segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

"veja.abril.com.br. Entrevista". André Leonardo Chevitarese: Entre a Fé e a Razão


Religião:  O que a história tem a dizer sobre Jesus

Pesquisas de historiadores ajudam a confirmar que, de fato, Jesus caminhou sobre a região da Galileia há 2.000 anos. As descobertas, no entanto, não devem satisfazer aqueles que levam a Bíblia ao pé da letra.

O pesquisador americano Joseph Atwill é categórico: Jesus não passa de um mito. O personagem, suas palavras e ações fazem parte de uma elaborada narrativa inventada por aristocratas romanos, com o objetivo de pacificar os judeus — um povo envolvido em sucessivas rebeliões contra o império. Atwill apresentou suas ideias em outubro, numa conferência realizada em Londres, na Inglaterra. "Os romanos perceberam que o melhor caminho para acabar com a atividade missionária fervorosa entre os judeus era criar um sistema de crenças que competisse com o deles", afirmou.

Joseph Atwill não é um acadêmico da área — sua formação é em ciências da computação. Ele não publicou suas pesquisas em periódicos científicos e suas ideias estão longe de ser apoiadas por seus pares. No entanto, sua teoria recebeu atenção mundial, e foi debatida entre pesquisadores, jornalistas e religiosos. Seu poder está no fato de ela ser o capítulo mais novo de uma antiga discussão — com quase 2.000 anos de idade — sobre qual é a verdade por trás de Jesus, seus feitos, milagres e mensagem.

Para Atwill, a ideia de que Jesus não passaria de uma montagem histórica deveria funcionar como um duro golpe aplicado pela ciência contra a ignorância propagada pela religião. "Embora o cristianismo possa ser um conforto para alguns, ele também pode ser muito prejudicial e repressivo, uma forma insidiosa de controle mental que levou à aceitação cega da servidão, pobreza e guerra ao longo da história", diz. Seu erro é que a existência de Jesus não é mais uma questão de fé, mas de ciência.

Os acadêmicos da área — historiadores das mais prestigiadas universidades do mundo — afirmam restar poucas dúvidas sobre a questão. "Volta e meia aparecem essas hipóteses sobre Jesus ser um mito. Mas, do ponto de vista metodológico, parece bastante claro que ele realmente existiu", diz André Chevitarese, professor do Instituto de História da UFRJ e autor dos livros Jesus Histórico - Uma Brevíssima Introdução e Cristianismos: Questões e Debates Metodológicos (Editora Kline), em entrevista ao site de VEJA.

Jesus histórico — Os historiadores deixam claro que o personagem estudado por eles não é o mesmo da religião. Eles estão em busca de informações sobre o homem chamado Jesus, que viveu na Galileia há 2.000 anos e em torno do qual foi criada a maior religião do mundo. “Os historiadores não buscam um ser divino, que é impossível de quantificar, medir e avaliar. O Jesus da história é estritamente humano“, afirma Chevitarese.

Nessa busca pelo Jesus histórico, a perspectiva dos pesquisadores lembra a de São Tomé, o apóstolo que duvidou de Cristo e exigiu provas de sua ressurreição. Do mesmo modo, os historiadores não podem acreditar cegamente no que dizem as religiões e seus líderes, mas devem embasar tudo que afirmam em evidências. Essas provas não precisam ser, necessariamente, físicas, como a descoberta de uma ossada ou um túmulo. "Se esse critério fosse adotado, 95% dos personagens históricos não seriam reconhecidos", diz o pesquisador.

Hoje, o critério mais importante que os pesquisadores possuem para atestar a existência de Jesus é o da múltipla confirmação: autores diferentes, que nunca se conheceram, afirmam fatos semelhantes sobre o personagem.

Os textos mais antigos sobre Jesus datam do século I, em sua maioria escritos por seguidores do cristianismo. A exceção é Flávio Josefo, um historiador judeu que tentou escrever toda a história do povo judaico, desde o Gênesis até sua época. Ele cita Jesus, João Batista e Tiago (irmão de Jesus) como exemplos de homens que lideraram movimentos messiânicos na região da Galileia.

No século seguinte, surgem mais textos de historiadores que citam Jesus e, principalmente, o movimento iniciado por seus seguidores. "Esses dados servem para mostrar que não estamos no campo da mitologia. São autores judeus e romanos, que nunca se tornaram cristãos, e permitem afirmar de modo muito seguro que Jesus é um personagem histórico."

O homem — A esses textos se somam descobertas recentes da arqueologia que fornecem informações precisas sobre o tempo e o espaço em que Jesus viveu. Os dados não são abundantes, mas permitem esboçar como se pareceria esse personagem histórico real. "Não podemos afirmar exatamente a cor de pele e cabelo de Jesus. A partir dos mosaicos e dos afrescos que retratam outros romanos, judeus e sírios que viviam no mesmo ambiente, a tendência maior é de vermos um Jesus de cabelos preto, com a pele queimada por causa de sol", diz Chevitarese.

Segundo a maior parte dos historiadores, Jesus não nasceu em Belém, como afirmam algumas passagens bíblicas, mas em Nazaré — uma pequena aldeia montanhosa da Galileia, cuja população era camponesa e girava em torno de 500 indivíduos. "A aldeia não tinha nenhuma relevância política, não possuía construções públicas ou sinagogas. Os escritores dos Evangelhos mudaram o lugar por razões teológicas, para que o nascimento de Cristo confirmasse algumas profecias do Antigo Testamento."

Jesus teria nascido na pequena vila em torno do ano 4 A.C., e teria passado a maior parte de sua vida na região, sem nunca pisar em uma cidade grande. A exceção acontece quando ele entra em Jerusalém — ato que teria como consequência sua crucificação pelas autoridades romanas. Sua morte deve ter acontecido por volta dos anos 35 e 36 D.C., pouco tempo depois de João Batista também ter sido morto pelos romanos, segundo a narrativa de Flávio Josefo.

A mensagem — Segundo os historiadores, tão importante quanto quem era Jesus é o que ele dizia — foi sua mensagem poderosa que repercutiu em todo o mundo e, séculos mais tarde, deu origem às diversas vertentes religiosas. "Ele era um camponês pobre que, diante das injustiças que o mundo apresentava, defendia a instauração do Reino de Deus — um reino de justiça e fartura, sem hierarquias sociais", diz Chevitarese.

A mensagem espiritual — e messiânica— de Jesus era voltada especialmente aos judeus de seu tempo. Ela, no entanto, adquiria caráter político ao afrontar o Império Romano e setores da elite judaica. Foi justamente a força dessa mensagem, e os rebanhos que ela poderia angariar, que levaram à sua crucificação e morte. Como aconteceu muitas vezes na história, no entanto, o assassinato de Jesus não conseguiu matar suas ideias.

Jesus teológico — Jesus nunca chegou a colocar suas ideias no papel (nem poderia, os historiadores afirmam que ele era analfabeto). A maior parte do que chega aos dias de hoje sobre o personagem e suas ideias foi escrito por seguidores das primeiras comunidades cristãs, duas ou três gerações depois de sua morte. Os autores não estão preocupados em transmitir uma versão fiel dos fatos, como uma biografia, mas em defender os pressupostos de sua fé. Assim, os primeiros cristãos que escrevem sobre Jesus — os evangelistas — já não estão fazendo história, mas teologia. 

Nessa época o cristianismo começava a se distanciar do judaísmo em que ele estava originalmente inserido, e a se aproximar do Império Romano — o que exigiu algumas mudanças em sua mensagem. "Ao serem escritas, suas ideias começam a ser diluídas, pois vários filtros são impostos. Primeiro, Jesus é um indivíduo de fala aramaica, mas quase tudo que conhecemos sobre ele está escrito em grego. Além disso, os textos são destinados a convencer um público urbano, muito diferente dos camponeses para quem Jesus pregava", diz Chevitarese.

Com o passar dos séculos, isso abriu margem para que vários teólogos interpretassem as escrituras de maneiras variadas, criando as inúmeras vertentes do cristianismo que se encontram nos dias de hoje. Assim, a depender de quem faz a homilia, Jesus pode ser visto como um personagem sagrado ou humano, santo ou falho, foco de paz ou de guerra, de fundamentalismo ou de liberdade.

É por isso que o estudo do Jesus histórico é importante. "Ele pode ajudar a colocar um freio naqueles que querem transformar pressupostos teológicos em verdades históricas", diz Chevitarese. Seu objetivo não é acabar com a teologia ou retirar da história de Jesus seu caráter espiritual. O que a ciência faz é descobrir o que, de fato, pode ser afirmado sobre o homem e sua época. As muitas lacunas que permanecerão abertas apresentam mistérios suficientes para que a religião possa se instalar. 

Oito perguntas e respostas sobre o Jesus histórico

1- Os autores dos Evangelhos conheceram Jesus?
A maior parte dos historiadores concorda que nenhum dos evangelistas foi testemunha ocular da vida de Jesus. Os Evangelhos, na verdade, faziam parte de uma grande variedade de textos que circulavam nos primeiros séculos depois de Cristo e representavam o que algumas das comunidades cristãs pensavam (os Evangelhos que foram deixados de lado pela tradição católica se tornaram conhecidos como apócrifos).

Os textos têm autoria anônima, e os pesquisadores possuem poucas informações sobre sua exata origem geográfica. O que se sabe é que eles foram criados a partir de relatos, memórias, tradições e textos mais antigos, que circulavam entre as primeiras comunidades cristãs. Eles teriam sido escritos entre o ano 60 e o 120, e só no século II é que seus autores foram atribuídos — o primeiro Evangelho a Marcos, e o último a João.

Com o passar dos séculos — e com a ortodoxia cristã tendo relações cada vez mais próximas ao Império Romano — surgiu a preocupação de delimitar exatamente quais os textos que guardavam a memória verdadeira sobre Jesus. Por volta do século IV, depois de sérias disputas teológicas, a Igreja finalmente escolheu quais haviam sido inspirados por Deus — criando o cânone do Novo Testamento. "Decidiu-se assim quais textos seria destruídos e quais preservados, e quais tradições cristãs seriam perseguidas e quais aceitas pela Igreja", diz André Chevitarese, professor do Instituto de História da UFRJ e autor dos livros "Jesus Histórico - Uma Brevíssima Introdução" e "Cristianismos: Questões e Debates Metodológicos" (Editora Kline), em entrevista ao site de VEJA.

Dentre os textos do Novo Testamento, aqueles que os historiadores atribuem, de fato, a alguém que conviveu com Jesus são as encíclicas escritas por Paulo — pelo menos sete delas teriam sido ditadas pelo apóstolo. "Na forma como o Novo Testamento está organizado, os quatro Evangelhos aparecem antes dos textos de Paulo. No entanto, as encíclicas foram escritas primeiro. O pesquisador tem de começar a ler por elas — assim fica mais fácil entender a evolução das primeiras comunidades cristãs."

2- Como era a família de Jesus?
A família de Jesus é citada em diversos pontos das escrituras, de Maria e José até seus irmãos e primos. No Evangelho de Marcos, o primeiro a ser escrito, seus parentes são mostrados de forma bastante distanciada. Em certo momento, eles tratam Jesus como maníaco, afirmando que suas atividades como pregador só poderiam ser fruto da loucura. Jesus se afasta, e passa a defender uma nova percepção de família, formada por aqueles que estão juntos dele, fazendo a vontade de Deus.

Nos outros Evangelhos, no entanto, a família é mostrada como sendo muito mais próxima do movimento de Jesus — com destaque especial para a figura de Maria, presente em momentos-chave da história. Em Atos dos Apóstolos, o livro bíblico que narra o que acontece com os discípulos após a ressurreição, a família recebe ainda mais destaque: os parentes de Cristo estão entre os principais pregadores da nova religião cristã que passa a ser construída. Dessa vez, o destaque fica para Tiago, irmão de Jesus e um dos principais líderes do cristianismo primitivo.

"Do primeiro texto, em que a família vê Jesus como um louco, ao último, onde são eles que levam adiante o cristianismo, parece haver uma contradição — mas não necessariamente. Pode ser que, com o passar do tempo, a família tenha se reaproximado de Jesus, e tomado seu lugar na Igreja", diz André Chevitarese.

A citação bíblica aos irmãos de Jesus é alvo de grandes discussões entre acadêmicos e teólogos, pois pode afrontar uma das principais crenças da igreja católica: a da virgindade de Maria. Ao longo dos séculos, os teólogos católicos esboçaram possíveis explicações para isso. Uma delas diz que eles seriam, na verdade, meios-irmãos de Jesus, filhos de um primeiro casamento de José. Outra explicação afirma que o termo grego utilizado no texto bíblico original pode significar tanto primo quanto irmão, e teria havido uma confusão nas traduções.

Essa segunda interpretação também pode estar correta. "A noção de família que se apresenta no contexto do século I mediterrâneo é muito diferente da atual. Ela é uma família extensiva, onde todos os parentes orbitam em torno de uma figura masculina mais velha. Nesse ambiente, o primo pode, sim, ser um irmão."

3- João Batista existiu?
Assim como Jesus, João Batista é um personagem histórico. Segundo diversas fontes da época, ele era um importante pregador judeu que viveu na Galileia durante o século I. O tipo de movimento messiânico comandado por João e Jesus era bastante comum na época. Esmagados pelo Império Romano, os camponeses judeus eram levados a esperar pela intervenção de um salvador que fosse mudar os rumos da história. O historiador judeu Flávio Josefo cita dezenas de candidatos a messias em seus textos.

Segundo as fontes históricas, o movimento liderado por João Batista chegou a ser, por certo tempo, mais importante que o de Jesus. "O número de páginas que Josefo dedica a Batista é muito maior do que o dedicado a Jesus. O historiador narra como Herodes reconhece sua força e manda matá-lo. Isso mostra que era Batista quem realmente desafiava Roma em sua época", diz André Chevitarese.

Na verdade, segundo os historiadores, Jesus pode ter sido um discípulo de João Batista — teria sido com ele que aprendeu a batizar, exorcizar e a desafiar as autoridades romanas. Acontece que, em algum momento, discípulo e mestre romperam. "As ideias dos dois eram muito diferentes. Enquanto João acreditava em preparar o caminho para um personagem divino intervir na história, Jesus dizia que essa personagem já veio, e era ele mesmo", diz o pesquisador.

Os próprios Evangelhos podem servir para mostrar o quanto João Batista era importante em seu tempo histórico. Segundo os pesquisadores, a necessidade que os evangelistas demonstram ter de citá-lo em seus textos se deve ao fato de sua memória ainda continuar forte no século I. Assim, os autores precisam mostrar que esse personagem, que até então permanecia independente do cristianismo, poderia ser amarrado à sua própria teologia. "Os cristãos tiveram a necessidade de mostrar que João Batista enxergou em Jesus o Messias. Assim, eles conseguiram demonstrar ainda mais o valor de Jesus."

4- Jesus sabia ler?
Jesus demonstra saber ler em dois momentos da Bíblia. O primeiro deles acontece no Evangelho de Lucas, quando ele entra em uma sinagoga na cidade de Nazaré e começa a ler textos escritos pelo profeta Isaías. O segundo é mostrado no Evangelho de João, onde Jesus aparece escrevendo. Logo depois de intervir no apedrejamento de uma mulher — usando o conhecido desafio de "quem nunca tiver pecado que atire a primeira pedra" — ele se abaixa e começa a escrever no chão.

O problema é que ambos os trechos apresentam problemas. Não existe nenhum indício de sinagoga em Nazaré e, mais importante, o verbo grego para ler é o mesmo para memorizar — Jesus poderia simplesmente ter decorado a passagem de Isaías. Ao mesmo tempo, o trecho tirado do Evangelho de João (capitulo 8, versículo 8) é bastante discutido entre os pesquisadores. Muitos deles vêm a passagem como uma alteração tardia feita à Bíblia, adicionada já no século V.

A verdade é que as estimativas dos historiadores mostram que entre 95% e 98% da população que vivia naquela região do mediterrâneo era analfabeta. Seria natural que Jesus, um camponês pobre que nasceu e nunca saiu daquele ambiente, estivesse dentro dessa estatística.

"Na verdade, o maior incômodo com o fato de Jesus ser analfabeto vem do mundo contemporâneo. Hoje, se assume que uma liderança — politica, religiosa ou econômica — precisa ter feito até faculdade, quanto mais saber ler. Mas essa não era uma demanda dos discípulos."

5- Qual era a religião de Jesus?
"Jesus nasceu judeu, viveu judeu, e morreu judeu", responde André Cheviterese. Foi só nos séculos seguintes à sua morte que a Igreja começou a se distanciar do judaísmo e a se aproximar do Império Romano. Nesse processo, a teologia cristã vai se tornando cada vez mais arredia aos judeus, resvalando até no antissemitismo — o que transparece nos Evangelhos, principalmente no de João.

"Acho que a base para se entender isso está na tensão que é criada entre a comunidade cristã joanina [que se pretendia seguidora do apóstolo João] e a religião judaica. A partir da década de 80 do século I, seu proselitismo se torna tão agressivo que eles são expulsos das sinagogas. A partir daí, se tornam muitos hostis", diz o pesquisador.

Assim, no Evangelho de João (capítulo 8, versículo 44), Jesus se refere aos judeus como Filhos do Diabo, adoradores de um Deus homicida e mentiroso. Do mesmo modo, a narração deixa de mostrar Jesus sendo morto de forma sumária pelos romanos. Segundo os textos, ele é assassinado a pedido dos judeus — Pôncio Pilatos até lava as mãos.

6- Jesus seria casado com Maria Madalena?
Maria Madalena é uma das figuras mais importantes e disputadas de todo o cristianismo. Ela costuma ser usada como a prova de que Jesus teria apóstolos e apóstolas — o que contraria a doutrina religiosa de só permitir padres do sexo masculino. Mais que isso, ela é uma personagem central dos Evangelhos, pois é a primeira a visitar o sepulcro de Jesus e perceber que seu corpo não estava lá — e a primeira a reconhecer o Cristo ressuscitado.

Do século I ao IV, houve uma grande disputa dentro do cristianismo para decidir se mulheres poderiam ou não assumir funções de proeminência nos ritos religiosos. "No ano 591, o papa Gregório Magno proferiu uma homilia onde juntava duas personagens diferentes citadas no Evangelho de Lucas. Ele afirma que uma mulher vista como pecadora (uma prostituta) e Maria Madalena eram a mesma pessoa. Desse modo, sugere que as mulheres são demoníacas", afirma Chevitarese. 

No século XIX, a Igreja finalmente voltou atrás: Maria Madalena deixa de ser prostituta e é promovida a santa. Mesmo assim, sua imagem como pecadora continua entranhada no imaginário cristão.

7- Jesus foi traído por Judas?
Os pesquisadores costumam concordar que Jesus foi traído e entregue por um de seus discípulos para o exército romano. Mas o traidor é desconhecido. A figura de Judas — desde seu nome até seus trejeitos — parece ter sido criada sob medida para objetivos teológicos.

"Ele é fruto de uma teologia evidentemente antijudaica. Seu nome remete a Judá, a Judeia. Suas características também vêm das caricaturas que se fazem dos judeus: ele ama o dinheiro, é traidor e ladrão. Do século 2 em diante, isso vai, de novo, ser usado como ferramenta antissemita. Quando pensado em seus efeitos de longo prazo, isso é muito cruel. É só lembrar da malhação de Judas, por exemplo", diz Chevitarese.

As próprias narrativas da morte de Judas servem como exemplo de que o personagem é mais fruto da teologia do que de história. No Evangelho de Mateus, ele se enforca. No Ato dos Apóstolos, ele tropeça, rasga a barriga e morre. E nos textos de Papias, um autor cristão contemporâneo ao Evangelho de João, ele come até explodir.

8- Jesus foi crucificado?
A crucificação é, sim, um fato histórico. Já o contexto que a cerca, como o julgamento de Jesus e a via-crúcis, não é.

Ser pregado em uma cruz era a penalidade aplicada pelos romanos aos escravos que matavam seus senhores, aos escravos que se rebelavam e aos rebeldes políticos — categoria onde Jesus poderia ser facilmente incluído. O historiador Flávio Josefo, por exemplo, cita uma cena onde milhares de judeus foram crucificados após uma rebelião em Jerusalém.

Quanto à Via Crúcis e ao julgamento, eles dificilmente seriam realizados pelo governo romano naquelas circunstâncias. Jesus foi preso em Jerusalém, na sexta-feira que antecede a Páscoa. Acontece que nessa época do ano a cidade estava lotada de judeus de todos os cantos, desde o Mediterrâneo até o Oriente Médio, vindos para as festividades. Além disso, a Páscoa judaica não é uma festa apenas religiosa, mas também política — ela celebra a passagem dos hebreus da escravidão para a liberdade.

terça-feira, 10 de dezembro de 2013

Temor e Tremor de Sören Kierkegaard / Fear and Trembling by Sören Kierkegaard

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Prefácio
Kierkegaard, escrevendo sob um pseudônimo (Johannes De Silentio), tem como objetivo a crítica irônica seu próprio trabalho. Ele afirma que o "escritor" não é nada de um filósofo, não entendeu "o sistema", e não sabe se ele realmente existe.
Prelude
A história de Abraão é dada uma volta de Kierkegaard, cheia de paradoxos e inconsistências. Abraão não podia compreender que era um pecado que estar disposto a oferecer a Deus a melhor coisa que ele possuía - seu próprio filho Isaac.
Capítulo 1: um panegírico sobre Abraão
O início de um devaneio - Sermão do sacrifício de Isaac por seu pai Abraão.
Capítulo 2: Preliminar Expectoração
A história de Abraão tem a propriedade notável que é sempre glorioso, porém mal se pode compreendê-lo. A expressão ética para o que Abraão fez é que ele iria matar Isaac, ea expressão religiosa é que ele iria sacrificar Isaac. Abraão teve que conviver com essa contradição que poderia fazer um homem sem dormir. Mas Abraão não é o que ele é, sem esse medo.
Capítulo 3: Problema um:? Há uma coisa como uma suspensão teleológica da ética
As conseqüências dialético na história de Abraão são expressas aqui na forma de problemata , a fim de ver o que uma fé enorme paradoxo é, por essa história apresenta o paradoxo que dá Isaac volta a Abraão, que nenhum pensamento pode dominar, porque a fé começa precisamente aí onde o pensamento deixa de fora.
Capítulo 4: Problema dois:? Há uma coisa como um dever absoluto para com Deus
O cavaleiro da fé é obrigado a confiar em si mesmo, ele se sente a dor de não ser capaz de fazer-se inteligível para os outros, mas ele não sente vão o desejo de ajudar outras pessoas.
Capítulo 5: Problema três:? Foi Abraham ponto de vista ético em manter o silêncio sobre o Seu Propósito
conduta de Abraão é indefensável para ele não prestou atenção aos determinantes éticos intermediários. Mas, em face do seu esconderijo, estamos na presença de um paradoxo que não pode ser mediada, em que se baseia no fato de que o indivíduo é maior do que o universal.
Epílogo
A fé é a mais elevada paixão de um homem. Há, talvez, muitos em todas as gerações que nem sequer alcançá-lo, mas ninguém fica mais longe. Mas para o homem também que não tanto como a fé alcance, a vida tem tarefas o suficiente, e se alguém ama sinceramente, a vida não tem por ser desperdiçado.




Jesus: por Martin Dibelius

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Capítulo I: Jesus em História
ataques seculares sobre o cristianismo exige que a igreja levar a sério as raízes históricas válidas do registro Jesus.   capítulos que seguem lidar com uma apresentação científica do evento, com a esperança de que ele possa fortalecer e informar as pessoas de fé que têm de lidar com o significado do evento como uma revelação de Deus.
Capítulo II: As Fontes
Este capítulo trata das fontes sobre as quais um conhecimento histórico de Jesus pode se basear. Uma pequena quantidade de testemunho não-cristão é apresentado, mas as principais fontes são as testemunhas cristãs, a tradição evangélica, e as seções narrativas dos evangelhos sinóticos.
Capítulo III: Pessoas Terra, Descendência
Este capítulo faz as perguntas: "Quais foram as pessoas como, a situação política e da área da Palestina em que Jesus veio?   Para que as pessoas e raça que Jesus pertence?   Qual foi a comunidade religiosa como a que tempo?
Capítulo IV: O Movimento Entre as Missas
Este capítulo traça a cronologia da vida de Jesus, AHD a historicidade de seu movimento em seu próprio tempo.
Capítulo V: O Reino de Deus
Jesus define o seu movimento em termos de dois opostos:   A convicção de que o Reino de Deus é o futuro e se opuseram a este mundo, e   uma consciência de que o Reino já está em processo de vir, e já colocar -se em movimento.
Capítulo VI: Os sinais do Reino
através de ações de sua Jesus julgando, criticando, aviso, incentivando, promissor e cura-os sinais do Reino estão presentes, e não o Reino em sua plenitude.
Capítulo VII: O Filho do Homem
que Jesus exige não é uma confissão formal da sua messianidade, com conotações políticas ou outras,   mas que se vê em seus atos de trabalho de Deus, percebe em sua vinda a vinda de Deus com o seu Reino.
Capítulo VIII: Estado do homem diante de Deus
Jesus não dá uma série de regras para uma vida de fé, capacitando um receber "direito" com Deus.   vontade absoluta de Deus não pode ser comprimido em uma lei para este mundo.   Ele pode ser definido apenas . nos "sinais", as evidências do Reino   Portanto, ele procura de Jesus, em seu significado mais profundo não é executada:   Então tu deves agir, mas, assim que deves ! ser  que ele quer criar não é realizações ascéticas ou éticas, mas pessoas que na palavra e testemunho escritura, manifestar, o Reino de Deus.
Capítulo IX: A Força de Oposição
O autor examina o relato do Novo Testamento da acumulação de forças seculares e religiosas que levam à resistência e rejeição de Jesus e, finalmente, ao seu ser acusado, julgado e crucificado.

As mais antigas edições existente das cartas de Paulo

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Índice analítico

Introdução *
Diferentes Edições *
Grande número de manuscritos *
Agrupamento Manuscritos *
A Versão Autorizada bizantino *
Os manuscritos fragmentários *
Os Manuscritos *
Introdução *
Notação de Manuscritos *
Os manuscritos mais antigos da Bíblia Cristã *
Códice Alexandrino (A 02) *
Codex Ephraemi Rescriptus (C 04) *
Codex Sinaiticus (A 01) *
Codex Vaticanus (B 03) *
Número e a sequência das cartas de Paulo *
As quatro unidades literárias do Novo Testamento *
A Carta aos Hebreus *
Manuscritos contendo apenas as Cartas de Paulo *
O Arquétipo *
Introdução *
Princípio de Arranjo *
Ordem cronológica? *
Arranjos independente? *
Sequências uniformes *
Outros manuscritos *
Interpretação *
Uniforme número de letras *
Títulos uniformes *
Resumo *
Título geral da Edição *
Princípio de Arranjo *
Carta a Filémon *
Carta aos Hebreus *
Resumo *
Tabela de Ilustrações:
Página típica do Novo Testamento grego *
Codex Ephraemi Rescriptus (C 04) *
As quatro unidades literárias do Novo Testamento *
Número e conteúdo de manuscritos do grego cartas de Paulo . *
Codex Boernerianus (G 012). *
P46: Cartas de Paulo organizadas de acordo com seu comprimento *
A seqüência das cartas de Paulo nos manuscritos (1) *
A seqüência das cartas de Paulo nos manuscritos (2) *
Ef 1:1 Codex Sinaiticus: *

A lista cronológica de todos os Primeiros Escritos Cristãos


Acesse o Link dos Livros
30-60Paixão Narrativa
40-80Perdeu provérbios Evangelho Q
50-601 Tessalonicenses
50-60Filipenses
50-60Gálatas
50-601 Coríntios
50-602 Coríntios
50-60Romanos
50-60Philemon
50-80Colossenses
50-90Sinais Gospel
50-95Livro de Hebreus
50-120Didache
50-140Evangelho de Tomé
50-140Oxyrhynchus 1224 Gospel
50-200Sophia de Jesus Cristo
65-80Evangelho de Marcos
70-100Epístola de Tiago
70-120Egerton Evangelho
70-160Evangelho de Pedro
70-160Mark Segredo
70-200Fayyum Fragmento
70-200Testamentos dos Doze Patriarcas
73-200Mara Bar Serapião
80-1002 Tessalonicenses
80-100Efésios
80-100Evangelho de Mateus
80-1101 Pedro
80-120Epístola de Barnabé
80-130Evangelho de Lucas
80-130Atos dos Apóstolos
80-1401 Clement
80-150Evangelho dos Egípcios
80-150Evangelho dos Hebreus
80-250Christian Sibyllines
90-95Apocalipse de João
90-120Evangelho de João
90-1201 João
90-1202 João
90-1203 João
90-120Epístola de Judas
93Flávio Josefo
100-1501 Timóteo
100-1502 Timóteo
100-150Tito
100-150Apocalipse de Pedro
100-150Livro Secreto de Tiago
100-150Pregação de Pedro
100-160Evangelho dos Ebionitas
100-160Evangelho dos nazarenos
100-160Pastor de Hermas
100-1602 Pedro
100-200Odes de Salomão
101-220Livro de Elchasai
105-115Inácio de Antioquia
110-140Policarpo aos Filipenses
110-140Papias
110-160Oxyrhynchus 840 Gospel
110-160Tradições de Matthias
111-112Plínio, o Jovem
115Suetônio
115Tácito
120-130Quadratus de Atenas
120-130Apologia de Aristides
120-140Basilides
120-140Naasenos Fragmento
120-160Valentino
120-180Apócrifo de João
120-180Evangelho de Maria
120-180Diálogo do Salvador
120-180Evangelho do Salvador
120-1802 Apocalipse de Tiago
120-180Trimorfas Protennoia
130-140Marcião
130-150Aristo de Pella
130-160Epifânio de justiça
130-160Ofitas Diagramas
130-1602 Clement
130-170Evangelho de Judas
130-200Epístola de Mathetes a Diogneto
140-150Epistula Apostolorum
140-160Ptolomeu
140-160Isidore
140-170Fronto
140-170Evangelho da Infância de James
140-170Evangelho da Infância de Thomas
140-180Evangelho da Verdade
150-160Martírio de Policarpo
150-160Justino Mártir
150-180Trechos de Theodotus
150-180Heracleon
150-200Ascensão de Isaías
150-200Atos de Pedro
150-200Atos de João
150-200Atos de Paulo
150-200Atos de André
150-225Atos de Pedro e dos Doze
150-225Livro de Tomé o Contender
150-250Quinta e Sexta Livros de Esra
150-300Ensinamento autorizado
150-300Copta Apocalipse de Paulo
150-300Discurso sobre o oitavo e nono
150-300Melquisedeque
150-400Atos de Pilatos
150-400Anti-marcionistas Prologues
160-170Endereço de Taciano para os gregos
160-180Cláudio Apolinário
160-180Apeles
160-180Julius Cassianus
160-250Otávio de Minucius Felix
161-180Atos de Carpo
165-175Melito de Sardes
165-175Hegésipo
165-175Dionísio de Corinto
165-175Luciano de Samósata
167Marcus Aurelius
170-175Diatessaron
170-200Dura-Europos Harmony Gospel
170-200Muratoriano Canon
170-200Tratado sobre a Ressurreição
170-220Carta de Pedro a Filipe
175-180Atenágoras de Atenas
175-185Irineu de Lyon
175-185Rhodon
175-185Teófilo de Cesaréia
175-190Galen
178Celsus
178Carta de Viena e Lyons
180Paixão dos Mártires Scillitan
180-185Teófilo de Antioquia
180-185Atos de Apolônio
180-220Bardesanes
180-220Kerygmata Petrou
180-230Hipólito de Roma
180-2501 Apocalipse de Tiago
180-250Evangelho de Filipe
182-202Clemente de Alexandria
185-195Maximus de Jerusalém
185-195Polícrates de Éfeso
188-217Talmud
189-199Victor I
190-210Pantaenus
193Anônimo Anti-Montanista
193-216Inscrição de Abercius
197-220Tertuliano
200-210Serapião de Antioquia
200-210Apolônio
200-220Caius
200-220Philostratus
200-225Atos de Tomé
200-250Didascalia
200-250Livros de Jeu
200-300Pistis Sophia
200-300Copta Apocalipse de Pedro
203Atos de Perpétua e Felicitas
203-250Orígenes

segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

A relação do Homem com a Morte no decorrer da história humana

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“É impossível conhecer o homem sem lhe estudar a morte, porque, talvez mais do que na vida, é na morte que o homem se revela. É nas suas atitudes e crenças perante a morte que o homem exprime o que a vida tem de mais fundamental.” Edgar Morin
A Morte, a figura sombria em que em nenhuma época o homem foi capaz de lutar contra ela. Um tabu que temos como a única certeza que temos na vida, que não conseguimos esquecê-la ou nega-la. Tentamos controla-la com os avanços da ciência, tendo a esperança de que as contribuições com a medicina, ciências humanas e sociais, possa tirar um pouco desta inquietude que nos persegue desde quando nos conhecemos por seres humanos. O Homem, segundo a ciência, é o único ser vivo que tem consciência da própria finitude. Desde os tempos mais remotos, constroem-se túmulos para sepultamento, fazem-se rituais, culminando em atos de grande inquietação, curiosidade, fascínio e medo. A nossa relação com a indesejada das indesejadas conta-nos uma história, que muitas vezes achamos que sempre foi imutável. Não, a Morte sofreu mutações com o tempo, e vamos contar com que olhos ela foi observado, desde a Pré-história até a nossa idade moderna. Prepara-se, vamos começar uma jornada minuciosa e incrível sobre aquela que nos encontra no final do túnel, carregada de metáforas, com sua foice e capa preta. Nossa velha amiga, aquela que nos espera no final da estrada.
Estudos apontam que o Homem de Neandertal foi o primeiro de nossa linhagem a enterrar os mortos. Como era antes disso? Bem, antes deste conceito, o homem pré-histórico era deixado à mercê dos animais. Nossos antepassados faziam várias oferendas, com os objetos mais próximos do morto, e os mesmos eram enterrados em cavidades abertas em rochas. O corpo era disposto de cócoras e em seguida coberto com pedras. Na época sucessiva ao Neandertal, o homem de Cro-Magnon colocava seus mortos em outra posição, geralmente deitado ou em posição fetal, mantendo as oferendas, na crença de que os mortos poderiam levar elas consigo. Na época do Mesolítico, predominou as sepulturas ovais. Os corpos continuaram a serem cobertos com pedras e geralmente eram adornados com materiais feitos de conchas e dentes de animais. No Neolítico e na Idade do Bronze, consolidaram-se as sepulturas coletivas e marcou o surgimento dos primeiros monumentos funerários.
Alcançar a vida eterna era um lema para os egípcios. Utilizou-se de feitiços, rituais, os embalsamamentos, e a construção de tumbas que entraram para a história. Coma crença de que cada um tinha uma espécie de “alma” que continuava após a morte, os egípcios colocavam uma série de objetos na tumba, a fim de que a “alma” pudesse usufruir-se deles depois da morte. Essa “alma” tinha o nome de “ka”. Sem os objetos, o “ka” não tinha como fazer uma ligação com o corpo físico, e este corpo-físico deveria estar muito bem conservado para que esta união acontecesse. Foi assim que surgiu a mumificação. E como era feita a mumificação? Primeiramente, o cadáver era submetido a um processo de embalsamamento, e o principal ingrediente era o sal, devido à sua grande capacidade de preservação de tecidos. Sobretudo, embalsamar é uma arte, e esta arte tem sua documentação lá no Egito antigo.  É uma forma de proteger o corpo da decomposição, causada por bactérias. O legado antigo foi tão importante para a sociedade moderna, que hoje o processo é pai de várias técnicas utilizadas para translado de corpos em viagens aéreas de longo percurso. O processo no Egito demorava cerca de setenta dias. Primeiramente, o cérebro era removido através das fossas nasais e as vísceras, através de uma incisão localizada no lado esquerdo do tronco. Esvaziado, ou seja, eviscerado, as cavidades eram esterilizadas e as vísceras eram posteriormente tratadas através da desidratação. A desidratação era realizada com natrão, um composto de carbonato de cálcio hidratado. O corpo era preenchido de resinas perfumadas e imerso na solução de natrão. Ficava imerso durante 40 dias. Depois de todo este processo, os membros tinham o preenchimento subcutâneo feito com uma mistura de areia e argila. As cavidades eram preenchidas com panos cheios de resina, serragem e materiais conservantes. Para espantar o odor, compostos aromatizantes feitos de mirra, canela. Com uma espécie de resina derretida, o corpo era envolto e posteriormente envolvido nas famosas faixas de linho. Por fim, a tumba era decorada com os famosos hieróglifos e pinturas.
Os egípcios antigos deixaram um legado cheio de representações da Morte. Trata-se do livro “O livro dos Mortos”, o mais antigo livro ilustrado do mundo. Segundo estudiosos, surgiu na V Dinastia, aproximadamente em 2345 a.C. Este livro contém toda a forma de louvor que os egípcios tinham com seus mortos, desde hinos, preces, textos mágicos de proteção (contra animais necrófagos, violação de túmulos). Os egípcios acreditavam que quem levasse este livro na tumba, encontraria a salvação para alma, pois o livro continha toda a orientação para chegar ao além.
Os romanos foram os primeiros a dar início às esculturas nos túmulos, tal como podemos ver hoje nos cemitérios. Era uma forma de homenagear os entes queridos. Tinha também como característica cultural, a cremação dos mortos, pois a cremação era vista como uma forma de marcar uma nova etapa na vida deles, que era a condição de estarem mortos. Na sociedade Greco-romana havia distinções entre as pessoas que morriam. Os anônimos e os que pertenciam à sociedade comum eram cremados e depois as cinzas eram dispostas em valas coletivas. Aos olhos da sociedade, eram meros mortais. Membros da alta sociedade, considerados como heróis, tinham uma linda cerimônia, e a cremação era cheia de pompa, pois o morto tornar-se-ia um imortal.
 Na Grécia, o sepultamento tinha uma série de rituais. O cadáver era desinfectado, lavado com essências aromáticas e envolto em um pano branco, para representar a pureza. Depois, é envolvido com faixas e disposto em uma mortalha, sempre com o rosto descoberto, pois é uma forma para que a alma possa enxergar o caminho que leva para o outro lado. Objetos de valor eram enterrados com o cadáver e muitas vezes, dependendo da época, colocava-se uma moeda em cima da boca. Como assim? Uma moeda? Sim, a moeda servia como uma espécie de pagamento para o barqueiro Caronte, pois era ele que atravessava as almas nos quatro rios do inferno de Hades. Algumas vezes, próximo ao cadáver, também era colocado um bolo de mel, para que agrade Cérbero, o cão de três cabeças, guardião da porta do inferno de Hades. Os mortos eram expostos em leitos, durante um ou dois dias dentro do cômodo mais importante da casa, sempre com os pés voltados para a porta. Os enterros em Atenas eram realizados antes do nascimento do sol, para que os raios do sol não fossem contaminados pela dor da Morte. As pessoas presentes no enterro se vestiam de preto, cinza ou branco e os cabelos eram cortados como símbolo de dor. Um vaso com cristais era colocado na porta da casa, a fim de absorver a contaminação da Morte. Os cemitérios eram sempre fora dos muros da cidade e então, o corpo era finalmente cremado e os restos recolhidos dentro de uma urna. Após todo este processo, os parentes do falecido tomavam um banho de renovação com água do mar, para retirar as impurezas que o rastro da Morte deixava. Um grande banquete era realizado, durante trinta dias após o falecimento e nos aniversários de falecimento, para dar memória ao falecido.
 Na Idade Média, a relação Homem-Morte desenvolveu-se em duas fases, pois a Morte teve duas representações distintas neste período. Temos a Alta Idade Média, que vai do período do século V até meados do século XII, e a Baixa Idade Média, que vai do século XII até o século XV.
Na primeira fase, nos deparamos com o conceito de uma morte mais “íntima”, ou seja, a Morte era mais presente na sociedade, mais “domesticada” e “familiar”. Nesta época, o morrer era encarado com muita naturalidade. A consciência da Morte era tão intima, que o moribundo já sabendo de sua aproximação, fazia uma espécie de reconciliação, em que pedia perdão por todos os seus pecados. Toda essa reconciliação era a fim de obter a tão desejada paz e o caminho para o paraíso. Um moribundo que não confessasse pedindo perdão aos seus pecados era destino certo a queimar no inferno, e este era um dos maiores medos do homem medieval. A morte súbita era vista com muito temor, pois não teria como pedir o perdão e então, na mentalidade da época, inviabilizaria a ida da alma para o paraíso.
Nesta fase, os mortos eram envoltos em um sudário e não existiam caixões. Os corpos eram jogados em valas, na maioria das vezes em cima de outros cadáveres, sendo muito deles em adiantado processo de decomposição. Os pobres eram enterrados no pátio das igrejas e os mais ricos dentro da igreja. Acreditava-se que aqueles que eram enterrados dentro da igreja, estavam protegidos do inferno, pois os santos e os mártires os protegeriam de toda maldição. Outra característica desta época é a não separação destes ambientes. Nos cemitérios e igrejas, era muito comum ocorrer inúmeras reuniões e festividades, o que denota a principal característica do convívio do homem com a Morte, ambos eram tão íntimos, que não era problema conviverem lado a lado. Segundo o historiador francês Philippe Ariès, autor do livro “História da Morte no Ocidente: Da Idade Média aos dias atuais”,
A atitude antiga em que a morte é ao mesmo tempo próxima, familiar e diminuída, insensibilizada, opõe-se demasiado à nossa onde faz tanto medo que já não ousamos pronunciar o seu nome. É por isso que, quando chamamos a esta morte familiar a morte domada, não entendemos por isso que antigamente era selvagem e que foi em seguida domesticada. Queremos dizer, pelo contrário, que hoje se tornou selvagem quando outrora o não era. A morte mais antiga era domada.”


Na segunda fase, com a ascensão definitiva da Igreja, a familiaridade com a morte tomou outro rumo. O julgamento da morte passa a ser sinônimo de fins dos tempos. A morte começa a tomar conta da literatura e pinturas europeias e esta caracterização é marcada como uma figura de horror, medo, podridão. Foi nesta época que surgiu o ícone que até hoje é tido como símbolo da Morte, o esqueleto e a foice. O conceito de que a morte é conhecida como a Ceifeira, vem do conceito de colheita. A Morte pode ceifar de maneira individual ou coletiva. A peste negra na Idade Média ilustra bem este conceito. Em quadros representativos, podemos ver a personificação da Morte, levando os pestilentos da terra. As guerras e as doenças levaram quase uma sociedade inteira. 1/3 da população europeia foi varrida do mapa por causa da peste bubônica, que era constantemente reintroduzida por causa das Cruzadas. Para tornar o cenário ainda mais mórbido, com a chegada da Inquisição, para punir os infiéis, fizeram que a sociedade da época estivesse ainda mais presente com a morte, todos os dias, sem exceção; e assim, a Morte torna-se um castigo de Deus para o Homem.

O filósofo Espinosa dizia que a sabedoria do homem não é uma meditação sobre a Morte, mas sim sobre a vida. O Homem livre não deveria pensar apenas na morte. Com a chegada do Iluminismo e o avanço da ciência e livre pensamento, o homem ocidental passou a repensar na forma de como encara a Morte. A morte, que antes era algo mais familiar, passou a ser reprimido, pouco falado, um verdadeiro tabu dos dias modernos. Constantemente negamos sua existência. Em 1794, o iluminista Condorcet teve uma visão de como nós encaramos a morte hoje:
“(…) um dia, chegará um período em que a Morte não será nada mais que o efeito de acidentes extraordinários ou da lenta e gradativa decadência de forças vitais: e no qual a duração do intervalo entre o nascimento de um homem e sua decadência não terá um limite que lhe possa ser atribuído”.
Foi durante o século XVII que o termo eutanásia passou a ser visto como um alívio àqueles que estavam sofrendo, e os mesmos médicos que trabalhavam com a cura, trabalharem também com uma morte mais tranquila. Hoje a morte é vista como uma espécie de escândalo, um mistério ao qual não temos do que se esconder. Cala-se e uma esfera de temor assombra em volta daqueles que ouvem falar seu nome. As revoluções científicas ocorridas a partir do século XV colocaram mais razão e intelecto nos pensamentos sobre o assunto. Com o declínio do pensamento religioso, a Morte que antes era vista de forma mais íntima, passou a ser cada vez mais vista como algo ruim. Com o crescimento da burguesia pós-revolução industrial, o conceito de higiene e sanitarismo aumentaram, entrando no concerne da saúde pública. Morrer é sujo, contamina, fede. A morte torna-se cada vez mais impessoal,
”Um tipo absolutamente novo de morrer apareceu durante o século XX, em algumas das zonas mais industrializadas, mais urbanizadas, mais tecnicamente avançadas, do mundo ocidental… Dois traços saltam aos olhos do observador menos atento: a sua novidade, evidentemente, a sua oposição a tudo o que precedeu, de que é a imagem revertida, o negativo: a sociedade expulsou a morte, exceto a dos homens de Estado. Nada avisa já na cidade que se passou qualquer coisa… A sociedade deixa de fazer pausas: o desaparecimento de um indivíduo já não afeta a sua continuidade. Tudo se passa na cidade como se já ninguém morresse.” (Ariès).
O quarto do moribundo passou da casa para o hospital. Devido às causas técnicas médicas, esta transferência foi aceita pelas famílias, estendida e facilitada pela sua cumplicidade. O hospital é a partir de então o único lugar onde a morte pode escapar seguramente à publicidade – ou àquilo que resta – a partir de então considerada como uma inconveniência mórbida. É por isso que se torna o lugar da morte solitária.” (Ariès)
A Morte passou então a ser associada com tudo o que é ruim, não somente ao medo, à perda.

“O quarto do moribundo passou da casa para o hospital. Devido às causas técnicas médicas, esta transferência foi aceita pelas famílias, estendida e facilitada pela sua cumplicidade. O hospital é a partir de então o único lugar onde a morte pode escapar seguramente à publicidade – ou àquilo que resta – a partir de então considerada como uma inconveniência mórbida. É por isso que se torna o lugar da morte solitária.” (Ariès)
“O Beijo da Morte”, é considerado um ícone da arte fúnebre. Criada em 1930, encontra-se no cemitério de Poblenou, em 
Barcelona, na Espanha. É a homenagem de uma família a um filho morto, representado como um deus grego na escultura. 
A estátua, segundo boatos, influenciou Ingmar Berg­man para a criação da obra-prima cinematográfica, “O Sétimo Selo”, 
que retrata a vida e a morte e ilustra a imagem tema desta matéria, acima do título.
Cena da série “Six Feet Under”, de Allan Ball, produzida pela HBO.
A Morte é uma inconstante. Mesmo com o passar dos tempos, sempre nos restará dúvidas e perguntas sobre a Indesejada. A ciência já nos colocou diante da realidade, os aspectos da Morte, já nos debruçamos sobre este tema tentando aceitá-lo. Por que tanto medo? Por que tanto tabu em algo que tanto sabemos que não podemos escapar? Todos nós tempos medo da Morte, essa representação já tão antiga da entidade vestida de negro, o esqueleto que carrega a foice que ceifa vidas. Poucos se aventuram a entender todo o mistério sombrio que existe dentro do tema. E a grande questão deste enigma está na nossa sobrevivência à morte biológica. Será que um dia vamos enganar a morte? Existirá o dia em que ninguém mais morrerá? Pense, reflita. Neste mês o Literatortura trará a você uma série de matérias sobre o tema. Um novo olhar sobre aquela que ninguém escapa. Nem eu e você.
Fontes de Pesquisa:
 ARIÈS, Philippe. A história da morte no ocidente.
ARIÈS, Philippe. O homem diante da morte.
BECKER, Ernest. A Negação da Morte.
GIMENEZ, Sonia Maria. Morte: Implicações ambientais e culturais.
HUIZINGA, Johan. O outono na Idade Média