terça-feira, 23 de novembro de 2010

Richard Bauckham, Raymond Brown e a pluralidade do movimento cristão

Há um texto chave no Evangelho de João a partir do qual podemos refletir sobre a pluralidade do movimento cristão nascente entre segmentos religiosos da região de onde emergiu. Ele ganha maiores cores quando o examinamos à luz de outras importantes passagens sobre o nascimento da igreja cristã.
João 4.1-42. A passagem por Samaria, o diálogo com a Samaritana e a imagem da colheita.

Antes, gostaria de expor uma questão ridícula por parte de alguns eruditos. Costuma-se apontar que nesta época do ano tal poço ( cujo termo empregado pegé também designa “nascente”) - que se alega ter sido objeto de descoberta arqueológica [1]- deveria estar transbordando, o que seria um sinal inequívoco, senão cômico, da não-historicidade do relato. J.P. Méier é um que, infelizmente, comete tal temeridade [2].

Sabe-se que, para um poço transbordar não basta haver chuva em uma determinada época. Condições agroecológicas determinantes da capacidade de infiltração de água, retenção de água no solo, capilaridade do solo, profundidade do solo, que estão interligados com a fitofisionomia do local; isso sem contar que variações no índice pluviométrico ocorrem, pode haver anos em que determinado índice de determinado mês sofra grandes variações, ainda mais extrapolando vários séculos. Por isso considero no mínimo irresponsavelmente precipitado alguém querer ser tão seguro numa afirmação como essa. [ Nota de acréscimo: segundo o professor D.A.Carson, o poço teria pelo menos 30 metros de profundidade, e Jesus teria se encontrado lá à hora sexta, ou meio-dia [3]].

Esta passagem de João nos remete a diversas alusões para com o Antigo Testamento e expectativas messiânicas, com implicações para grupos e povos como os Samaritanos, vizinhos mas repudiados pelos judeus, em que se estabelece a importância da tradição ser guardada, memorizada e relatada pela sua significação por um ambiente de grupos oriundos, ou compostos significativamente por pessoas ligadas a eles. A começar pela passagem da Judéia para a Galiléia por Samaria; habitualmente seguia-se o vale do Jordão. Poderia remeter à profecia de Isaías 11.12:, em que O Espírito de Deus “reagrupará os banidos de Israel e reunirá os dispersos de Judá”. Confira Os. 2.2; Ez.37.16-24. A referência aos maridos da samaritana remete a II Reis 17.24-41 [4], a respeito das divindades das 5 tribos babilônicas que se estabeleceram em Samaria após a conquista do Reino do Norte. Josefo, em Antiguidades Judaicas, IX, 14,3, dedica uma menção e reflexão a respeito. Nesta passagem de Reis, de forma mais aproximada, implica na verdade que teriam sido 7 divindades, pois duas das tribos levaram duas divindades, passando a adorar YHWH igualmente.

A perspectiva "messiânica" samaritana tinha ênfase no papel deste como profeta e sacerdote, como o prometido em Dt.18.15, o profeta semelhante a Moisés. Não advogamos aí as injunções forçadas quanto ao “Messias Filho de José” para com o evangelho. Embora possamos refletir paralelamente uma figura remetida por muitos judeus cristãos a Jesus, à qual a comunidade de Samaria iria se opor- o ‘Filho de Davi”, que seria a vindicação dos judeus ante os gentios e samaritanos, inclusive em questões territoriais. Jesus parece ter tido uma relação quase ambivalente com essa perspectiva, assumindo partes dela e também negando outros aspectos. Quando no encontro com a mulher siro-fenícia [Mt. 15.21-28], Jesus ironiza-a clamando por ele como “Filho de Davi”, pois pela lógica ela teria era medo e/ou ojeriza com essa figura, que seria perigosa para ela e seu povo. Como muitas outras vezes, Jesus não é condescendente com quem pode se aproximar dele com dubiedade, dissimulação. Tal figura seria um adversário para ela, alguém que poderia lhes ( i.e., ela e seu povo) expulsar da terra...estaria ela sendo dissimulada apenas para obter o que queria, ou manifestava uma fé sincera? O restante da história mostra que não era o caso, que para ela a aflição de sua filha era mais importante do que os conflitos.

Podemos visualizar a imagem da "água viva", e a referência antecedente a “dom de Deus”, na ótica da esperança do "messias" sacerdotal. À luz da passagem da leitura messiânica de Dt. 18.18, o "messias" seria o Profeta à semelhança de Moisés, um libertador; João retrata que alguns dos discípulos mais chegados de Jesus compartilhavam de tal expectativa, vide a menção a “aquele que Moisés escreveu na Lei” (1,45), no convite de André para Natanael em João 1.45. Raymond Brown [5] assevera sobre a fala da personagem da mulher samaritana: “Em nenhuma parte mais Jesus é chamado ‘Salvador’ durante o ministério público. Contudo, o mais que se pode provar de Jo 4,4-42 é que os samaritanos usam um título que não é tradicionalmente messiânico – não há nenhuma alusão à preexistência”.

Samaritanos esperavam o “Taeb” [6], uma figura "messiânica" de menos vulto (tanto que não se vê de forma comum referências a ela como Messias), de caráter sacerdotal. Aqueles que buscam afirmar que o evangelho joanino apregoaria que Jesus se identificara como o enviado divino da perspectiva samaritana necessitam crer que as diversas partes em que se recusa a se auto-identificar tanto com as reivindicações samaritanas quanto as dos judeus, foram uma inserção posterior corretiva...pois invocando a imagem do Ruah – em pneumati kai aletheia – transpassaria-se as conotações de disputas políticas e territoriais em seu messianato... Estaria significando “não sou o messias da política de aspiração de poder judaica nem a samaritana”, transcendendo os dois ideários. Nesse ponto, podemos entender o que, no ponto de vista de seus opositores, teria sido um insulto a Jesus ao lhe dirigirem a pergunta retórica “Você é um samaritano?”(Jo.8.48). O autor do evangelho, na passagem que temos referente ao versículo 22 neste mesmo capítulo 4, deixa claro que não estava usando Jesus para uma apologia do movimento samaritano contra o judaico.

Alguns exegetas ingenuamente acabam partilhando do ponto de vista dos interlocutores e concluem que de fato Jesus se identificara com o partido Samaritano. Lamentamos tamanha ingenuidade. Pois com pouco esforço de raciocínio nos lembramos que um grupo extremista, que se afirma pelo contraste com outro grupo, tende a pensar das posições não-alinhadas como tomar partido com os outros. Recentemente, não o vimos tais declarações por parte de autoridades estadunidenses em sua guerra unilateral contra o “Terror”? Não eram assim também ambos os lados da Guerra Fria? Novamente lembramos que não basta buscarmos apenas lançar mão de dados para ter erudição, senão caímos na falácia estatística das “imagens semi-aderentes”; é importante antes o bom concatenar lógico das proposições. Coerentemente, teriam que especular se Jesus teria mesmo parte com o demônio...

O cenário didático da colheita é corrente em Jesus. Por exemplo, confira-se Mt. 9.37. A semeadura ocorria em outubro/novembro e a colheita-março/abril. Se estabelece aí um contraste entre os campos literais verdes, ainda longe do tempo da colheita. “Levantai e vede”: grupos samaritanos vindo de Sicar. Os campos da missão dão os sinais de que estão no ponto de colheita. Então, já haviam sido semeados anteriormente! Era para os discípulos participarem da alegria dos trabalhadores anteriores, e não serem recalcitrantes por não terem sido eles– vs. 36-37. Afinal, como a fala no evangelho de Marcos, “Aquele que não está contra nós é a nosso favor” - Tradução Bíblica Ecumênica. Quem semeara? Terá sido por isso que Jesus “necessitou passar por Samaria?” Vs. 38 – o trabalho dos cultivadores será proveitoso para a comunidade cristã, para a Igreja. Interessante essa imagem. Se o Cristo é o semeador, e os apóstolos os colhedores, os outros então cultivaram a partir do trabalho de Cristo, e não por conta própria.

Podemos perceber que neste evangelho poderia estar contido[7], de forma embutida ou mais clara para aqueles do seu contexto, uma resposta a questionamentos sobre o papel de samaritanos e grupos ligados a eles na igreja cristã; os que supostamente promoviam este questionamento podiam se apegar a Mateus 10.5, considerando, como no apontado por Bauckham [8] , que é um erro considerar os evangelhos como destinados apenas às comunidades locais, e sim que a partir delas eles tinham a perspectiva da difusão entre as igrejas e delas para a evangelização. Especificamente quanto ao ambiente da comunidade joanina, acompanhamos Raymond Brown [9]: “longe de ser um cristianismo de isolamento, ele foi um confronto em plena corrente com as sinagogas e outras igrejas, e que apesar de tendências sectárias, ele orava pela unidade com os outros cristãos. Mas era um cristianismo desafiadoramente diferente e volátil – tão volátil que estava destinado a ser absorvido nos movimentos cristãos mais amplos (de direita e de esquerda) que surgiam no primeiro século".

Esse motivo no evangelho, de buscar apontar a legitimidade das missões a partir de Samaria, pode mostrar as ligações precoces logo no início da atividade missionária da igreja, dentre os conversos samaritanos e helenistas, e que estaria também ligado também à polêmicas cristológicas, envolvendo a alta cristologia da perspectiva do evangelho joanino. Assim, desconstruiria-se os argumentos de que encontrar indícios de pensamento helenista, ou de âmbitos culturais além de estritamente judaicos, em textos neotestamentários - especialmente evangelhos - é certeza de que seja desenvolvimento tardio. Não adoto aqui a perspectiva radical de que o evangelho joanino é uma costura de diversas tradições independentes e criadas em épocas diferentes, sendo o “discípulo amado” narrador uma figura simbólica ou um “rosto coletivo”, a personificação do grupo [10].

Podemos saltar para, bem mais à frente, um episódio crucial para a expansão do movimento cristão. Em Atos, o discurso de Estevão parece trabalhar em cima da Torá Samaritana. Vemos isso analisando-se à luaz de temas quanto à idade de Terach implicada como 145, não 205 anos. Abraão sepultado em Sh'kem. Filo de Alexandria, em “De Migratione Abrahami”[11], coloca que Abraão deixou Haran depois da morte de Terach. Também no seu discurso há influência do livro de “Jubileus”, no enterro dos ossos dos irmãos de José em Heron – Jb 1.27-29; 2.1.

O caráter indissiocrático das idéias de Estêvão, comparadas com o evangelho lucano e com Atos – destacando os demais discursos onde se apresenta ideias coerentes com o que se mostra ser a do compilador do livro- atesta para a fonte independente do discurso [12], sem dúvida de origem dos “helenistas” cristãos [13], ou como especulamos mais aqui, dos conversos samaritanos, acrescentando a importância dada ao patriarca José característica do imaginário efraimita. O livro o apresenta como “denunciado” pelos judeus da dispersão que eram ex-escravos (At 6.9).

Os helenistas foram a Samaria com a perseguição. Não acredito que apenas a oposição ao culto do Templo serviria como elo tão forte. Importante: eles não tinham comprometimento apologético nem com o Templo, tampouco com o Monte Gerazim, tal como Jesus. Para o evangelista, eles tinham contemplado a Shekinah, ou seja, Jesus era lócus do culto. Ele “habitou entre nós”, retoma a idéia do Tabernáculo, ou da resposta de Deus a Davi-Salomão, de que ia de tenda em tenda.

Os Sete, incluindo Felipe, que era dotado de desenvoltura para pregar entre gentios e samaritanos (At 8.4-13 e 26-40) – terão sido um grupo-referência, não contando com o status dos Doze mas sendo também um referencial alternativo? Os helenistas encontraram acolhida em Samaria porque ali poderia já existir um grupo coeso, importante? Então, tal grupo já vinha dos tempos da atividade de Jesus. Isso possibilitou a missão saída da perseguição desencadeada após o martírio de Estêvão, e daí Pedro e João foram enviados lá a partir das notícias – Atos 8.14, expressando o quadro desenhado em Jo. 4.38. Serviram então ali como uma ponte, um referencial maior entre os dois grupos, o mais identitariamente judaico e o nem tanto. Tiago passara a ser o Bispo de Jerusalém, no lugar de Pedro...este, é encostado na parede por Paulo por se intimidar pelo “partido judaizante”, tendo passado por uma saia justa em um momento que tinha que tomar uma posição(Gl. 2.11-14). E João (além da grande probabilidade de fundar/ dirigir comunidades na Ásia Menor, especialmente Éfeso)?..
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Referências:

[1] BROWN, Raymond E. The Gospel According to John I-XII [2] MEIER, J.P. Um Judeu Marginal.[3] CARSON, D.A. The Gospel According to John.[4] CULLMAN, Oscar. Das origens do Evangelho à formação da teologia cristã. [5] BROWN, Raymond E. A comunidade do discípulo amado[6] SCARDELAI, D. Movimentos Messiânicos no tempo de Jesus: Jesus e outros messias.[7] CULLMAN, Oscar. Early Christian Worship[8] BAUCKHAM, Richard. The Gospels for All Christians: Rethinking the Gospel Audiences[9] BROWN, Raymond E. A comunidade do discípulo amado [10] - BAUCKHAM, Richard. Testimony of the Beloved Disciple, The: Narrative, History, and Theology in the Gospel of John - HENGEL, Martin. Johannine Question - MOLONEY, Francis J., HARRINGTON, Daniel J., The Gospel of John[11] ALEXANDRIA, Philon. De Migratione Abrahami.[12] BLOMBERG, Craig. From Pentecost to Patmos: An Introduction to Acts Through Revelation [13] HENGEL, Martin. Acts and the History of Earliest Christianity

Perseguição no cristianismo Primitivo

Observaste o procedimento correto, caro Plinio, lidando com os casos daqueles que foram denunciados a ti como cristãos. Pois não é possível estabelecer uma regra geral para servir de parâmetro. Eles não devem ser perseguidos. Se eles forem denunciados, e for provada a culpa, eles deverão ser punidos, com esta ressalva, qualquer um que negar que é cristão, e provar isso, istoé, adorando os nossos deuses, mesmo que tenha sido suspeito no passado, obterá perdão mediante seu arrependimento. Mas acusações anônimas não devem ser admitidas nos processos. Por isso, além de perigoso, não se coaduna com o espírito de nossa época.
[Imperador Trajano para Plínio, o Moço; em Cartas 10:97]

A carta acima, escrita em 110 DC, faz parte da ampla correspondência entre o Imperador Trajano (98-117 DC), e Plínio, o Moço, então governando a província da Bitínia. Entre os assuntos tratados, está a questão dos cristãos. Como já discutimos aqui, Plínio encontrou um grande número deles na província, e não sabendo muito bem o que fazer, e tendo recebido algumas denúncias, interrogou os acusados. Os que confessaram (ser cristãos), foram interrogados segunda e terceira vez, agora sob ameaça, e os que não se retrataram foram executados (ou enviados a Roma, se fossem cidadãos romanos), pois como o próprio Plinio afirma "independente da natureza de sua crença, teimosia e obstinação inflexível certamente merecem punição".

Em certo momento, entretanto, Plínio começa a questionar: "devo puni-los apenas porque usam o nome de cristãos, ou há algum crime associado ao nome que mereça punição?". Para esclarecer suas dúvidas, interroga cristãos que se retrataram ou tinham abandonado o grupo anos antes, e descobre os "horríveis segredos" da seita :
"se reuniam num dia fixo, antes de nascer do sol, cantar um cântico a Cristo como seu deus, e se comprometiam sob juramento, não com algum crime, mas a abandonar o furto, o roubo, o adultério, a infidelidade e não se apossar dos bens a eles confiados. Findos estes ritos, tinham o costume de se separarem e de se reunirem novamente para uma refeição comum e inocente". E mesmo essas reuniões "secretas" deixaram de ser realizadas quando "após a publicação de um edito teu onde, segundo as tuas ordens, se proibiam as associações secretas".

Plínio, inconformado, e ainda incrédulo, entende ser necessário "extrair a verdade", e manda interrogar duas escravas, que eram líderes cristãs, chamadas diaconisas, sob tortura (como rezava o bom direito romano de então), e, se torna ainda mais perplexo em descobrir que embora se tratasse de uma superstição depravada, disso ele tinha certeza, dificilmente podia ser considerada perigosa, pois não era subversiva ou revolucionária, ou de alguma forma criminosa. Plínio decide então suspender o inquérito e pergunta a Trajano, O que eu faço agora?

Trajano endossa a percepção de Plínio, e acrescenta que os meios estatais não deveriam ser utilizados contra os cristãos, uma vez que nenhum crime ou ameaça concreta estavam associados ao grupo . Somente se provocados os oficiais romanos deveriam agir. E denúncias anônimas sequer deveriam ser consideradas. Mesmo após a denúncia, todas as oportunidades eram concedidas para que o acusado se livrasse do castigo. Trajano enfatiza que o que se demandava dos cristãos, se denunciados, é que obedecessem as determinações dos magistrados e adorassem aos deuses romanos.

Se como diz Plínio os cristãos não ofereciam perigo (e inclusive faziam juramentos de não fazer o mal), pode-se questionar a lógica de tal orientação, afinal:
Mas porque os cristãos foram perseguidos?

Paula Frederiksen, Professora da Universidade de Boston, explica que as primeiras perseguições contra os cristãos foram aleatórias, esporádicas e locais. Em muitos casos, os cristãos tinham relativa liberdade, até mesmo visitando e assistindo seus irmãos de fé presos, havendo casos de pessoas que mesmo sob custodia, como Inácio de Antioquia, visitavam igrejas. Isso ilustra o que o esta escrito com todas as letras na correspondência entre Plinio e Trajano: ser cristão não era motivo para alguém ser preso [1].

Já o Professor Graeme Clarke, da Universidade Nacional da Austrália, observa que a natureza não sistemática e esporádica das perseguições aos cristãos era semelhante a observada contra outros grupos considerados exóticos (astrólogos, adivinhos, magicos e assemelhados). Os cristãos estavam ipso facto, potencialmente, no lado errado da Lei, mas para que houvesse perseguição efetiva havia necessidade de que as circunstâncias locais favorecessem essa possibilidade, especialmente como resultado de agitação popular (tanto de fervor religioso, ou medo causado por terremotos, secas, inundações, praga ou fome), e, até, ocasionalmente, a própria ousadia de alguns cristãos. Em todo, continua o Prof. Graeme, era a pressão de baixo, da base que causava tais episódios, e não a iniciativa imperial. A atitude imperial era passiva até confrontar-se com um caso ou casos particulares, e estava geralmente confinada ao nível local e provincial. As fontes posteriores tenderiam a universalizar e exagerar as perseguições dos cristãos, o que não correspondeu a realidade ao longo do II e primeira metade do III século.[2]

As fontes pagãs e cristãs fixam como início da perseguição romana aos cristãos o reinado de Nero (54-68 DC), posteriormente ao grande incêndio de Roma em 64 DC [3] Professor Herbert Benario, Emory University, observa que os por conta de sua recusa a adorar o Imperador, seu estilo de vida, e suas reuniões "secretas", não eram muito populares. Além disso dois de seus maiores mestres estavam em Roma, Pedro e Paulo. Assim, continua Benario, eles eram "bodes expiatórios" perfeitos. Individuos a qual a maioria dos romanos desprezavam, e que nutriam crenças "estranhas". Nero planejou tudo com precisão e crueldade. Cristãos foram expostos a bestas selvagens, incendiados. Contudo, as execuções foram tão cruéis que acabaram despertando a compaixão da população. Assim, conclui Benario a tentativa de Nero de desviar as suspeitas acabou se voltando contra ele, sua popularidade, até mesmo entre os mais humildes, foi irremediavelmente prejudicada [4]

Após a morte de Nero (68 DC), seguiu-se uma Guerra Civil. O ano de 69 teve quatro imperadores (Galba, Vitélio, Oto e Vespasiano). Ao final daquele ano, Vespasiano (69-79 DC), conseguiu controlar a situação, inaugurando a dinastia Flaviana, ao ser sucedido por seu filho Tito (79-81). Durante esse período, o império parecia ter esquecido os cristãos, cujo número só aumentava. No ano de 81, Domiciano sucedeu Tito. Seus primeiros anos de reinado foram tão benignos aos cristãos quanto haviam sido seus antecessores. Mas no final de seu reinado (95-96 DC) desabou a perseguição, que parece ter sido inicialmente direcionada contra os judeus. Uma vez que o Templo de Jerusalém havia sido destruido na Guerra Judaico Romana de 66-73 DC, Domiciano determinou que a oferta anual dos judeus enviada a Jerusalém deveria ser destinada ao Tesouro Imperial. Muitos resistiram, e o Imperador reagiu violentamente. Como, à época, a distinção entre judeus e cristãos não estava completamente estabelecida, os servidores imperiais começaram a perseguir todos os que praticavam "costumes judaícos", atingindo ambos os grupos. [5]

Embora basicamente restrita a cidade de Roma e a Asia Menor (na atual Turquia), ela atingiu até a família imperial. Domiciano mandou executar seu primo, o Consul Flavio Clemente, e mandou para o exílio Flávia Domitila, esposa dele, e puniu também vários nobres, sob a acusação de "ateismo" (negação dos deuses romanos estabelecidos, acusação recorrente contra os cristãos) e "costumes judaicos". Provavelmente, entre esses nobres haviam conversos do judaismo e cristianismo. A perseguição durou pouco mais que um ano. Logo Domiciano seria assassinado (96 DC), e assim como Nero, o Senado Romano o declarou tirano, ordenando que seu nome fosse apagado de monumentos e inscrições. [5]

Tertuliano (cerca 200 DC) faz uma referência a um édito de Nero contra os cristãos, que foi sido utilizado por Domiciano, embora de forma mais branda e por um breve período:
"Consultai vossas histórias. Verificareis que Nero foi o primeiro que atacou com seu poder imperial a seita Cristã, fazendo isso, então, principalmente em Roma. Mas nós nos gloriamos de termos nossa condenação lavrada pela hostilidade de tal celerado porque quem quer que saiba quem ele foi, sabe que nada a não ser uma coisa de especial valor seria objeto da condenação de Nero. Domiciano, igualmente, um homem do tipo de Nero em crueldade, tentou erguer sua mão em nossa perseguição, mas possuía algum sentimento humano; logo pôs um fim ao que havia começado, chegando a restituir os direitos daqueles que havia banido. (...) Que Trajano por muito tempo tornou nula proibindo procurar os cristãos? Que nem Adriano, embora dedicado no procurar tudo o que fosse estranho e novo, nem Vespasiano, embora fosse o subjugador dos Judeus, nem Pio, nem Vero, jamais as puseram em prática? " [6]

Muito se discute em relação a esse Édito de Nero e sua utilização pelos seus sucessores. Maurice Crouzet observa que, em todo caso, Trajano reduziu significativamente sua eficácia ao proibir tanto as denúncias anônimas, quanto ao instruir que os cristãos não deveriam ser procurados. Posteriormente, Adriano (118-137 DC) tornou o edito de Nero efetivamente letra morta ao determinar que somente ofensas objetivas a Lei deveriam ser analisadas, e não o simples fato do acusado ser cristão [7]. Mas, ainda assim, como vimos, a recusa em adorar aos deuses diante de um tribunal era uma ofensa a Lei, e essa parece ter sido a "ofensa a Lei" que levou muitos cristãos a execução. Em todo o caso, não há notícia de perseguição organizada contra os cristãos por Vespasiano e Tito, sendo provavél que as orientações de Trajano a Plínio fossem apenas a formalização de uma política já adotada por seus antecessores. Que foi seguida, em linhas gerias, pelos imperadores Adriano e Antonino Pio (138-161 DC). Logo, Nero e Domiciano foram uma excessão a regra.

Dois aspectos estão ligados a perseguição aos cristãos. O primeiro era a desconfiança de Roma relativa as associações voluntárias, o que englobava não só o cristianismo mas também grupos como astrólogos, adivinhos, mágicos e algumas religiões de mistério. A segunda, e mais séria, é a questão do culto público ao Imperador e aos deuses ancestrais.

Em sua Carta, Plínio relata a Trajano que havia dado curso a seu edito que proibia as associações secretas, o que atingira aos cristãos, que tiveram de alterar sua forma de se reunir. Existia o costume de grupos ligados por interesses comuns (corporativos, religiosos, funerários) se associarem em "Collegium". Tais associações eram comuns, necessárias e disseminadas no Império, mas também eram acompanhadas de perto, pois podiam "degenerar" em objetivos políticos. Por isso a preocupação de Plínio, com rigor um tanto excessivo, empregando até mesmo tortura, em se assegurar que os cristãos não representavam risco ao estado.

Professores John D. Crossan e Jonathan Reed relatam outro episódio que deixa isso claro.

"Plínio pedira permissão para organizar um "collegium" para cerca de 150 bombeiros na cidade de Nicomédia. Incêndios haviam danificado o Templo de Ísis e o santuario da deusa Men. Plínio esperava receber permissão para criar uma brigada de combate ao fogo, assegurando a Trajano que "não seria difícil manter sob observação tão pequeno número de homens" (Cartas 10:33). Mas como as próprias cartas atestam, Trajano nega o pedido e explica as razões:"Quando as pessoas reunem-se com propósitos comuns, não importando o nome que lhes demos nem as razões que possam ter, logo transformam essa reunião em clube político. A melhor política será providenciar equipamentos e ensinar os proprietários a usa-los, pedidndoajuda de outros se acharem necessário". (Cartas 10:34)Incêndios poderiam ameaçar propriedades e vidas, mas não podiam ameaçar as regras imperiais de integração da política com a religião enquanto sutíl e única operação de poder [8]

Assim, existia a preocupação dos oficiais romanos com o carater basicamente associativo dos cristãos. Contudo, essa preocupação existia com outros cultos e a postura típica era vigiar, controlar, acompanhar, monitorar, mas raramente proibir ou utilizar os recursos do estado para perseguir. Trajano sabia que os cristãos existiam, que eles se associavam em caráter "secreto", que estavam em grande número (Plínio diz que o "contágio" do cristianismo tinha sido tal que os Templos tinham ficado desertos e os ritos religiosos negligenciados, mas que ele estava resolvendo a situação), mas orienta que não deveria haver esforço para elimina-los. Eles não ofereciam risco e não eram motivo de maiores preocupações.

O segundo, e mais importante, motivo para a perseguição aos cristãos passa pela relação entre a religião e o estado romano, como Crossan e Reed, descrevem:
"A religião romana pertencia ao estado, existia para ele e, portanto, era por ele controlada. A obras "Das Leis" de Cicero, expressa a atitude romana consensual de que "ninguém deve ter deuses para si mesmo, sejam deuses novos, ou estrangeiros, a não ser que o estado os reconheça". Essa idéia explica as tensões crônicas e repressões períodicas depois da entrada de elementos religiosos estrangeiros em Roma. Dois exemplos são suficientes . O Império reprimiu certas devoções do Dionisio grego, o Baco Romano, e outras ligadas a mãe e deusa anatólia, Cibele, a Magna Mater" [9]

Existiam, literalmente, centenas de divindades, cultos e seitas no Império. Contudo, interesses religiosos e políticos caminhavam juntos, e, quando necessário, os deuses de Roma e o culto ao Imperador deveriam ser atendidos, para manutenção do bem do Império. "Ninguém deve ter deuses para si mesmo".

Paula Fredriksen observa a necessidade, na concepção vigente na Roma pagã, de se honrar os deuses locais, associados as cidades e povos do Império. Cada pessoa, não importa suas inclinações pessoais, devia ser leal aos deuses e práticas religiosas de seus ancentrais.

"O problema, então, do ponto de vista da cultura dominante, não era que cristãos gentios fossem "cristãos". O problema era que, seja quais fossem as práticas religiosas que essas pessoas escolhessem seguir, elas ainda eram, para todos os efeitos, "gentias". Quer dizer, os cristãos permaneciam como membros de de um genos (povo) ou natio (nação) particular, com obrigações para com os deuses de seu "genos", que eram os deuses da maioria das pessoas. Do final do primeiro século até cerca de 250 da era cristã, estes cristãos poderiam sofrer dos ressentimentos e ansiedades locais, precisamente porque eles não estavam honrando os deuses da qual a prosperidade de sua cidade dependia. Como na famosa reclamação de Tertuliano "Se as inundações do Tibre atingem os muros, se as [cheias] do Nilo não atingem os campos, se os céus não se movem ou se a Terra o faz, se há fome ou peste, o grito logo se faz ouvir "Lançem os cristãos aos leões" (Apologia 40.2). Judeus cristãos praticamente não eram perseguidos, porque como judeus a não participação do culto público era uma prática antiga, tradicional e protegida por sólida jurisprudência. Obrigação ancenstral era o que importava." [10]

A vida com uma espada na cabeça: O efeito prático da política de Trajano foi que os cristãos tinham relativa tranquilidade, até que alguém tivesse disposição suficiente em acusa-los publicamente, ou que algum administrador provincial, zeloso de suas funções, decidisse reforçar o culto público ao imperador, ou que um Imperador quissesse dar mais ênfase as velhas tradições e ao culto aos deuses, ou que catástrofes levassem a população a achar que o favor dos deuses devesse ser reconquistado, castigando os "ateus" e "impíos" cristãos. Os epísodios de perseguição eram esporádicos e curtos mas, frequentemente, muito violentos.

Professor Stephen Benko, da Universidade da Califórnia, em seu livro "Pagan Rome and Early Christians", apresenta um exemplo que ilustra muito bem o que falamos acima:
"Em algum momento durante o reinado do Imperador Antonino Pio (86-161 DC), uma senhora casada tornou-se cristã, ainda que seu marido não tenha se convertido. Posteriormente, diferenças irrenconciliáveis surgiram entre os dois, e a mulher se divorciou de seu marido. Ele fez isso, simplesmente, dando a ele um repudium, istoé, uma carta de divórcio. O marido amargurado denunciou então sua ex-mulher as autoridades, sob acusação de ser uma cristã. Imediatamente, ela foi presa, mas o Imperador lhe concedeu liberdade provisória, para que coloca-se sua vida em ordem, antes de comparecer ao tribunal para responder as acusações. Então, seu ex-marido denunciou o instrutor dela na fé cristã, um homem de nome Ptolemaeus, que também foi preso, acorrentado, e levado para prisão, e suportou um longo período maus tratos. Finalmente, o dia de seu julgamento chegou, e ele foi levado diante do Juiz, Urbicus. Urbicus fez uma unica pergunta a Ptolemaeus: "Tu és cristão?" Quando ele respondeu afirmativamente, ele foi condenado a morte, e como sentenças de morte eram aplicadas imediatamente, levado para a execução. Um certo Lucius, que testemunhou o julgamento, levantou-se indignado e gritou para o Juiz: "Porque aplicaste esta sentença? Foi esse homem acusado de um crime? Por acaso, ele era um adúltero, assassino, ou ladrão? Ele apenas confessou ser cristão? Urbicus então respondeu "Parece que és cristão também!" "Sim", disse Lucius, "eu sou". Prontamente, Urbicus mandou que fosse executado. Um terceiro cristão, também se apresentou, e recebeu a mesma sentença. Justino, o filósofo, e posteriormente, martir cristão (100 - 165 DC) soube desse episódio, e em protesto escreveu uma carta ao Imperador, que sobreviveu sob o nome de Segunda Apologia [11]

Ou seja, a mulher mancionada acima, Ptolemaus, Lucius e o terceiro cristão não identificado, podiam viver suas vidas de forma relativamente tranquila, manter casamento com incrédulos, ensinar o cristianismo, assistir procedimentos do forúm, por anos a fio, sem serem molestados. Contudo, caso tivessem inimigos dispostos a acusa-los publicamente diante das autoridades, e, dependendo da rigidez dos juízes, poderiam ter como destino a execução. Era uma condição que poderia até ser tranquila, mas sempre precária. A qualquer momento, uma denúncia podia levar a prisão e a morte. Entre as testemunhas dessa situação, esta um papiro (P. Ox XLII.3035), proveniente do Egito, que traz uma ordem de prisão, de 28 de fevereiro do ano 256, contra um certo "Petosorapis, filho de Horus, Cristão", residente na vila de Mermertha [12].

As Grandes Perseguições: Frederiksen observa que mesmo a primeira perseguição coordenada e universal, sob o Imperador Décio (249-251 DC), não marcou uma ruptura total com a politica anterior. Após décadas de crises, guerras civis e tumultos que atingiram o Império, Décio determinou que todos os cidadãos participassem do culto público, que envolvia sacrifícios e homenagens dedicadas ao Imperador. Apesar do grande número de supliciados, Décio não proibiu ou tentou exterminar o cristianismo (alías, nenhum Imperador o fez). Ele "apenas" ordenou que os cristãos gentios, quaisquer que fossem suas práticas peculiares, também observassem os ritos que, acreditava-se, asseguravam a boa vontade dos deuses (e os que não recusaram a cumprir a ordem, cristãos ou não, foram cruelmente torturados, até que o fizessem). O objetivo não era uniformidade religiosa, mas a "preservação" do "bem comum" [13]. Décio morreu em 251, e houveram algumas outras tentativas de reviver a perseguição contra os cristãos, por exemplo, sob o Imperador Valeriano entre 258-260 DC, mas com a ascensão do Imperador Galieno (260-268), houve um período de quase 40 anos de relativa paz para a Igreja, até a extremamente sangrenta "Grande Perseguição" dos cristãos sob o Imperador Diocleciano (284-305 DC) em 303. Conforme observa Frederiksen, quando a "Grande Perseguição" começou, uma grande Basílica ficava no caminho do Palácio de Diocleciano [13].

Crossan e Reed, complementam:
"À mente latina esses cultos iam além dos limites da religião apropriada e eram considerados "superstitio" , superstição. Roma queria dizer com isso não que eram a mesma coisa que magia, mas que se situavam além da crença. Superstição era o excesso imoderado e incontrolável a apenas uma forma de sagrado" [14]

Os cristãos dedicavam sua crença, de forma "imoderada" e "incontrolável" a apenas a uma forma de sagrado, o Cristo, que os desvinculava do culto de Roma ao Imperador e dos deuses de seus ancestrais. Logo, seu culto pode ser citado como um exemplo bem acabado de superstição na concepção romana. Não pelo que faziam, ou pelo que seu mestre havia feito. Não eram uma ameaça, reconheçe Plínio, ou um perigo a qual o estado deveria se ocupar, orienta Trajano. Seu verdadeiro crime era o que deixavam de fazer: adorar os deuses do estado quando solicitados. E isso era especialmente lembrado em situações de crise e calamidade.
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Referências Bibliográficas:
[1] Paula Frederiksen (2006), Christians in the Roman Empire, The First Three Centuries AD, in David Porter (2006), Blackwell Companion to the Roman Empire, fl. 602[2] Graeme Clarke (2005), "Third-century Christianity" in Alan K. Bowman, Peter Garnsey and Averil Cameron (Eds). "The Cambridge Ancient History: The Crisis of Empire, A.D. 193-337", fls. 616-624. Draft version disponível online em http://people.vanderbilt.edu/~james.p.burns/chroma/saints/Persecution.html[3] Tacito, Anais 15:44; Suetônio, A Vida dos Doze Césares, Nero 16:2; Tertuliano, Apologia 5:4[4] Herbert W. Benario, Nero In: De Imperatoribus Romanis:An Online Encyclopedia of Roman Rulers and their Families, http://www.roman-emperors.org/nero.htm, acesso em 18.08.2010[5] Justo L. Gonzalez Uma História Ilustrada do Cristianismo, Volume I, "A Era dos Mártires", fls. 57-60; ver também Suetônio, A Vida dos Doze Cézares, De Vita Domitian, 12.:2 e 17; Cassio Dio, Historia Romana, 67:4.[6] Tertuliano, Apologia, Capítulo V, versos 4 a 7, http://www.tertullian.org/brazilian/apologia.html#5[7] Maurice Crouzet, Historia Geral das Civilizações, Volume 4 - Roma e Seu Império[8] John Dominic Crossan e Jonathan Reed (2004), Em Busca de Paulo, fl. 236[9] John Dominic Crossan e Jonathan Reed, Em Busca de Paulo, fl. 230-231[10] Paula Frederiksen, Christians in the Roman Empire in the First Three Centuries ...., fls. 601[11] Stephen Benko (Stephen Benko, Pagan Rome and Early Christian, fl. 1; Justino Martir, 2ª Apologia, Capítulo 2[12] Graeme Clarke (2005), "Third-century Christianity" ..... fl. 638
[13] Paula Frederiksen, Christians in the Roman Empire in the First Three Centuries ...., fls. 602[14] John Dominic Crossan e Jonathan Reed, Em busca de Paulo, fl. 234

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Gerd Theissen, John P. Meier, Geza Vermes, Raymond Brown, e os milagres de Jesus

I . Introdução

Um conceito popular entre os céticos, se não entre estudiosos do Novo Testamento, é que os milagres de Jesus são melhor explicados como ficções acrescentadas pela igreja primitiva para acentuar a sua própria causa e a imagem de Jesus entre os potenciais convertidos. Muitos acreditam que os relatos de milagres de Jesus são semelhantes e não mais convincentes do que outros relatos de milagres do primeiro século. Há uma série de problemas com estas perspectivas. As mais antigas tradições sobre Jesus incluem os relatos do seu ministério com milagres. Eles estão interligados com as tradições mais antigas de ditos. Além disso, as atestações dos milagres de Jesus são excepcionalmente numerosas e diversificadas. Não há equivalentes no primeiro século. Para esclarecer, este artigo não equipara exorcismos de Jesus que não resultam em curas milagrosas com o seu ministério de milagres.

O que pretendo prover neste artigo são boas razões para crer que Jesus, seus seguidores contemporâneos, e seus inimigos contemporâneos, acreditavam que ele era um ministro de milagres. Acontece que eu também penso que - se pudermos deixar premissas naturalistas de lado- este artigo prevê justificação suficiente para explorar a vida e obra de Jesus em mais detalhes para ver se existe a possibilidade de que Jesus de fato realizara atos inexplicáveis. Tal investigação teria de ser muito mais extensa do que esta.

Existem várias evidências e argumentos que sustentam a tese de que Jesus era conhecido por seus contemporâneos como um operador de milagres. Vou me concentrar em quatro instrumentos históricos de inquirição: comprovação múltipla, padrões divergentes, cerência e dissimilaridade.

II. Múltipla Atestação

"Múltipla atestação argumenta que frases que aparecem em várias vertentes da tradição (geralmente visto como Mc, Q, M, L) ou em múltiplas formas (milagres, máximas, pronunciamentos, etc.) são susceptíveis de ser autênticas. A lógica é que quanto mais níveis da tradição a atestar um evento, o mais provável é ter alcançado o início da tradição ". (Darrell L. Bock, Studying the Historical Jesus, p. 201) Não somente a múltipla atestação indica a precocidade de uma tradição, mas “o mesmo dito ou traço de caráter é improvável que tenha sido" inventado" em várias comunidades cristãs independentes que preservaram partes da tradição do evangelho" (Graham Stanton, The Gospels and Jesus, p. 161). Segundo John P. Meier, "o critério mais importante na investigação dos milagres de Jesus é o critério de comprovação de múltiplas fontes e formas". (A Marginal Jew, vol. 2, página 619) Cada fonte de evangelho canônico, Marcos, Q, M, G, e João, afirma ministério com atividades de milagres de Jesus. Fontes menos amigáveis, como Josefo e o Talmude babilônico, também atestam a Jesus como um operador de milagres.

A. A evidência do Novo Testamento

1. O Evangelho de Marcos

É claro que as histórias de milagres de Marcos não são relatos fictícios criados por seu autor, mas sim herdados histórias de milagres "de muitas correntes de diferentes tradições da primeira geração cristã". (Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 618). Isto é provado, em parte, pela diversidade das narrativas de milagre e provérbios em Marcos. Total de 666 versículos de Marcos, 209 lidam com os milagres de Jesus. Estes versos são variados em forma e conteúdo. Há blocos de histórias de milagres (4:35-5:43), individuais, distintas histórias de milagres (9:14-29), histórias de milagres entrelaçada com narrativas mais amplas (6:7-8:21); e milagres individuais embutidos na pré-narrativa da paixão de Marcos (10:46-52). (Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 618) Além disso, as histórias de milagres de Marcos são variados. Elas são longos e circunstanciais, bem como curtas e incisivas (1:30-31). Elas são detalhadas, incluindo nomes de lugares e pessoas, e elas são sem descrições, não dando nem nomes nem lugares. Eles são curas físicas, milagres da natureza, exorcismos, e conhecimentos miraculosos. Jesus é retratado como ambos, realizando milagres e falando sobre seus milagres (3:20-30). Em suma, "quando se olha para esta vasta gama de diferentes correntes de tradições de milagres na primeira geração cristã, alguns já agrupados em coleções, alguns bocados de material desgarrado, Marcos sozinho – escrevendo como ele faz no final da primeira geração de cristãos - constitui uma justa refutação da idéia de que as tradições de milagres eram totalmente a criação da igreja inicial, após a morte de Jesus". (Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 620).

Além disso, pelo menos duas das histórias de milagres de Marcos contêm aramaismos: a ressurreição da filha de Jairo da morte (5:41) e da cura do surdo (7:34). Porque os escritores do evangelho estavam tentando atingir um público de língua grega, a maioria dos provérbios e narrativas são em grego. A existência de um aramaismo, portanto, é geralmente considerado como prova da formação inicial da tradição em questão. Veja Bock, Studying the Historical Jesus, página 202 ("O critério de características lingüísticas aramaicas argumenta que os traços de sintaxe aramaica ou formulação subjacente aponta para a idade da tradição e a autenticidade."). Assim, o fato de que duas das histórias de milagres persistiram em manter alguns aramaísmos argumenta fortemente para a sua existência precoce .

2. A fonte “Q”

Marcos não está sozinho na sua comprovação antecipada de Jesus como um operador de milagres. A chamada "fonte Q", amplamente considerado como tendo sido utilizada tanto por Lucas e Mateus, apesar de alguns dissidentes de hoje, também nos fornece atestado de ministério de milagres de Jesus. Q, embora geralmente considerada como uma fonte de provérbios, narra a cura, por Jesus, do servo do centurião (Mateus 8:5-13). Além disso, a Q contém diversas declarações atestando o fato de que Jesus era um fazedor de milagres, incluindo a declaração de Jesus para os discípulos de João Batista inquirindo sobre “se Jesus era o Messias:” Ide e anunciai a João o que você ouve e vê; os cegos vêem e os coxos andam, os leprosos são purificados e os surdos ouvem, os mortos são ressuscitados, e aos pobres é pregado o evangelho " - Mateus. 11:4-5. Veja também Mateus 10:1 -- 8; 11:20-24; 12:22-32 par. Assim sendo, embora não demonstrando nenhum interesse em "sensacionalizar " os milagres de Jesus, Q, no entanto, prevê comprovação independente do trabalho de Jesus com milagres.

3. O Material especial em Mateus e Lucas

"M", o material exclusivo de Mateus, e "L", o material exclusivo de Lucas, também contêm relatos de milagres. Para ser claro, "M" e "L" não são o material de que Mateus e Lucas apresentam em comum, através de Q. Pelo contrário, são os materiais que são exclusivos para o evangelho respectivos. Isto é, "M" é o material que é literariamente original de Mateus e "L" é o material que é literariamente original de Luke. Embora eu possa antecipar a tomar alguma atitude de desprezo para o "M especiais" e "L" material, eu acredito que a crítica é injustificada. Dada a natureza das tradições orais e até literárias, o fato de que Mateus e Lucas conservaram os materiais não preservados em Marcos é uma questão de oportunidade histórica ou preferência em vez de uma indicação de que essas tradições foram invenções simples pelos autores. Além disso, a prova é firme de que Mateus e Lucas foram relatar tradições bem estabelecidas em suas respectivas comunidades ou fontes, em vez de inventar histórias de milagres de por atacado.

A evidência histórica indica que o material exclusivo de Mateus constou de várias tradições preexistentes, mas não uma distinta, vasta, fonte escrita. A inclusão de fontes não-marcanas e histórias de milagres não vindas de Q é tanto mais significativa porque "em geral, o autor desenfatiza milagres". (E.P. Sanders, The Historical Jesus, p. 146) Não somente tende a encurtar as histórias de milagres de Marcos, como o autor de Mateus exclui alguns deles completamente. Em vez disso, Mateus concentra-se em ensinamentos éticos de Jesus. Por exemplo, Marcos começa a carreira de Jesus com alguns flashes de histórias de milagres, enquanto Mateus começa a carreira de Jesus com o Sermão da Montanha. Este não é um autor desdobrado sobre a promoção da ação milagrosa de Jesus. No entanto, apesar de Mateus desenfatizar os milagres, o seu material único, independentemente, preserva dois relatos distintos de milagres (14:28-31; 17:27). Assim, ele acrescenta outro nível de tradição que ateste a histórias de milagres de Jesus.

Material exclusivo de Lucas é composto por quase metade do seu Evangelho inteiro. Distinguindo-o de Mateus, porém, é a preservação de vários relatos independentes dos milagres de Jesus (5:1-11; 7:11-17; 8:2-3: 13:10-17, 14:1-6, 4 :29-30). Embora um pouco prejudicada pela consistência do Grego de Lucas, o estudo acadêmico do material exclusivo de Lucas tem produzido resultados muito mais amplos do que a avaliação mais limitada de material de Mateus. "A investigação sobre o Jesus histórico tem encontrado o conteúdo distintivo de Lucas, do ensino e da narrativa, como tendo um alto grau de autenticidade" (Robert E. Van Voorst, Jesus Outside of the New Testament, p. 137). Do material exclusivo de Lucas é pensado em consistir em menos fontes que Mateus. Embora não seja uma fonte em sua totalidade (a narrativa da infância, por exemplo, é considerada uma unidade interna distinta), a maior parte de "L" é comumente pensada a ser uma fonte escrita independente. (Van Voorst, Jesus Outside of the New Testament , pp. 137-38. Veja também Kim Paffenroth, The Story of Jesus According to Luke).

Uma razão para estudiosos estarem confiantes de que Lucas está perpassando ao longo tradições estabelecidas é por causa de ter demonstrado um uso cuidadoso de Marcos e Q. "A fidelidade geral de suas fontes M [arcos], e Q, onde estes podem ser identificados com certeza, faz alguém cético em relação a sugestões de que ele criou materiais no Evangelho em grande escala. É muito mais plausível que as atitudes próprias de Lucas foram, em grande medida, formadas pelas tradições que herdou ". (I.H. Marshall, The Gospel of Luke, p. 31) Essa fidelidade, embora não seja absoluta, é coerente com a finalidade declarada de Lucas em escrever seu Evangelho:

Na medida em que muitos têm empreendido pôr em ordem uma narrativa dessas coisas que foram cumpridas entre nós, assim como aqueles que desde o princípio foram testemunhas oculares e ministros da palavra entregada a nós, parecera bom para mim também, havendo tido perfeito entendimento de todas as coisas desde o início, escrever a você um relato ordenado, excelentíssimo Teófilo, para que você possa saber a verdade das coisas em que você foi instruído. (Lucas 1:1-4).

Assim, podemos estar confiantes de que material exclusivo de Lucas é derivado de outro desconhecido, mas tradições pré-existentes na comunidade cristã primitiva (talvez até mesmo uma significativa fonte literária).

Em suma, tanto o original em " M "e" L " materiais contêm referências independentes a ação milagrosa de Jesus. Esses materiais, além disso, já existiam em suas respectivas comunidades. Portanto, eles fornecem fontes independentes para o ministério de milagres de Jesus.

4. O Evangelho de João

Temos também o Evangelho de João, que a maioria dos estudiosos do Novo Testamento crê ser independente de Marcos e os outros sinóticos. Eu aceito este ponto de vista e considero as histórias em João de milagre a ser umas testemunhas distintas para o papel de Jesus como um operador de milagres. (Obviamente, a força deste ponto se baseia em um acordo sobre a questão da independência literária.) Apesar de sua independência, João contém os mesmos tipos de milagres como os Sinópticos, com alguns paralelos diretos: cura, milagres de erguer dos mortos, natureza, e do conhecimento profético. Tal como acontece com Marcos, Mateus e Lucas, a aplicação de críticas da forma e da fonte ao Evangelho de João revela que suas histórias de milagres são provenientes de fontes anteriores (seja por escrito, oral, ou relatos de testemunhas). W. Nicol, The Semiea in the Fourth Gospel. Tradition and Redaction, pp. 37-39, 109-10; Urban Von Wahlde, The Earliest Version of John's Gospel, pp. 116-23; Robert T. Fortna, The Fourth Gospel and its Predecessors; Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 637; Ben Witherington, John's Wisdom, pp. 5-11. Assim, João acrescenta, pelo menos, uma quinta fonte independente que ateste a ação milagrosa de Jesus.
*Nota do Tradutor

5. Sumário da evidência do Novo Testamento

A moderada estudiosa do Novo Testamento Paula Fredriksen, explica a força da evidência do Novo Testamento dos milagres de Jesus da seguinte forma:
Nós notamos que Jesus como exorcista, curador (mesmo ao ponto de ressuscitar os mortos), e operador de milagres é uma das mais fortes, mais onipresentes, e mais diversas representações atestada nos Evangelhos. Todas as camadas deste material - Marcos, João, M-tradições, L-tradições e Q - fazem esta reivindicação. Este tipo de comprovação independente suporta múltiplos argumentos para a antiguidade de uma determinada tradição, o que implica que a sua origem deve estar antes das suas tardias e variadas expressões, talvez na missão do próprio Jesus. (Paula Fredriksen, Jesus of Nazareth, King of the Jews, p. 114)”.

Barry Blackburn oferece um repartição específica da múltipla atestação do ministério de Milagres de Jesus:
A atividade de milagres no ministério de Jesus -, pelo menos, exorcismos e curas - facilmente passa no critério da múltipla atestação. Tais milagres são atestados em Q [Mateus 4:3 = Lucas 4:3; Mat. 8:5-10, 13b = Lucas 7:1-10; Mat. Lucas 11:4-5 = 7:22; Mat. 10:8 = Lucas 10:9, Mt 11:20-24 = Lucas 10:13-15; Mt 9:32-34 = 12:22-29 = Lucas 11:14-15, 17-22], Marcos, material exclusivo de Mateus [7:22, 9:27-31, 17:24-27; 21:14] e Lucas [4:18, 23-27; 5:1-11; 7:11-17; 8:2; 9 : 54; 10:17-20, 13:10-17; 13:32, 14:1-6, 17:11-21, 22:51, 23:8, 37, 39; 24:19], e os Evangelho de João (curas apenas), incluindo a "fonte de sinais". Atos milagrosos de Jesus também são atestados em várias formas de tradição oral isolada por crítica da forma: (1 controvérsia) [Marcos 3:1-6 par, Lucas 14:1-6, 13:10-17, Marcos 3:22-30; 2:1-12 par], escolástico [Mateus 11:2-19 nominal; par Marcos 9:38-40; par 11:20-25], e apotegmas biográficos [Lucas 17:11-19; Mat. 17:24 -- 27, Lucas 13:31-33]. Bultmann considera igualmente par Marcos 7:24-31 e Mateus 8:5-13 par como apotegmas (cf. History of the Synoptic Tradition, 38-39)], (2) provérbios dominicais, incluindo logia (sabedoria) [Marcos 3 :24-26 par], palavras proféticas [Mateus 11:21-24 nominal; 11:5-6 nominal; 7:22-23 par], as regras da igreja [Marcos 6:8-11 = Mat. 10:5-16 = Lucas 10:2-12], e "I" ditos [Mateus 12:27-28 par], (3) histórias de milagres, (4) lendas, e (5) a narrativa da paixão. (B.L. Blackburn, "The Miracles of Jesus," in Chilton and Evans, eds., Studying the Historical Jesus: Evaluations of the State of Current Research, pp. 356-57).

Examinado pelas suas fontes, portanto, o Novo Testamento oferece nada menos que cinco fontes independentes, que atestem o ministério de Milagres de Jesus.

B. O Testimonium Flavianum

Alguns rejeitam o forte consenso acadêmico que as referências de Josefo a Jesus são genuínas, embora embelezado. No entanto, concordo com o consenso acadêmico representado por tais estudiosos diversos e respeitados como Dominic Crossan, John P. Meier e N.T. Wright que a primeira e mais completa referência a Jesus por Josefo é parcialmente autêntica, com sinais de adulteração detectável que pode ser desconsiderada . Eu tenho explicado em pormenor os motivos para aceitar a autenticidade parcial da primeira referência de Josefo a Jesus aqui.

Segue-se a parte relevante da versão reconstruída do Testimonium Flavianum aceita pela maioria dos estudiosos do N.T.:
Neste momento, apareceu Jesus, um homem sábio. Ele era um fazedor de feitos extraordinários, um professor de pessoas que recebem a verdade com prazer. E ele ganhou seguidores entre judeus e entre muitos de origem gentia.

Como eu explico no meu artigo, a frase "fazedor de feitos extraordinários" tem um pedido especial forte de autenticidade. Cristãos geralmente evitavam este termo, pois poderia ser facilmente interpretado de modo neutro ou mesmo negativo, como "obras controversas". Observa o professor Van Voorst que a frase "é ambígua, mas também pode ser traduzida como" chocante / obras controversas. "(Jesus Outside of the New Testament, p. 78). O professor Vermes observa que “paradoxa” não é uma referência inequívoca para um milagre Divino. De fato, "os estudantes de Josefo parecem concordar que a palavra melhor expressar sua noção de “milagre" é um termo grego diferente". Vermes traduz como "sinal". Isto é especialmente verdadeiro quando o assunto diz respeito a um extraordinário feito conseguido por um homem de Deus. (Vermes, "The Jesus Notice of Josephus Re-Examined," Journal of Jewish Studies [Spring 1987], p. 7). O testemunho não usar o termo inequívoco, mas sim paradoxa. Segundo Vermes, paradoxa é simplesmente demasiado neutro para permanecer em pé sozinho como sendo uma atestação positiva. Embora Josefo usa este termo para Moisés e Eliseu, ele desvia do caminho para explicar que as ações descritas eram vindas de Deus. (Vermes, "The Jesus Notice," p. 8). Não é assim com Jesus. Obviamente, um cristão não iria deixar a questão suspensa no ar, mas seria mais decidido ao afirmar tais ações.

Dada a linguagem e teologia do texto reconstruído, é altamente improvável que Josefo usou o Evangelho, ou suas respectivas fontes, quando ele escreveu o testemunho. Também não foram os próprios cristãos uma fonte para seu material, especialmente para descrição evasiva Josefo de "ações extraordinárias de Jesus". Assim, a referência de Josefo constitui uma atestação independente, de origem judaica, para o ministério de Milagres de Jesus. Como afirma John P. Meier:
Para além da idéia de atrair muitos gentios durante sua vida, este conjunto de afirmações, tem exatamente a mesma configuração do ministério de Jesus como o fazem os Evangelhos. Raramente a comprovação da tradição do Evangelho por várias testemunhas literárias chega a abarcar tantas fontes diferentes, incluindo um não-cristão. Mas, tal é o caso aqui, bem como a certificação que inclui uma referência a supostos milagres de Jesus
(Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 622)

Assim, escrevendo cerca de 92 d.C., Josefo, preserva outra fonte para a tradição, uma atestação judaica para o ministério de Milagres de Jesus.

C. O Talmud Babilônico

Uma outra fonte judaica para o ministério de milagres de Jesus pode ser encontrada no Talmud Babilônico:
Foi ensinado: Na véspera da Páscoa penduraram Yeshu. E um locutor saiu, em frente a ele, por quarenta dias, (dizendo): "Ele vai ser apedrejado, porque praticou feitiçaria e induziu e conduziu Israel ao extravio. Qualquer pessoa que saiba algo a seu favor, venha e pleiteie em seu nome". Mas, não tendo encontrado nada em seu favor, penduraram-no na véspera da Páscoa.
(Talmud Babilônico, Sanhedrin 43a)

A referência a "feitiçaria" é claramente uma indicação de que Jesus realizou, pelo menos aparentemente, feitos milagrosos. É uma reminiscência das acusações das autoridades judaicas que Jesus estava na liga com Satanás (Marcos 3:22, Mateus 9:34, 12:24). Em geral, no entanto, essa referência apenas acrescenta pouco peso. O Talmud é, por comparação, uma referência mais recente que poderia ter sido em resposta às crenças sobre Jesus em um século mais tarde.

II. Padrões divergentes

Outra característica interessante sobre alguns dos milagres de Jesus é que eles realmente criam problemas desnecessários para os seus autores. Este fato dá origem ao que os estudiosos do Novo Testamento chamam o critério de padrões divergentes, muitas vezes conhecido como constrangimento. Ele sustenta que os fatos ou eventos, no Novo Testamento que teriam sido "constrangedores" para a Igreja primitiva são mais prováveis que sejam verdadeiros. "O critério de padrões divergentes argumenta que uma história que é mantida em face de sua dificuldade é susceptível de ser autêntica.... A lógica deste critério é claro: o texto difícil foi preservado porque ela pertencia a tradição". Bock, Studying the Historical Jesus, p. 201. Este critério aplica-se a algumas das narrativas de milagre, ou declarações sobre milagres, que são registradas nos Evangelhos. Por causa dos problemas que criam, é improvável que a Igreja primitiva teria inventado.

A. Um Líder Religioso Judaico

Marcos 5:22 coloca o líder de uma sinagoga em uma luz favorável:
E eis que um dos chefes da sinagoga chegou, chamado Jairo. E quando o viu, caiu a seus pés e implorou-lhe muito, dizendo: "Minha filha está no ponto da morte. Venha colocar suas mãos sobre ela, que ela pode ser curada, e ela vai viver....” Então Ele tomou a menina pela mão e disse-lhe: "Talita cumi", que traduzido, "Menininha, eu vos digo: Levanta-te".
Dado o conflito da igreja primitiva com as autoridades judaicas (mais forte, provavelmente com os líderes das sinagogas), e o retrato negativo dos líderes judaicos no evangelho, não faz sentido que os autores dos evangelhos iriam inventar um milagre colocando o líder em uma luz favorável. Além disso, especificamente em relação aos milagres, os líderes judeus são vistos como opositores dos milagres de Jesus (Marcos 3:1-5; João 5:4-10), sendo ofendidos por seus milagres (Mateus 21:14-15), tentando abafá-los ( João 9:13-41), ou apresentá-los como obra de Satanás (Marcos 3:20-30, Mateus 12:22-32). Mas, Jairo é mostrado a ter, e agir com fé em Jesus. Embora se possa argumentar que este episódio mostra os inimigos de Jesus tendo que vir a ele para receber ajuda, o papel de Jairo em qualquer oposição a Jesus não é mencionado ou mesmo sugerido. Assim, é improvável que inventar, ou transmitir, uma história de milagre falso apresentando um líder da sinagoga em uma luz positiva.

B. Jesus em Coligação com Satã

Marcos e “Q” incluem a acusação dos adversários de Jesus que ele era capaz de realizar milagres, porque ele estava na liga com o diabo. (Marcos 3:20-30, Mateus 12:22-32). Não só isto é duplamente confirmado, mas é uma fabricação improvável. Como afirma N.T. Wright, "a Igreja não teria inventado a acusação de que Jesus foi taxado como em liga com Belzebu, mas são acusações que não seriam passadas a diante a menos que fossem necessárias como uma explicação para algum fenômeno bastante notável." (N.T. Wright, Jesus and the Victory of God, p. 188). Parece, portanto, que os opositores religiosos Jesus fizeram essa acusação, e devem ter tido uma razão para o fazer. "É notável que os inimigos de Jesus não são apresentados como negando que ele fez feitos extraordinários, mas eles atribuíram-lhes as origens malignas, quer para o diabo (Marcos 3:22-30) ou nas polêmicas do 2º, à magia [Irineu , Contra as Heresias, 2.32.3-5]." (Raymond E. Brown, An Introduction to New Testament Christology, pp. 62-63).

Blackburn apresenta o seguinte:
Os exorcismos e a atividade de cura de Jesus são mencionados ou implícitos por umas poucas logias dominicais com fortes reivindicações de autenticidade. Na seqüência da acusação de que Jesus exorcizava como um feiticeiro, os dois, Marcos e Q, contêm duas parábolas dominicais, a primeira das quais, a parábola do "reino dividido" (Mc 3:24-26, Mt 12:25-26, Lucas 11:17 -- 18), quase certamente originou-se como uma defesa contra a acusação de estar possuído por demônios para as curas e / ou exorcismos. Só assim poderia a linguagem sobre Satanás sendo dividido contra si mesmo ser significativamente interpretada. Independentemente atestada por Marcos e Q, abordando uma acusação manifestamente não criada pela igreja, sua pretensão de ser um autêntico dito dominical é boa. (B.L. Blackburn, "The Miracles of Jesus", em Chilton e Evans, eds., Studying the Historical Jesus: Evaluations of the State of Current Research, pp. 356-57).

C. Jesus Falha em Executar Milagres

Outra declaração embaraçosa que até a igreja moderna tem dificuldade em conciliar é registrada em Mateus. Especificamente, Jesus admite que ele não fez milagres em Nazaré, sua cidade natal, por causa da falta de fé entre os seus residentes. (Mateus 13:58). Admissão de Jesus que ele não pode fazer milagres em Nazaré por causa de uma falta de fé não é algo que se espera que a igreja primitiva criasse. Os evangelhos saem de sua maneira de enfatizar, não diminuir a cristologia. No entanto, a declaração é gravada e transmitida ao longo da igreja primitiva como uma declaração de Jesus. Admissão de Jesus que ele não poderia fazer milagres em um lugar específico indica que ele foi pensado, por ele próprio e outros, como tendo realizado milagres em outros lugares.

III. Coerência

O critério de coerência é uma ferramenta comum de investigação histórica. É usado geralmente após algum material ter sido razoavelmente estabelecido como histórico por outros métodos. Ele sustenta que palavras ou ações de Jesus que se encaixam bem com o material histórico estabelecido acumulado tem uma boa chance de ser histórico. "O princípio da coerência argumenta que tudo o que é consistente com o que já é mostrado a ser autêntico tem também uma boa alegação de autenticidade". (Bock, Studying the Historical Jesus, p. 201) O argumento da coerência é relevante para os milagres de Jesus de duas formas: (1) O estoque inicial de narrativas e ditos de Jesus misturam-se com os milagres. Ou seja, os ditos completam os milagres e os milagres completam as palavras, (2) Os relatórios das ações surpreendentes de Jesus se encaixa bem com o fato de que Jesus conseguiu ganhar um grande número de seguidores durante o seu ministério.

A. Mensagem e Milagres

Que Jesus foi um defensor apaixonado da chegada escatológica do reino de Deus é a principal conclusão das obras de alguns dos mais respeitados estudiosos do Novo Testamento, como o Albert Schweitzer, E.P. Sanders, e N.T. Wright. Essa crença é apoiada por um grande número de palavras bem atestadas de Jesus e pela incontestável relação de Jesus com o ministério de João o Batista. Ajustando-se bem com o sucesso de Jesus como um professor escatológico são relatados seus exorcismos e curas. Exorcismos de Jesus são vistos como apresentações dramáticas e realizações parciais do triunfo escatológico de Deus sobre o mal através das ações de Jesus. Além disso, os milagres de cura mostram que Jesus cumpriu as profecias de figuras do Antigo Testamento, como Isaías. Talvez possa ser mais bem colocados desta maneira: ensinos fundamentais de Jesus e os milagres são complementares e interligados em nossas mais antigas tradições de ditos. "O que é notável em tudo isso é como cortar os ditos e feitos através de diferentes fontes e categorias das críticas da forma para criar um significado. Esta asseada, elegante, e não forçada "adequação" dos atos e ditos de Jesus, vindo de várias fontes diferentes, argumenta eloqüentemente para um fato histórico fundamental: Jesus realizara atos que ele e alguns de seus contemporâneos consideraram milagres". (Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 623).

B. Atração de seguidores

Jesus atraiu um grande número de seguidores durante o seu ministério. Isto é testemunhado pela fonte do material do Novo Testamento e Josefo. Estas fontes indicam que parte da razão que Jesus atraiu um grande número de seguidores de seu trabalho foram milagres. Certamente é verdade que o trabalho de Jesus operando milagres daria forte poder explicativo sobre a sua importância como uma figura religiosa do primeiro século. "Uma habilidade para operar cura, além disso, coerente com outro dado da missão de Jesus: Ele tinha um apoio popular, que tal capacidade ajuda a explicar." (Fredriksen, Jesus of Nazareth, King of the Jews, p. 115) Embora eu certamente considere o ensinamento do Sermão da Montanha um discurso impressionante, duvido da sua capacidade para atrair e manter grandes multidões. Alguns argumentam que esta seria também coerente com a resistência dos seguidores de Jesus. O movimento não morreu depois de sua morte. A maioria dos outros o fizeram. Embora plausível, a explicação mais provável para a resistência dos seguidores de Jesus é o motivo declarado por seus seguidores: a ressurreição de Jesus. Nossa melhor evidência nos diz que muitos dos seguidores de Jesus experimentaram aparições da ressurreição após sua morte. Sendo ou não a tradição o túmulo vazio remontada um tanto para trás (penso que sim), parece claro que muitos dos seguidores de Jesus atribuíram a sua missão contínua e coragem às aparições da ressurreição de Jesus. A centralidade da ressurreição para a pregação cristã primitiva (nas cartas de Paulo e nos discursos de pregação no início de Atos) acrescenta peso a esta explicação. Assim, enquanto a capacidade de Jesus para reunir muitos seguidores ou multidões durante seu ministério é coerente com os relatos de milagres, a persistência de seus seguidores após a sua morte é mais provável explicada por suas experiências de ressurreição.

IV. Dissimilaridade

Outra característica importante dos milagres de Jesus é a dissimilaridade do judaísmo, paganismo, e a Igreja primitiva. Não há exemplos de operadores de milagres comparável no judaísmo ou o paganismo contemporâneo com Jesus. Como observa o professor Raymond Brown:
Alguém deve ser cauteloso com a alegação de que Jesus foi retratado como o muitos outros professores operadores de milagre, judeus e pagãos, de sua época. A idéia de que tal figura era comum no século 1 é em grande parte uma ficção. Jesus é lembrado como combinando ensino com milagres intimamente relacionado com o seu ensinamento, e essa combinação foi única.
(An Introduction to New Testament Christology, p. 63)

O foco desta seção é sobre as curas de Jesus e os milagres da natureza, como não há evidência de outros exorcistas durante o tempo de Jesus.


V. Judaísmo

Dadas as muito diferentes visões de mundo de pagãos e judeus, um foco na história judaica e reclamações milagre é apropriado. Esse milagre dos créditos originados entre os seguidores judeus de Jesus é incontestável. Os autores de Mateus, Marcos e João foram os judeus. Assim também Paulo. Quanto a Lucas, as fontes para créditos seu milagre foram os judeus. Embora muitas pessoas acreditam que os tempos de Jesus estavam cheios de reivindicações dos trabalhadores sobre o milagre, Jesus e seu milagre de trabalho são únicas na história de seu povo e tempo.

No entanto, em seu artigo “vagabundos e charlatães do Império Romano", Richard Carrier tenta mostrar que os antigos do tempo de Jesus eram apenas demasiado ingênuos para ser confiáveis em seus relatos de milagres. Notavelmente, os únicos exemplos judaicos que ele dá são alguns reclamantes não messiânicos que prometeram milagres, mas não entregaram. Primeiro Carrier discute o egípcio e sua promessa - relatado por Josefo- que "sob seu comando, os muros de Jerusalém cairiam abaixo" (Ant. 20,170). Os romanos saíram em vigor e os seguidores do egípcio foram mortos, capturados, ou obrigados a fugir. O egípcio conseguiu escapar, mas não foi ouvido de novo. Apesar de sua afirmação de que ele iria realizar um milagre, ninguém realmente acreditava ou relatou que ele havia feito. Em seguida, o auto-denominado profeta Theudas reuniu um seguidor seguinte depois de prometer "que ele iria, pelo seu próprio comando, dividir o rio [Jordão]" (Ant. 20,97). Claro, ele também foi derrotado e seus seguidores espalhados. Theudas foi capturado pelos romanos e executado. Ninguém nunca alegou que ele era o Messias e depois e não há relatos de que ele nunca seguira completamente em sua pretensão de realizar um milagre. De fato, há um padrão aqui. Um líder judeu surge, afirma ser o Messias, e promete fazer milagres. O líder judeu é golpeado, os seguidores abandonar a causa, e são relatados sem milagres. Este é o oposto do que acontece com Jesus. Jesus é golpeado, mas os seguidores continuam com sua missão. Seus seguidores e não-seguidores tanto preservam as tradições múltiplas sobre o ministério de Jesus com milagres. Assim, o artigo de Carrier faz mais a acrescentar à singularidade dos relatos de milagres de Jesus que faz para enfrentá-los.

Talvez, porém, o trabalho de Carrier não seja exaustivo. Paula Fredriksen oferece uma linha semelhante, também não citando reclamantes messiânicos, mas referindo-se a uns supostos operadores de milagre judeus. Na verdade, há poucos "concorrentes" como operadores de milagre com Jesus para avaliar. Fredriksen faz apenas duas menções; são "Honi, o Desenhista de Círculos" e Hanina. Mesmo estes dois, porém, não são comparáveis com Jesus.

Os dois mais citados operadores de maravilhas judeus são Honi (Onias), o faz-chuva (ou desenhista de círculos), do 1 º século a.C., e o Hanina Galileu do 1º século d.C. Quase tudo o que é conhecido desses homens vem muito mais tarde, a literatura rabínica, e pelo tempo que as evoluções lendárias e teológicas tinham engrandecido o papel. Quase certamente não eram professores na mais antiga tradição rabínica, e é discutível se admirar que eles eram principalmente operadores milagrosos por seus próprios meios ou homens de oração persuasiva que trouxe ajuda extraordinária de Deus.
(Brown, An Introduction to New Testament Christology, p. 63).

Um exame mais próximo de Honi demonstra o ponto de Brown bem. Honi morrera cerca de 100 anos antes de Jesus. A primeira menção a ele é por Josefo, escrita em 93 d.C. Em seu ”Antiguidades Judaicas”, Josefo se refere a "Onias", que é a forma grega de Honi. Segundo Josefo, Onias era "um homem justo e amado de Deus, que uma vez durante uma seca rezou para que Deus trouxesse a seca ao fim. Ouvindo a [oração], Deus fez a chuva a cair."

Josefo se refere a ele um pouco como ele faz com João o Batista. Honi aparece de repente, é descrito de forma positiva, e é então condenado à morte. É também evidente que Josefo não faz referência a Honi como um operador de milagres. Em vez disso, ele conta apenas um caso em que Deus respondeu a oração Honi para chuva. Não há indicação de qualquer esperança messiânica ou aspirações ligadas a ele, nem qualquer indicação de que ele era considerado um rabino, ou professor. A próxima menção de Honi vem, pelo menos, cem anos depois de Josefo (e mais de duzentos anos após a morte de Honi). Pode ser encontrada na Mishná - literatura rabínica judaica. A Mishná acrescenta detalhes para breve menção de Josefo da famosa oração. Afirma que a oração famosa de Honi em primeira vez ficou sem resposta. Em seguida, ele desenha um círculo e jura que ele não vai sair do círculo até que Deus faça chover. Ela começa a regar. Honi exige mais, e começa uma violenta chuva. Honi censura e a chuva recua para um nível moderado. Ele, então, reza para que a chuva pare e a chuva cessa.

Observe que Honi ainda não é retratado como um operador de milagres, mas há alguns detalhes adicionais sobre como Deus responde à oração. Não há nenhuma indicação de que Honi era um operador de milagres mesmo, ou que quaisquer esperanças messiânicas foram anexadas a ele. Em suma, duzentos anos depois, temos Honi retratado como um homem de oração eficaz que tem algumas janelas para os precursores dos fariseus. Honi, no entanto, eventualmente é mencionado no Talmud babilônico, escrito mais uns cem anos mais tarde. Como retratado pelo Talmude babilônico, ele foi convertido completamente em um fariseu e dado o título de "Mestre" pela primeira vez. No entanto, não havia esperanças messiânicas ligadas a ele. Ele também não pode razoavelmente ser chamado de um operador de milagres.
Como J.P. Meier resume:
Para retornar a partir do final da história da tradição de 'Rabi Honi' para as suas origens humildes: tudo o que podemos dizer com alguma probabilidade sobre o "histórico" Onias / Honi é que ele viveu na primeira metade do 1o século a.C., talvez, em Jerusalém, e foi notado por uma ocasião em que ele rezava em uma época de seca e Deus mandou chuva. Mesmo esta parca declaração repousa em dois relatos escritos sobre cem (Josefo) e duzentos (Mishná) anos após o evento.
(A Marginal Jew, vol. 2, p. 484)

A figura um tanto obscura de Hanina tem ainda menos para oferecer. Embora ele provavelmente estava ativo antes da queda de Jerusalém, ele não recebe menção por qualquer escritor até o Mishná. Das três referências a ele na Mishná, uma se refere a um comentário que ele fez sobre a oração. m. Ber. 5:5. Mas nem sequer há alegação de que suas orações tinham nenhuma força especial, apenas que ele dizia ser capaz de dizer aqueles que vivem de quê iria morrer. "O resultado de tudo isso é que nenhum dos três textos da Mishná apresenta Hanina explícita e inequívocamente como um operador de milagres, no sentido mais rigoroso do termo (isto é, uma pessoa humana que diretamente executa um milagre, dando certos comandos ou usando certos gestos). Diante do silêncio da Mishná sobre operadores de milagre rabinos, não devemos nos surpreender que Hanina ben Dosa realmente não seja uma exceção. " (Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 586) Na verdade, não é até o Talmud babilônico que Hanina é convertido em um operador de milagres. Parece que tudo o que sabemos sobre Hanina é que ele provavelmente era um professor ou um líder religioso judeu que viveu no primeiro século e foi, possivelmente, talvez provavelmente, conhecido por orar por pessoas doentes. Que tipo de pessoas doentes e o efeito não é indicado até centenas de anos mais tarde.
Finalmente, pode-se argumentar que os milagres de Jesus são baseados no Antigo Testamento. O principal problema com esta objeção é que ele perde o ponto do critério padrão divergente. Seria possível para qualquer número de judeus ou fontes inventar histórias de milagres com base no Antigo Testamento. Mas, como mostra a discussão acima, eles simplesmente não o fizeram. Assim, não é nenhuma objeção a este critério a hipótese de uma possível fonte para o material, porque não consegue explicar porque ninguém se preocupou em fazê-lo. Estas histórias foram centenas de anos e não podem servir para mostrar que havia outras histórias de operador de milagres durante o tempo de Jesus. Em todo o caso, embora algumas das histórias de milagre de Jesus podem ser semelhantes aos do Antigo Testamento (sem surpresa, dado o desejo dos cristãos retratar Jesus ao longo de linhas do A.T., algo que seria difícil de evitar, dada a amplitude do assunto), muitos não encontram fácil comparação. "Nada menos que oito dos milagres de Jesus de cura são curas de surdos, mudos, cegos e coxos. Estes tipos de curas, embora possam ter sido alegados ocorrer em santuários de cura pagã, eram completamente sem precedentes na cultura do próprio Jesus. Nem no Antigo Testamento, nem em quaisquer escritos judaicos subseqüentes fazem esses relatórios ocorrerem. Em realizá-las, Jesus estava quebrando a terra nova, e aproveitando uma opção para a qual não havia precedentes”. (A.E. Harvey, Jesus and the Constraints of History, p. 115).

Além disso, se Jesus se via como fazendo a obra de Deus , não seria razoável supor que ele iria ignorar os padrões e as histórias do Velho Testamento como uma fonte de inspiração para suas próprias ações. Por conseguinte, a apreciação de Brown quanto a existência de operadores judeus de milagres está correta. Jesus é único entre o seu povos e período de tempo relatado como um operador de milagres.

B. Paganismo

Porque está bem estabelecido que os relatos de milagres a respeito de Jesus nasceram em um contexto judaico, em vez de pagão, a evidência pagã é de pouca relevância para a nossa discussão sobre a exclusividade dos relatos de Jesus. No entanto, não existem evidências para qualquer outra figura pagã contemporânea comparável a de Jesus.

"No lado pagão, há pouco além de relatos de registros de curas em santuários de cura, que certamente foram muito freqüentes, mas são um fenômeno bastante diferentes das curas realizadas por um curandeiro individual." (Harvey, Jesus and the Constraints of History, pp. 103-104). A cautela de Harvey sobre a comparação de Jesus com os santuários é bem aceita. No entanto, é apenas um fenômeno de tal forma que Carrier menciona em seu artigo: "os 'pagãos' tinham Asclépio, seu própria salvador-curador, séculos antes, e depois, o ministério de Cristo". Carrier comenta destacando a incongruência de comparar estes santuários e deuses pagãos de cura com a apresentação de Jesus nos Evangelhos. Ele está se referindo a "séculos" de tradições acumuladas em torno de um deus grego da cura, não as ações de um homem em um determinado período de tempo. Parece também que o que estava acontecendo a estes templos e santuários pagãos era uma mistura de medicina primitiva, magia e religião:
No caso de Asclepio, há muito debate quanto a saber se ele sequer existiu como um verdadeiro homem. Se sim, ele era certamente um médico primitivo e não certamente uma curador milagroso, uma vez que ‘sacerdotes’ de seu templo mais tarde combinaram ambos, medicina e a superstição, no tratamento dos pacientes.
(Craig Blomberg, The Historical Reliability of the Gospels, p. 84)

Assim, este fenômeno pagão não diminui a singularidade da apresentação no Evangelho do ministério de milagres de Jesus.

No entanto, existe uma figura pagã (que também é mencionada por Carrier), que tem mais semelhanças com Jesus: Apolônio. Conforme descrito na Vida de Apolônio de Tiana, de Filóstrato, Apolônio era um homem com fama de fazer muitos milagres e curas, incluindo de levantar uma menina dos mortos (embora Filóstrato parece ter algumas reservas sobre esta história). Há, no entanto, vários fatores que removem Apolônio como uma figura comparável a Jesus.

Antes de tudo é que Apolônio viveu depois de Jesus. Ele obviamente não poderia ser uma inspiração ou fonte de material para ministério de milagres de Jesus. Na verdade, pode ser que Jesus fora uma fonte de inspiração para histórias de Apolônio. O ministério de milagres de Jesus havia sido amplamente difundido por todo o Império Romano por esse tempo. O cristianismo foi bem estabelecido e muito vocálico sobre seu Salvador. Autores pagãos como Celso conheciam e referiam-se aos Evangelhos. Alguns estudiosos têm argumentado que a vida de Apolônio foi uma resposta à apresentação do cristianismo de Jesus. Mesmo aqueles que não vão tão longe admitir que Filóstrato provavelmente emprestara algumas das histórias do Evangelho de Jesus ou o vira como uma inspiração para sua própria criatividade (Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 580). Em qualquer caso, parece provável que, se não influenciaram Filóstrato diretamente, as histórias sobre Apolônio que fizeram o seu caminho em sua Vida de Apolônio foram influenciadas.

Em seguida, A vida de Apolônio de Tiana é uma relato do terceiro século que data mais de cem anos após a vida de Apolônio. Não existem relatos mais atigos em extensão. Por outro lado, as epístolas de Paulo revelam conhecimentos sobre vários detalhes da vida e morte de Jesus dentre 20 e 25 anos depois de Jesus. O Evangelho de Marcos é quando muito datado de 30 a 40 anos depois de Jesus. Até os anos Evangelhos de Mateus e Lucas são amplamente datado dentre 40 e 50 anos depois de Jesus. E a sua fonte comum, Q, é datado de décadas anteriores. Bastando examinar as datas por si só revela-se que houvera mais tempo para o material lendário se desenvolver em torno de Apolônio. Mas talvez ainda mais importante é que entre os Evangelhos canônicos apenas há cinco tradições independentes sobre Jesus, enquanto a Vida de Apolônio de Tiana é a única fonte real de material sobre Apolônio. Além disso, o autor de A Vida de Apolônio nasceu em 172 d.C. Assim, Apolônio estava morto há décadas antes de seu biógrafo nascer. Com os Evangelhos, parece que a vida de seus autores se sobrepunha a de Jesus. No mínimo, os autores Evangelhos escreveram enquanto muitos dos discípulos de Jesus ainda estavam vivos. Não é assim com a vida de Apolônio:
Em pouco mais de uma geração após a morte de Jesus todos os fatos importantes e os ensinamentos de sua vida foram fixados por escrito, e no final da segunda ou terceira geração cristã quase tudo o que sabemos sobre Jesus tinha sido registrado. O contraste com a distância de longo século, no caso de Apolônio, é gritante
(Meier, A Marginal Jew, vol. 2, p. 579)

Finalmente, parece que a fonte declarada de material para a biografia de Filóstrato era uma pessoa fictícia. O autor afirma que a principal fonte de sua informação foi Damis, discípulo de Apolônio. De Damis é dito que é da cidade de Nínive. Mas sabemos que Nínive não existia naquela época, porque foi destruída centenas de anos antes do primeiro século. Por esta e outras razões, os estudiosos concluíram que Damis e seu diário são completas mentiras. Ver e.g., Howard Clark Kee, Miracles in the Early Christian World, pp. 255-265; John Ferguson, The Religions of the Roman Empire, pp. 181-82; Frederick Copleston, A History of Philsophy: Greece and Rome, p. 193.

C. Cristianismo Nascente

Embora as histórias sobre o ministério de milagres de Jesus, sem dúvida inspirara seus seguidores cristãos, os milagres de Jesus são retratados de forma diferente do que os da Igreja primitiva. "Nos Sinóticos, Jesus não segue precedente bíblico ou cristão posterior no exercício das suas curas, ele não reza nem ele invoca o nome sagrado". (Ben Witherington III, The Christology of Jesus, p. 159) Por exemplo, quando Jesus faz milagres em Lucas, ele não invoca o nome divino, ele não depende de qualquer encantamento ou artefato. Ele geralmente apenas comanda. ("Então, ele veio e tocou no caixão aberto, e aqueles que carregavam pararam. E ele disse:" Jovem, eu vos digo: Levanta-te." Lucas 7:14.) Em Atos, no entanto, quando Pedro é mostrado como a realizar um milagre, ele o faz de maneira muito diferente: "Então Pedro disse: ouro e prata não tenho, mas o que tenho eu te dou: Em nome de Jesus Cristo de Nazaré, levanta-te e anda". (Atos 3:6) Além disso, quando Paulo realizou um exorcismo, ele declarou, "Eu te ordeno em nome de Jesus Cristo que saias dela." (Atos 16:18). Esta distinção não está limitado a Atos, mas geralmente é aplicável aos relatos de milagres dos primeiros cristãos.

D. Sumário da Evidência da Dissimilaridade

Mesmo lançando nossa rede para além da origem judaica do ministério de milagres de Jesus, se nos oferece pouca evidência de que o ministério de milagres, tais como o canônico Jesus foi relatado sobre outras figuras. Com efeito, "nós temos chegado à conclusão notável que a atividade miraculosa de Jesus está de acordo com nenhum padrão conhecido." (Harvey, Jesus and the Constraints of History, p. 113). Mesmo se tomarmos os argumentos de Carrier ao valor de face - que os antigos eram mais ingênuos do que somos hoje, isso só aumenta a imponência dos relatórios sobre Jesus. Se as pessoas eram tão ingênuas, por que Jesus deixou uma tradição tão forte sobre o seu ministério de milagres do que qualquer outra figura de seu tempo? A singularidade dos relatos do Evangelho destaca-se ainda mais pela raridade de tais relatórios em tempos antigos romanos. Assim, o peso dos critérios de dissimilaridade é muito forte e aumenta o peso grande à conclusão de que a reputação de Jesus como operador de milagres começou com o próprio Jesus.

V. A Avaliação da Crítica Acadêmica

Por todas estas razões, estudiosos modernos concluíram que a reputação de Jesus como um operador de milagres originou-se com o próprio Jesus. Seus seguidores contemporâneos acreditavam que Jesus estava fazendo milagres no meio deles. Veja B.L. Blackburn, "Miracles and Miracle Stories" (in Jesus and the Gospels, p. 556), "Entre os estudiosos do Novo Testamento há um acordo quase universal que Jesus realizou o que ele e seus contemporâneos consideraram como curas milagrosas e exorcismos". Muitos desses estudiosos, porém, não admitiriam que Jesus realmente realizara proezas sobrenaturais. Por exemplo, embora Fredriksen acredita que Jesus curou os doentes, ela também está convencida do que ela apresenta "não acredito que Deus, ocasionalmente, suspende a operação do que Hume chamou "lei natural ". (Fredriksen, Jesus of Nazareth, King of the Jews, p. 114). No entanto, colocar a origem dos milagres de Jesus com o próprio Jesus é uma conclusão histórica significativa. Como tal, quero prestar aqui uma amostragem demonstrativa de estudiosos respeitados e as suas conclusões sobre o assunto:
• "Qualquer leitura justa dos Evangelhos e de outras fontes antigas (incluindo Josefo) conduz inexoravelmente à conclusão de que Jesus era conhecido em sua época como um curandeiro e exorcista. As histórias de milagres são tratadas a sério e são amplamente aceitas pelos estudiosos de Jesus como decorrentes do ministério de Jesus. Vários estudos especializados têm surgido nos últimos anos, que concluem que Jesus fez coisas que eram vistas como "milagres". B. D. Chilton and C.A. Evans (eds.), Authenticating the Activities of Jesus, pp. 11-12 (NTTS, 28.2; Leiden: E.J. Brill, 1998).
• "A tradição de que Jesus fez exorcismos e curas (que também podem ter sido originalmente exorcismos) é muito forte." R.H. Fuller, Interpretation of the Miracles, p. 39.
• "De longe a profunda impressão de Jesus deixou sobre seus contemporâneos era como um exorcista e um curandeiro.... Em qualquer caso, ele não era só acreditava possuir alguns dons curativos muito especiais, mas, evidentemente, de uma forma ou outra ele realmente possuía-os". Michael Grant, An Historian's Review of the Gospels, pp. 31, 35.
• "Sim, eu penso que Jesus provavelmente realizara atos que os contemporâneos viram como milagres". Paula Fredriksen, Jesus of Nazareth, King of the Jews, p. 114.
• "Não há dúvida de que Jesus fez milagres, curou os enfermos e expulsou demônios." G. Thiessen, The Miracle Stories of the Early Christian Tradition, p. 277.
• "Na maioria das histórias de milagres nenhuma explicação é dada a tudo; Jesus simplesmente fala ou age e o milagre é feito pelo seu poder pessoal. Essa característica provavelmente reflete um fato histórico." Morton Smith, Jesus the Magician, p. 101.
• "Há acordo sobre os fatos básicos: Jesus fez milagres, atraiu multidões e prometeu o reino para os pecadores". E.P. Sanders, Jesus and Judaism, p. 157.
• "Sim, nós podemos ter certeza de que Jesus realizou sinais reais que foram interpretados por seus contemporâneos como experiências de um poder extraordinário". H. Hendrickx, The Miracle Stories and the Synoptic Gospels, p. 22.
• "Que Jesus realizou atos que eram vistos como milagres, tanto para ele como para sua audiência, é difícil duvidar." Bem Witherington III, The Christology of Jesus, page 155.
• "Deve ficar claro para nós que os contemporâneos de Jesus, tanto aqueles que se tornaram seus seguidores quanto aqueles que estavam determinados a não ser seus seguidores, certamente, consideraram-no como possuidor de poderes notáveis ". Wright, Jesus and the Victory of God, p. 187.

. "As tradições dos milagres de Jesus tem muitas características incomuns para serem convenientemente atribuídas a lenda convencional. Além disso, muitos delas contêm detalhes de relatos precisos que é bastante diferente do dirigido habitual de lendas e é difícil de explicar a menos que deriva de algumas recordações históricas, e os próprios Evangelhos mostram um apoio notável em suas narrativas que contrasta estranhamente com aquele deleite no milagroso para sua própria satisfação, que normalmente caracteriza o crescimento da lenda. " A.E. Harvey, Jesus and the Constraints of History, p. 100.

VI. Conclusão

As histórias de milagres de Jesus surgiram muito cedo, continham relatos que não parecem ter sido criados por cristãos, e são bem coerentes com o resto do que sabemos sobre Jesus e seu ministério. A melhor explicação para esta evidência é que Jesus foi conhecido durante sua vida como um operador de milagres. A singularidade de tal ministério de milagres acrescenta peso significativo a esta conclusão e nos leva a concluir ainda que os feitos de Jesus devem ter sido impressionantes. Embora, como apontara Carrier, Jesus viveu em uma época de superstição e religiosidade, seus milagres são excepcionalmente atestados. Nenhuma outra pessoa do mesmo período de tempo tem nada perto do certificado que Jesus recebe como um operador de milagres. Assim, mesmo que a sua predisposição filosófica impede você de acreditar que Jesus realmente realizou milagres que violavam as leis da natureza, deve-se admitir que ele realizou façanhas que convenceram seus contemporâneos que ele fez essas ações.
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Bibliografia
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*NOTA DO TRADUTOR:
Em apoio à perspectiva em relação ao Evangelho de João que advoga uma maior coesão e unidade interna do livro, em correção das teses a respeito de que seria uma costura de diversas tradições independentes e criadas em épocas diferentes, provenientes de “rostos coletivos”, sendo o “discípulo” narrador uma figura simbólica ou a personificação do grupo, indicamos: