terça-feira, 23 de agosto de 2011

Gary Habermas e John Dominic Crossan: Sobre a Ressurreição de Jesus

Gary Habermas completou a mais ampla investigação já feita até o momento sobre o que os estudiosos acreditam a respeito da ressurreição de Jesus. Habermas reuniu mais de 1.400 obras dos eruditos mais críticos que falam sobre a ressurreição de Jesus, escritas de 1975 a 2003. Na obra The Risen Jesus and Future Hope, [O Jesus ressurreto e a esperança do futuro]

Habermas expõe que quase todos os estudiosos, independentemente do espectro ideológico — desde os ultra liberais até os conservadores defensores da Bíblia -, concordam que os pontos a seguir, todos relacionados a Jesus e ao cristianismo, são fatos históricos reais:
1.A morte de Jesus deu-se por meio da crucificação romana.
2.Ele foi sepultado, muito provavelmente, num túmulo particular.
3. Pouco tempo depois, os discípulos ficaram desanimados, desolados e desacorçoados, tendo perdido a esperança.
4. O túmulo de Jesus foi encontrado vazio pouco tempo depois de seu sepultamento.
5. Os discípulos tiveram experiências que acreditaram ser aparições reais do Jesus ressurreto.
6. Devido a essas experiências, a vida dos discípulos foi totalmente transformada. Depois disso, até mesmo se dispuseram a morrer por sua crença.
7. A proclamação da ressurreição aconteceu logo de início, desde o começo da história da igreja.
8. O testemunho público e a pregação dos discípulos sobre a ressurreição de Jesus aconteceram na cidade de Jerusalém, onde Jesus fora crucificado e sepultado pouco tempo antes.
9. A mensagem do evangelho concentrava-se na pregação da morte e da ressurreição de Jesus.
10. O domingo passou a ser o principal dia de reunião e adoração.
11. Tiago, irmão de Jesus e cético antes desse evento, converteu-se quando acreditou que também vira o Jesus ressurreto.
12. Poucos anos depois, Saulo de Tarso (Paulo) tornou-se cristão devido a uma experiência que ele também acreditou ter sido uma aparição do Jesus ressurreto.
A aceitação desses fatos faz sentido à luz daquilo que vimos até aqui. As evidências nos demonstram os pontos a serem apresentados a seguir.
A história do Novo Testamento não é uma lenda. Os documentos do NT foram escritos exatamente dentro de um período de duas gerações, com base nos eventos, pelas testemunhas oculares ou por seus contemporâneos. A seqüência da história do NT é corroborada por escritores não-cristãos. Além disso, o NT menciona pelo menos 30 personagens históricas que foram confirmadas por fontes externas ao NT. Portanto, a história do NT não pode ser uma lenda.
A história do Novo Testamento não é uma mentira. Os autores do NT incluíram detalhes divergentes e embaraçosos, dizeres difíceis e exigentes e fizeram cuidadosa distinção entre as palavras de Jesus e suas próprias palavras. Eles também se referiram a fatos e a testemunhas oculares que seus leitores já conheciam ou poderiam verificar. De fato, os autores do NT fizeram seus leitores e os mais destacados inimigos do século I verificarem aquilo que disseram. Se isso não é suficiente para confirmar sua fidedignidade, então seu martírio deveria remover qualquer dúvida. Essas testemunhas oculares sofreram perseguição e morte por causa da declaração empírica de que viram, ouviram e tocaram o Jesus ressurreto, embora elas pudessem ter-se salvado simplesmente negando-se a dar o seu testemunho.
A história do Novo Testamento não é um embelezamento. Os autores do NT foram meticulosamente precisos, conforme evidenciado pelos mais de 140 detalhes historicamente confirmados. Registraram milagres nessas narrativas historicamente confirmadas e o fizeram sem maquiagem aparente ou comentário teológico significativo.
Portanto, o Novo Testamento é verdadeiro? Se a maioria dos estudiosos concorda com os 12 fatos relacionados anteriormente porque as evidências mostram que a história do NT não é uma lenda, uma mentira ou um embelezamento, então sabemos, acima do que se considera dúvida justificável, que os autores do NT registraram com precisão aquilo que viram. Por acaso isso significa que todos os acontecimentos do NT são verdadeiros? Não necessariamente. O cético ainda tem uma questão.
A última questão possível para o cético é que os autores do NT foram enganados.
Em outras palavras, talvez os autores do NT estivessem simplesmente errados em relação àquilo que pensaram ter visto.
Dadas as características do NT que já revisamos anteriormente, não parece plausível que os autores do NT tenham sido enganados com relação a acontecimentos comuns e não miraculosos. Eles se mostraram corretos em relação a muitos detalhes históricos. Por que duvidar de suas observações de acontecimentos do dia-a-dia?
Mas teriam eles sido enganados no caso de acontecimentos miraculosos como a ressurreição de Jesus? Talvez realmente tenham crido que Jesus ressuscitara dos mortos — e, por isso, pagaram com a própria vida -, mas estavam errados ou enganados. Talvez existam explicações naturais para todos os milagres que julgavam ter visto.
Os estudiosos mais críticos ignoram isso. Considere o fato número 5 daquela lista de 12 nos quais praticamente todos os estudiosos acreditam: “Os discípulos tiveram experiências que eles acreditaram ser aparições reais do Jesus ressurreto”. Em outras palavras, os estudiosos não estão necessariamente dizendo que Jesus realmente ressuscitou dos mortos (embora alguns considerem que realmente ressuscitou). O consenso mínimo entre praticamente todos os estudiosos é que os discípulos acreditaram que Jesus ressuscitara dos mortos.
Para que testemunhas oculares e contemporâneos dos acontecimentos estejam errados, é preciso haver alguma outra explicação para a ressurreição de Jesus e os outros milagres registrados no NT. Uma vez que a ressurreição de Jesus é o fato central do cristianismo, vamos começar daí. De que maneira os céticos excluem a ressurreição?

Aqui estão as explicações para a ressurreição de Jesus mais freqüentes ente apresentadas pelos céticos.

Teoria da alucinação. Teriam os discípulos sido enganados por alucinações?
Talvez eles pensaram sinceramente que tinham visto o Cristo ressurreto, mas, em vez disso, na verdade estavam experimentando alucinações. Essa teoria tem muitas falhas fatais. Vamos abordar duas delas.
Em primeiro lugar, as alucinações não são experimentadas por grupos, mas apenas por indivíduos. Nesse aspecto, são muito parecidas com sonhos. É por isso que, se um amigo lhe diz pela manhã: “Uau! Esse foi um grande sonho que nós tivemos, não é?”, você não diz “Sim, foi fabuloso! Vamos continuar hoje à noite?”. Não, você acha que seu amigo ficou louco ou que está simplesmente fazendo uma brincadeira. Você não o leva a sério porque sonhos não são experiências coletivas. Quem tem sonhos é o indivíduo, não grupos. As alucinações funcionam da mesma maneira. Se existirem raras condições psicológicas, um indivíduo pode ter uma alucinação, mas seus amigos não a terão. Mesmo que a tiverem, não terão a mesma alucinação.
A teoria da alucinação não funciona porque Jesus não apareceu uma única vez para uma única pessoa — ele apareceu em dezenas de ocasiões diferentes, numa grande variedade de cenários, para diferentes pessoas, durante um período de 40 dias. Ele foi visto por homens e mulheres. Foi visto caminhando, falando e comendo. Foi visto dentro e fora de lugares. Foi visto por muitos e por poucos. Um total de mais de 500 pessoas viu o Jesus ressurreto. Elas não estavam tendo uma alucinação ou vendo um fantasma, porque, em seis das 12 aparições, Jesus foi fisicamente tocado e/ou comeu comida verdadeira (v. tabela 12.1).
A existência do túmulo vazio é a segunda falha fatal da teoria da alucinação.
Se mais de 500 testemunhas oculares tiveram a experiência sem precedentes de ter a mesma alucinação em 12 ocasiões diferentes, então por que as autoridades judaicas ou romanas simplesmente não exibiram o corpo de Jesus pela cidade? Isso teria desferido um golpe fatal no cristianismo de uma vez por todas. As autoridades adorariam ter feito isso, mas, aparentemente, não puderam fazê-lo porque o túmulo estava realmente vazio.
As testemunhas foram ao túmulo errado. Talvez os discípulos tenham ido ao túmulo errado e, então, presumiram que Jesus havia ressuscitado. Essa teoria também possui duas falhas fatais.
Primeira falha: se os discípulos tivessem ido à sepultura errada, as autoridades judaicas e romanas teriam ido à sepultura certa e, então, teriam mostrado o corpo de Jesus na cidade. O túmulo era conhecido pelos judeus porque era um túmulo deles (pertencia a José de Arimatéia, membro do Sinédrio). O túmulo também era conhecido pelos romanos porque colocaram guardas ali. Como destaca William Lane Craig, a teoria do túmulo errado presume que todos os judeus (e os romanos) tiveram um tipo de “amnésia coletiva’ permanente em relação àquilo que eles haviam feito com o corpo de Jesus.
ORDEM DAS DOZE APARIÇÕES DE JESUS CRISTO
Pessoas
Viram
Ouviram
Tocaram
Outras evidências
1 Maria Madalena (Jo 20.10-18)
X
X
X
túmulo vazio
2. Maria Madalena e outra Maria (Mt 28.1-10)
X
X
X
túmulo vazio (e panos no sepulcro também em Lc 24.1-12)
3. Pedro (1Co 15.5) e João (Jo 20.1-10)
X
X
túmulo vazio, panos no sepulcro
4. Dois discípulos (Lc 24.13-35)
X
X
comeram com ele
5. Dez apóstolos (Lc 24.36-49; Jo 20.19-23)
X
X
X**
viram as feridas,comeram
6. Onze apóstolos(Jo 20.24-31)
X
X
X**
viram as feridas
7. Sete apóstolos a o 21)
X
X
comeram
8. Todos os apóstolos (Mt 28.16-20; Mc 16.14-18)
X
X
9. Quinhentos irmãos (1Co 15.6)
X
X*
10. Tiago (1Co 15.7)
X
X*
11. Todos os apóstolos (At 1.4-8)
X
X
comeram com ele
12. Paulo (At 9.1-9; 1Co 15.8)
X
X
* implícito ** deixou que seu corpo fosse tocado
Tabela 12.1
Segunda falha: mesmo que os discípulos realmente tivessem ido ao túmulo errado, a teoria não explica de que maneira o Jesus ressurreto apareceu em 12 diferentes ocasiões. Em outras palavras, são as aparições que devem ser explicadas, e não apenas o túmulo vazio.
Perceba que o túmulo vazio não convenceu a totalidade dos discípulos (com a possível exceção de João) de que Jesus ressuscitara dos mortos. Foram as aparições de Jesus que os fizeram deixar de ser covardes assustados, fugitivos e céticos e se transformar na maior força missionária pacífica da história. Isso é especialmente verdadeiro com relação a um religioso inimigo do cristianismo, Saulo (Paulo). Ele não apenas não foi convencido pelo túmulo vazio, como estava perseguindo os cristãos logo após a ressurreição de Jesus. Foi necessária uma aparição do próprio Jesus para transformar Paulo. Parece que Tiago, o cético irmão de Jesus, também foi convertido depois de uma aparição de Jesus. Como vimos, a conversão de Tiago foi tão dramática que ele se tornou líder da igreja de Jerusalém e, mais tarde, foi martirizado nas mãos do sumo sacerdote.
O resumo é este: mesmo que alguém pudesse dar uma explicação natural para o túmulo vazio, não seria suficiente como prova contrária à ressurreição. Qualquer teoria alternativa da ressurreição também deve excluir as aparições de Jesus. A teoria do túmulo vazio não faz nenhuma das duas coisas.
Teoria do desmaio, do desfalecimento ou da morte aparente. Existe a possibilidade de Jesus não ter realmente morrido na cruz? Talvez Jesus tenha simplesmente desfalecido. Em outras palavras, ele ainda estava vivo quando foi colocado no túmulo, mas, de alguma maneira, Jesus escapou e convenceu seus discípulos de que havia ressuscitado dos mortos. Existem diversos erros fatais nessa teoria também.
Primeiro erro: tanto inimigos quanto amigos acreditaram que Jesus estava morto.
Os romanos, que eram executores profissionais, chicotearam e bateram em Jesus de maneira brutal. Então, depois disso, pregaram cravos rústicos em seus punhos e em seus pés e enfiaram uma lança em seu lado. Eles não quebraram as pernas para apressar sua morte porque sabiam que já estava morto (as vítimas de crucificação freqüentemente morriam por asfixia porque não podiam erguer o corpo para poder respirar. Quebrar as pernas, portanto, apressaria a morte). Além do mais, Pilatos foi verificar para certificar-se de que Jesus estava morto, e a morte de Jesus foi a razão de os discípulos terem perdido toda a esperança.
A técnica brutal de crucificação romana foi verificada por toda a arqueologia e por fontes escritas não-cristãs (v. capo 15, em que temos uma vívida descrição da experiência da crucificação de Jesus). Em 1968, os restos de uma vítima de crucificação do século I foram encontrados numa caverna em Jerusalém. O osso do calcanhar desse homem tinha um prego de quase 18 cm que o atravessava, e seus braços também mostravam evidências de pregos. A lança no coração também foi reconhecida como uma técnica romana de crucificação pelo autor romano Quintiliano (35-95 d.C.). Em função desse tratamento dispensado a Jesus, não é de surpreender que as testemunhas oculares tenham pensado que ele estivesse morto.
Não foram apenas as pessoas do século I que acreditaram que Jesus estava morto: médicos modernos também acreditam que Jesus realmente morreu. Escrevendo em 21 de março de 1986, na edição do Journal of the American Medical Association, três médicos, incluindo um patologista da Clínica Mayo, concluíram:
Está claro que o peso das evidências históricas e médicas indica que Jesus já estava morto antes de receber o ferimento em seu lado e apóia a visão tradicional de que a lança, introduzida entre as costelas do lado direito, provavelmente perfurou não apenas o pulmão direito, mas também o pericárdio e o coração e, portanto, garantiu sua morte. Por conta disso, interpretações baseadas na pressuposição de que Jesus não morreu na cruz parecem não estar de acordo com o conhecimento médico moderno’!
Como indicamos no capítulo anterior, o sangue e a água que saíram da ferida da lança parecem ser outro detalhe genuíno de uma testemunha ocular, relatado pela pena de João. Esse único fato deveria pôr fim a todas as dúvidas sobre a morte de Jesus.
O segundo grande erro na teoria do desfalecimento é que Jesus foi embalsamado com 34 quilos de bandagens e especiarias. É altamente improvável que José de Arimatéia e Nicodemos ao 19.40) pudessem ter embalsamado por engano um Jesus que ainda estivesse vivo.
Terceiro erro: mesmo que todo mundo estivesse errado sobre o fato de Jesus realmente estar morto quando foi para o túmulo, de que maneira um homem gravemente ferido e sangrando ainda estaria vivo 36 horas depois? Ele teria sangrado até morrer naquele túmulo frio, úmido e escuro.
Quarto erro: se ele tivesse sobrevivido ao túmulo frio, úmido e escuro, de que maneira poderia tirar as bandagens, empurrar a pedra para cima e para fora (uma vez que estava dentro do túmulo), passar pelos guardas romanos (que seriam mortos por permitir uma brecha na segurança) e, então, convencer os covardes assustados, fugitivos e céticos de que ele havia triunfado sobre a morte? Mesmo que pudesse sair do túmulo e passar pelos guardas romanos, Jesus seria apenas uma massa mole alquebrada e ensanguentada de homem, da qual os discípulos teriam pena, e não alguém a quem eles adorariam. Eles diriam: “Você pode estar vivo, mas certamente não ressuscitou. Vamos levá-la já para um médico!”.
Quinto erro: a teoria do desfalecimento não pode explicar a brilhante aparição de Jesus a Paulo na estrada de Damasco. O que transformou esse dedicado inimigo do cristianismo logo depois da crucificação? Certamente não foi um ser humano normal que fora curado de sua experiência de crucificação.
A descrição que Paulo faz de sua conversão está registrada duas vezes no livro de Atos, que é historicamente autenticado. No capítulo 22, Paulo fala a uma multidão judaica hostil sobre a aparição de Cristo a ele:
“Por volta do meio-dia, eu me aproximava de Damasco, quando de repente uma forte luz vinda do céu brilhou ao meu redor. Caí por terra e ouvi uma voz que me dizia: ‘Saulo, Saulo, por que você está me perseguindo?’ Então perguntei: ‘Quem és tu, Senhor?’. E ele respondeu: ‘Eu sou Jesus, o Nazareno, a quem você persegue’.” (v. 6-8).
Paulo ficou sem enxergar por três dias e experimentou uma mudança de 180 graus em suas atitudes. Deixou de ser o mais enérgico inimigo do cristianismo para se tornar o seu mais ardente defensor.
A experiência de conversão de Paulo não pode ser explicada por um Jesus desfalecido segurando uma tocha e usando sua “voz de Deus” no meio dos arbustos. Foi uma mostra dramática do poder divino, em plena luz do dia, que mudou dramaticamente um homem e o mundo para sempre.
Sexto erro: vários autores não-cristãos confirmaram que Jesus morreu por crucificação. Dentre eles, incluímos Josefo, Tácito, Talo e o talmude judaico. O talmude judaico, por exemplo, diz que Yeshua Qesus) foi pendurado num madeiro na véspera da Páscoa. Essa não é considerada uma fonte favorável ao cristianismo, de modo que não há razão para duvidar de sua autenticidade.
Por essas e outras razões, poucos estudiosos ainda acreditam na teoria do desfalecimento. Simplesmente existem evidências demais contra ela.
Os discípulos roubaram o corpo. A teoria de que os discípulos roubaram o corpo de Jesus não pode apoiar a última opção dos céticos — a de que os autores do NT foram todos enganados. Por quê? Porque a teoria faz que os autores do NT sejam os enganadores, e não os enganados! Naturalmente, isso é um ataque frontal a todas as evidências que vimos até aqui. A teoria presume a insustentável posição de que os autores do NT eram todos mentirosos. Por alguma razão inexplicável, roubaram o corpo com o objetivo de serem eles mesmos surrados, torturados e martirizados! As pessoas que defendem essa teoria não podem explicar por que qualquer pessoa faria isso. Por qual razão os discípulos embarcariam em tal conluio de autodestruição? E por que todos eles continuaram a dizer que Jesus ressuscitara dos mortos quando poderiam preservar sua vida ao se negarem a dar seu testemunho?
Além do grave conflito de interesse dos discípulos, os defensores dessa ideia não podem explicar outros absurdos exigidos pela teoria. De que maneira, por exemplo, os discípulos passaram pela guarda de elite romana que fora treinada para guardar o túmulo com o penhor da própria vida? Se Jesus nunca ressuscitou dos mortos, então quem apareceu a Paulo, a Tiago e às outras testemunhas oculares? Os autores do NT mentiram sobre sua conversão também? Paulo simplesmente inventou as evidências encontradas em 1 Coríntios? E o que dizer sobre os autores não-cristãos? Teria Josefo mentido sobre Tiago ter sido martirizado pelo Sinédrio? Por acaso o escritor romano Flegon (nasc. c. 80 d.C.) mentiu também quando escreveu suas Crônicas, em que diz: “Jesus, enquanto vivo, não foi de qualquer ajuda para si mesmo, mas, quando ressuscitou depois da morte, exibiu as marcas de sua punição, e mostrou de que maneira suas mãos foram perfuradas pelos pregos”?. Seria preciso mais do que um “milagre” para que tudo isso acontecesse, caso Jesus não tivesse ressuscitado dos mortos. Não temos fé suficiente para acreditar em tudo isso!
Como já vimos, a noção de que os discípulos roubaram o corpo é exatamente a explicação que os judeus ofereceram para justificar o túmulo vazio. Além do fato de os discípulos não terem nenhum motivo ou habilidade para roubar o corpo, essa antiga explicação judaica não foi uma boa mentira por duas outras razões: 1) como os guardas adormecidos poderiam ter visto que os discípulos haviam roubado o corpo? e 2) nenhum guarda romano se deixaria punir com a pena capital por ter dormido no posto (talvez seja por isso, como registra Mateus, que as autoridades judaicas tiveram de pagar os guardas e prometer que os livrariam de problemas com o governador).
Em 1878, foi feita uma fascinante descoberta arqueológica que corrobora a afirmação bíblica de que os judeus estavam espalhando a versão do roubo. Uma placa de mármore de 38 cm por 60 cm foi descoberta em Nazaré com a seguinte inscrição:
Decreto de César: É meu prazer que tumbas e sepulturas permaneçam perpetuamente imperturbadas por aqueles que as construíram para o culto aos seus ancestrais, aos filhos ou aos membros de sua casa. Se, porém, qualquer um fizer acusação de que outro as destruiu ou que, de alguma maneira, tenha extraído o sepultado, ou o tenha maliciosamente transferido para outro lugar com o objetivo de fazer-lhe mal, ou que tenha substituído o selo por um outro, contra este ordeno que seja constituído um tribunal, tanto com relação aos deuses, como em relação ao culto aos mortais. Pois é muito mais obrigatório honrar os sepultados. Que seja absolutamente proibido a qualquer um perturbá-los. Em caso de violação, desejo que o ofensor seja sentenciado à pena capital ou considerado culpado de violação de sepulcro. I
Os estudiosos acreditam que esse edito foi promulgado pelo imperador Tibério, que reinou de 14 a 37 d.C. (durante a maior parte da vida de Cristo), ou pelo imperador Cláudio, que reinou de 41 a 54 d.C. O aspecto notável desse dito é que ele transforma a simples ação de saquear uma sepultura de um ato passível de multa para um ato passível de pena de morte!
Por que o imperador romano se importaria em promulgar um edito tão severo naquele momento, numa área tão remota de seu Império? Embora ninguém saiba com certeza as razões que levaram à promulgação desse edito, existem algumas possibilidades que remetem a Jesus.
Se a inscrição é de Tibério, então é provável que Tibério tenha ouvido falar de Jesus com base em um dos relatórios anuais que Pilatos teria feito. Justino Mártir afirma que foi isso o que aconteceu. Pode ter sido incluída nesse relatório a explicação judaica para o túmulo vazio (os discípulos roubaram o corpo), levando Tibério a impedir qualquer “ressurreição” futura daquele edito.
Se a inscrição é de Cláudio, então o edito pode ter sido parte de sua resposta às revoltas que aconteceram em Roma no ano 49 d.C. Lucas menciona em Atos 18.2 que Cláudio expulsou os judeus de Roma. Isso é confirmado pelo historiador romano Suetônio, que nos diz que “porque os judeus em Roma causavam perturbações contínuas em função da instigação de Crestos, ele [Cláudio] os expulsou da cidade” (Crestos é uma variante do nome Cristo).
Qual a relação entre Cristo e as revoltas judaicas em Roma? Talvez Roma tivesse experimentado o mesmo curso de fatos ocorridos em Tessalônica basicamente no mesmo período. Em Atos 17, Lucas registra que houve um “tumulto” em Tessalônica quando os judeus “ficaram com inveja’ porque Paulo estava pregando que Jesus ressuscitara dos mortos. Aqueles judeus reclamaram com os oficiais da cidade, dizendo: “Esses homens, que têm causado alvoroço por todo o mundo, agora chegaram aqui [ ... ]. Todos eles estão agindo contra os decretos de César, dizendo que existe um outro rei, chamado Jesus” (v. 6,7).
Se foi isso o que realmente aconteceu em Roma, então Cláudio não estava feliz com o grupo que agia contra os seus decretos e que seguia outro rei. Uma vez que já tinha conhecimento dessa nova seita rebelde nascida entre os judeus que acreditavam que seu líder havia ressuscitado, é possível que tenha expulsado todos os judeus de Roma e transformado a violação de sepulturas em crime capital.
Qualquer uma dessas duas possibilidades poderia explicar o tempo, o local e a severidade do edito. Contudo, mesmo que o edito não estivesse ligado ao túmulo vazio de Cristo, já temos boas evidências de que os judeus propagaram a hipótese do roubo (v. capo anterior). A questão principal é que a hipótese do roubo foi uma admissão tácita de que o túmulo estava realmente vazio. Além do mais, por que os judeus inventariam uma explicação para o túmulo vazio se o corpo de Jesus ainda estivesse ali?
Um substituto assumiu o lugar de Jesus na cruz. Essa é a explicação apresentada pelos muçulmanos hoje — Jesus não foi crucificado, mas alguém — como Judas, por exemplo — foi morto em seu lugar. O Alcorão faz a seguinte afirmação sobre Jesus:
Eles não o mataram, não o crucificaram, mais tudo foi feito para que lhes parecesse assim, e aqueles que discordam desse aspecto estão cheios de dúvidas sem conhecimento (correto), mas apenas conjeturas para seguir, pois com certeza eles não o mataram: não, Alá o ressuscitou para si mesmo; e Alá é Exaltado em Poder, Sábio (surata 4.157,158).
Desse modo, de acordo com o Alcorão, parece que Jesus foi crucificado e que Alá o levou diretamente para o céu.
Existem muitos problemas com essa teoria, sem contar que simplesmente não existe evidência alguma que a apoie. Essa afirmação do Alcorão foi escrita mais de 600 anos depois da vida de Jesus. De que maneira isso pode ser considerado uma fonte mais autorizada sobre a vida de Jesus do que os relatos das testemunhas oculares? Essa teoria contradiz todo o depoimento das testemunhas oculares e o testemunho das fontes não-cristãs.
Além do mais, essa teoria levanta mais perguntas do que respostas. Devemos acreditar que a multidão de testemunhas que presenciou algum aspecto da morte de Jesus — os discípulos, os guardas romanos, Pilatos, os judeus, a família e os amigos de Jesus — estava toda errada sobre quem fora morto? De que maneira tantas pessoas poderiam estar erradas quanto a uma simples identificação? Isso é o mesmo que dizer que Abraham Lincoln não foi a pessoa assassinada ao lado de sua esposa numa noite de abril de 1865 no Teatro Ford. Estaria Mary Lincoln errada sobre o homem que estava sentado ao seu lado? O guarda-costas de Lincoln estava errado sobre quem ele estava guardando? Todas as outras pessoas estavam erradas sobre a identidade do presidente também? Não se pode acreditar nisso.
Existem muitas outras perguntas levantadas por essa teoria. Se Jesus não foi morto, então por que o túmulo do homem que realmente foi morto foi encontrado vazio? Por acaso devemos acreditar que o substituto ressuscitou dos mortos? Se foi assim, de que maneira ele o fez? Devemos acreditar que todos os historiadores não-cristãos estão errados sobre a morte de Jesus? E o que devemos fazer com a admissão judaica da morte de Jesus? Estaria o talmude errado ao dizer que Jesus foi pendurado num madeiro na véspera da Páscoa? Em resumo, devemos acreditar que todas as pessoas do século I estavam erradas sobre tudo?
É preciso questionar uma teoria surgida 600 anos depois dos fatos e que pede a você para acreditar que todas as evidências do século I estão erradas. A verdade é que essa teoria contradiz a maioria dos 12 fatos nos quais praticamente todos os estudiosos acreditam (v. o início deste capítulo). Tal como outras teorias alternativas, essa está construída sobre mera especulação, sem nem mesmo uma partícula de comprovação que possa apoiá-la. Portanto, não temos fé suficiente para acreditar nela.
A fé dos discípulos levou-os à crença na ressurreição. John Dominic Crossan é o co-fundador do grupo de estudiosos e críticos de extrema esquerda que chamam a si mesmos de o “Seminário de Jesus”. Eles decidiram que apenas 18% dos dizeres atribuídos a Jesus nos evangelhos são autênticos (leia mais sobre isso no apêndice 3). Não apresentam nenhuma evidência real para o seu ceticismo, apenas teorias especulativas sobre como a fé dos discípulos levou-os à sua crença na ressurreição e em tudo mais no NT.
Essa teoria foi levantada exatamente durante o debate que Crossan teve com William Lane Craig sobre a ressurreição de Jesus. Crossan apresentou a teoria de que os discípulos inventaram a história da ressurreição porque eles “pesquisaram nas Escrituras” depois de sua morte e descobriram que “a perseguição, se não a execução, era muito semelhante a uma espécie de descrição de função dos eleitos de Deus”.
Todo o debate de duas horas girou em torno da resposta de Craig. Ele disse:
“Certo. Isso surgiu depois de terem presenciado as aparições da ressurreição [ ... ]. A fé dos discípulos não levou às aparições [da ressurreição], mas foram as aparições que levaram à sua fé; depois disso é que eles foram pesquisar nas Escrituras”.
O fato é que os discípulos assustados, amedrontados e céticos não inventariam uma história de ressurreição e depois sairiam por aí dispostos a morrer por Jesus.
Em terceiro lugar, antigas fontes não-cristãs sabiam que os autores do NT não estavam apresentando relatos míticos. Como observa Craig L. Blomberg, “os antigos críticos judaicos e pagãos da ressurreição entenderam que os autores dos evangelhos estavam fazendo afirmações históricas, não escrevendo mitos ou lendas. Eles simplesmente discutiam a plausibilidade dessas afirmações”.
Em quarto lugar, nenhum mito grego ou romano falou da encarnação literal de um Deus monoteísta numa forma humana (cf. Jo 1.1-3,14), por meio de um nascimento virginal (Mt 1.18-25), seguido por sua morte e ressurreição física. Os gregos eram politeístas, e não monoteístas como os cristãos do NT. Além do mais, os gregos acreditavam na encarnação em um corpo mortal diferente; os cristãos do NT acreditavam na ressurreição do mesmo corpo físico que se tornava imortal (cf. Lc 24.37; Jo 9.2; Hb 9.27).
Em quinto lugar, o primeiro paralelo real de um deus que morre e ressuscita só aparece depois do ano 150 d.e, mais de cem anos depois da origem do cristianismo. Desse modo, se houve qualquer influência de um sobre o outro, foi a influência do fato histórico do NT sobre a mitologia, e não o inverso.
O único relato conhecido de um deus sobrevivendo à morte que seja anterior ao cristianismo é o culto egípcio ao deus Osíris. Nesse mito, Osíris é cortado em 14 pedaços, espalhado por todo o Egito e, depois, remontado e trazido de volta à vida pela deusa Ísis. Contudo, Os íris não volta realmente à vida física, mas torna-se membro de um submundo de sombras. Como observam Gary Habermas e Michael Licona, “isso é muito diferente do relato da ressurreição de Jesus, no qual ele é o gloriosamente ressurreto Príncipe da vida que foi visto por outros na terra antes de sua ascensão ao céu”.
Por fim, mesmo se existirem mitos sobre deuses morrendo e ressuscitando que sejam anteriores ao cristianismo, isso não significa que os autores do NT copiaram esses mitos. A série de TV de ficção científica Jornada nas estrelas precedeu o programa norte-americano do ônibus espacial, mas isso não significa que as reportagens de jornal sobre as missões do ônibus espacial são influenciadas pelos episódios de Jornada nas estrelas! É preciso olhar para a evidência de cada relato para ver se é histórico ou mítico. Não há testemunhas oculares ou evidências que corroborem a historicidade da ressurreição de Os íris ou de qualquer outro deus pagão. Ninguém acredita que eles sejam realmente figuras históricas. Contudo, como vimos, existem fortes evidências de testemunhas oculares que corroboram a historicidade da morte e da ressurreição de Jesus Cristo.

Os cristãos estão acostumados a “contra-atacar” teorias alternativas da ressurreição. De fato, nós mesmos acabamos de fazer isso ao destacar as inúmeras deficiências das teorias alternativas. Mas isso não é suficiente. Embora os céticos corretamente coloquem o ônus da prova da ressurreição sobre os cristãos (e, como vimos, os cristãos podem satisfazer essa prova com boas evidências), os cristãos precisam colocar o ônus da prova sobre os céticos quanto às suas teorias alternativas. À luz de todas as evidências positivas da ressurreição, os céticos devem mostrar evidências positivas originárias do século I para suas visões alternativas.

Uma coisa é inventar uma teoria alternativa da ressurreição; outra é encontrar evidências do século I para ela. Uma teoria não é uma evidência. É sensato exigir evidências, não apenas teoria. Qualquer um pode inventar uma teoria para explicar um fato histórico qualquer. Por exemplo: você acreditaria numa história que afirmasse que todo o material filmado nos campos de concentração do Holocausto fora encenado e fabricado por judeus com o objetivo de angariar simpatia e apoio para um Estado judeu? É claro que não, porque isso vai de encontro a todas as evidências conhecidas. Para serem levados a sério, aqueles que propõem tal teoria devem apresentar relatórios dignos de crédito e independentes de testemunhas oculares, além de outras evidências corroborantes, para irem na direção oposta aos inúmeros relatos que dizem que o Holocausto foi real e que foi realmente perpetrado pelos nazistas. Mas não existe nenhuma dessas contra-evidências.
Esse é o caso da ressurreição. Embora os céticos tenham formulado diversas teorias alternativas para desacreditar a ressurreição, não há evidência de alguma fonte do século I que apoie qualquer uma dessas teorias. A única teoria que é até mesmo mencionada por uma fonte do século I (os discípulos roubaram o corpo) vem de Mateus e é claramente identificada como mentira. Ninguém do mundo antigo — nem mesmo os inimigos do cristianismo — deu uma explicação alternativa plausível para a ressurreição. Muitas das teorias alternativas formuladas nos 200 anos seguintes estão baseadas no anti-sobrenaturalismo. Uma vez que os estudiosos modernos eliminam filosoficamente os milagres logo de início, eles inventam explicações ad hoc para desacreditar a ressurreição. Como vimos, suas explicações ad hoc contêm inúmeros absurdos e improbabilidades.
Deveríamos perguntar àqueles que possuem teorias alternativas para a ressurreição: “Que evidências você tem para sua teoria? Por favor, poderia citar três ou quatro fontes do século I que apóiem sua teoria?”. Quando os céticos honestos se vêem diante dessa pergunta, normalmente respondem com o silêncio ou admitem de modo gaguejante que não possuem tais evidências, porque elas não existem.
E não é apenas a ressurreição que os céticos precisam explicar. Também precisam explicar os outros 35 milagres que as testemunhas oculares associaram a Jesus. Devemos acreditar que os quatro autores dos evangelhos foram todos enganados acerca de todos aqueles milagres, bem como sobre a ressurreição de Jesus?
Essa teoria de engano em massa precisa de evidência. Possuímos alguma outra fonte do século I que ofereça uma explicação diferente para as obras de Jesus? A única que foi descoberta (e que provavelmente é do século 11) é o !talmude judaico, que admite que Jesus realizou atos incomuns dizendo que ele “praticava feitiçaria’. Mas essa explicação é tão fraca quanto a explicação judaica para a ressurreição (os discípulos roubaram o corpo). Talvez a feitiçaria pudesse explicar alguns dos “milagres” de Jesus, mas o que dizer de todos os 35? Feiticeiros e mágicos não podem realizar o tipo de ato que se diz que Jesus realizou — ressuscitar mortos, dar vista a cegos, caminhar sobre as águas, e assim por diante.
Desse modo, se não existe nenhuma evidência antiga para esse engano coletivo, devemos aceitar os milagres do NT como são apresentados? Por que não? Vivemos num Universo teísta, onde milagres são possíveis. Embora seja verdade que não tenhamos confirmação independente para todos os milagres do NT (porque alguns são mencionados por apenas um autor), certamente temos múltiplas confirmações de muitos deles (até mesmo a ressurreição de Jesus). A quantidade de milagres de Jesus citados por fontes independentes é grande demais para que eles sejam eliminados como se fossem um grande engano. Uma pessoa pode ser enganada uma vez, mas não é possível que vários observadores sejam enganados repetidamente.
O estudioso alemão Wolfgang Trilling escreve: “Estamos convictos e consideramos historicamente correto que Jesus de fato realizou milagres [ ... ]. Os relatos de milagres ocupam tanto espaço nos evangelhos que é impossível que tudo isso pudesse ter sido subsequentemente inventado ou transferido para Jesus”.
William Lane Craig conclui: “O fato de que a obra miraculosa pertence ao Jesus histórico não é mais discutido”. Ou seja, os milagres não são discutidos com bases históricas, mas apenas com bases filosóficas (falaremos sobre isso mais à frente).
O mais importante é que existem muitos milagres e muito testemunho para se acreditar que todas as testemunhas oculares erraram todas as vezes. Com respeito à ressurreição, todas as teorias alternativas possuem erros fatais e temos fortes evidências circunstanciais e de testemunhas oculares de que Jesus realmente ressuscitou dos mortos. Em outras palavras, não apenas carecemos de uma explicação natural para o túmulo vazio, mas temos evidências positivas da ressurreição. A explicação que exige a menor quantidade de fé é a de que Jesus realmente realizou milagres e realmente ressuscitou dos mortos como havia predito anteriormente. Desse modo, não temos fé suficiente para acreditar que os autores do Novo Testamento foram todos enganados.

Se temos uma cópia precisa de um testemunho antigo (cap. 9); se esse testemunho é não apenas antigo, mas provém de testemunhas oculares (cap. 10); se essas testemunhas oculares registraram com precisão aquilo que viram (cap. 11); e se as testemunhas oculares não foram enganadas sobre aquilo que registraram (este capítulo), então por que nem todos os estudiosos aceitam o NT como ele é? Pela mesma razão que os darwinistas recusam-se a reconhecer as evidências que derrotam sua visão: possuem um viés filosófico contrário aos milagres.

Esse viés foi admitido durante um debate entre Craig e Crossan. Craig acredita, como nós, que a evidência da historicidade da ressurreição literal é forte. Por outro lado, Crossan não acredita que Jesus ressuscitou literalmente dos mortos. Leia a seguir um trecho do debate entre os dois homens:
Craig: — Haveria alguma coisa, dr. Crossan, que pudesse convencê-lo do fato histórico de que Jesus ressuscitou dos mortos?
Crossan: — Preciso certificar-me do que estamos falando. Digamos que estamos diante de algum acontecimento do lado de fora do túmulo vazio na manhã do domingo de Páscoa. Se alguém tivesse uma câmera de vídeo, teríamos o registro de alguma coisa saindo do túmulo? É esse o tipo da pergunta?
Craig: — Creio que o que estou perguntando e o que penso que o sr. Buckley [o moderador do debate] está exigindo é isto: que evidência seria necessária para convencê-lo? Ou você possui uma idéia preconcebida sobre a impossibilidade do miraculoso e similares que, de fato, é tão forte que distorce o seu julgamento histórico, de modo que tal fato jamais pudesse ser admitido num tribunal?
Crossan: — Não … Um médico na cidade de Lourdes poderia admitir: “Não possuo uma maneira médica de explicar o que aconteceu”. Essa é uma afirmação correta. Então alguém tem o direito de dizer: “Portanto, eu, pela fé, acredito que Deus interveio aqui”. Mas é uma pressuposição teológica minha de que Deus não opera dessa maneira … O que seria necessário para me provar o que você pergunta? Eu não sei, a não ser que Deus mude o Universo. Eu poderia imaginar descobrir amanhã pela manhã que todas as árvores do lado de fora da minha casa moveram-se 2 metros. Isso exige alguma explicação. Não sei qual é a explicação, mas não presumiria imediatamente que foi um milagre.
A declaração explícita de Crossan de sua pressuposição teológica contra os milagres é uma franca admissão de sua parte. Naturalmente Crossan não está falando em nome de todos os estudiosos céticos. Contudo, certamente a maioria deles nega a leitura direta do NT porque compartilha de seu viés filosófico contra os milagres. Não é que a evidência histórica favorável ao NT seja fraca (na verdade, ela é muito forte). É que excluíram os milagres de antemão. Chegam à conclusão errada porque seu viés os impede de chegar à conclusão correta.

Vamos analisar o comentário final de Crossan sobre as árvores no seu jardim movendo-se 2 metros da noite para o dia. Ele diz que ele”não presumiria imediatamente que foi um milagre”. Bem, nós também, porque a maioria dos fatos realmente possui uma explicação natural (que, conseqüentemente, ajuda os milagres a destacar-se quando ocorrem). Desse modo, faz total sentido procurar uma explicação natural em primeiro lugar.

Mas isso significa que nunca deveríamos concluir que um fato qualquer (como as árvores movendo-se) foi um milagre? Crossan não concluiria isso por causa de sua pressuposição teológica de que Deus “não opera dessa maneira”. Contudo, uma vez que a pressuposição é injustificada — porque Deus existe -, qual seria a conclusão correta? Depende do contexto do fato. Lembre-se do capítulo 5, no qual dissemos que a evidência deve ser interpretada à luz do contexto no qual ela é encontrada.
Desse modo, vamos supor que o evento de Crossan no qual as árvores movem-se aconteceu no seguinte contexto: 200 anos antes, alguém que afirma ser um profeta de Deus escreve uma predição de que todas as árvores numa área de Jerusalém realmente se moveriam 1 metro numa noite, em um ano em particular. Duzentos anos depois, um homem chega para dizer às pessoas da cidade que o milagre do mover das árvores vai acontecer em breve. Esse homem afirma ser Deus, ensina verdades profundas e realiza muitos outros atos incomuns que parecem ser milagres.
Então, numa manhã, diversas testemunhas oculares afirmam que as árvores no jardim de Jerusalém de Crossan — incluindo algumas com raízes profundas, carvalhos com 30 metros de altura — realmente se moveram 1 metro durante a noite, exatamente como o homem-Deus predissera. Essas testemunhas oculares também dizem que esse é apenas um dos mais de 30 milagres realizados por aquele homem-Deus. Então as testemunhas começam a sofrer perseguição e martírio por proclamar tais milagres e recusar-se a negar o seu depoimento. Os oponentes do homem-Deus não negam a evidência sobre as árvores ou os outros milagres, mas oferecem uma explicação natural que possui inúmeros erros fatais. Muitos anos mais tarde, depois que todas as testemunhas morreram, os céticos oferecem explicações naturais adicionais que fatalmente são comprovadas como erros. De fato, nos 1.900 anos seguintes, os céticos tentam explicar o fato de maneira natural, mas nenhum deles consegue.
Pergunta: Dado o contexto, não seria racional presumir que o movimento das árvores foi sobrenatural, em vez de ter uma origem natural? É claro que sim. O contexto faz toda a diferença.
Esse é o caso que temos quanto à ressurreição. Não é simplesmente porque não temos uma explicação natural para o túmulo vazio. É que temos evidências circunstanciais positivas de testemunhas oculares que corroboram favoravelmente o milagre da ressurreição de Jesus. Aqui está o contexto no qual devemos avaliar as evidências.
I. A natureza teísta deste Universo faz milagres serem possíveis. Vivemos num Universo teísta onde milagres são possíveis (na verdade, o maior milagre de todos — a criação do Universo do nada — já aconteceu). Desse modo, Deus pode usar profetas para anunciar sua mensagem e milagres para confirmá-la. Ou seja, um milagre pode ser usado para confirmar a palavra de Deus, por meio de um homem de Deus, ao povo de Deus.
II. Documentos antigos dizem que se devem esperar os milagres. Temos documentos do AT, escritos centenas de anos antes, que predizem que o Messias — um homem que, na verdade, seria Deus — viria, seria morto num momento específico como sacrifício pela humanidade pecaminosa e ressuscitaria dos mortos (v. mais sobre esse assunto no capítulo seguinte).
III. Documentos de testemunhas oculares historicamente confirmados dizem que os milagres são reais. Existem 27 documentos escritos por nove testemunhas oculares ou por seus contemporâneos que descrevem diversos acontecimentos miraculosos. Muitos desses documentos contêm depoimentos historicamente confirmados de testemunhas oculares que remontam aos tempos dos acontecimentos, e essas evidências demonstram que a narrativa não foi inventada, maquiada ou produto de fraude. Sabemos isso porque os documentos do NT satisfazem todos os sete testes de historicidade identificados no capítulo 9. Os documentos do NT:
  1. são antigos (a maioria deles foi escrita 15 a 40 anos depois, num período de no máximo duas gerações depois dos fatos);
    1. possuem depoimento de testemunhas oculares;
  2. possuem depoimento independente de testemunhas oculares de múltiplas fontes;
    1. foram escritos por pessoas dignas de confiança que ensinaram e viveram de acordo com elevados padrões de ética e que morreram por causa de seu testemunho;
  3. descrevem acontecimentos, locais e indivíduos corroborados pela arqueologia e por outros autores;
  4. descrevem alguns acontecimentos que os inimigos tacitamente admitem serem verdadeiros (confirmação do inimigo);
  5. descrevem acontecimentos e detalhes que são embaraçosos para os autores e até mesmo para o próprio Jesus.
Esses documentos historicamente confirmados de testemunhas oculares contam a seguinte história:
  1. No tempo, no local e da maneira predita pelo AT, Jesus chega a Jerusalém e afirma ser o Messias. Ele ensina verdades profundas e, de acordo com numerosas testemunhas oculares independentes, realiza 35 milagres (alguns em grupos de pessoas) e ressuscita dos mortos.
  2. As testemunhas oculares — que antigamente eram covardes e descrentes — repentinamente começam a proclamar a ressurreição de Jesus de maneira ousada, arrostando perseguição e morte (pessoas mal orientadas podem morrer por uma mentira que elas consideram ser verdade, mas não vão morrer por uma mentira que sabem que é uma mentira. Os autores do NT estavam em posição de saber a verdade real sobre a ressurreição).
  3. Na própria cidade da morte e do túmulo de Jesus, um novo movimento (a igreja) nasce e espalha-se rapidamente de maneira pacífica, na crença de que Jesus ressuscitou dos mortos (isso seria difícil de explicar se a ressurreição não tivesse acontecido. Como seria possível o cristianismo começar em uma cidade hostil como Jerusalém se o corpo de Jesus ainda estivesse no túmulo? As hostis autoridades religiosas e governamentais teriam exposto o cristianismo como uma farsa ao apresentarem o corpo).
  4. Os milhares de judeus de Jerusalém, incluindo sacerdotes fariseus, abandonaram cinco de suas crenças e práticas mais estimadas e adotaram novas práticas estranhas ao se converter ao cristianismo.
  5. Saulo, o mais ardoroso inimigo da igreja nascente, converte-se repentinamente e torna-se seu propagador mais produtivo. Ele viaja pelo mundo antigo para proclamar a ressurreição, sofrendo perseguição e martírio (se a ressurreição não tivesse acontecido, então por que o maior inimigo do cristianismo repentinamente se tornaria seu maior líder? Por que sofreria voluntariamente perseguição e morte?).
  6. Tiago, o cético irmão de Jesus, repentinamente se convence de que seu irmão é o Filho de Deus e, então, torna-se o líder da igreja em Jerusalém. Mais tarde, sofre martírio nas mãos do sumo sacerdote (todos nós sabemos que os membros da família podem ser as pessoas mais difíceis de se convencerem de nosso ponto de vista religioso. Tiago começou como um irmão inconvicto de Jesus (Jo 7.5]. Se a ressurreição não tivesse acontecido, então por que Tiago — que foi chamado de “o justo” pelos historiadores Clemente e Hegesipo no século 11 — repentinamente se tornaria crente de que seu irmão realmente era o Messias? A não ser que tenha visto o Cristo ressurreto, por que Tiago se tornaria o líder da igreja em Jerusalém e sofreria a morte por meio de martírio?).
    1. Os inimigos judeus do cristianismo não negam as evidências, mas oferecem justificativas naturais falhas para explicá-la.
IV: Confirmação adicional. As referências coletivas de outros historiadores e de autores antigos confirmam essa linha básica da história dos documentos do NT, e várias descobertas arqueológicas confirmam os detalhes que esses documentos descrevem.
Quando se colocam as evidências no contexto adequado, você pode ver por que não temos fé suficiente para sermos céticos em relação a isso. É muito mais lógico ser cético sobre o ceticismo!
Os céticos que analisam os pontos 11 a IV mostrados anteriormente (incluindo seus subi tens) podem concluir que Jesus não ressuscitou dos mortos. Mas, se o fizerem, então precisarão dar evidências para uma teoria alternativa que possa responder a todas essas questões. Como já vimos, eles falharam terrivelmente. A ressurreição é a melhor explicação para todas as evidências.
Uma vez que existe um Deus capaz de agir, então pode haver atos de Deus.
Quando a intenção de Deus é anunciada antecipadamente e você possui bons depoimentos de testemunhas oculares e evidências que corroboram que tais fatos realmente aconteceram, é preciso ter muito mais fé para negar esses eventos do que para acreditar neles.

Existem duas objeções adicionais que os céticos freqüentemente levantam contra a ressurreição de Jesus e os milagres. A primeira é a demanda por evidência extraordinária.

Evidência extraordinária. Alguns céticos podem admitir que a ressurreição seja possível, mas eles dizem que isso exigiria uma evidência extraordinária para que fosse crível. Ou seja, uma vez que o NT faz afirmações extraordinárias como os milagres -, devemos ter evidências extraordinárias com o objetivo de acreditar nessas afirmações. Essa objeção parece lógica até que se pergunte: “o que significa ‘extraordinário’?”.
Se significa além do natural, então o cético está pedindo que a ressurreição seja confirmada por outro milagre. Como isso poderia funcionar? Com o objetivo de acreditar no primeiro milagre (a ressurreição), o cético precisaria então de um segundo milagre que a apoiasse. Ele então exigiria um terceiro milagre para apoiar o segundo, e isso prosseguiria infinitamente. Assim, por esse critério, o cético nunca acreditaria na ressurreição de Jesus. Existe alguma coisa errada com um padrão de prova que impossibilita que se creia naquilo que realmente aconteceu.
Se “extraordinário” significa repetível como no laboratório, então nenhum fato da história é digno de crédito, porque os fatos históricos não podem ser repetidos. A credibilidade de um fato histórico só pode ser confirmada ao olhar-se para a qualidade das evidências das testemunhas oculares e para a natureza das evidências forenses à luz dos princípios de uniformidade e causalidade (abordamos esses princípios no capo 5). Além disso, os ateus que exigem a repetibilidade dos milagres bíblicos são incoerentes, porque não exigem repetibilidade de “milagres” históricos nos quais eles acreditam — o Big Bang, a geração espontânea da primeira vida e a macroevolução das formas de vida subsequentes.
Se “extraordinário” significa mais do que o comum, então é exatamente o que temos para apoiar a ressurreição. Temos mais documentos de testemunhas oculares e documentos de testemunhas oculares mais antigos sobre a ressurreição de Jesus do que de qualquer outra coisa do mundo antigo. Além do mais, esses documentos incluem mais detalhes históricos e personagens e foram corroborados por mais fontes independentes e externas do que qualquer outra coisa do mundo antigo. Como acabamos de ver, também temos mais do que evidências circunstanciais comuns apoiando a ressurreição de Jesus.
Por fim, as pressuposições dos céticos podem ser contestadas. Não precisamos de evidências “extraordinárias” para acreditar em alguma coisa. Os ateus afirmam isso com base em sua própria visão de mundo. Eles acreditam no Big Bang não porque ele tenha evidências “extraordinárias” favoráveis, mas porque existem boas evidências de que o Universo explodiu e passou a existir do nada. Boas evidências é tudo de que você precisa para acreditar em alguma coisa. Contudo, os ateus não possuem nem mesmo boa evidência para algumas de suas próprias crenças tão preciosas. Os ateus acreditam, por exemplo, na geração espontânea e na macroevolução somente pela fé. Dizemos somente pela fé porque, como vimos nos capítulos 5 e 6, não apenas existe pouca ou nenhuma evidência para a geração espontânea e a macroevolução, mas existem fortes evidências contra essas possibilidades.
Além disso, os céticos não exigem evidências “extraordinárias” para outros fatos “extraordinários” da história. Poucos fatos da história antiga, por exemplo, são mais “extraordinários” do que os feitos de Alexandre, o Grande (356-323 a.C.). Apesar de ter vivido apenas 33 anos, Alexandre alcançou um sucesso sem paralelo. Ele conquistou grande parte do mundo civilizado de sua época, desde a Grécia, indo ao leste da Índia e ao sul do Egito. Contudo, como sabemos tudo isso sobre Alexandre? Não temos fontes da época de sua vida ou de pouco tempo depois de sua morte. Temos apenas fragmentos de duas obras escritas cerca de cem anos depois de sua morte. A verdade é: baseamos quase tudo o que sabemos sobre a vida “extra-ordinária” de Alexandre, o Grande, daquilo que historiadores escreveram cerca de 300 a 500 anos depois de sua morte! À luz das robustas evidências favoráveis à vida de Cristo, qualquer um que duvide da historicidade de Cristo deveria também duvidar da historicidade de Alexandre, o Grande. De fato, para ser coerente, tal cético deveria duvidar de toda a história antiga.
Por que os céticos pedem evidências “extraordinárias” para a vida de Cristo, mas não para a vida de Alexandre, o Grande? Porque se apegam novamente aos milagres. Apesar do fato de os milagres serem possíveis pelo fato de Deus existir — e a despeito do fato de que os milagres foram preditos e depois testemunhados -, os céticos não suportam admitir que os milagres realmente aconteceram. Desse modo, colocam o padrão de credibilidade num nível muito alto. É como se algum cético estivesse dizendo: “Eu não vou acreditar nos milagres porque não vi um deles acontecer. Se Jesus ressurreto aparecesse a mim, então eu acreditaria nele”. Essa então seria uma evidência extraordinária.
Ela seria certamente extraordinária, mas seria realmente necessária? Jesus precisa aparecer a toda pessoa no mundo para que suas declarações sejam dignas de crédito? Por que faria isso? Não precisamos testemunhar todo acontecimento em primeira mão com o objetivo de acreditar que ele realmente aconteceu. De fato, seria fisicamente impossível fazer isso. Acreditamos no testemunho dos outros se são pessoas dignas de confiança e especialmente se o seu testemunho é corroborado por outros dados. É exatamente isso o que acontece com o testemunho dos autores do NT.
Além do mais, como destacamos no capítulo 8, se Deus fosse muito aberto à demonstração de milagres freqüentes, então, em alguns casos, estaria infringindo o nosso livre-arbítrio. Se o propósito desta vida é permitir que façamos escolhas livremente que vão nos preparar para a eternidade, então Deus vai nos dar evidências convincentes — mas não evidências impositivas — de sua existência e de seus propósitos. Portanto, aqueles que querem seguir a Deus podem fazê-lo com confiança, e aqueles que não querem podem suprimir ou ignorar a evidência e viver como se ele não existisse.
Milagres que se auto-cancelam. O grande cético David Hume argumentou que os milagres não podem confirmar a religião de alguém porque são baseados em um testemunho pobre e todas as religiões os possuem. Em outras palavras, as declarações sobre milagres se auto-cancelam. Infelizmente para Hume, sua objeção não descreve o estado real das coisas.
Em primeiro lugar, Hume faz uma generalização precipitada ao dizer que os supostos milagres de todas as religiões são iguais. Como estamos vendo desde o capítulo 9, os milagres associados ao cristianismo não estão baseados em um testemunho pobre. Eles estão baseados em um testemunho antigo, de testemunhas oculares e de múltiplas fontes que não possuem similares em qualquer outra religião mundial. Ou seja, nenhuma outra religião mundial testificou milagres como aqueles presentes no NT.
Em segundo lugar, a objeção de Hume é anterior às descobertas da ciência moderna que confirmam que este é um Universo teísta (caps. 3-6). Uma vez que este é um Universo teísta, o judaísmo e o islamismo são as únicas outras grandes religiões mundiais com possibilidade de serem verdadeiras. Os milagres que confirmam o AT do judaísmo também confirmam o cristianismo. Desse modo, resta o islamismo como a única alternativa possível para “cancelar” os milagres do cristianismo. Contudo, como vimos no capítulo 10, não existem milagres verificáveis confirmando o islamismo. Todos os supostos milagres de Maomé surgiram depois de sua morte e não estão baseados no depoimento de testemunhas oculares.
Por fim, a singularidade, a quantidade e a qualidade dos milagres do NT não podem ser explicadas por qualquer outra coisa que não seja uma causa sobrenatural. Jesus realizou mais de 30 milagres, os quais foram instantâneos, sempre bem-sucedidos e singulares. Alguns foram até mesmo preditos. Os assim chamados milagreiros que afirmam sucesso parcial realizam apenas curas psicossomáticas, estão envolvidos em embuste, realizam sinais satânicos ou estão baseados em acontecimentos que podem ser explicados naturalmente. De fato, nenhum curandeiro contemporâneo jamais afirmou ser capaz de curar todas as doenças (incluindo as “incuráveis”) instantaneamente, com 100% de sucesso. Mas Jesus e os apóstolos fizeram isso. Assim, fica demonstrada a natureza singular e de autenticação divina dos milagres do NT contra todas as afirmações sobrenaturais de qualquer outra religião. Em resumo, nada “cancela” os milagres do NT.

No começo do capítulo 9, dissemos que existem duas perguntas às quais precisamos responder para verificar se o NT é verdadeiramente histórico:

  1. Possuímos cópias precisas dos documentos originais que foram escritos no século I?
  2. Esses documentos falam a verdade?
Como temos observado nos últimos quatro capítulos, há fortes evidências para uma resposta afirmativa a ambas as perguntas. Em outras palavras, podemos ter certeza, ainda que passível de dúvida, de que o NT é historicamente confiável.
Nesse ponto, não estamos dizendo que o NT está isento de erros. Vamos investigar essa questão mais tarde. Por ora, podemos apenas concluir que os principais fatos do NT realmente aconteceram cerca de 2 mil anos atrás. Jesus realmente viveu, ensinou, realizou milagres, morreu crucificado e depois ressuscitou dos mortos.
Se você ainda não se convenceu, considere mais uma peça das evidências corroborantes o incrível impacto da vida de Cristo conforme expresso num pequeno excerto de um sermão freqüentemente intitulado “Uma vida solitária’:
Ele nasceu numa vila obscura, filho de um camponês. Cresceu em outra vila, onde trabalhou como carpinteiro até os 30 anos. Então, por três anos, foi pregador itinerante. Ele nunca escreveu um livro. Nunca teve um escritório. Nunca constituiu família nem teve casa. Ele não foi para a faculdade. Nunca viveu numa cidade grande. Nunca viajou a mais de 300 quilômetros do lugar onde nasceu. Nunca realizou as coisas que normalmente acompanham a grandeza. Ele não tinha credenciais, a não ser ele mesmo. Tinha apenas 33 anos quando a onda da opinião pública voltou-se contra ele. Seus amigos fugiram. Um deles o negou. Foi entregue aos seus inimigos e sofreu zombaria durante seu julgamento. Foi pregado numa cruz entre dois ladrões. Enquanto estava morrendo, por meio de sortes seus executores disputavam suas roupas, a única coisa material que tivera. Quando morreu, foi colocado numa sepultura emprestada, por compaixão de um amigo.
[Vinte] séculos se passaram, e hoje ele é a figura central da raça humana. Sintoma plenamente confiante quando digo que todos os exércitos que já marcharam, todos os navios que já navegaram, todos os parlamentos que já discutiram, todos os reis que já reinaram, colocados juntos, não afetaram a vida do homem nesta Terra tanto quanto aquela vida solitária.
Se não houve ressurreição, de que maneira essa vida poderia ter sido a vida mais influente de todos os tempos? Não temos fé suficiente para acreditar que essa vida solitária de uma vila remota e antiga pudesse ser a mais influente de todos os tempos … A não ser que a ressurreição seja verdadeira.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Richard A. Horsley, John P. Meier, e a figura histórica de Jesus


Numa incrível viagem à Palestina do século 1, historiadores e arqueólogos reconstituem com era a vida do homem comum que se tornou o filho de Deus para os mais de 2 bilhões de cristãos.

Cristo está em toda parte: nas obras mais importantes da história da arte, nos roteiros de Hollywood, nos letreiros luminosos de novas igrejas, nas canções evangélicas em rádios gospel, nos best-sellers de auto-ajuda, nos canais de televisão a cabo, nos adesivos de carro, nos presépios de Natal. Onde você estiver, do interior da floresta amazônica às montanhas geladas do Tibete, sempre será possível deparar com o símbolo de uma cruz, pena de morte comum no Império Romano à qual um homem foi condenado há quase 2 mil anos. Para mais de 2 bilhões de pessoas esse homem era o próprio messias ("Cristo", do grego, o ungido) que ressuscitara para redimir a humanidade.

Embora o mundo inteiro (inclusive os não-cristãos) esteja familiarizado com a imagem de Cristo, até há bem pouco tempo os pesquisadores eram céticos quanto à possibilidade de descobrir detalhes sobre a vida do judeu Yesua (Jesus, em hebraico), o homem de carne e osso que inspirou o cristianismo. "Isso está começando a mudar", diz o historiador André Chevitarese, professor de História Antiga da Universidade Federal do Rio de Janeiro e um dos especialistas no Brasil sobre o "Jesus histórico" - o estudo da figura de Jesus na história sem os constrangimentos da teologia ou da fé no relato dos evangelhos. Embora tragam detalhes do que teria sido a vida de Jesus, os evangelhos são considerados uma obra de reverência e não um documento histórico. Chevitarese e outros pesquisadores acreditam que, apesar de não existirem indícios materiais diretos sobre o homem Jesus, arqueólogos e historiadores podem ao menos reconstruir um quadro surpreendente sobre o que teria sido a vida de um líder religioso judeu naquele tempo, respondendo questões intrigantes sobre o ambiente e o cotidiano na Palestina onde ele vivera por volta do século I.

NAZARÉ, ENTRE 6 E 4 A.c.

Uma aldeia agrícola com menos de 500 habitantes, cuja paisagem é pontuada por casas pobres de chão de terra batida, teto de estrados de madeira cobertos com palha, muros de pedras coladas com uma argamassa de barro, lama ou até de uma mistura de esterco para proteger os moradores da variação da temperatura no local. Segundo os arqueólogos, essa é a cidade de Nazaré na época em que Jesus nasceu, provavelmente entre os anos 6 e 4 a.c., no fim do reinado de Herodes. Isso mesmo: segundo os historiadores, Jesus deve ter nascido alguns anos antes do ano 1 do calendário cristão. "As pessoas naquele tempo não contavam a passagem do tempo como hoje, por meio da indicação do ano", explica o historiador da Unicamp Pedro Paulo Funari. "O cabeçalho dos documentos oficiais da época trazia apenas como indicação do tempo o nome do regente do período, o que leva os pesquisadores a crer que Jesus teria nascido anos antes do que foi convencionado."

Estudos históricos sobre a vida dos judeus da Palestina no século 1 a.C.
indicam que Jesus nasceu em Nazaré e que tinha irmãos

Se você também está se perguntando por que os historiadores buscam evidências do nascimento de Jesus na cidade de Nazaré - e não em Belém, cidade natal de Jesus, de acordo com os evangelhos de Mateus e Lucas -, é bom saber que, para a maioria dos pesquisadores, a referência a Belém não passa de uma alegoria da Bíblia. Na época, essa alegoria teria sido escrita para ligar Jesus ao rei Davi, que teria nascido em Belém e era considerado um dos messias do povo judeu. Ou seja: a alcunha "Jesus de Nazaré" ou "nazareno" não teria derivado apenas do fato de sua família ser oriunda de lá, como costuma ser justificado.

Mesmo que os historiadores estejam certos ao afirmarem que o nascimento em Belém seja apenas uma alegoria bíblica, o entorno de uma casa pobre na cidade de Nazaré daquele tempo não deve ter sido muito diferente do de um estábulo improvisado como manjedoura. Como a residência de qualquer camponês pobre da região, as moradias eram ladeadas por animais usados na agricultura ou para a alimentação de subsistência.

Jesus deve ter tido uma infância comum, dividida entre brincadeiras com os
irmãos e ajuda nas tarefas profissionais da família

A dieta de um morador local era frugal: além do pão de cada dia (no formato conhecido no Brasil hoje como pão árabe), era possível contar com azeitonas (e seu óleo, o azeite, usado também para iluminar as casas), lentilhas, feijão e alguns incrementos como nozes, frutas, queijo e iogurte. De acordo com os arqueólogos, o consumo de carne vermelha era raro, reservado apenas para datas especiais. O peixe era o animal consumido com mais freqüência pela população, seco sob o sol, para durar. A maioria dos esqueletos encontrados na região mostra deficiência de ferro e proteínas. Essa parca alimentação é coerente com relatos como o da multiplicação dos pães, no Evangelho de Mateus, no qual os discípulos, preocupados com a fome de uma multidão que seguia Jesus, mostram ao mestre cinco pães e dois peixes, todo o alimento de que dispunham.

Se alguém presenciasse o nascimento de Jesus, provavelmente iria deparar com um bebê de feições bem diferentes da criança de pele clara que costuma aparecer nas representações dos presépios. Baseados no estudo de crânios de judeus da época, pesquisadores dizem que a aparência de Jesus seria mais próxima da de um árabe (de cabelos negros e pele morena) que da dos modelos louros dos quadros renascentistas. Seu nome, Jesus, uma abreviação do nome do herói bíblico Josué, era bastante comum em sua época. Ainda na infância, deve ter brincado com pequenos animais de madeira entalhada ou se divertido com rudimentares jogos de tabuleiro incrustados em pedras.

Nossa Senhora de ísis. De onde pode ter se originado uma das mais belas imagens cristãs. O Cristianismo sofreu influências de diversas religiões da época de Jesus. Se você acha que conhece a imagem ao lado, é bom dar uma olhada com um pouco mais de atenção. À primeira vista, ela parece, de fato, representar a Nossa Senhora embalando o menino Jesus. Mas não é. A imagem da estátua é uma representação da deusa egípcia ísis oferecendo o peito a seu filho Hórus. Apesar de não haver como provar que as imagens de Nossa Senhora tenham sido inspiradas diretamente em representações como essa, os pesquisadores sabem que o cristianismo sofreu, em seus primórdios, a influência de diversos cultos que faziam parte dos mundos egípcio e greco-romano. "Desde seu início, o cristianismo tinha uma diversidade assombrosa", diz o professor de Teologia Gabriele Cornelli, da Universidade de Brasília. Na região do Egito, por exemplo, prevalecera o chamado cristianismo gnóstico, cujos textos revelam um Jesus bem mais parecido com um monge oriental. Alguns historiadores acreditam até que alguns cristãos gnósticos possam ter sido influenciados por missionários budistas vindos da índia.

Quanto à família de Jesus, os pesquisadores não acreditam que ele tenha sido filho único. Afinal, era comum que famílias de camponeses tivessem mais de um filho para ajudarem na subsistência da família. Isso poderia explicar o fato de os próprios evangelhos falarem em irmãos de Jesus, como Tiago, José, Simão e Judas. "As igrejas Ortodoxa e Católica preferiram entender que o termo grego adelphos, que significa irmão, queria dizer algo próximo de discípulo, primo", diz Chevirarese.

Assim como outros jovens da Galiléia, é provável que ele não tenha tido uma educação formal ou mesmo a chance de aprender a ler e escrever, privilégio de poucos nobres. Ainda assim, nada o impediria de conhecer profundamente os textos religiosos de sua época transmitidos oralmente por gerações.

POLÍTICA, RELIGIÃO, SEXO

Desde aquele tempo, a região em que Jesus vivia já era, digamos, um tanto explosiva. O confronto não se dava, é claro, entre judeus e muçulmanos (o profeta Maomé só iria receber sua revelação mais de cinco séculos depois). A disputa envolvia grupos judaicos e os interesses de Roma, cujo império era o equivalente, na época, ao que os Estados Unidos são hoje. E, assim como grupos religiosos do Oriente Médio resistem atualmente à ocidentalização dos seus costumes, diversos grupos judaicos da época se opunham à influência romana sobre suas tradições.

O LUXO QUE VEM DE ROMA Diferentemente de Jesus, nobres judeus viviam muito bem obrigado. Para a elite judaica que vivia na Palestina do século I, levar uma vida com requinte e elegância era sinônimo de viver como os romanos. Escavações arqueológicas em Jerusalém e outras cidades indicam uma clara influência da arquitetura e da decoração de Roma no interior das mansões. Para criar uma atmosfera palaciana, era comum, no interior das casas, a reprodução de afrescos e desenhos decorativos com motivos florais e geométricos. Em ambientes maiores, as colunas no estilo romano eram indispensáveis, assim como o uso de mármore para o acabamento dos detalhes - quem não podia pagar pelo mármore usava uma tinta de cor parecida para manter a aura palaciana. Fontes, vasos vitrificados e pisos de mosaico colorido também faziam parte do sonho de consumo dos novos ricos de Jerusalém, que costumavam receber os amigos influentes recostados confortavelmente no TRICLINIUM, espécie de divã usado na hora das refeições. Resquícios da importação de vinhos e outros ingredientes nobres da cozinha mediterrânea, como o garum, um molho especial de peixe típico da cidade de Pompéia, também foram encontrados no interior das mansões. Algumas delas deviam ter uma vista privilegiada para o Templo de Jerusalém, de onde os nobres podiam assistir confortavelmente à movimentação dos peregrinos ou mesmo à condenação à morte de rebeldes judeus.

Na verdade, fazia séculos que os judeus lutavam contra o domínio de povos estrangeiros. Antes de os romanos chegarem, no ano 63 a.c., eles haviam sido subjugados por assírios, babilônios, persas, macedônios, selêucidas e ptolomeus. Os judeus sonhavam com a ascensão de um monarca forte como fora o rei Davi, que por volta do século 10 a.c. inaugurara um tempo de relativa estabilidade. Não é à toa, Davi ficaria lembrado como o messias (ungido por Javé) e, assim como ele, outros messias eram aguardados para libertar o povo judeu.

A resistência aos romanos se dava de maneiras variadas. A primeira delas, e mais feroz, era identificada como simples banditismo. Nessa categoria estavam bandos de criminosos formados por camponeses miseráveis que atacavam comerciantes, membros da elite romana ou qualquer desavisado que viajasse levando uma carga valiosa.

O peixe, pescado no mar da Galileia, fazia parte do cardápio fundamental
das famílias de Nazaré da época. Para conservar o alimento, ele era seco sob o sol.

Além do banditismo, havia a resistência inspirada pela religião, principalmente a dos chamados movimentos apocalípticos. De acordo com os seguidores desses movimentos, Israel estava prestes a ser libertado por uma intervenção direta de Deus que traria prosperidade, justiça e paz à região. A questão era saber como se preparar para esse dia.

Alguns grupos, como os zelotes, acreditavam que o melhor a fazer era se armar e partir para a guerra contra os romanos na crença de que Deus apareceria para lutar ao lado dos hebreus. Para outros grupos, como os essênios, a violência era desnecessária e o melhor mesmo a fazer era se retirar para viver em comunidades monásticas distantes das impurezas dos grandes centros. E Jesus, de que lado estava?

É quase certo que Jesus tenha tido contato com ao menos um líder apocalíptico de sua época, que preparava seus seguidores por meio de um ritual de imersão nas águas do rio Jordão. Se você apostou em João Batista, acertou.

O curioso é que, para a maioria dos pesquisadores, incluindo aí o padre católico John P. Meier, autor da série sobre o Jesus histórico chamada 'Um Judeu Marginal', o movimento apocalíptico de João Batista deve ter sido mais popular, em seu tempo, do que a própria pregação de Jesus. Os historiadores acreditam que é bem provável que Jesus, de fato, tenha sido batizado por João Batista nas margens do rio Jordão, e que o encontro deve ter moldado sua missão religiosa dali em diante.

Os relatos escritos sobre o tempo de Jesus têm, em sua maioria caráter religioso, como os chamados Manuscritos do Mar Morto, encontrados em cavernas próximas a Qumram em Israel

Apesar de não haver nenhuma restrição para que um líder religioso judeu tivesse relações com mulheres em seu tempo, ninguém sabe ainda se entre as práticas espirituais de Jesus estaria o celibato. Da mesma forma, afirmar que ele teve relações com Maria Madalena, como no enredo de livros como 'O Código Da Vinci', também não passaria de uma grande especulação.

UMA MORTE MARGINAL

O pesquisador Richard Horsley, professor de Ciências da Religião da Universidade de Massachusetts, em Boston, é categórico: a morte de Jesus na cruz em seu tempo foi muito menos perturbadora para o Império Romano do que se costuma imaginar. Horsley e outros pesquisadores desapontam os cristãos que imaginam a crucificação como um evento que causara, em seu tempo, uma comoção generalizada, como naquela cena do filme 'O Manto Sagrado' em que nuvens negras escurecem Jerusalém e o mundo parece prestes a acabar. Apesar de ter sido uma tragédia para seus seguidores e familiares, a morte do judeu Yesua deve ter passado praticamente despercebida para quem vivia, por exemplo, no Império Romano. Ou seja: se existisse uma rede de televisão como a CNN, naquele tempo, é bem possível que a morte de Jesus sequer fosse noticiada. E, caso fosse, dificilmente algum estrangeiro entenderia bem qual a diferença da mensagem dele em meio a tantas correntes do judaísmo do período - assim como poucas pessoas no Ocidente compreendem as diferenças entre as diversas correntes dentro do Islã ou do budismo.

Os pesquisadores sabem, no entanto, que Jesus não deve ter escolhido por acaso uma festa como a Páscoa para fazer sua pregação em Jerusalém. A data costumava reunir milhares de pessoas para a comemoração da libertação do povo hebreu do Egito. No período que antecedia a festa, o ar tornava-se carregado de uma forte energia política. Era quando os judeus pobres sonhavam com o dia em que conseguiriam ser libertados dos romanos."

Para a elite judaica que vivia em Jerusalém, contudo, as manifestações anti-Roma não eram nada bem-vindas. Afinal, como ela se beneficiava da arrecadação de impostos da população de baixa renda, boa parte dela tinha mais a perder que a ganhar com revoltas populares que desafiassem os dirigentes romanos, cujos estilos de vida eram copiados por meio da construção de suntuosas vilas (espécie de chácaras luxuosas) nas cercanias de Jerusalém.

OS OUTROS MESSIAS: Os lideres religiosos judeus que não emplacaram na história. Na época de Jesus, a figura do messias esperado para libertar o povo judeu era muito diferente da nossa atual concepção do messias cristão. Para início de conversa, o messias do povo hebreu não precisava ser nenhum santo. Podia ter várias mulheres (como tivera o rei Davi) e devia empregar a violência, caso fosse necessário, para garantir a autonomia do povo hebreu frente a seus inimigos. Não é à toa que, décadas antes e depois da morte de Jesus, diversos outros homens identificados como messias lideraram movimentos religiosos na região. Por volta do ano 4 a.c., por exemplo, um homem conhecido como Judas, filho de Ezequias, liderou uma revolta contra Herodes na cidade de Séforis, na Galiléia. Judas e seus seguidores chegaram a invadir um palacete na cidade para roubar armas para seu exército de oposição aos romanos. No mesmo ano, outras revoltas foram desencadeadas pelos líderes messiânicos Simão e Astronges. O principal objetivo desses movimentos era derrubar a dominação romana e restaurar os ideais tradicionais do povo hebreu. Na década de 60 do século I, o líder Simão Bar Giora organizou um exército de camponeses que chegou a assumir o controle de diversas regiões da Palestina daquele século. De acordo com os historiadores, o último e mais famoso líder messiânico a comandar uma revolta contra os romanos na região foi o judeu Bar Kokeba. Entre os anos 132 e 135, Kokeba teria liderado uma batalha sem precedentes contra os romanos, conquistando territórios por meio de uma tática de guerrilha que incluía esconderijos em cavernas e construção de fortalezas em montanhas. A rebelião somente foi aniquilada depois que o poderoso Exército romano mobilizou uma força maciça para pôr fim à guerra que se arrastava pelo terceiro ano. Não deixa de ser emblemático o fato de que o pacifico Jesus de Nazaré tenha ficado para a história como o "verdadeiro messias" - logo ele, que nunca liderara um exército.

A própria opulência do Templo do Monte de Jerusalém, reconstruído por Herodes, o Grande, parecia uma evidência de que a aliança entre os romanos e os judeus seria eterna. A construção era impressionante até mesmo para os padrões romanos, o que fazia de Jerusalém um importante centro regional em sua época.

Em meio às festas religiosas, o comércio da cidade florescia cada vez mais. Vendia-se de tudo por lá, incluindo animais para serem sacrificados no templo. Os mais ricos podiam comprar um cordeiro para ser sacrificado e quem tivesse menos dinheiro conseguia comprar uma pomba no mercado logo em frente. A cura de todos os problemas do corpo e da alma (na época, as doenças eram relacionadas à impureza do espírito) passava pela mediação dos rituais dos sacerdotes do templo.

Não é difícil imaginar a afronta que devia ser para esses líderes religiosos ouvir que um judeu rude da Galiléia curava e livrava as pessoas de seus pecados com um simples toque, sem a necessidade dos sacerdotes. A maioria dos pesquisadores concorda que atos subversivos como esses seriam suficientes para levar alguém à crucificação.

Quase tudo o que os pesquisadores conhecem sobre a crucificação deve-se à descoberta, em 1968, do único esqueleto encontrado de um homem crucificado em Giv'at há-Mivtar, no nordeste de Jerusalém. Após uma análise dos ossos, eles concluíram que os calcanhares do condenado foram pregados na base vertical da cruz, enquanto os braços haviam sido apenas amarrados na travessa. A raridade da descoberta, deve-se a um motivo perturbador: a pena da crucificação previa a extinção do cadáver do condenado, já que o corpo do crucificado deveria ser exposto aos abutres e aos cães comedores de carniça. A idéia era evitar que o túmulo do condenado pudesse servir de ponto de peregrinação de manifestantes. De qualquer forma, a descoberta desse único esqueleto preservado prova que, em alguns casos, o corpo poderia ser reivindicado pelos parentes do morto, o que talvez tenha acontecido com Jesus.

O que aconteceu após sua morte?

Para os pesquisadores, a vida do Jesus histórico encerra-se com a crucificação. "A ressurreição é uma questão de fé, não de história", diz Richard Horsley.

Tudo o que os historiadores sabem é que, apesar de pequeno, o grupo de seguidores de Jesus logo conseguiria atrair adeptos de diversas partes do mundo. E foi um dos novos convertidos, um ex-soldado que havia perseguido cristãos e ganhara o nome de Paulo, que se tornaria uma das pedras fundamentais para a transformação de Jesus em um símbolo de fé para todo o mundo. Com sua formação cosmopolita, Paulo lutou para que os seguidores de Jesus trilhassem um caminho independente do judaísmo, sem necessidade de obrigar os convertidos a seguirem regras alimentares rígidas ou, no caso dos homens, ser obrigados a fazer a circuncisão. A influência de Paulo na nova fé é tão grande que há quem diga que a mensagem de Jesus jamais chegaria aonde chegou caso ele não houvesse trabalhado com tanto afinco para sua difusão.

O templo de Jerusalém era o centro político, econômico, social e religioso do mundo em que viveu Jesus. Para lá convergiam mercadores, bandidos, profetas e revolucionários.

Mesmo para quem não acredita em milagres, não há como negar que Paulo e os outros seguidores de Jesus conseguiram uma proeza e tanto: apenas três séculos após sua morte, transformaram a crença de uns poucos judeus da Palestina do século I na religião oficial do Império Romano. Por essa época, a vida do judeu Yesua já havia sido encoberta pela poderosa simbologia do Cristo: assim como os judeus sacrificavam cordeiros para Javé, o Cristo se tornaria símbolo do cordeiro enviado por Deus para tirar os pecados do mundo. Desde então, a história de boa parte do mundo está dividida entre antes e depois de sua existência.

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SAIBA MAIS

LIVROS:

Excavating Jesus - Beneath the Stones, Behind the Texts, John Dominic Crossan e Jonathan l. Reed, Harper San Francisco, 2002

O diferencial do livro está no fato de ele trazer as descobertas arqueológicas mais importantes para que se possa entender como era a vida no tempo de Jesus.

Bandidos, Profetas e Messias, Richard A. Horsley e John S. Hansom. Paulus, 1995

O melhor guia para quem quer compreender os diversos movimentos religiosos e políticos no tempo de Jesus.

Jesus, uma Biografia Revolucionária, John Dominic Crossan, Imago, 1995

Um retrato fascinante sobre o que podemos saber sobre a figura histórica de Jesus escrito por um dos maiores especialistas sobre o tema.

Um Judeu Marginal- Repensando o Jesus Histórico, John P. Meier, Imago, 1992

Uma obra corajosa sobre a vida marginal de Jesus em seu tempo escrita com rigor, erudição e clareza

Jesus de Nazaré, uma Outra História, André Chevitarese, Gabriele Cornelli, Mônica Selvatici (or95.), Annablume Editora, 2006

Coletânea de artigos dos maiores especialistas brasileiros sobre o Jesus histórico

Jesus, Coleção Para Saber Mais, Rodrigo Cavalcante e André Chevitarese, Editora Abril, 2003

Introdução rápida sobre a figura do Jesus na história escrita pelo autor desta reportagem em parceria com o historiador André Chevitarese

Revista Aventuras na História