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segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Christopher D. Stanley, Catherine Hezser, e o letramento das sociedades nos estudos históricos do judaísmo de Jesus

O baixo nível de letramento das sociedades mediterrâneas dos primeiros séculos, em geral, e das comunidades rurais, em particular, não era levado em consideração nos estudos históricos do judaísmo de Jesus e sua continuação, o cristianismo primitivo. O estudo antropológico comparado de culturas, antigas e modernas, em que a comunicação é marcadamente oral trouxe novas luzes para a compreensão da transmissão primitiva das tradições de e sobre Jesus.

Não se encontra em parte alguma do material cristão, intra ou extracanônico, qualquer recomendação por parte do Jesus histórico (ou que a ele tenha sido atribuído) para que seus seguidores registrassem por escrito seus ditos e feitos para a posteridade. Antes, o que se observa, em vários ditos de diferentes seções do cristianismo, são menções explícitas a um programa de disseminação de uma mensagem, atrelada à interiorização e à exemplificação de um estilo de vida cujo meio primordial de transmissão seria a palavra falada. Implica dizer, a comunicação face a face, coletivamente repartida.

É inegável, porém, que os homens e mulheres que aderiram ao programa político-religioso do Reino de Deus, no espaço de algumas décadas, legaram substancial corpo de textos das mais variadas espécies e gêneros. Como declara Harry Gamble, “nenhum grupo religioso greco-romano produziu, usou ou deu valor a textos em escala comparável ao Judaísmo e ao Cristianismo, de tal modo que, excetuando a literatura judaica, não há um corpo apreciável de escritos religiosos com que a literatura cristã primitiva possa ser proveitosamente comparada.”

Com efeito, houve um espaço de tempo, aqui considerado como a transição do Jesus histórico ao cristianismo mais primitivo, em que as memórias dos feitos e ditos do milagreiro de Nazaré, mais ou menos afetadas por fatores emocionais, foram recordadas, criadas, desenvolvidas, alteradas, melhoradas, expandidas, abreviadas, contestadas e também esquecidas.

Essas memórias, não obstante esses fatores, circulavam e eram transportadas pelos seguidores que permaneceram ligados ao grupo de Jesus, ainda que não exclusivamente, mas essencialmente, tal qual projetada e vivenciada pelo próprio Jesus durante seu ministério público: por peregrinos em movimento no curso de pregações comunitárias.

Esse estágio intermediário, portanto, requer uma abordagem que leve em conta o mundo social das primeiras comunidades de judeus e gentios que se cristianizaram, ou seja, considerando: (a) o não-letramento massivo da população e (b) o papel desempenhado pela comunicação oral em todas as camadas sociais que caracterizam a época em que as tradições primitivas de e sobre Jesus eram transmitidas.

Nesse sentido, Christopher D. Stanley pondera que, virtualmente, todos os pesquisadores do Novo Testamento parecem divisar um mundo em que os autores cristãos escreviam para congregações letradas que cultivavam o hábito de ler, estudar e discutir entre si acerca das escrituras judaicas e os escritos das lideranças cristãs. Com efeito, embora vários estudiosos reconheçam que os baixos níveis de letramento estavam entre um dos fatores que contribuíram para a transmissão oral das tradições de e sobre Jesus antes de sua composição na forma de evangelhos, eles têm pouco a dizer sobre como esse baixo letramento poderia ter afetado o uso dos evangelhos nas comunidades primitivas após eles terem sido escritos. Ou seja, a maioria dos estudiosos contemporâneos trabalha com um modelo social que pressupõe níveis de letramento no interior das primeiras comunidades cristãs que variam de médio a alto.

Entretanto, quão realista é esse modelo? É evidente que estimar a extensão do letramento dentro das comunidades judaico-cristãs do primeiro século constitui-se num empreendimento incerto, embora alguns estudiosos concordem que pelo simples fato de que os evangelhos foram escritos e preservados implica um substancial conhecimento da escrita à medida que não faria sentido para seus autores compor textos para pessoas que não os pudessem ler. O problema dessa posição é que ela admite aquilo que precisa provar, ou seja, que os textos eram escritos para ser lidos e estudados por judeus cristãos comuns.

Outros acadêmicos argumentam que o aparecimento freqüente de citações e alusões bíblicas nos escritos cristãos indicaria um substancial grau de letramento nas comunidades primitivas. Por trás desse argumento jaz a crença de que os autores neo-testamentários esperavam que suas audiências fossem capazes de identificar todas as referências explícitas e muitas de suas alusões implícitas às escrituras judaicas. O que os pesquisadores não provam é como os primeiros seguidores obtiveram tão alto nível de letramento bíblico.

Segundo Stanley, uma porção de estudos recentes questionou se o letramento entre os judeus da antiguidade era, de fato, tão alto quanto anteriormente se pensava. Uma inspeção mais detida das evidências persuadiu muitos pesquisadores de que os textos utilizados como argumentos a favor de um letramento judaico amplamente disseminado estavam, em verdade, falando acerca de subgrupos especiais situados no interior da comunidade judaica. Catherine Hezser concluiu, após exaustivo levantamento de evidências literárias e epigráficas na Palestina romana, que pouquíssimos judeus eram capazes de ler textos simples e assinar seus próprios nomes durante a era imperial.

A autora descreve o letramento entre os judeus por meio da imagem de círculos concêntricos no qual o círculo central seria ocupado por um número muito pequeno de pessoas altamente letradas que podia ler textos em hebraico/aramaico e em grego. O círculo seguinte seria composto por pessoas que podiam ler textos em hebraico/aramaico ou em grego. Em torno desses dois círculos, haveria um terceiro, formado por pessoas que não conseguiriam ler textos literários, mas seriam capazes de ler somente listas ou cartas. Uma proporção bem mais ampla da população conseguiria identificar letras, nomes e rótulos e, finalmente, a vasta maioria da população que tinha acesso a textos apenas por meio de intermediários.

Ao mesmo tempo, vem crescendo uma consciência, como assegura Richard Horsley , que as comunicações na Galileia, assim “como em outras partes do império romano, eram em grande parte orais, mesmo entre os letrados. A escrita tinha pouca importância, a não ser para certas funções da elite”. Percepção bastante similar à oferecida por Eric Havelock, segundo a qual, “dos egípcios e sumérios aos fenícios e hebreus (para não mencionar os indianos e os chineses), a escrita nas sociedades onde era praticada restringiu-se às elites clericais ou comerciais, que se davam ao trabalho de aprendê-la”.

Por conseguinte, Horsley sugere que três fatores sejam reconhecidos: (1) no mundo antigo, pouquíssimas pessoas tinham as habilidades mínimas para ler; (2) a escrita estava a serviço, principalmente, da comunicação oral e (3) dadas as disponibilidades limitadas e a utilização proibitiva de rolos escritos tais como os das Escrituras Judaicas, o cultivo das tradições culturais israelitas se dava através da memória e da comunicação oral.

WERNER KELBER E AS LIMITAÇÕES DA CRÍTICA DAS FORMAS

Nos anos recentes, o campo dos estudos bíblicos histórico-críticos deparou-se com inovações em três áreas inter-relacionadas que apresentaram desafios fundamentais às suposições padrão até então predominantes: (a) na década de 70, alguns intérpretes começaram a ler os evangelhos intracanônicos como narrativas globais e não com o olhar centrado sobre alguns ditos e passagens; (b) na década de 80, começaram a despontar explorações sobre a comunicação oral que era predominante no mundo antigo e suas conseqüências para os materiais evangélicos e (c) nos anos 90, a memória cultural chamou a atenção de pelo menos alguns intérpretes como um fator central na composição e apropriação da literatura bíblica, em especial no que tange aos evangelhos.

Nessas três áreas inter-relacionadas, Werner Kelber foi um dos pioneiros em todas. Ele foi um dos primeiros a explorar o evangelho de Marcos como uma narrativa com um enredo central e não como uma espécie de “rosário”, no sentido de uma série de pequenos episódios e situações interligados por acidentes geográficos. Ele foi um dos primeiros a reconhecer que os evangelhos foram compostos e recebidos em um mundo dominado pela comunicação oral. Em conseqüência desses insights, Kelber demonstrou que as narrativas evangélicas foram produzidas por e a partir da memória cultural. Suas incisivas investigações nessas áreas conduziram a mudanças decisivas na abordagem e no entendimento do evangelho de Marcos. No entanto, como pondera Richard Horsley, nos estudos bíblicos “a inovação nem sempre é bem-vinda e é, às vezes, suspeita”.

Assim, uma das principais premissas que fundamentam toda a pesquisa de Kelber consiste na percepção de que a “consciência humana é estruturada em pensamentos pelas formas de comunicação disponíveis”. Por conseguinte, “o meio oral, em que as palavras são dirigidas da boca para o ouvido, manuseia a informação diferentemente do meio escrito, que liga os olhos a visíveis, porém silenciosas, letras sobre páginas e páginas”.

Porém, ele prossegue, a atual pesquisa bíblica acadêmica é, num grau elevado, um produto das forças interdependentes da lógica e da cultura impressa. A lógica, como é sabido, foi formalizada com a ajuda da escrita.

O surgimento do alfabeto converteu a linguagem falada em artefatos que facilitaram a indexação de sons em um número limitado de símbolos. Um triunfo da lógica em si mesmo, a alfabetização da linguagem veio a servir, de maneira crescente, como um catalisador na formação e implementação do pensamento abstrato. Mais tarde, a impressão despersonalizou as palavras e transformou a cultura manuscrita, fortalecendo a linguagem com um senso de objetivação desconhecido até então.

No entanto, fora dos estudos bíblicos observa-se uma ampliação da consciência que os padrões de regularidade linguística e as noções de propriedade verbal fixa não são empregáveis em culturas quirográficas e inaplicáveis para o discurso oral. Nesse sentido, reitera Kelber, “a reificação e neutralização de textos, embora altamente análogo ao processamento tipográfico da linguagem, fez-nos esquecer que as quirografias antigas nasceram, tanto pelo ângulo da composição quanto do ângulo da recepção, em um meio saturado por sensibilidades orais”.

Precisamente porque documentos escritos a mão não eram percebidos como sendo entidades estritamente autônomas com fronteiras impermeáveis, eles interagiam, em parte e no todo, com o discurso oral. Isso é excessivamente difícil para nós entendermos porque os métodos que empregamos nos estudos bíblicos instilaram em nós a idéia de entidades textuais autônomas, que cresceram de textos, ligaram-se diretamente a outros textos e, por sua vez, geraram outros textos.

Kelber assinala que os cristãos primitivos viviam em um mundo que não era estranho ao letramento, mas um sentido de dominação por textos e da primazia das palavras escritas é uma experiência do mundo que ocorre somente depois de Johannes Gutenberg. Por toda a antiguidade, ele prossegue, a escrita estava nas mãos de uma elite de especialistas treinados e a leitura exigia uma educação avançada disponível somente para poucos. Em função da vasta maioria das pessoas estarem habituadas à palavra falada, muito do que era escrito destinava-se à recitação e à escuta. A prática da escrita, ele considera, não transformou o letramento num novo modelo de comportamento linguístico, nem foram as formas e hábitos do discurso oral sumariamente extintos pela literatura.

Em seu ponto de vista, a escrita era, na antiguidade, essencialmente, um produto da urbanização e de povoados compactos, enquanto nas áreas rurais a linguagem era quase inteiramente confinada a comunicação face a face. À medida que o movimento liderado pelo Jesus histórico nasceu em e disseminou-se por ambientes rurais, Kelber considera que a fala era a norma das comunicações mais do que a circulação de textos.

Não sobram dúvidas que todos os evangelhos canônicos sustentam um retrato geral de Jesus como um proclamador de autorizadas e freqüentemente perturbadoras palavras, mas jamais como um leitor, escritor ou líder de uma escola. À proporção que ele é caracterizado como um orador profético e um mestre escatológico, deslocando-se de um lugar para outro, rodeado de ouvintes e envolvido em uma série de debates, os evangelhos terão retido um aspecto genuíno de um pregador oral. Consoante Kelber, “sua mensagem e sua pessoa estão ligadas, inextricavelmente, à palavra falada, não a textos”.

Por conseguinte, ele declara, “diferente de Sócrates, Jesus não tinha um herdeiro letrado que colecionasse e interpretasse sua mensagem. Ele pregou e recrutou mais entre a população rural da Galileia do que entre a classe média urbana”. Convém ressaltar que as palavras de Jesus, segundo Kelber, não estavam destinadas a serem memorizadas pelas autoridades, mas para serem lembradas pelas pessoas comuns e seus seguidores mais próximos. Mais que isso, Kelber também lança dúvidas se o Jesus histórico, “narrador de parábolas e proclamador de aforismos”, e os primitivos “escribas e recitadores” que mais adiante aderiram ao movimento, estavam comprometidos, como nós estamos, com um “ethos de pura formalidade, linearização do pensamento, compartimentação da linguagem, causalidade estratigráfica”.

Nesse sentido, o historiador moderno, persuadido da natureza literário-teológica dos evangelhos e resolvido a lidar com a mensagem de Jesus vê-se confrontado com a questão da fala. Por conseguinte, o primeiro evangelho canônico – Marcos – traria em si sua dívida para com a vida oral e a consciência não-letrada. Se primeiro veio à fala e se ela ajustou os padrões linguísticos para a tradição sinótica, uma importação de aspectos orais para esse evangelho deve ser admitida. Consoante seus argumentos, “a menos que se veja o texto [o texto de Marcos] como um corpo errante caído do céu, é razoável esperar conexões com o que precedeu sua existência”.

Em suma, Kelber destaca a formação de um paradigma que resultou das análises da Crítica das Formas inteiramente inconsistente com as realidades sociais da época e do meio em que a tradição sinótica entrou em circulação. De fato, ele sublinha, o letramento está tão profundamente implantado em todos os acadêmicos que estudam os textos bíblicos que é imensamente difícil evitar tomá-lo como o meio de comunicação normal e como a única medida da linguagem.

OUVINDO MARCOS E Q COMO PERFORMANCES ORAIS

Rompendo com o paradigma constituído pela Crítica das Formas, Kelber também chamou a atenção que qualquer investigação das dinâmicas da tradição e da cultura deve iniciar com uma abordagem sobre o papel da linguagem nas comunidades.

De acordo com Jonathan Draper, a linguagem é moldada pela interação humana, mas também molda essa interação, tanto pela ampliação quanto pela limitação, das possibilidades de comunicação. A linguagem, ele prossegue, também nos socializa dentro de hierarquias e classes sociais e marca nosso status social em termos da linguagem que falamos. Por conseguinte, a comunicação é uma interação entre sistema linguístico, cultura e estrutura/classe social.

Entre esses fatores, a estrutura/classe social afeta a comunicação de duas maneiras fundamentais. Em primeiro lugar, o dialeto é um aspecto importante de estrutura e classe. Apesar de diferentes dialetos se desenvolverem, normalmente, em diferentes espaços geográficos, eles tornam-se implicados na manutenção do status social. Assim, o dialeto de uma região dominante passa a ser a linguagem falada e escrita padrão do centro de poder em uma dada sociedade. Em segundo lugar, a comunicação também é afetada por um código socialmente determinado. Pesquisas empíricas nessa área mostram que crianças, originárias da classe média e da classe operária, são socializadas diferentemente por seus pais no que tange ao uso da linguagem, de modo que, pela linguagem empregada, pode-se presumir a classe social da criança.

Assim, à medida que as teorias linguísticas modernas têm enfatizado o quão importante é reconhecer o papel que a classe/estrutura social exerce sobre a comunicação, convém atentar para dois aspectos: (a) Jesus e seus companheiros provinham das classes menos favorecidas da sociedade de Israel. Como as narrativas intracanônicas fornecem indicações claras, eles eram pescadores, camponeses, pequenos agricultores; (b) embora só apareça em Mateus (26:73), encontra-se uma referência ao fato de os companheiros de Jesus possuírem um dialeto ou sotaque distintivo: “Pouco depois, os que lá estavam disseram a Pedro: „De fato, também tu és um deles; pois o teu dialeto te denuncia.”

Portanto, à luz das teorias sócio-linguísticas, a origem social dos missionários judeus cristãos pode ter afetado mais do que simplesmente o conteúdo de seu ensino; deve ter determinado e canalizado o processo comunicativo como um todo.

Implica dizer, o iletramento, a estrutura/classe social e o dialeto dos primeiros seguidores de Jesus que se dedicaram à disseminação do “evangelho” afetaram, substancialmente, a performance da mensagem. Não no sentido de empobrecimento, mas no de distingui-lo das performances executadas por sujeitos letrados.

Ademais, John Milles Foley defende o argumento que o contexto oral de uma performance oral fixada em um texto escrito pode ser reconstruído, visto que ela sobrevive em forma retórica. Essa reconstrução foca sua atenção sobre os indicadores chaves da performance oral na literatura que são aliterações, assonâncias, rimas, repetições, paralelismos e ritmos. Com efeito, todos esses indicadores são auxiliares da memória e artifícios para a fluência da declamação das histórias orais diante de audiências. Cumpre ressaltar que linguagem arcaica, fórmulas, imagens e linguagem simbólica são todas também encontradas em “textos” orais, como aspectos metonímicos. Outras ajudas à composição oral, a maior parte das quais são perdidas na transmissão escrita, são as canções, entonações da voz, acompanhamento por instrumentos musicais, diálogos e resposta da audiência.

Com efeito, se for possível deduzir que várias dessas características da comunicação oral se mostram presentes em Marcos e/ou Q, ficará evidenciada a natureza oral daqueles escritos. Assim, mais do que mapear textos da antiguidade, sublinhando indicadores chaves de performances orais, cabe, tal como buscado em relação à memória, atentar para uma teoria, com base empírica, que fundamente a suposição de que Marcos e/ou Q são transcrições de comunicações orais.

Conforme o antropólogo Dell Hymes, que propõe a teoria dos versos rítmicos, as narrativas do povo Chinookan – índios norte-americanos nativos do Óregon – estão organizadas em termos de linhas, versos, estrofes, cenas e no que se poderia chamar de atos. Um conjunto de aspectos dos discursos diferenciam as narrativas dentro de versos. No interior desses versos, é possível observar a diferenciação de linhas por meio de verbos. Os versos, por sua vez, são comumente reunidos em grupos de três e cinco. Esses versos agrupados constituem estrofes e, onde a elaboração das estrofes é tal que exige algum tipo de distinção, elas viram cenas. E, em narrativas mais longas, as próprias cenas são organizadas em termos de uma série de atos.

Essas conclusões, Hymes obteve após analisar “textos” orais de quatro povos Chinookan, coletados por diversos antropólogos e por ele mesmo, desde o fim do século XIX até os primeiros anos da década de 70. Ele admite, porém, que, em seu primeiro paper sobre as narrativas daqueles povos nativos dos EUA, vários detalhes passaram despercebidos, mas, após acompanhar outros pesquisadores e suas hipóteses e teorias, resolveu reescrever seu trabalho com o objetivo de comentar a relevância desse tipo de análise para outras abordagens da literatura oral.

Enfim, Hymes constata que a descoberta de tal organização nas narrativas americanas nativas parecem de importância fundamental à proporção que podem fornecer os rudimentos de, ao menos, uma teoria da estrutura do discurso literário na cultura em questão.

Portanto, consoante essa teoria, cabe afirmar: (1) uma estrutura consistente existe na literatura oral que pode ser identificada por uma análise cuidadosa e (2) a estrutura pode ser vista em co-variações de forma e significado. É certo que essa teoria, admitidamente, consiste de dificuldades e incertezas, pois infere uma padronização extremamente genérica para todos os exemplares de comunicação oral do mundo.

As performances orais da Boa Nova, por carismáticos itinerantes, foram, em algum momento, registradas por escrito. Isso parece ser uma conclusão óbvia. Igualmente, parece evidenciado, que o registro escrito das performances, relevando as possíveis interferências dos escribas, assumiu contornos específicos e peculiares a cada um dos presumidos profetas, ou grupos deles, que disseminavam as tradições de e sobre Jesus.

Não obstante, há uma categoria de ditos de Jesus que, embora os discursos não sejam paralelos em Marcos e em Q, podem ser analisados comparativamente. Kelber os denomina estórias didáticas e cobrem uma variedade de diálogos de controvérsias e contos biográficos cujo cume é sempre um dito de Jesus aparentemente exarado para ficar retido na memória do orador e sua audiência. Definido dessa maneira há seis exemplos que fornecem evidências claras de uma formulação pré-textual: Jesus à mesa de Levi (2:15-17), Debate sobre o jejum (2:18-19), Arrancar espigas de milho no sábado (2:23-28), Discussão sobre o divórcio (10:2-9), Questão sobre as posses (10:17-22) e Pagamento de impostos a César (12:13-17). Segundo Kelber, todas assumem a mesma forma padrão, com uma variação ou outra.


quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Dr. Robert Eisenman: E a longa e perdida história da formação do cristianismo "pré-histórico"


Nas suas recentes publicações The Dead Sea Scrolls Uncovered (em parceria com Michael Wise) e The Dead Sea Scrolls and The First Christians, Rober Eisenman do Institute for the Study of Judeo-Christian Origens e do Institute For Higher Critical Studies tinha ameaçado/prometido redesenhar o mapa das origens cristãs e agora, por Deus, ele conseguiu. A amplitude e o detalhe da investigação de Eisenman tanto quanto suas implicações são de tirar o fôlego. Em James The Brother Of Jesus ele nos conta a longa e perdida história da formação do cristianismo "pré-histórico" tal como ele emerge da atribulada Palestina revolucionária e das hostilidades mutuamente destrutivas entre os Paulinos e o Cristianismo Ebionita. Eu denomino isso de "pré-histórico" porque Eisenman reconstrói os eventos apresentados diante de nós e por de baixo das histórias canônicas do cristianismo primitivo que conhecemos. Seu empreendimento é nesse sentido relacionado com aquele de Burton L. Mack, esse outro grande pesquisador das profundezas subterrâneas do cristianismo pré-histórico. Como Mack, Eisenman descobre um cristianismo (ou talvez uma protocristianismo ou mesmo um pré-cristianismo) para as quais Jesus ainda não tinha obtido centralidade. Apenas, aonde Mack enxerga o germe inicial de uma nova religião como uma variedade do cinismo, Eisenman rejuvenesce ou mesmo reivindica a antiga alegação de Renan de que o cristianismo começou como "um essenismo".

No processo Eisenman reivindica outro dito de Renan, especificamente de que para se escrever a história de uma fé, precisamos ter pertencido a ela, mas não devemos mais pertencer a ela. Enquanto alguém carrega o fardo de representar o cristianismo parece ser quase impossível se livrar de tendências apologéticas. Lidando com Paulo, isso significa que mesmo especialistas críticos não conseguem se furtar em pressupor que a mensagem de Paulo, teológica, ou qualquer outra, deve ser, basicamente, verdadeira. Mesmo se alguém deve praticar uma pequena cirurgia crítica aqui e acolá, e.g, o papel da mulher, Paulo é ainda é o alicerce da Igreja de cada um. Pelo menos esta tendência Paulina implícita resulta no que Bruce Malina e outros denominam de uma abordagem doceta para o texto.

Para antecipar o núcleo do livro como um todo, digamos que Eisenman primeiro desenha um retrato das comunidades primitivas de Tiago como um religioso, nacionalista messiânico e uma seita xenofóbica de devoção extrema algo que a maioria de nós consideraria fanatismo. Eisenman mostra como a "cristandade-judia" era parcela de um ambiente sectário o qual incluía Essênios, Zelotas, Nazoreus, Naziritas, Ebionitas, Elchasites (um subgrupo dos Ebionitas), Sabeanos, Mandeanos etc., e que essas categorias não eram mais do que tipos ideais de maneira alguma segregados uns dos outros como bestas exóticas em jaulas adjacentes, identificadas no zôo teológico. Contra essa qualidade de "Lubavitcher Christianity", Eisenman retrata o cristianismo Paulino (e ainda seus primos helenistas, os cristianismos Joaninos, de Marcos e Lucas) como sendo raiz e ramo, comprometendo e assimilando uma apostasia herodizante do judaísmo. O cristianismo grego dá a Torá e à identidade judaica o surto de crescimento. O Cristo Paulino, um redentor espiritual com um reino invisível, é consistente com a cristianização de Vespasiano como messias por Josefo.

Claro que essas idéias de maneira alguma são novas. Eisenman está, simplesmente, preenchendo o quadro de uma maneira exaustiva inimaginável por S.G.F. Brandon, Robert Eisler e seus sucessores. A figura de Jesus nos evangelhos gregos, comendo com coletores de taxas, caçoando das tradições de seu povo, acolhendo pecadores e ridicularizando a devoção da Torá são todas expressões de antijudaísmo gentílico. Somente gentios totalmente sem simpatia com o judaísmo poderiam professar enxergar Jesus como um nobre pioneiro de "superior virtuosidade". Da mesma forma, a noção do Novo Testamento de que Jerusalém caiu porque seu povo havia rejeitado o messias, quando na verdade eles estavam lutando uma guerra messiânica contra o anticristo romano, deve ser julgada como uma peça helenista cínica de perseguição judia. O cristianismo tal como emerge na missão gentia é um produto da acomodação cultural, Quinlingismo pró-romano, e assimilação intencional. É uma maneira de judaísmo sincrético diluído diferente do culto Sabázio.

Armado com uma hermenêutica de suspeição, Eisenman nos mostra como quebrar os códigos da desinformação teológica, para ouvir os ecos amortecidos e longínquos, como encontrar sustentação para o que tem parecido ser uma escalada inaccessível a um cume o qual se possa ver a até agora inobservada paisagem do cristianismo primitivo. Quais são as ferramentas para a escalada?

Primeiro; Eisenman considera uma gama maior de fontes históricas do que a maioria pensa que ele precisa. Ele examina como poderíamos esperar os Pergaminhos do Mar Morto, bem como os Reconhecimentos e Homilias Clementinas, as Constituições Apostólicas, Eusébio, os dois Apocalipses de Tiago de Nag Hammadi e até mesmo o texto Ocidental dos Atos e o Josefo Slavônico. Eisenman assume Josefo como fonte dos Atos de Lucas de uma maneira muito mais séria do que qualquer um jamais tinha considerado antes. Tudo isso nosso autor escrutina cuidadosamente, não deixando nada sem crítica. Aonde ele se diferencia da maioria dos especialistas é em tomar seriamente esses materiais como novas fontes de informação, a sugestão estranha aqui ou acolá, sobre Tiago ou Paulo. Como Richard Pervo (Profit With Delight) começou a mostrar o negligenciamento tradicional de fontes relacionadas com elas (e.g O Apócrifo Atos dos Apóstolos) por supostamente especialistas críticos é mais um caso de apologética canônica do que método histórico. Porque os especialistas do Novo Testamento concordam que os Atos de Lucas são legendários e fictícios em larga medida e logo em seguida assumem a história com o valor de face? Eisenman, por outro lado, percebe que Lucas e a literatura Pseudoclementinas estão mais ou menos par a par. Cada uma delas deve ser tratada com reservas, todavia com um otimismo que no meio de todo o material, em algum lugar, alguém pode descobrir um pedaço vital de informação.

Segundo; Eisenman desenvolveu um apurado senso para o "jogo dos nomes" jogado nas fontes. A maioria de nós alguma vez já quebrou a cabeça com as provocativas confusões latentes na estranha redundância de nomes similares nas narrativas do Novo Testamento. Como pode Maria ter tido uma irmã de nome Maria? Existe alguma diferença entre José Barrabás Justo, Judas Barrabás Justo e Tiago o Justo? Daí todos os Tiagos e Judas? Quem é Simão o Zelote e Judas o Zelote (o qual aparece em alguns manuscritos do NT e em outros documentos do cristianismo primitivo)? Seria Coplas o mesmo que Cleofás? O que acontece com Jesus bem-Ananias, Jesus Barrabás, Elimas bar-Jesus e Jesus Justo? O que realmente significa Boanerges? Seria Nataniel um apelido para alguém que conhecemos? E assim por diante e por diante. A maioria de nós se espanta, momentaneamente, com essas estranhezas e depois nos movemos adiante. Afinal, quão importante podem ser elas? Eisenman não segue adiante antes de explicá-las.

Sua hipótese de trabalho é que as confusões, alterações e ofuscações seguem um interesse em encobrir a importância e, portanto, a identidade dos Desposyni, os herdeiros de Jesus o qual aparentemente funcionaram, ao menos para o cristianismo palestino, como um califado dinástico similar à sucessão no Islã ou a sucessão dos irmãos hasmoneanos. É lugar comum que os textos dos evangelhos tratando a mãe de Jesus, irmãos e irmãs, ora duramente (Marcos e João), ora delicadamente (Lucas, c.f, o Evangelho de acordo com os hebreus), são funções das polêmicas eclesiásticas sobre as reivindicações de suas lideranças em oposição a Pedro e os Doze (analogamente aos Companheiros do Profeta no Islã) ou a forasteiros como Paulo. É igualmente bem conhecido que as listas dos apóstolos nos Sinóticos diferem entre elas e entre os manuscritos de cada Evangelho. Por quê? Eisenman conecta esse fenômeno com outro, a confusão levantada entre teólogos primitivos sobre os parentes de Jesus à medida que a doutrina da virgindade perpétua de Maria tornou-se largamente difundida. Eles tiveram que harmonizá-la com o dogma, assim irmãos e irmãs se tornaram primos, meio irmãos etc. E personagens tornaram-se divididos. Maria, subitamente, tinha uma irmã chamada Maria porque a mãe de Tiago, Joset e Judas não podia mais também ser a mãe de Jesus. E assim por diante.

Os evangelhos deram importância a um círculo interior de três: Pedro, João filho de Zebedeu e João irmão de Tiago. Gálatas tem os três Pilares em Jerusalém: Pedro, João filho de Zebedeu e Tiago o irmão de Jesus. O que aconteceu aqui? Certamente o grupo interior de três é entendido como preparatório para os Pilares, para provê-los de uma ancestralidade de Jesus. Mas então porque existem dois Tiagos? Não deveriam ser eles, originalmente, os mesmos? Eisenman diz que eles eram, mas certas facções que pretendiam enfatizar a autoridade do sombrio colégio dos Doze contra a primitiva autoridade dos herdeiros consideraram político levantar uma barreira entre Tiago, o irmão de Jesus, e os Doze, assim Tiago tornou-se, Tiago o Justo, de um lado e Tiago, o irmão de Jesus, no outro.

Outra tentativa de distanciar Tiago, o Justo, dos Companheiros de Jesus teria sido a clonagem de Tiago o Justo com Tiago o filho de “Alfeu“, cujo nome Papias afirma ser intercambiável com “Cleofás” que vem a ser o pai de Simão, sucessor de Tiago como bispo de Jerusalém e também seu irmão. E posteriormente Tiago o filho de Alfeu e Tiago o filho de Zebedeu ambos substituíram Tiago o Justo no círculo de discípulos. Enquanto isso, Tomé sofreu uma mitose em Judas de Tiago, Tadeu, Lebeu e Judas Iscariotes. Simão o Zelote é Simão bar-Cleofas outro irmão de Jesus, o sucessor de Tiago como líder dos cristãos de Jerusalém após o martírio de Tiago. Ele foi confundido também com Simão Cefas (Simão Pedro).

Eisenman trabalhou uma complexa e coerente construção gramática desses processos e termina com um círculo muito mais reduzido “dos Doze”, a maioria deles sendo “aliases” e substituições para os irmãos de Jesus. Isso escandalizará alguns, mas outros leitores acharão que a teoria agrega verdade em contrapartida ao, alternativamente, estranho fato de que os Doze são entidades sombrias e insignificantes no Novo Testamento.

Terceiro; Eisenman traz para suportar as narrativas dos Atos o modelo de uma técnica redacional "combina e ajusta" pela qual Lucas é visto como tendo composto suas histórias através da recombinação de características proeminentes de cada história nas suas fontes. Quando Lucas termina, somente pedaços dos paradigmas ou composição sintática dos originais são encontradas, mas existindo suficiente para reconhecer uma como mutação da outra. Esse é o procedimento usado recentemente com grande resultado por um número de especialistas, nada menos do que John Dominic Crossan (o qual mostra a narrativa da paixão ter sido provadamente construída a partir de vários textos do Antigo Testamento), Randel (o qual nas ficções do evangelho mostra caso após caso uma história do evangelho derivada de uma história similar da Septuaginta) e Thomas L. Brodie (o qual decifra numerosas narrativas de Lucas em seus componentes originais Deuteronômicos). A originalidade de Eisenman nesse ponto não está na técnica, mas no seu zelo de levar a sério o uso de Josefo como fonte por Lucas. (Novamente, isso é algo que ninguém que deseja uma data mais cedo para Lucas ou uma base histórica para os Atos gostaria de considerar seriamente, mas dessa forma temos um caso de apologética disfarçada como crítica). E a análise redacional de Eisenman sobre Lucas em Josefo é somente um dos principais avanços de Tiago o irmão de Jesus. Não parece ser demasiado dizer que o livro inaugura uma nova era no estudo dos Atos.

Não se quer afirmar, entretanto, que Eisenman limita seu uso de técnicas ao uso de Josefo por Lucas. Longe disso: ele é capaz de extrair tradições de várias fontes e identificá-las em seus novos aspectos nos Atos-Lucas e em qualquer outra parte do Novo Testamento. Eu proponho agora oferecer sumários de algumas reconstruções de Eisenman, mostrando em contornos amplos o que ele vê em Lucas (ou outros) tendo produzido tradições originais bastante diferentes.

Várias fontes primitivas cristãs apresentam Tiago como sendo eleito pelos apóstolos como bispo de Jerusalém sob indicação de Jesus (como no Evangelho de Tomé, logion 12). A agenda helenizante de Lucas o levou a recontar essa história não como uma substituição de Jesus por Tiago o Justo, mas sim a substituição de um vilão Judas Iscariotes pelo insignificante "Matias". Tiago, o Justo, foi diminuído bastante de maneira a se esconder atrás do candidato à posição, "José Barrabás chamado Justo". O nome Matias foi sugerido, através de simples associação de palavras, por Matias o pai de outro Judas, Judas Macabeu. Assim, quando mais tarde encontramos Tiago, o Justo, como o chefe da Igreja de Jerusalém nós temos a expectativa de saber quem é ele, embora Lucas tenha eliminado o que poderia ser sua apresentação! Um sinal evidente da história original tratando da eleição de Tiago, não como novo 12º apóstolo, mas como o bispo de Jerusalém, é o texto-prova, "seu episcopado deixa outro homem tomar" (Atos 1:20/Ps 109:8). Tiago foi simplesmente abortado de várias narrativas dos Atos nas quais deveríamos esperar ler sobre todos os três pilares, mas agora lemos somente sobre o duo dinâmico Pedro e João.

Como Hans-Joachim Schoeps já tinha conjecturado, o apedrejamento de Estevão suplantou exatamente da mesma maneira o apedrejamento de Tiago (na realidade uma combinação do posterior apedrejamento de Tiago sob o comando de Ananus e um anterior ataque por Saulo nos degraus do templo preservado em um incidente separado nos Reconhecimentos). O nome de Estevão foi emprestado de um oficial romano surrado por insurgentes judeus o qual Josefo retrata ter sido emboscado fora dos muros da cidade. Porque esse nome? Por causa de um jogo de palavras: Estevão significa "coroa" e foi sugerido tanto pelos longos cabelos dos Naziritas (ao qual Tiago pertencia de acordo com escritores da igreja primitiva) como pela coroa do martírio. Sobre Estevão havia sido transferida a declaração de Tiago sobre o Filho do Homem situado à direita de Deus no paraíso, assim como a oração de Tiago, para seus perseguidores do mesmo tipo daquelas proferidas por Cristo. (Eisenman deve ter notado também que a identidade original do mártir como Tiago, O justo, é assinalada por Atos 7:52, "Até mataram os que anteriormente anunciaram a vinda do Justo, do qual vós agora fostes traidores e homicidas!").

Lemos que um jovem de nome Saulo estava verificando vestes para os executores de Estevão e com seu gosto por sangue imediatamente estimulado iniciou a fomentar perseguição em Jerusalém e Damasco. Isso tem sido trazido novamente pelo folclore de Tiago bem como de Josefo. O motivo da roupa foi sugerido pelo golpe final em Tiago com um bastão, ao mesmo tempo logo após sua própria narrativa da morte de Tiago, Josefo relata sobre o tumulto iniciado por um Herodiano de nome Saulo em Jerusalém!

Eisenman observa vários temas envolvendo Tiago circulando livres para serem conectados de formas inteiramente diferentes nas escrituras cristãs. Por exemplo, a transfiguração traz Jesus resplandecendo em glória celestial como Estevão o viu e Tiago o proclamou. E claro Tiago estava lá na cena. O elemento "branqueador" é repetido na aparência de Jesus com as roupas brilhantes, mais brancas do que qualquer branqueador as pudesse alvejar. Novamente, nos Reconhecimentos, Saulo está perseguindo Tiago e os santos de Jerusalém até Jericó (nas vizinhanças de Qumran "Damasco"), e de alguma maneira eles são protegidos pelo espetáculo da tumba de dois mártires as quais, milagrosamente, brilham a cada ano. Existe o elemento branqueador ligado à perseguição de Saulo. De novo, na tumba vazia (relembrando aquelas tumbas dos mártires), encontramos um "jovem homem" (o epíteto aplicado a Saulo no apedrejamento de Estevão em Atos) vestido de branco e sentando à direita, dessa vez, no local de repouso de Jesus exatamente como Estevão viu Jesus à mão direita de Deus.

A visita de Pedro a Cornélio, qualificada, praticamente, como uma paródia da história de Josefo sobre Simão, um líder piedoso com sua própria assembléia o qual desejava barrar Herodes Agripa I no templo por conta de suas contaminações gentias, conseqüentemente Agripa o convidou para inspecionar sua casa em Cesaréia e então dispensá-lo com presentes. Lucas pegou emprestado o nome Cornélio de algum local em Josefo aonde Cornélio é o nome de dois soldados romanos, um envolvido no cerco do Templo sob Pompéia, o outro no cerco de Jerusalém sob Tito. Os colaboradores dos romanos em Cesaréia, aonde Lucas estacionou seus piedoso Cornélio, estava entre os mais dispostos à violência da Palestina. O elemento de conflito entre Herodes Agripa I e Simão Pedro foi naturalmente transferido para Atos 12, aonde Herodes prende Pedro e Pedro foge, sendo o mesmo desenvolvimento básico, mas com dramaticidade aumentada.

O que dizer do sempre fascinante personagem Simão Magno? Eisenman o identifica com um mágico de nome Simão de quem Josefo reconta que ele ajudou Berenice a convencer sua irmã Drusila a desprezar seu marido Rei Azizo de Emesa que se circuncisou para esposá-la, para que pudesse se arranjar, não com ele, mas com o não-circuncisado Felix. O Simão mágico de Josefo é um Cipriota enquanto O Simão Mago dos Atos é considerado por escritores posteriores procedente de Gita na Samária, mas na verdade esse fato estressa a conexão, desde que era natural confundir "Gita" com "Kittim" ou Povo Marítimo de Cipros. Não só isso, mas Eisenman nota que alguns manuscritos de Josefo denominam o mágico "Átomos" que Eisenman relaciona com a doutrina do Adão Primal enxergada por ele como implicada na alegação de Simão ser o uno encarnado muitas vezes. Mas ainda existe uma relação próxima que Eisenman não teve a oportunidade de notar. Qualquer um pode ver que Lucas criou o episódio Saulo/Paulo argumentando contra Elimas o vidente (Atos 13:8 e seguintes) como uma contrapartida paulina para a competição de Pedro com Simão Mago em Atos 8:9 (na verdade, o patronímico de Elimas "bar-Jesus", provavelmente, reflete a alegação que Simão fez de ter aparecido recentemente na Judéia como Jesus). Assim Elimas é simplesmente Simão Mago. E o que você sabe, o texto ocidental dos Atos dá nomes como Etoimas ou Etomas ao invés de Elimas! Assim, Simão Mago=Elimas=Átomos=José de Simão=Simão Mago.

Aonde Lucas encontrou sua matéria prima para a profecia de Ágabo sobre a grande fome para ocorrer no reinado de Cláudio, para a viagem de Paulo da Antioquia para levar fundos de ajuda para a fome a Jerusalém e para a narrativa anterior de Felipe e o eunuco Etíope? Novamente, de Josefo (embora talvez também de outras fontes de informação associadas). Tudo isso deriva, de um jeito ou de outro, da história de Helena, rainha de Adiabene, um reino contíguo e/ou superposto com Edessa, cujo rei Agbaro/Abgaro em algumas fontes é o marido de Helena. Helena e seu filho Izates convertido ao judaísmo, embora inicialmente Izates se abstivesse da circuncisão devido ao conselho de um professor judeu que garantiu a ele que a devoção a Deus era mais importante do que a circuncisão. Sua mãe, também aconselhou contra isso, uma vez que seus súditos poderiam se ressentir por ele abraçar tal costume estrangeiro. Mas logo um professor austero de Jerusalém, um tal de Eliezer, visitou Izates encontrando-o a meditar sobre a passagem de Gêneses da aliança Abraâmica sobre a circuncisão. Eliezer indagou se Izates entendia a implicação do que estava lendo. Se sim, porque então ele não enxergava a importância de ser circunsisado? E isso o príncipe concordou em fazer. Helena e Izates provaram sinceridade na sua conversão, através de entre outras filantropias, ao enviar agentes ao Egito e Cerne para comprar grãos durante a fome no tempo de Cláudio e distribuí-los entre os pobres de Jerusalém.
Esses eventos deixaram sua marca no Novo Testamento da maneira que se segue: Eisenman nota (como naturalmente todos os comentaristas fazem) que não existe espaço para a visita de ajuda da fome no itinerário Galatiano da visita de Paulo a Jerusalém, mas ele tenta colocar o evento durante a jornada na "Arábia" o qual, no idioma da época, poderia incluir Edessa/Adiabene. Os Atos conhecem duas Antioquias, aquela na Pisídia e Síria, mas havia outras incluindo Edessa! Eisenman identifica Paulo como o primeiro professor judeu que diz a Izates que ele não precisa se circuncisar na sua fé em Deus. (Esse episódio também está na base do episódio de Antioquia recontado em Gálatas, quando certo homem de Tiago chega a Antioquia para dizer aos convertidos por Paulo que eles afinal precisam ser cincuncisados.) Paulo é um dos agentes de Helena para trazer ajuda para a fome em Jerusalém, o qual ele diz em Atos 11 fazer "de Antioquia".

Mas, peguemos novamente a história de Helena no capítulo 8, com Filipe substituindo Paulo, aonde Filipe aborda o agente financeiro de um rei estrangeiro indo de Jerusalém para o Egito via Gaza. Esse é claro o eunuco etíope. Porque Lucas transformou Helena a rainha de Adiabene em Candace a rainha da Etiópia? Ele reverteu um padrão do antigo do Antigo Testamento, fazendo Helena, convertida ao judaísmo, em uma Rainha de Sabá do Novo Testamento que viera a Jerusalém para ouvir a sabedoria de Salomão. Existe também um jogo de palavras na raiz saba, denotando batismo no estilo dos Essênios, Sampsaeans, Sabeanos, Masbutheans e Mandeanos, o tipo de judaísmo que Helena havia se convertido (dado o posterior envolvimento Zelote de seus filhos e sua própria reputação de 21 anos de ascetismo Nazirita). Henry Cadbury anotou muito tempo atrás que Lucas caiu na mesma armadilha que um número de literatos contemporâneos foi pego ao assumir como nome próprio, Candace, o título de todas as antigas rainhas Etíopes, kandake, mas Eisenman também vê um jogo de palavras no nome do filho de Helena, Kenedaeos. Que deu sua vida para o adotado povo na Guerra Romana. De qualquer maneira não havia rainhas etíopes naquele tempo.

Quando o profeta Ágabo previu a fome, Lucas derivou seu nome daquele do marido de Helena, Agbaro. Quando o eunuco convida Filipe para entrar em sua carruagem, temos um eco de Jeú recebendo Jonadab em sua carruagem. Quando Filipe pergunta ao etíope se ele entendia o que lia, Lucas estava emprestando isso da história de Izates e Eliezer, aonde a questão também pressagia um ritual de conversão, apenas que dessa vez é a profecia de Isaias sobre Jesus, e o ritual do batismo. A circuncisão original sobrevive na forma de paródia crua (relembrando Gálatas 5:12) com o Etíope sendo totalmente castrado. Até mesmo a localização do episódio dos Atos é ditado pela história de Helena, pois o etíope viaja para o Egito via Gaza porque o agente de Helena precisa estar em posição de comprar grão. A motivação substituída por Lucas para o objeto da a viagem é absurda: um eunuco não poderia ter ido a Jerusalém para adorar uma vez que eunucos eram barrados no Templo!

O suicídio de Judas Iscariotes (originalmente "O Sicário") representa uma mistura de elementos que fazem mais sentido no seu presumível ambiente mais cedo na vida de Tiago e Judas. Os elementos do suicídio (bem como o lançamento de sorte no contexto adjacente de Atos 1) provêm do lançamento de sorte para iniciar os suicídios dos Sicários em Massada. A queda abrupta vem de Tiago sendo empurrado do pináculo do templo, enquanto as entranhas derramadas refletem o esmagamento dos miolos de Tiago pelo diabólico lavador. Como Tiago, Judas nos Atos é enterrado aonde cai.

Eisenman enxerga Tiago estando envolvido, integralmente, em alguns dos episódios que Josefo reconta no mesmo período, tal como a construção de um muro para cortar a vista da sala de jantar de Herodes Agripa do altar sacrifical do templo, que aconteceu logo antes do martírio de Tiago e a profecia de Jesus-ben-Ananias sobre a destruição final de Jerusalém, que aconteceu exatamente depois. Tiago tinha sido a fortaleza impedindo o julgamento de Deus. E com ele fora do caminho, o destino da cidade estava selado. (Orígenes leu uma versão de Josefo na qual ele diz que o povo atribuía a queda da cidade como punição pela morte de Tiago o Justo). Essa profecia de Jesus bem-Ananias é a base tanto para o oráculo mencionado por Eusébio que alertava aos cristãos de Jerusalém para fugirem como para Ágabo alertando Paulo para não continuar em Jerusalém (atos 21).

Tiago foi executado por blasfêmia por conta de sua atuação (como os antigos escritores da Igreja nos contam) como Sumo Sacerdote opositor entrando no Santo do Santos no dia do perdão. Como um essênio (como mostrado por suas práticas ascéticas, suas vestes de linho brancas etc.) ele celebraria o Yom Kippur em um dia diferente, que seria a maneira de não esbarrar com Ananus fazendo a mesma coisa que é a razão pela qual por irregularidades ritualísticas ele teria sido executado, como o Mishnah exigia para infrações como essa.

A maneira como Eisenman descreve o papel de Tiago tem muito pouco a ver com Jesus (tão pouco quanto a Epístola de Tiago). Até mesmo a famosa história de Tiago sendo convidado pelo Sumo Sacerdote para se dirigir ao povo na Páscoa, para dissuadi-los de sua crescente fé em Jesus e recebendo sua surpresa confissão, "Porque vocês me perguntam sobre o Filho do Homem...?" deve ser lido, pelo que parece Eisenman sugerir, como uma cristianização de um original na qual Tiago foi solicitado a acalmar a excitação da multidão na Páscoa (uma fonte anual de dores de cabeça escatológicas para o Templo e para o "establishment" romano) com nenhuma referência a Jesus como o messias esperado. E a resposta de Tiago teria sido um incitamento da expectativa messiânica novamente sem referência a Jesus como o Filho do Homem. Igualmente o voto de Tiago prometendo não comer ou beber até que o Filho do Homem tenha se elevado, pode ser uma redação cristã do voto de Tiago para observar o ascetismo nazirita até a vinda do messias, não necessariamente a ressurreição de Jesus. Assim o Tiago de Eisenman faria muito mais sentido como uma figura religiosa em seu próprio mérito, não se apoiando na sombra de Jesus. Essa é, de qualquer forma, a impressão que ganhamos de Hegésipo e de outros: Como poderiam as autoridades do Templo sequer solicitado a Tiago para acalmar o entusiasmo popular sobre Jesus se eles soubessem que ele mesmo era um líder cristão? Eles o conheciam como um judeu piedoso assim como Josefo.

A figura de Tiago como importante por seu próprio mérito, encerra duas outras hipóteses distintas de Eisenman. O primeiro é a identificação de Tiago o Justo como o Mestre da Retidão de Qumran, uma situação que ele argumenta extensivamente em seu livro anterior The Dead Sea Scrolls and the First Christians. Ele alude à possibilidade dessa identificação várias vezes em James the Brother of Jesus. Claro que, mesmo nas leituras de Eisenman dos textos dos Manuscritos do Mar Morto, muito pouco é dito sobre Jesus. Suas leituras nas fontes originais de Tiago faz sentido com isso. Jesus não tinha ocupado uma centralidade criptológica no contexto original do "Essenismo" o qual posteriormente se fragmentou ao longo das linhas faccionais leais a Jesus (Cristianismo Ebionita), João Batista (Mandeanos) e Tiago o Justo (seita em Qumran). Para um cenário similar em solo gentio veja 1 Co 1:12.

A segunda audaciosa hipótese de Eisenman, relevante para este quadro de um Tiago mais ou menos independente, é que o nosso quadro nos evangelhos gregos parece largamente ser uma amálgama Paulino anti-halaka e episódios emprestados de várias figuras messiânicas e proféticas encontradas em Josefo.

Na entrada triunfal de Jesus em Jerusalém para "limpar" o Templo que se tornara um "antro de ladrões", como não reconhecer a entrada do messias Simão bar-Giora na cidade sob convite dos sacerdotes para "limpar" o Templo de agitadores subversivos rivais? E (como Eisenman e John Dominic Crossan ambos notaram) não seria a muda flagelação de Jesus pelos sacerdotes e pelo Procurador Romano para prever a destruição do Templo suspeitamente similar àquela de Jesus bem-Ananias? A humilhação de Jesus como um rei durante a visita a um "soberano" herodiano soa marcadamente como o incidente de Carabas reportado por Philo em Contra Flaco (Adversus Flaccus - novamente Crossan também notou isso), o qual também ecoa Barrabas. A tentativa pela multidão de forçar Pilatos a condenar Jesus através da ameaça de relatar sua delinqüência a César lembra a verdadeira alegação feita contra Pilatos feita por Samaritanos após ele liquidar partidários do Samaritano Taheb no Monte Gerizim, um feito que na verdade resultou numa chamada de Pilatos Roma. A execução de Jesus como Rei dos Judeus nos relembra a de Simão bar-Giora em Roma.

A espetada de lança para confirmar sua morte lembra aquela que se seguiu ao pacto de suicídio do rei revolucionário fugitivo espartano Cleomenes e seus colaboradores em Vidas, de Plutarco. Igualmente, os prodígios na crucificação de Jesus são exatamente aqueles da crucificação de Cleomenes os quais deixaram as mulheres espectadoras a aclamar o rei rebelde assassinado como filho dos deuses e a visitarem o local para adorá-lo. E como Eisenman mostra, mesmo as aparições de Jesus depois de três dias de luto de seus discípulos se encaixa nas do herói Niger em na Guerra Romana, o qual foi considerado morto por amigos e adversários, mas estava realmente se escondendo numa caverna por três dias enquanto seus enlutados discípulos procuravam por seu corpo, somente para serem "surpreendidos pela alegria" quando ele reaparece vivo de sua caverna!

Eisenman também nos lembra que sabemos menos do que supomos sobre a cronologia de Jesus. De acordo com evidências em Josefo devemos posicionar a execução de João Batista o mais tardar em 35-36 CE. E Epifânio afirma que o espiscopado de Tiago durou 24 anos após a partida de Jesus; partindo da data informada por Josefo para a morte de Tiago, a morte de Jesus seria colocada cerca de 38 CE. E os Atos de Pilatos, substituído pelo Evangelho Cristão de Nicodemus, datou a execução de Jesus em 21 CE. Irineu imagina Jesus morrendo aos 50 anos, sob Cláudio, enquanto o Talmude o tem crucificado sob Alexandre Janeau! E teria o Credo se importado em afirmar que Pilatos executou Jesus a não ser que alguém estivesse negando isso?

Igualmente chocante para muitos será a sugestão de Eisenman que o Saulo Herodiano de Josefo, ativo durante o cerco de Jerusalém, não era outro senão Saulo de Tarso! Como Hyam Maccoby, recentemente, nos lembrou (No The Mythmaker). Nossa assunção convencional de que Paulo morreu sob ordem de Nero permanece apenas no manifestadamente imperfeito legendário material em Clemente 1 (um resumo anônimo de peças exortatórias de datas desconhecidas) e nos Atos de Paulo. Nós realmente não sabemos o que pode ter acontecido a ele. Igualmente, Eisenman chega perto de identificar Simão Pedro com Simão bar-Cleofas, que é dito, como Simão Pedro, ter sido crucificado, mas bem depois do reinado de Nero. (Na verdade, Eisenman pensa que sem dúvida existia um Pedro distinto do Pilar Cefas, que a tradição referente aos dois tem sido confundida devido à similaridade entre os nomes).

Outro ponto no qual Maccoby e Eisenman coincidem é sua disposição de assumir seriamente a acusação Ebionita de que Paulo nunca foi, para início de conversa, realmente um judeu. Maccoby mostra quase extensivamente em seu Paul and Hellenism que as espístolas paulinas dão pouca evidência séria de que sejam escritas por um judeu, por suas explosões antisemitas, suas afinidades religiosas misteriosas, suas exegeses gnósticas e suas visões definitivamente não-judias do Torá como ônus. Eisenman afirma a evidência da influência Herodiana, alguma coisa que realmente não precisamos ler nas entrelinhas para ver, dado sua cidadania romana, seu parentesco com um dos Herodes e à casa de Aristóbulo. Se isso é o que os Ebionitas querem significar, que Paulo era tão judeu como Herodes o Grande a despeito de suas pretensões, então temos um cenário mais natural do que aquele que os Ebionitas acusam o que de outra forma implica: a idéia de Paulo como um tipo de Grego pagão entrando superficialmente e por fora no judaísmo. Como Eisenman observa, Paulo protesta de que é Hebreu, um Israelita, mesmo um Benjaminita, mas ele evita chamar-se de judeu! E Eisenman sugere que, dado o estranho fato que "Bela" aparece tanto como chefe do clã dos Benjamins como o primeiro rei Edomita. "Benjaminita" pode ter siso um tipo de eufemismo Herodiano para a sua oblíqua relação com o judaísmo.

Eisenman cita a nota do Talmude que os Rechabitas (=Naziritas) costumavam casar com as filhas do Sumo Sacerdote. Embora ela não faça a particular conexão Eu vou fazê-la, pois essa nota talmúdica me sugere uma nova e mais natural maneira de entender a acusação Ebionita de que Paulo se converteu ao judaísmo porque estava fascinado pela filha do Sumo Sacerdote e desejava bajular seu pai para ganhar sua mão. Agora, pense na narrativa dos Atos sobre o estratagema infeliz de Paulo, fingindo uma aliança Nazirita pagando para a purificação de quatro dos ativistas de Tiago (Atos 21:23-26) o quais se voltaram contra ele o que acabou conduzindo a desordens por "ativistas da Torá" de Tiago (não alguns judeus da Ásia Menor, como Lucas reportou) devido à tentativa de Paulo de profanar o Templo (atos 21:27-30). Como o uso de dinheiro para endossar o rito de purificação dos quatro homens parece ser uma variante da apresentação e rejeição da Coleta (Romanos 15:31), podemos suspeitar que a repulsa a Paulo como um pretenso Nazirita, essa decisiva rejeição da tentativa de Paulo de bajular o partido de Tiago tem sido figurativamente interpretada na propaganda posterior Tiaguista (i.e., Ebionita) como uma tentativa frustrada de Paulo fazer o que os Naziritas faziam, "esposar a filha do Sumo Sacerdote!" Porque escolher essa metáfora em particular para Paulo como um falso profeta? Devido às ressonâncias do "cortejador" como sedutor (de Israel), um enganador e falso profeta (cf., 2 Co 11:1-5 aonde Paulo redireciona precisamente a mesma acusação de volta aos "super-apóstolos" de Jerusalém).

Em relação à associação de Eisenman entre Paulo e o Pregador da Mentira que repudiava a Lei e traia a nova aliança, o inimigo do Mestre da Retidão de Qumran, uma tese que permeia inteiramente o livro, eu observarei apenas que as coincidências entre a retórica de Qumran e os vestígios de anti-paulinismo no Novo Testamento são no mínimo tão convincentes como aquelas convencionalmente aceitas como prova de Mateus alvejando Paulo em vários pontos de seu evangelho. Eisenman ameaça obscurecer seu próprio caso exagerando, referenciando muitas terminologias compartilhadas por Paulo e Qumran, algumas vezes utilizadas com sentidos diferentes, e insistindo que elas refletem mutuamente refutação e ridículo, mas os principais exemplos são impressionantes. E certamente a rotulação de Paulo, Tiago e Ananus nos Pergaminhos é muito mais natural que os palpites desordenados através dos quais especialistas convencionais em Qumran procuram identificar os principais personagens dos Pergaminhos com essa ou aquela figura Hasmoniana. (Admitidamente existem raras referências aqui e acolá para denominar figuras do primeiro século da EC, mas Eisenman não sustenta que cada simples pergaminho seja um produto do primeiro século da EC. Como poderia ele, quando seu argumento é que o "cristianismo" de Tiago foi um crescimento evolucionário a partir de uma espécie pré-existente "Essênia").

Uma questão que Eisenman deixa aberta é a verdadeira identidade existente atrás do fictício João "filho de Zebedeu". Quem poderia ter sido ele? Eu penso que temos um par de palpites. (E penso que vale a pena persegui-las dessa maneira demonstrando que a tese de Eisenman não se fia meramente sobre suas próprias impressões subjetivas, mas também em um método que pode ser assumido por outros obtendo seus próprios resultados. Uma vez que alguém absorve o talento, seu método se prova tão científico como qualquer um empregado sobre a forma e crítica redacional).

Primeiro, desde que Tomé/Tadeu é também chamado "Lebeu", uma aparente variante do título de Tiago "Oblias" (o Bastião = O Pilar), devemos supor que os herdeiros de Jesus e os Pilares eram sinônimos, o que de certa maneira torna o Pilar João um irmão de Jesus. (Eisenman supõe que deve ter existido um Pilar de nome João; é sua conexão com o Zé Ninguém "Tiago filho de Zebedeu" é que apresenta a dificuldade). Assim não há problemas em se aceitar o Pilar João como irmão real de Tiago, o Justo, de Judas Tomé e de Simão bar-Cleofas. Todos eram contados como Pilares ou Bastiões cuja presença em Jerusalém mantinha a cidade segura. E lembremos a curiosa questão com Tiago e João sendo cristianizados "Boanerges", que significa "filhos do trovão".

Mas porque João não aparece na lista de parentes em Marcos 6:3? Eu suspeito que seu lugar foi tomado por "Joset". A posição original de João como irmão de Jesus tem sido transferida para outro João, João Batista! Lucas torna o Batista tanto um sacerdote popular hereditário por linhagem como um "primo" de Jesus, da mesma maneira como uma tradição posterior faz Os irmão de Jesus Simão e Tiago seus primos. E um apocalipse anterior preservado no Chrysostom's Encomium on John the Baptist (ver E. A Wallace Budge's Coptic Apocrypha in the Dialect of Upper Egypt) é atribuído a "João o irmão do Senhor", implicando que talvez alguém, em algum lugar, lembrou-se da conexão original.

Mas e sobre o Joset de Marcos? Eisenman sugere que esse nome é simplesmente um disfarce substituindo ninguém mais do que Jesus, o que não é inconcebível. Mas eu sugeriria que Joset é uma reserve para João. O nome propriamente é um vestígio de uma lista que originalmente se leria, "Não é o carpinteiro, o filho de Maria e José, e irmão de Tiago, João, Judas e Simão"? Quando a vemos em Marcos 6 ela já foi misturada, Joset se tornando um dos irmãos e o pai de Jesus sendo retirado da lista. Mateus, aparentemente, pensou isso, assim ele tomou de Jesus o epíteto "o carpinteiro" e colocou-o sobre o pai de Jesus.

O livro de Eisenman James the Brother of Jesus frequentemente parece muito redundante e repetitivo, mas isso é o resultado dele ter mantido uma série de bolas no ar ao mesmo tempo. Ele tem que começar a explicar algo aqui, coloca aquilo em espera, vai para outra material que você precisa ligar ma primeira explicação, então retorna, vai para outra e outra então vota aos primeiros itens, relembra o leitor deles e finalmente monta todo o complexo mecanismo. Eisenman é como os cientistas da Renascença que tem que construir à mão todas as partes intricadas de uma invenção planejada. O livro é um oceano de teorias e abordagens instrutivas, uma maciça e profunda realização que deve abrir novas linhas na pesquisa do Novo Testamento.
Independente de acharmos que o retrato de Tiago apresentado por Eisenman seja convincente ou não deveríamos ficar gratos pela enchente de novas luzes que ele espalha em muitos assuntos incluindo as fontes dos Atos e seu método de redação.