmo sem qualquer conotação militar, Jesus o elogiou, dizendo: “Bem-aventurado és tu, Simão Barjonas, porque to não revelou a carne e o sangue, mas meu Pai, que está nos céus”. (Mateus 16:17). (Observem a expressão “Meu Pai”. E não “Nosso Pai”, conforme os judeus costumavam se dirigir a Deus.)

4. - Logo em seguida, Jesus declara entregar a Pedro as “chaves do reino” - outro elogio enorme! Isto porque Pedro havia defendido os interesses divinos.Mas, o leitor acha que Jesus não seria capaz de recriminar Pedro, se ele tivesse feito uma declaração falsa? Então vamos ler abaixo, o que Ele disse a Pedro, quando este O tentou a abandonar a missão para a qual o Pai O havia enviado:“Para trás de mim, Satanás, que me serves de escândalo; porque não compreendes as coisas que são de Deus, mas só as que são dos homens”.

Objeção 4 - Geralmente, Jesus deixou de se declarar como o Cristo

As narrativas sobre a vida terrena de Jesus negam totalmente esta objeção. Já declaramos as razões importantes pelas quais Jesus, em geral, evitava declarar que era o Messias e também admoestava os discípulos a não revelarem, a pessoa alguma que Ele era o Cristo (Mateus 16:20). Isto é bem diferente de não se declarar como o Messias. De maneiras sempre muito mais sutis e poderosas, Jesus declarava ser o Messias, conforme constatamos em cada página dos evangelhos.Até mesmo na idade de 12 anos, Ele se referiu a Deus como “Meu Pai”, tendo continuado a usar este termo até os Seus dias finais, pelo menos 40 vezes. O Dr. Robert Lindsay explica a significação deste termo:

“As orações nas sinagogas contêm a expressão “Nosso Pai" (Avinu) que está no céu e muitas vezes Jesus ensinou os Seus discípulos a fazerem a oração que assim principia [N. T. - Por exemplo, a Oração do Senhor]. Mas “Meu Pai” (avi) era imprópria aos judeus, nesse período. Somente uma vez na Escritura Hebraica Deus é chamado “Meu Pai”, no Salmo 89:26, que fala da vinda do Messias. O Messias tem o direito exclusivo de chamar Deus de “Meu Pai”, mas o povo só poderia usar “Nosso Pai”.

A 2 Samuel 7:14-b contém uma profecia sobre o Messias: ‘Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho; e, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos de homens.’” Este verso trata do Messias vindouro, o Filho de Deus.

Conhecida através do Salmo 89-26, 2 Samuel 7:14 e do Salmo 2:7: ‘Proclamarei o decreto: o SENHOR me disse: Tu és meu Filho, eu hoje te gerei’ era a maneira pela qual se expressava a esperança do Messianismo. E foi esta a maneira pela qual Jesus falou, conforme o Espírito Santo.

Jesus também se declarava como o Messias, pelas coisas que fazia. Quando João Batista estava preso por ordem de Herodes, João mandou os seus discípulos para saber se Jesus era de fato Aquele que os judeus estavam esperando. A resposta de Jesus foi clara: ‘Ide, e anunciai a João o que tendes visto e ouvido: que os cegos vêem, os coxos andam, os leprosos são purificados, os surdos ouvem, os mortos ressuscitam e aos pobres anuncia-se o evangelho. E bem-aventurado é aquele que em mim se não escandalizar’. (Lucas 7:22-23).

Estas palavras Ele retirou de dois versos de Isaías 35:5 e 61:1: “Então os olhos dos cegos serão abertos, e os ouvidos dos surdos se abrirão”.

“O ESPÍRITO do Senhor DEUS está sobre mim; porque o SENHOR me ungiu, para pregar boas novas aos mansos; enviou-me a restaurar os contritos de coração, a proclamar liberdade aos cativos, e a abertura de prisão aos presos” .

Obviamente, João Batista entendeu perfeitamente o que Jesus havia respondido, como sendo: “Sim, eu sou o Messias” e também: “Aqui estou para provar-te, que ninguém mais pode fazer esta afirmação, que é verdadeira”. Então cada vez que Jesus curava alguém ou operava um milagre comprovado, Ele estava afirmando ser o Messias.

Já mencionamos antes como Jesus declarou ser o Messias em Sua entrada triunfal em Jerusalém. Um verso no Talmude babilônico - Menaroth 78-b - mostra o Rabino Yoanan explicando que, “fora do muro” de Jerusalém significa “não muito longe de Betfagé”. Quando Jesus montou numa cria de jumenta em Betfagé, indo para Jerusalém, Ele estava declarando, definitivamente, que sabia ser o Messias. Ali, Ele pretendia, claramente cumprir Zacarias 9:9: “Alegra-te muito, ó filha de Sião; exulta, ó filha de Jerusalém; eis que o teu rei virá a ti, justo e salvo, pobre, e montado sobre um jumento, e sobre um jumentinho, filho de jumenta”.

O povo entendeu claramente a intenção de Jesus. Fleming declara: “A palmeira havia se tornado um símbolo do nacionalismo judaico. Mas, naquele Domingo de Ramos, a população pobre de Jerusalém estava sentindo o peso do exército romano sobre ela. Havia uma compreensão popular, no tempo de Jesus, de que o Messias ia chegar na época da Páscoa. (Vocês se lembram da narrativa de Jesus alimentando 5.000 pessoas, quando o povo quis proclamá-Lo Rei, porque era Páscoa?). O papel do Messias na esperança popular é que Ele iria libertar o povo da opressão... como o havia feito no Êxodo do Egito. Ao levar folhas de palmeira, o povo estava querendo dizer: ‘Jesus, estamos contigo...Vê que tens muito a fazer contra o domínio romano em Jerusalém!’”

Foram cinco os incidentes registrados nas narrativas dos evangelhos, citados por Geza Vermes como sendo muitíssimos importantes, devendo ser usados para demonstrar como Jesus declarou ser o Messias. O primeiro (aliás, o único) que Geza Vermes aceita como autenticamente de Jesus é a ocasião da pergunta referente a Davi e ao seu filho como “Senhor”. Este ele descreve simplesmente como os fariseus costumavam usar métodos incorretos para interpretar as Escrituras, não que houvesse concordado que o “filho de Davi” era uma espécie de Senhor super-humano. Contudo, Jesus está mais definidamente expressando a natureza do Messias, quando inicia a conversa indagando: “Que pensais vós do Cristo? De quem é filho? Eles disseram-lhe: De Davi”. É como se Ele lhes tivesse dito: “Vocês ainda estão esperando por ele, mas se Davi o chama Senhor, então o Messias deve ter existido antes do início da história humana”. Ele diz: “Eu vim de Ti (Deus)”.

As outras quatro passagens são descartadas por Geza Vermes, como não autênticas, sem razão alguma, exceto que ele não crê que Jesus tenha dito o que os autores dos evangelhos escreveram. Este é o recurso favorito da alta crítica, quando as evidências são contra suas crenças. Estas passagens são: 1. - Jesus anunciando Sua Segunda Vinda; 2. - Jesus prometendo recompensa a quem der um copo dágua em Seu nome; 3 e 4.- Jesus ensinando aos dois discípulos no caminho de Emaús sobre a vinda do Messias, Sua morte e ressurreição, conforme predito nas Escrituras. Pelo menos, Geza Vermes deveria ter descartado as duas últimas, como não constantes da vida terrena de JESUS. Mas todas as quatro referências, vistas no contexto, são declarações definitivas de Jesus de que Ele se considerava o Messias.

Em João 4, Jesus falou à mulher samaritana, fora de Sicar. [N.T.: Leiam a passagem]. Aqui vemos que não existe qualquer razão para se afirmar que Jesus não sabia que era o Messias.
Outra declaração de Jesus, afirmando ser o Messias é vista em Seu julgamento diante do sumo sacerdote Caifás, quando este Lhe perguntou: “És tu o Cristo, Filho do Deus Bendito? E Jesus disse-lhe: Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu”.Aqui “Filho do Homem” é como Jesus costumava se referir a Ele mesmo, conforme Daniel havia profetizado, após ter recebido suas visões...Que Jesus afirmava ser o Messias é confirmado pelo registro que Pilatos deve ter enviado ao Sinédrio. Norman Anderson explica:

“A crucificação fornece uma prova convincente sobre a qual tantos eruditos do Novo Testamento têm se dividido e sobre a qual uma referência anterior já foi feita, ou seja, Jesus acreditava ser o Messias? A verdade é que Ele não fez muitas afirmações, explicitamente, em sua pregação - parcialmente, sem dúvida, por razões políticas, mas amplamente por causa das expectações que estas poderiam gerar entre os ouvintes.Mas [Sua pregação] era, claramente, uma ameaça em potencial a Roma, tanto que Pilatos e seus servidores O entregaram à morte amplamente reservada aos assaltantes armados e aos políticos dissidentes. Isto está implícito na inscrição colocada sobre a cruz: “Jesus Nazareno, o Rei dos Judeus” (João 19:19), a qual parecia frisar, no registro dos evangelistas, que parte da conversa entre Pilatos e Jesus fora sobre assunto político. (Mateus 27:11; Marcos 15:2; Lucas 23:3 e João18:33-37). E esta [conclusão], por sua vez, deve ter sido obtida pelo fato de que foi por “blasfêmia” que o Sinédrio o condenou, quando ‘O sumo sacerdote lhe tornou a perguntar, e disse-lhe: És tu o Cristo, Filho do Deus Bendito? E Jesus disse-lhe: Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu. E o sumo sacerdote, rasgando as suas vestes, disse: Para que necessitamos de mais testemunhas? Vós ouvistes a blasfêmia; que vos parece? E todos o consideraram culpado de morte’. Esta foi uma resposta que levou o Sinédrio à conclusão de que Jesus era um agitador político”.Embora uma porção de eruditos, no passado, tenha tentado negar que Jesus achava que Ele era o Messias, outros hoje apoiam Sua conscientização disto. Um deles é Samuel Sandmel, reconhecido como uma autoridade em Novo Testamento e Cristianismo Primitivo, no Judaísmo americano. Ele foi professor em Yale, depois no Hebrew Union College, em Cincinnatti, até sua morte, em 1979. Sandmel concluiu: “Eu creio que Ele acreditava que era o Messias e os eruditos que o negam estão errados”.

David Flusser, professor de Religião Comparada na Universidade Hebraica em Jerusalém, vê, como outros eruditos judeus vêem, algumas passagens nos textos dos evangelhos como não autênticas. Contudo, ele apoia que “outras afirmações aparentemente autênticas de Jesus devem ser entendidas apenas se Ele tivesse assumido ser o Filho do Homem. Para Flusser, o conceito de Jesus de ‘Filho do Homem’ era tanto messiânico como divino”.

E já que estamos tratando deste assunto, façamos uma pausa para considerar a significação do termo “Filho do Homem”.

Filho do Homem Quem é Ele?

Pela expressão “Filho do Homem”, temos um simples, mas profundo conceito, que se tornou terrivelmente confuso entre os modernos eruditos. Geza Vermes escreve:

“A erudição contemporânea do Novo Testamento tem feito um esforço enorme, gastando erudição e tinta, para, finalmente, sem quase resultado algum, ter concordado que ‘Filho do Homem’ é um título vitalmente importante”. Mas, o próprio Geza Vermes chega ao ponto de confundir mais o assunto, afirmando que o termo não contém um ‘uso titular’, conforme usada por Jesus...“Vamos propor uma simples definição, para ver se o termo combina com o uso dos termos bíblicos usados. Na mais ínfima conotação do termo, ‘filho do homem” é alguém nascido ... da raça humana. No VT ele é usado quase sempre nesta maneira. Por exemplo, no salmo 144:3, lemos: ...Geralmente o termo acontece em paralelismo conforme vemos neste verso, isto é, ‘filho do homem” no VT, sempre se referindo a alguém nascido na humanidade ou a um representante da humanidade. Muito raramente ele se refere a um específico indivíduo. De suas 106 ocorrências, 91 aparecem em Ezequiel e uma em Daniel.” Que em apenas uma de suas ocorrências ela seja usada para descrever alguém de proporções aparentemente superiores às humanas, é verdade. O texto é Daniel 7:13, citado acima. Este ser foi citado como semelhante a um filho do homem, tendo forma de homem. Daniel conta: “Eu estava olhando nas minhas visões da noite, e eis que vinha nas nuvens do céu um como o filho do homem; e dirigiu-se ao ancião de dias, e o fizeram chegar até ele... Mas os santos do Altíssimo receberão o reino, e o possuirão para todo o sempre, e de eternidade em eternidade.... Até que veio o ancião de dias, e fez justiça aos santos do Altíssimo; e chegou o tempo em que os santos possuíram o reino... e o reino, e o domínio, e a majestade dos reinos debaixo de todo o céu serão dados ao povo dos santos do Altíssimo; o seu reino será um reino eterno, e todos os domínios o servirão, e lhe obedecerão. (Daniel 7:7, 13,22,27).Estes santos, obviamente, serão os Seus súditos. Não é de admirar que este título fosse comumente aceito como o do Messias vindouro. Das mais de 80 referências ao Filho do Homem encontradas no Novo Testamento, todas, exceto uma, se referem a Jesus. E apenas três delas são encontradas fora dos evangelhos. Hebreus 2:6 cita o Salmo 8:4, referindo-se a alguém nascido na humanidade. Todas as outras se referem a Jesus, de algum modo. Algumas O mostram apenas em Sua humanidade, tais como “não tem onde reclinar a cabeça” (Mateus 8:20; Lucas 9:58), comendo e bebendo com os coletores de impostos e os pecadores (Mateus 11:19; Lucas 7:34), passagens nas quais o Filho do Homem é identificado com a Sua humanidade. Mas, na maioria dos textos dos evangelhos, Filho do Homem é identificado como tendo mais do que meras dimensões humanas. Ele tem autoridade para perdoar pecados; é chamado o Senhor do sábado; prediz Sua ressurreição; tem autoridade para executar julgamento, oferece alimento imperecível e deve ser glorificado.Contudo, a observação mais notável é que pelo menos 27 referências ao Filho do Homem aludem, de algum modo, a Daniel 7:13-14. As tentativas da alta crítica no sentido de descartar estas passagens são quase cômicas. Para Jesus e Seus discípulos, Filho do Homem foi a completa figura humana de alguém que assumiu a dimensão messiânica e as expectações messiânicas dos Seus dias.

Jesus era o Messias?

No Velho Testamento, existem centenas de alusões e profecias referentes ao Messias vindouro. O brilhante erudito do século 19, Prof. Henry Lindsay, encontrou 32 predições distintas, as quais foram literalmente cumpridas em Jesus.

Por exemplo, Daniel 9:25-26 indica que o Messias viria antes do segundo templo ser destruído (70 d.C.). Miquéias 5:2 fala sobre o lugar de nascimento como sendo Belém, Efrata, a cidade onde Jesus nasceu. Isaías 35:5-6 fala dos paralíticos e mudos sendo curados. Zacarias 9:9 prediz a entrada do Messias em Jerusalém, montado numa cria de jumento. O Salmo 22 provê a descrição gráfica de alguém sofrendo por crucifixão (embora o salmista não conhecesse este tipo de morte) e Jesus citou este verso, quando estava na cruz. Zacarias 12:9-10 menciona uma passagem onde se entendem as duas vindas distintas do Messias: “Mas sobre a casa de Davi, e sobre os habitantes de Jerusalém, derramarei o Espírito de graça e de súplicas; e olharão para mim, a quem traspassaram; e pranteá-lo-ão sobre ele, como quem pranteia pelo filho unigênito; e chorarão amargamente por ele, como se chora amargamente pelo primogênito”.

Existem centenas de outras profecias no VT que ainda não se cumpriram em Jesus. Uma destas foi que o Messias deveria sofrer e morrer e, mais tarde, reinar num reino eterno, o que deixa entendido que o Messias teria de morrer, ressuscitar dos mortos, voltar ao céu e vir, novamente...

Os cristãos e os críticos, hoje em dia, tanto focalizam a ressurreição de Jesus que esqueceram a outra parte da pregação dos apóstolos. Pedro pregou no Templo: “.... Mas, alcançando socorro de Deus, ainda até ao dia de hoje permaneço dando testemunho tanto a pequenos como a grandes, não dizendo nada mais do que o que os profetas e Moisés disseram que devia acontecer, isto é, que o Cristo devia padecer, e sendo o primeiro da ressurreição dentre os mortos, devia anunciar a luz a este povo e aos gentios” (Atos 26:22-23).

Os apóstolos não estavam pregando novidade alguma. O próprio Jesus havia sempre declarado que iria a Jerusalém para ali sofrer, morrer e ressuscitar. Mas, onde no Velho Testamento isto foi profetizado? Em Isaías 53:1-15:
“QUEM deu crédito à nossa pregação? E a quem se manifestou o braço do SENHOR? Porque foi subindo como renovo perante ele, e como raiz de uma terra seca; não tinha beleza nem formosura e, olhando nós para ele, não havia boa aparência nele, para que o desejássemos. Era desprezado, e o mais rejeitado entre os homens, homem de dores, e experimentado nos trabalhos; e, como um de quem os homens escondiam o rosto, era desprezado, e não fizemos dele caso algum. Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores levou sobre si; e nós o reputávamos por aflito, ferido de Deus, e oprimido. Mas ele foi ferido por causa das nossas transgressões, e moído por causa das nossas iniqüidades; o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados. Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas; cada um se desviava pelo seu caminho; mas o SENHOR fez cair sobre ele a iniqüidade de nós todos. Ele foi oprimido e afligido, mas não abriu a sua boca; como um cordeiro foi levado ao matadouro, e como a ovelha muda perante os seus tosquiadores, assim ele não abriu a sua boca. Da opressão e do juízo foi tirado; e quem contará o tempo da sua vida? Porquanto foi cortado da terra dos viventes; pela transgressão do meu povo ele foi atingido. E puseram a sua sepultura com os ímpios, e com o rico na sua morte; ainda que nunca cometeu injustiça, nem houve engano na sua boca. Todavia, ao SENHOR agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando a sua alma se puser por expiação do pecado, verá a sua posteridade, prolongará os seus dias; e o bom prazer do SENHOR prosperará na sua mão. Ele verá o fruto do trabalho da sua alma, e ficará satisfeito; com o seu conhecimento o meu servo, o justo, justificará a muitos; porque as iniqüidades deles levará sobre si. Ele o despojo; porquanto derramou a sua alma na morte, e foi contado com os transgressores; mas ele levou sobre si o pecado de muitos, e intercedeu pelos transgressores.”

Durante mais de 1.700 anos, os rabinos interpretaram esta passagem, quase unanimemente, como se referindo ao Messias. Este fato é inteiramente documentado na obra “The Fitfty-Third Chapter of Isaiah According To The Jewish Interpreters”, de S.R. Driver e Adolf Neubauer. Eles citam vários rabinos durante este período, os quais equiparam Isaías 53 com o Messias.
Não antes do século 21 d.C., sem dúvida por causa do sofrimento dos judeus nas mãos dos cruzados, os intérpretes judeus começaram a interpretar Isaías 52:13 e 53:12 como se referindo a toda a nação de Israel. Mesmo depois que o Rabino Rashi (Rabino Salomn Yaschaki) propôs primeiro esta interpretação, muitos outros intérpretes judeus têm mantido, até hoje, a interpretação tradicional do Talmude de que Isaías 53 fala do Messias. Um dos mais respeitados intelectuais judeus de toda a história, Moses Maimonides (1135-1204 d.C.), rejeitou a interpretação de Rashi, ensinando que esta passagem se refere ao Messias.

Rashi e outros intérpretes judeus não estão necessariamente errados, quando sugerem que o servo é a nação de Israel. Isaías 43:10 diz ao povo de Israel: “Vós sois minhas testemunhas, diz o Senhor e o meu servo a quem escolhi. Certamente, portanto, o servo deve ser Israel”.

Que esta interpretação está em erro, logo se vê em Isaías 52:14, onde vemos que é a Jesus que a passagem se refere:“Como pasmaram muitos à vista dele, pois o seu parecer estava tão desfigurado, mais do que o de outro qualquer, e a sua figura mais do que a dos outros filhos dos homens”. Em Isaías 53:8, o servo (Jesus) recebe o castigo que deveria ser recebido pelo “meu povo” (obviamente Israel). Não faz sentido que a nação de Israel seja a substituta de sua própria punição. Desse modo, Israel não pode ser o servo mencionado em Isaías 52:13 e 53:12. Mas, o que dizer sobre Isaías 49:3: “E me disse: Tu és meu servo; és Israel, aquele por quem hei de ser glorificado”? Interessante! Foi bom vocês terem trazido este assunto. A chave para se identificar o servo em Isaías 52:13 e 53:12 é ver quem ele é, nas anteriores “canções do servo” de Isaías 42:1-9; 49:1-12 e 50:4-9. Visto como estas passagens falam do servo, como por exemplo, estabelecendo justiça na Terra, (Isaías 42:4) e resgatando o povo judeu do exílio em todo o mundo (Isaías 49:8-13), os intérpretes judeus têm, tradicionalmente, mantido as canções do servo como falando que o servo (Messias) é o verdadeiro Israel. Nos versos 49:5 e 6, vemos: “E agora diz o SENHOR, que me formou desde o ventre para ser seu servo, para que torne a trazer Jacó; porém Israel não se deixará ajuntar; contudo aos olhos do SENHOR serei glorificado, e o meu Deus será a minha força. Disse mais: Pouco é que sejas o meu servo, para restaurares as tribos de Jacó, e tornares a trazer os preservados de Israel; também te dei para luz dos gentios, para seres a minha salvação até à extremidade da terra”. O caso é que Israel (Jacó) apostatou, especialmente na comissão que Deus lhe deu, conforme Gênesis 28:14: “E a tua descendência será como o pó da terra, e estender-se-á ao ocidente, e ao oriente, e ao norte, e ao sul, e em ti e na tua descendência serão benditas todas as famílias da terra”. Agora, o servo (Messias) devia tomar o lugar de Israel, para realizar duas coisas: 1. Levar a nação de Israel de volta a Deus (Isaías 49:5); 2. ser luz aos gentios, conforme vemos no verso 6: “Pouco é que sejas o meu servo... também te dei para luz dos gentios, para seres a minha salvação até à extremidade da terra”.

Se vocês entenderem o que acontece aqui em Isaías, provavelmente vão verificar, agora mesmo, porque o servo Jesus tanto apelava e citava este profeta. O servo é o Messias. O Messias teria de sofrer e morrer por muitos. Ele também deveria ressuscitar dos mortos (Salmo 16:10). Quando o monumental evento da ressurreição aconteceu e os discípulos foram cheios do Espírito Santo, no Dia de Pentecoste, eles saíram pregando esta mensagem em toda parte: “O Messias morreu pelos nossos pecados, conforme as Escrituras; Ele foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, conforme as Escrituras”. A julgar pela literatura cristã mais antiga, a 1 Tessalonicenses, eles também pregavam que o Messias iria vir novamente.

Filho de Deus

Geralmente, os cristãos logo interpretam este termo significando divindade. Mas existe uma porção de ocorrências da expressão “Filho de Deus” nos evangelhos e no resto da Bíblia, onde este termo, provável e definitivamente, não significa “divindade” a quem usa ou então escuta o mesmo. Colin Brown declara, pela evidência dos evangelhos, que “Filho de Deus” apenas sugere uma série de conotações não necessariamente divinas. É simplificar demais afirmar que o título “Filho de Deus” expressa a divindade de Jesus e “Filho do Homem”, Sua humanidade.

De fato, devemos ir mais longe e dizer que quase ninguém no mundo judaico do tempo de Jesus escutou ou usou o termo ‘Filho de Deus’ no sentido de divindade. Após pesquisar o VT e a literatura intertestamentária, Geza Vermes concluiu o que achamos bem exato: “De todos os modos, parece que os palestinos do primeiro século d.C. quando escutavam a expressão ‘filho de Deus’ iriam pensar: primeiro, que se tratasse de seres angelicais ou celestes, e segundo, quando a conexão humana fosse esclarecida, de um homem santo”.

Até mesmo nas narrativas dos evangelhos, a conclusão de Geza Vermes é bem exata. Lucas chama Adão “o filho de Deus”, mas ninguém iria achar que Adão fosse divino. [N.T. - Exceto os Mórmons, claro]. Quando o centurião, ao pé da cruz, exclamou: ”Verdadeiramente, este era o Filho de Deus” (Mateus 27:54; Marcos 15:39), ele quis dizer no mesmo sentido em que Lucas o registrou”: ’Na verdade, este homem era justo”. Até mesmo Pedro, quando Jesus lhe indagou quem os homens achavam que Ele era, respondeu: “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mateus 16:16), poderia, naquele tempo, não ter entendido perfeitamente o sentido divino do termo e ainda tivesse em mente um reino messiânico terreno, conforme a mensagem de Davi a Salomão: “Eu lhe serei por pai, e ele me será por filho; e, se vier a transgredir, castigá-lo-ei com vara de homens, e com açoites de filhos de homens” (2 Samuel 7:14).

Este mesmo verso de Samuel prediz a queda de Salomão na iniquidade e o resultante castigo que aconteceu com a divisão do reino. Mas, dois versos, imediatamente precedentes, falam de um reino eterno estabelecido através da semente de Davi. Então, mesmo que Pedro tivesse visto Jesus como o Messias de um reino terreno, poderia haver em sua mente a indagação de como o Messias iria continuar o Seu reinado “para sempre”. Existem lampejos no VT de que o Messias seria mais do que um simples homem mortal. Por exemplo, em Isaías 9:6, uma clara passagem messiânica deve ter causado algumas dores de cabeça aos judeus: “Porque um menino nos nasceu, um filho se nos deu, e o principado está sobre os seus ombros, e se chamará o seu nome: Maravilhoso, Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz”.

O Dr. Norman Geisler, professor de Filosofia da religião no Seminário Teológico de Dallas, declara, com referência ao VT que:

“O Messias é identificado como Yavé ou Divindade, em muitas passagens. Ele é chamado Deus poderoso, em Isaías 9:6 e Yavé, em Zacarias 12:10 e 14:3-9. O Messias é chamado “Senhor” (Adonai) no Salmo 110:1, e Deus (Eloim), no Salmo 45:6. (conforme Hebreus 1:8). Segundo Miquéias 5:2, Ele preexistia antes de Belém. E Ele é identificado como o Anjo de Yavé no VT (Isaías 63:7-10), o qual é o “EU SOU” de Êxodo 3:14.

Sem dúvida, o firme monoteísmo dos rabinos judeus conduzia-os a outras interpretações destas passagens, em vez de lidar com a questão de como atribuir divindade ao Messias, enquanto mantendo o claro ensino do VT da existência de um só Deus. Para a maioria dos judeus, no tempo de Jesus, Messias significava Rei - mas não certamente Deus.

Por causa de passagens messiânicas como 2 Samuel 7:14 e Salmo 2:7: “Tu és meu filho, eu hoje te gerei”, o termo “Filho de Deus” naturalmente foi associado ao Messias. Por isso, Caifás exigiu de Jesus: “És tu o Cristo, Filho do Deus bendito?”. Caifás não estava perguntando se Jesus era Deus, apenas se Ele era o Messias. Mas Jesus deu a Caifás, e a todo o Sinédrio, mais do que eles poderiam desejar. Quebrando o silêncio mantido nas perguntas anteriores, Jesus resumiu os mais importantes aspectos do Seu ensino e crença sobre a Sua identidade: “... Eu o sou, e vereis o Filho do homem assentado à direita do poder de Deus, e vindo sobre as nuvens do céu”.

Lembrem-se que, apenas alguns dias antes, Jesus havia destruído as operações comerciais no pátio do templo. Agora, os membros do Sinédrio escutavam aquele rebelde galileu afirmando:*

Que o Messias, Filho do Deus bendito e o Filho do Homem eram a mesma Pessoa e se referiam a Ele.*

Que Ele se assentaria à direita do poder de Deus, governando sobre os Seus inimigos (Salmo 110:1-2)*
Que Ele era um Sacerdote, governando para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque (Salmo 110:4).*

Que Ele havia feito tudo com autoridade e poder (Salmo 110:5-7).*

Que Ele seria visto vindo sobre as nuvens do céu...

E o mais importante:* Que Ele era, de fato, Yavé, Deus.

John Buel e Quentin Hyder explicam:
“As palavras de Jesus, embora tranquilas, são chocantes em sua audácia. “Ani hu” nesta passagem é entregue como “EU SOU”, em muitas traduções, como uma resposta à pergunta de Caifás: ‘És tu o Cristo, Filho do Deus bendito?’. É a mesma usada na frase ‘Eu sou o que sou’. Certamente, Jesus verificou que Sua audiência, ansiosa na busca de provas contra Ele, iria interpretar Suas palavras na exata significação teofânica. Foi uma deliberada afirmação de Sua divindade e, se não foi a exata resposta que Caifás esperava, foi uma ‘blasfêmia’ bem maior aos ouvidos dele”.

Jesus Acreditava Realmente que Ele era Deus?

Os que escreveram as narrativas históricas da vida terrena de Jesus eram todos judeus. As próprias narrativas fornecem o claro testemunho de que a tendência natural das testemunhas era ver Jesus numa postura messiânica inquebrantável e não numa postura messiânica divina. Até mesmo na noite de Sua prisão, os discípulos lhe trouxeram espadas. Como devotos adoradores de Yavé, teria sido muito difícil para eles entender as coisas que Jesus havia falado e feito, as quais Lhe atribuíam divindade. Geza Vermes declara, com referência à alegada divindade de Jesus, que “a identificação de uma figura contemporânea e histórica com Deus era inconcebível para um judeu palestino do século 1 d.C.” A forte convicção de Geza Vermes é que o próprio Jesus jamais havia imaginado ser Deus. Mas, vejamos as evidências:

Em Mateus 12:6, Jesus diz aos fariseus:

“Pois eu vos digo que está aqui quem é maior do que o templo”. Ao referir-se a Si mesmo, Jesus declara ser “o Senhor do sábado”.

Como poderia alguém ser o Senhor do sábado, exceto Deus, que o havia instituído? Esta foi uma afirmação direta de Sua divindade.

Em Mateus 23:37, Jesus fala como se Ele tivesse, pessoalmente, testemunhado a história de Jerusalém: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas, e apedrejas os que te são enviados! quantas vezes quis eu ajuntar os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintos debaixo das asas, e tu não quiseste!”

Em Marcos 2:1-2, Jesus diz a um paralítico: “Perdoados são os teus pecados. E estavam ali assentados alguns dos escribas, que arrazoavam em seus corações, dizendo: Por que diz este assim blasfêmias? Quem pode perdoar pecados, senão Deus?”

(Marcos 2:6-7). Então Jesus falou: “Por que arrazoais sobre estas coisas em vossos corações? Qual é mais fácil? dizer ao paralítico: Estão perdoados os teus pecados; ou dizer-lhe: Levanta-te, e toma o teu leito, e anda? Ora, para que saibais que o Filho do homem tem na terra poder para perdoar pecados (disse ao paralítico), a ti te digo: Levanta-te, toma o teu leito, e vai para tua casa” (versos 8-11).
O paralítico foi curado e a implicação foi óbvia. Ninguém poderia perdoar pecados, senão Deus; portanto, Jesus estava afirmando claramente a Sua divindade.

O preletor John Buell e o autor O. Quentin Hyder escrevem:

“Não existe um só verso no VT (ou em qualquer literatura judaica) que dê ao Messias o poder de perdoar pecados, embora a mesma literatura dê este poder a Jeová. Desse modo, ao perdoar pecados, Jesus estava afirmando o Seu poder como Deus e não como o Messias”.

Antes, no Sermão do Monte (Mateus 7:21-23), Jesus fala de Si mesmo como o Juiz final, com autoridade para proibir a entrada no Reino do Céu. No parágrafo seguinte, em vez de “cada pessoa que ouve as palavras de Deus na torá, edificará um sólido fundamento em sua vida”, Jesus declara: “Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras” (Mateus 7:24).

David Biven, pesquisador da origem hebraica dos evangelhos conclui:

“Não era a maneira dEle ensinar, nem mesmo o conteúdo geral do Seu ensino que tornou Jesus único entre os rabinos. O que era exclusivo em Jesus era o que Ele afirmava ser e Ele raramente ensinava sem afirmar que era, não apenas o Messias de Deus, porém, admiravelmente, que Ele era o próprio Emanuel (Deus conosco).”

É surpreendente como os críticos tentam rejeitar as constantes referências de Jesus à Sua própria divindade. Ian Wilson, por exemplo, escreve:
“No Evangelho de Marcos, o que apresenta mais consistentemente a humanidade de Jesus, um homem é apresentado correndo até Jesus e a Ele se dirigindo com estas palavras: “Bom Mestre”.