quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Voltaire e as suas deduções sobre a existência de Deus

O homem é um ser caracterizado por grandes capacidades intelectuais e práticas, mas, em sua finitude, é concomitantemente um ser frágil que se encontra em meio a grandes forças externas, como a natureza e a sociedade, e forças internas, como os instintos e as paixões. Por causa de sua fragilidade, inquieta-se com o sentido de sua existência e sempre se pergunta qual o sentido de seu nascimento, de sua morte, da angústia, do medo, do sofrimento e do desespero. Diante disso, busca algo que lhe traga esperança, algo que lhe dê segurança e sentido para a vida, encontrando assim respostas na aceitação de um ser superior a ele, um ser perfeito e eterno, que é “Deus”.

Porém Deus não é um ser material, tangível, do qual facilmente se constate a existência. Por isso, sua existência foi e é uma questão muito discutida, principalmente no âmbito da filosofia. Vários filósofos escreveram sobre este tema e tentaram argumentar sobre a existência de Deus. Assim, será tratado neste artigo, especificamente, a perspectiva de Voltaire.

Voltaire (1694-1778) foi um filósofo francês iluminista considerado “deísta” (embora o próprio Voltaire use o termo teísmo para designar sua concepção de Deus). Acredita que Deus se manifesta ao homem não pela revelação histórica como a tradição judaico-cristã, mas através da razão, de modo que, negar a existência de Deus seria um absurdo, pois segundo ele: “Deus existe como a coisa mais verossímil que os homens podem pensar e a proposição contrária como uma das mais absurdas” (VOLTAIRE, 1978b, p.68).

No entanto, o filósofo em questão tem uma visão cética em relação à metafísica, pois a razão humana não é capaz de conhecer a natureza divina e a realidade transcendente. Ao contrário da presunção da antiga metafísica, que se gabava de tudo conhecer, Voltaire evita o conhecimento que supera o limite da natureza humana, porque segundo ele: “a verdadeira filosofia consiste em saber deter-se no ponto exato e nunca continuar sem um guia seguro” (ROVIGHI, 1999, p.355). Isto é, não existe um guia seguro para a metafísica, justamente por causa da insuficiência da razão em relação à realidade supra-sensível. .

Contudo, Voltaire acreditava numa certa ordem inerente à natureza. Uma prova desta ordem inerente é o fim com que cada coisa se relaciona, pois este fim comprova que existe uma função para cada coisa no universo, conforme se segue: “Não há arranjo sem objeto, nem efeito sem causa; logo tudo é igualmente o resultado, o produto de uma causa final; logo, é tão verdadeiro dizer que os narizes foram feitos para trazer lunetas, como é verdadeiro dizer que as orelhas foram formadas para ouvir os sons e os olhos para receberem a luz”. (VOLTAIRE, 1978a, p.191).

Deste modo, a partir da ordem inerente da natureza, Voltaire deduz duas provas da existência de Deus, as quais segundo ele resumiriam todas as outras provas e também todos os outros escritos sobre esta questão. Sendo assim, o primeiro argumento a ser considerado é exatamente esta ordem do universo, mas não só ela, como também o fim com que cada coisa se relaciona:

Quando vejo um relógio cujo ponteiro marca as horas, disso concluo que um ser inteligente montou as engrenagens desta máquina para que o ponteiro marque as horas. Assim quando considero as engrenagens do corpo humano, concluo que um ser inteligente montou os órgãos para serem recebidos e nutridos por nove meses na matriz: que os olhos nos são dados para ver, às mãos para segurar, e assim por diante. (VOLTAIRE, 1978b, p.63).

Por esse motivo, para Voltaire, como para Newton, Deus é o grande engenheiro ou mecânico que idealizou, criou e regulou o sistema do mundo (REALE, 2005, p.257), ou seja, se existe uma ordem no universo é porque alguém ordenou, e o relógio é uma prova inegável da existência do relojoeiro, assim como o mundo é uma prova evidente da existência de um Criador Supremo que é Deus. “Se Deus não existisse seria preciso inventá-lo, porém a natureza proclama a sua existência”. (REALE, 2005, p.257).

O segundo argumento a ser considerado é mais metafísico, partindo assim, do pressuposto da necessidade da existência de um Ser que exista necessariamente e seja eterno, pois se existe uma coisa ou existe eternamente ou foi criado por um Ser eterno que existe por si mesmo.

Existo, portanto alguma coisa existe. Se algo existe, existiu desde toda eternidade, pois aquilo que é, ou é por si mesmo ou recebeu seu ser de outro. Se é por si mesmo, é necessariamente, sempre foi necessariamente e é Deus. Se recebeu o ser de outro, e este seu ser de um terceiro, aquele de quem este último recebeu seu ser deve ser necessariamente Deus, pois não podeis conceber um ser que dê o ser a um outro se não tiver o poder de criar. (VOLTAIRE, 1978b, p.64)

Neste argumento a existência de Deus é provada pelo fato de ter que existir um Ser que exista necessariamente por si mesmo. Pois se existe algo, existe necessariamente por si mesmo desde toda eternidade ou seu ser deriva de um outro ser que existe desde toda eternidade sendo o seu ser a origem de todos os outros seres. Logo, este ser necessário que existe por si mesmo é Deus. E por fim, basta agora examinar, segundo a reflexão de Voltaire, se o mundo material é este Ser necessário que existe por si mesmo e que é a origem dos outros seres que não são necessários.

Se este mundo material existisse por si mesmo de modo absolutamente necessário, seria contraditório pensar que a mínima parte dela poderia ser diferente de como é, pois, se o seu ser neste momento é absolutamente necessário, isso é suficiente para excluir qualquer outra maneira de ser. Ora está fora de dúvida que esta mesa sobre a qual escrevo, esta pena de que me sirvo, não foram sempre aquilo que são; estes pensamentos que traço sobre esta folha um momento antes nem sequer existiam, e não existem de modo necessário. Ora, se cada parte não existe com absoluta necessidade, é impossível que o todo exista por si mesmo. Eu produzo movimento; portanto um movimento antes não existia; portanto, não é essencial a matéria; portanto ela o recebe de outro; portanto, há um Deus que o comunica a ela. (REALE, ,2005 p.73.)

Desta forma, se a matéria existisse como uma necessidade absoluta, todas as partes dela deveriam existir necessariamente. Porém, as partes não existem necessariamente, pois uma mesa nem sempre foi uma mesa e uma caneta nem sempre foi uma caneta. Sendo assim, se as partes não existem necessariamente, o todo também não existe necessariamente. Logo, a matéria não existe necessariamente e não é Deus. Pois como se percebeu, Deus é um ser que existe necessariamente por si mesmo.

Portanto, fica claro no pensamento de Voltaire que Deus se revela aos homens por meio de sua razão, no entanto esta mesma razão não é capaz de conhecer a realidade transcendente. E a existência de Deus é algo inegável, pois a natureza proclama sua existência, ou seja, as provas de sua existência são tiradas da ordem inerente que existe na natureza e esta ordem se dá pelo fim com que cada coisa se relaciona no universo.

O Problema do Mal: A questão mais difícil da história da teologia


Talvez você já ouviu falar do “Problema do Mal”. A expressão se refere à mais difícil pergunta da história da teologia cristã: Se Deus é onipotente e bondade, por que ele permite a existência do mal e do sofrimento? Afinal, o que quer a expressão “Problema do Mal”? Antes de tudo, é importante reconhecermos que o mal não é necessariamente um problema no sentido filosófico do termo. O conceito de problema pode ser invertido aqui. Por exemplo, uma perspectiva pessimista e ateísta que afirma a realidade do mal como experiência básica da realidade e nega o divino e o bem, teria de enfrentar o “problema do bem”. Explicando melhor: “se o universo não tem propósito e é absurdo (como sugerem alguns existencialistas ateus, por exemplo), como explicar a experiência do belo, do inefável e do prazer”? Não seria esse um grande problema filosófico? Como disse o famoso biblista autraliano Francis I. Andersen: “A rigor, a desgraça humana, ou o mal em todas as suas formas, é um problema somente para a pessoa que crê num Deus único, onipotente e todo amoroso”. Isso significa que outras religiões e filosofia não enfrentam um dilema, no sentido de terem de explicar a existência do mal. Mesmo assim, o mal ainda permanece um problema para todos os sistemas de pensamento por causa da questão do sofrimento.
A tentativa cristã de lidar com esse tripé “Deus todo-poderoso”, “Deus todo-amoroso” e “existência do mal”, mostrando que a despeito do mal, Deus continua justo, bom e poderoso foi historicamente denominada Teodicéia. A palavra foi cunhada em 1710 pelo filósofo alemão Gottfried Leibnitz (1646-1716). Seu sentido é “justificação de Deus” (do grego theós “Deus” e dikê “justiça”). A dificuldade do problema foi bem definida pelo filósofo escocês David Hume (1711-1776) numa retomada do antigo filósofo grego Epicuro (341-270 a.C.). Conforme escreveu David Hume: “As antigas perguntas de Epicuro permanecem sem resposta. Quer ele (Deus) impedir o mal, mas não é capaz de fazê-lo? Então ele é impotente (i.e, não é onipotente). Pode ele fazê-lo, mas não o deseja? Então ele é malévolo. Não é ele tanto poderoso como o deseja fazê-lo? De onde, pois, procede o mal?
O problema do mal também é discutido e compartilhado pelo judaísmo e islamismo. A importância da discussão na tradição judaica foi expressa por Nachmânides quando se referiu ao problema do mal como “a questão mais difícil que se encontra tanto na raiz da fé quanto da apostasia, com a qual estudiosos de todas as épocas, povos e línguas têm lutado”.
Historicamente, na tentativa de construir-se essa explicação que procura manter a justiça de Deus diante do mal, vários tipos básicos de teodicéia foram elaborados. Os principais tipos respondem ao problema assim:

A Teoria do Livre-arbítrio

É a posição clássica das religiões monoteístas. Ela afirma que Deus permite o mal e o utiliza para fins bons. Deus permite o mal para produzir um bem maior. Nunca foi elaborada solução mais razoável e esperançosa do que a judaico-cristã.
Para explicar a origem do mal, afirma-se que o mal sempre seria uma possibilidade, visto que Deus criou seres dotados de vontade livre. E para que fossem de fato livres, e não máquinas, tais seres sempre teriam a possibilidade de optar contra a vontade de Deus, dando assim origem ao mal. Portanto, a única saída para a impossibilidade plena do mal seria a inexistência de seres pessoais livres, o que nos daria um universo mecanicista, composto de seres impessoais, destituídos de arbítrio. Os defensores dessa posição ainda argumentam que Deus apenas permite o mal, o que é diferente de ser autor direto do mal, por razões e finalidades boas que não compreendemos plenamente agora. Evidentemente, a força desses argumentos depende de suas pressuposições. O argumento teísta clássico afirma que o mal pode ter início no bem, embora isto nunca seja de modo essencial. Não há derivação essencial do bem para o mal. Isso é compreensível, pois segundo o teísmo clássico o mal não existe enquanto substância, conforme mostrou Agostinho, ou seja, o mal não possui existência plena. É como a ferrugem que atinge o ferro. Não existe um ferro totalmente enferrujado, pois esse deixaria de existir. Assim como a ferrugem existe em função do ferro como elemento parasita e destruidor, também o mal só existe em função do bem.

A Teoria Pedagógica

Numa teodicéia pedagógica o enfoque é deslocado da origem do mal e é colocado principalmente nos possíveis bons resultados da experiência do sofrimento. A idéia é que a experiência do sofrimento (mal) é um benefício indispensável para o desenvolvimento das capacidades humanas, do contrário a humanidade permaneceria eternamente na infância. Argumenta-se, por exemplo, que um pouco de sofrimento aumenta a nossa própria satisfação com a vida e que um sofrimento maior e mais intenso desenvolve em nós uma maior profundidade de caráter e de compaixão. Além disso esta posição enfatiza a realidade de que vivemos em um mundo regulado por leis naturais e que boa parte do mal existente no mundo decorre da atuação destas leis. Deveria Deus ter criado um mundo desprovido de ordem natural para satisfazer a vontade de cada um? Isso seria bom? Todavia, há duas grandes dificuldades aqui: 1) nem sempre o sofrimento produz maturidade e aprendizado. Muitas vezes o que fica é ódio e amargura; 2) em alguns casos não há muito o que aprender e o preço pago é muito alto. Quando milhares de pessoas morrem em uma guerra, devemos perguntar: que tipo de pedagogia é essa que mata seus próprios alunos?

A Teoria Escatológica

Uma teodicéia escatológica diz que há esperança para o problema, pois ela está baseada na convicção de que a vida transcende a morte e que justiça e injustiça receberão sua devida recompensa. As perspectivas variam desde uma esperança entre o inaugurar de uma nova história humana por meio da ressurreição ou ainda como uma vida em um reino celestial após a morte. O futuro tem a resposta e a solução do que acontece no presente. Apesar de essa ser uma das esperanças mais enfatizadas pelas religiões monoteístas, muitos descartam esta possibilidade e questionam que tipo de reparação pode haver pela desgraça atual. Alguém que teve sua família arruinada e assassinada repentinamente pode de fato ter tal sofrimento “reparado”? Será possível isso?

A Teoria da Teodicéia Protelada

É uma postura de expectativa e fé em Deus a despeito do mal. A fé na soberania e bondade finais de Deus espera a compreensão de todas as questões. A diferença entre essa teodicéia e a teodicéia escatológica é a seguinte: na teodicéia protelada espera-se mais uma compreensão do que uma compensação final do mal. Argumenta-se que as limitações humanas e a tremenda distância que separa Deus do homem não nos permitem conhecer as razões da permissão do mal agora. Deve-se destacar ainda que tal posição também é diferente da idéia que sugere ser impossível avaliar o comportamento de Deus.

A Teoria da Teodicéia de Comunhão

Para muitos, a experiência do sofrimento leva o homem a encontrar motivos para romper com o divino. Essa é, por exemplo, a fonte do ateísmo, do agnosticismo e do antagonismo religioso. A Teodicéia de Comunhão enfatiza que Deus é principalmente percebido e conhecido no sofrimento. O Deus verdadeiro é aquele que se compadece. É o Deus que sofre com suas criaturas e que, de certa forma, é vítima do mal, juntamente com elas. Esta teodicéia não explica o sofrimento imerecido. Todavia, transforma a visão sobre o sofrimento, pois o sofrer por um propósito justo é fazer a vontade de Deus e torná-lo conhecido. O sofrimento é a grande oportunidade para Deus e o homem entrarem em comunhão e colaboração. O sofrimento é transcendido e aquilo que parecia ser o pior é visto como a ocasião da mais intensa experiência religiosa.
A Rejeição da Resposta Cristã
No panorama da história, muitas correntes de pensamento apresentaram soluções alternativas para o problema, sem a intenção de justificar a Deus. Vamos apresentar um resumo daquelas posições filosóficas que tratam o problema do mal com um enfoque distinto do teísmo ou da teodicéia. As diversas propostas de resolução das relações entre o divino e o mal serão delineadas, destacando os seus principais representantes.

Alguns Negam a Existência do Mal

O Mal é visto como ilusão. Essa perspectiva é encontrada em conceitos monistas e panteístas. A tensão entre Deus e o mal é resolvida pela negação do mal. A cosmovisão hindu (ensinos Vedanta), Zenão (336-274 a.C.) e Spinoza (1632-1677) são exemplos desta perspectiva. Spinoza, por exemplo, chega a afirmar que o mundo parece cheio de mal apenas porque é visto de uma perspectiva humana estreita e errônea. Da perspectiva divina, porém, o mundo forma um todo necessário e perfeito. A dificuldade dessa posição é provar que os sentidos não merecem confiança alguma, visto que eles apontam para a realidade objetiva do mal. Além disso, os defensores dessa perspectiva precisam responder por que tal “ilusão” é tão comum e se mostra persistente na história humana? Que conhecimentos nos levam a tal conclusão? Seria tal conclusão uma ilusão também?
Alguns Negam a Existência de Deus
Essa é a perspectiva do ateísmo. É a negação da realidade de Deus. Os ateus opõem-se diretamente aos “ilusionistas”. Afirmam a realidade do mal com base nos sentidos e negam a realidade de Deus, cuja existência é incompatível com o mal. O pensamento ateísta sistematizado desenvolveu-se nos últimos dois séculos de história da filosofia ocidental, fruto do racionalismo. Os principais argumentos ateístas são: 1) Deus e o mal são mutuamente excludentes: se o mal existe, logo Deus não pode existir; 2) Se Deus existisse, ele não seria Deus propriamente dito, pois carece de bondade por permitir o mal; 3) Se Deus existisse ele não seria Deus propriamente dito, pois carece de poder visto que permite o mal.
Essa perspectiva é encontrada no budismo que pressupõe uma alienação entre o homem e o universo. O universo é impessoal e opera por causa e efeito. Não existe a figura de Deus, o sofrimento decorre da vontade humana e a sua solução se dá de maneira individual e existencial. Por isso o budista anseia pelo estado impessoal no nirvana. Esse pessimismo também encontra exemplos no pensamento grego clássico. Hegesias de Cirenaica ensinava ser a vida sem valor e que o único bem, que nunca seria alcançado, seria o prazer. Todavia esse pessimismo não marca o pensamento helênico propriamente dito que, de modo geral, acreditava na vitória sobre o mal por meio da virtude e da sabedoria.
É no pensamento europeu contemporâneo que encontraremos um exemplos dessa posição: Arthur Schopenhauer (1788-1860). Há também filósofos existencialistas ateus que enfatizam o absurdo da realidade, vendo o homem como um ser sem saída. Os principais são Jean Paul Sartre (1905-1980) e Albert Camus (1913-1960), famoso por sua obra “A Peste”. Schopenhauer cria que a realidade última é a cega vontade irracional de viver que a todos impulsiona. Tal vontade transcendental é essencialmente má, particularmente pelo fato de haver criado o nosso corpo com desejos que não podem ser satisfeitos. O sofrimento é causado pelo desejo incessante que nunca pode ser plenamente atendido. A dor e a ilusão são inevitáveis. A maior tragédia humana é o fato de ter o homem nascido.
Entre o pensamento judaico-cristão e as alegações ateístas têm surgido propostas problemáticas e incompletes que merecem ser mencionadas.
  1. Negação da bondade de Deus. Deus pode ser poderoso, mas é visto como mau e comprometido com a desgraça e o sofrimento.
  2. Negação do poder de intervenção de Deus. O bem não tem poder infinito sobre o mal. Essa é a posição deísta, da teologia do processo e do teísmo aberto. Fundamenta-se na realidade da persistência do mal. O bem parece não ter poder para destruí-lo.
  3. Negação do poder original de Deus. Deus foi obrigado a criar um mundo mau. Deus, sendo limitado, tinha necessidade de criar um mundo e não pode impedir que este fosse mau.
  4. Negação da onisciência divina. Deus não podia prever o mal. Deus é criador, e justo, mas não é plenamente onisciente.
  5. Negação da imanência divina. Deus não pode ser avaliado pelos nossos padrões morais. Desse modo não é necessário defender sua conduta. Suas ações estão numa esfera de atuação que não podemos julgar.
A verdade é que o Problema do Mal permanece como a questão mais difícil da história da teologia. As outras tentativas de resolve-lo parecem apenas tê-lo complicado ainda mais. A esperança cristã continua afirmando uma mistura das teodicéias aqui apresentadas. Mas a sua essência ecoa por toda a história: Deus permite o mal e o utiliza para fins bons, e Deus permite o mal para produzir um bem maior. Por isso, vivemos pela fé e sempre na esperança.

terça-feira, 23 de agosto de 2011

Celso, Tácito e o Talmude judaico: fontes anticristãs.

No ano 66 d.C., os judeus da Palestina iniciaram uma revolta contra o governo romano que, para dizer o mínimo, não agradou aos romanos. O imperador enviou tropas lideradas pelo general Vespasiano para conter a rebelião e retomar o controle das áreas rebeldes. Em 67, Vespasiano liderou um cerco à cidade rebelde de Jotapata, na Galiléia. No 47º dia daquele cerco, um jovem revolucionário judeu optou por entregar-se ao exército romano, muito superior, em vez de cometer suicídio — um destino que muitos de seus compatriotas haviam escolhido. Aquele jovem recebeu o favor de Vespasiano e, depois, foi levado a Roma pelo general Tito, filho de Vespasiano; mais tarde, Tito destruiu Jerusalém e o templo judeu no ano 70 d.C.

Aquele jovem era Flávio Josefo (c. 37-100 d.C.) que, por fim, tornou-se o maior historiador judeu de sua época. Josefo começou a escrever documentos históricos em Roma, enquanto trabalhava como historiador do imperador romano Domiciano. Foi ali que escreveu sua autobiografia e duas obras históricas importantes. Uma dessas obras é sua atualmente famosa Antiguidades dos judeus [publicada em português pela CPAD], concluída por volta do ano 93. No livro 18, capítulo 3, seção 3 dessa obra, Josefo, que não era cristão, escreveu estas palavras:

Nessa época [a época de Pilatos], havia um homem sábio chamado Jesus. Sua conduta era boa e [ele] era conhecido por ser virtuoso. Muitos judeus e de outras nações tornaram-se seus discípulos. Pilatos condenou-o à crucificação e à morte. Mas aqueles que se tornaram seus discípulos não abandonaram seu discipulado, antes relataram que Jesus havia reaparecido três dias depois de sua crucificação e que estava vivo; por causa disso, ele talvez fosse o Messias, sobre quem os profetas contaram maravilhas.

Essa não foi a única menção feita a Jesus por Josefo. Em outra passagem das Antiguidades dos judeus, Josefo revelou de que maneira o novo sumo sacerdote dos judeus (Ananus, o jovem) valeu-se de um hiato no governo romano para matar Tiago, o irmão de Jesus. Isso aconteceu no ano 62, quando o imperador romano Festo morreu repentinamente durante seu ofício. Três meses se passaram até que seu sucessor, Albino, pudesse chegar à Judéia, abrindo um grande espaço de tempo para que Ananus realizasse seu trabalho sujo. Josefo descreve o incidente da seguinte maneira:

Festo está morto, e Albino está a caminho. Assim, ele [Ananus, o sumo sacerdote] reuniu o Sinédrio dos juízes e trouxe diante deles o irmão de Jesus, que era chamado Cristo, cujo nome era Tiago, e alguns outros [ou alguns de seus companheiros] e, quando havia formulado uma acusação contra eles como transgressores da lei, ele os entregou para que fossem apedrejados.

Temos aqui não apenas outra referência do século I feita a Jesus, mas a confirmação de que tinha um irmão chamado Tiago que, obviamente, não era benquisto pelas autoridades judaicas. Poderia ser o caso de Tiago ter sido martirizado por ser ele o líder da igreja de Jerusalém, como o NT deixa implícito?

Quantas fontes não-cristãs fazem menção a Jesus? Incluindo Josefo, existem dez outros escritores não-cristãos conhecidos que mencionam Jesus num período de até 150 anos depois de sua morte Por outro lado, nesses mesmos 150 anos, existem nove fontes não-cristãs que mencionam Tibério César, o imperador romano dos tempos de Jesus. Assim, descontando todas as fontes cristãs, em relação ao imperador romano existe uma fonte a mais que menciona Jesus. Se você incluir as fontes cristãs, os autores que mencionam Jesus superam aqueles que mencionam Tibério numa proporção de 43 para 10!

Algumas dessas fontes não-cristãs — como Celso, Tácito e o Talmude judaico — poderiam ser consideradas como fontes anticristãs. Embora essas obras não tenham uma testemunha ocular sequer que contradiga os fatos descritos nos documentos do NT, foram escritas por autores claramente anticristãos. O que podemos aprender nos baseando neles e nas fontes não-cristãs mais neutras? Aprendemos que admitem certos fatos sobre o cristianismo primitivo que nos ajudam a formar uma narrativa que é surpreendentemente congruente com o NT. Reunindo todas as dez referências não-cristãs, vemos que:

1. Jesus viveu durante o tempo de Tibério César.

  1. Ele viveu uma vida virtuosa.
  2. Realizou maravilhas.
  3. Teve um irmão chamado Tiago.
  4. Foi aclamado como Messias.
  5. Foi crucificado a mando de Pôncio Pilatos.
  6. Foi crucificado na véspera da Páscoa judaica.
  7. Trevas e um terremoto aconteceram quando ele morreu.
  8. Seus discípulos acreditavam que ele ressuscitara dos mortos.
  9. Seus discípulos estavam dispostos a morrer por sua crença.
  10. O cristianismo espalhou-se rapidamente, chegando até Roma.
  11. Seus discípulos negavam os deuses romanos e adoravam Jesus como Deus.

À luz dessas referências não-cristãs, a teoria de que Jesus nunca existiu é claramente injustificável. De que maneira escritores não-cristãos poderiam juntos revelar uma narrativa congruente com o NT se Jesus nunca tivesse existido?

Mas as implicações vão muito além disso. O que isso nos fala sobre o NT?

Diante de tal fato, as fontes não-cristãs confirmam o NT. Embora os autores não-cristãos não digam que acreditam na ressurreição de Jesus, eles relatam que os discípulos certamente acreditavam nela.

Uma vez que a existência de Deus e a possibilidade de milagres são firmemente estabelecidas por meio da revelação natural — como já demonstramos e a história geral de Cristo e da igreja primitiva é confirmada por meio de fontes não-cristãs, será que os milagres de Cristo realmente aconteceram como os discípulos afirmam? Os documentos do NT registram a história real? Poderia ser o caso de esses documentos não serem textos religiosos puramente tendenciosos, cheios de mitos e fábulas — como muitos em nosso mundo moderno afirmam — mas, em vez disso, documentos que descrevem eventos que realmente aconteceram cerca de 2 mil anos atrás? Se é assim, estaremos na direção certa na nossa busca para saber qual religião teísta é verdadeira.

Para verificar se o NT é um registro fidedigno da história, precisamos responder a duas perguntas em relação aos documentos que compõem o NT:

  1. Temos cópias precisas dos documentos originais que foram escritos no século I?
  2. Esses documentos falam a verdade?

Para que se possa acreditar na mensagem do NT, essas duas perguntas precisam ser respondidas de maneira afirmativa. Não basta simplesmente apresentar evidências de que possuímos cópias precisas dos documentos originais do século I (pergunta 1), porque tais documentos poderiam contar mentiras. Devemos ter uma cópia precisa dos documentos e termos razões para acreditar que esses documentos descrevem aquilo que realmente aconteceu cerca de 2 mil anos atrás (pergunta 2). Vamos começar com a pergunta número 1.

Temos certeza de que você se lembra da brincadeira infantil chamada “telefone sem fio”. Era uma brincadeira na qual uma criança recebe uma mensagem verbal para passar à próxima criança, que passa aquilo que ouviu à criança seguinte, e assim por diante. Quando a mensagem chega à última criança na seqüência, ela é uma péssima representação daquilo que a primeira criança ouviu. Para o observador comum, esse parece ser o mesmo tipo de distorção que poderia ter infectado documentos que foram transmitidos de geração a geração num espaço de 2 mil anos.

Felizmente o NT não foi transmitido dessa maneira. Uma vez que não foi contado a uma pessoa, que o contou a outra, e assim por diante, a brincadeira do telefone não se aplica. Várias pessoas testemunharam acontecimentos do NT de modo independente, muitas das quais os registraram em sua memória, e nove dessas testemunhas oculares/contemporâneas registraram suas observações por escrito.

Neste momento, precisamos esclarecer um conceito errado muito comum sobre o NT. Quando falamos dos documentos do NT, não estamos falando de um único texto, mas de 27 textos. Os documentos do NT são 27 documentos diferentes, escritos em 27 rolos diferentes, por nove autores, num período de 20 a 50 anos. Esses textos específicos desde então foram reunidos em um único livro que hoje chamamos Bíblia. Desse modo, o NT não é uma fonte única, mas uma coleção de fontes.

Existe apenas um problema: até agora, nenhum dos documentos escritos originais do NT foi descoberto. Temos apenas cópias dos textos originais, chamados manuscritos. Isso pode nos impedir de saber o que diziam os originais?

De modo algum. De fato, toda literatura significativa do mundo antigo é reconstituída à sua forma original ao se comparar os manuscritos que sobreviveram. Para reconstruir-se o original, é muito útil termos um grande número .de manuscritos produzidos não muito tempo depois do original. Maior quantidade de manuscritos e manuscritos antigos normalmente nos dão um testemunho mais confiável e geram condições para uma reconstrução mais precisa.

Como os documentos do NT se saem nesse aspecto? Muito bem, melhor do que qualquer outro material do mundo antigo. De fato, os documentos do NT possuem mais manuscritos, manuscritos mais antigos e manuscritos mais abundantemente apoiados do que as dez melhores peças da literatura clássica combinadas. Veja a seguir o que queremos dizer com isso.

Mais manuscritos. De acordo com a última contagem, existem cerca de 5.700 manuscritos gregos do NT escritos à mão. Além disso, existem mais de 9 mil manuscritos em outras línguas (e.g., siríaco, copta, latim, árabe). Alguns desses quase 15 mil manuscritos são bíblias completas, outros são livros ou páginas, e somente alguns são apenas fragmentos. Como mostrado na figura 9.1, não existe nada no mundo antigo que sequer se aproxime disso em termos de apoio a manuscritos. A obra mais próxima é a llíada, de Homero, com 643 manuscritos. A maioria das outras obras antigas sobrevive com pouco mais de uma dúzia de manuscritos. Contudo, poucos historiadores questionam a historicidade dos eventos que essas obras registram.

Manuscritos mais antigos. O NT não apenas desfruta de um amplo apoio dos manuscritos, como também possui manuscritos que foram escritos logo depois dos originais. O mais antigo e incontestável manuscrito é um segmento de João 18.31-33,37,38, conhecido como fragmento John Rylands (porque está na Biblioteca John Rylands, em Manchester, Inglaterra). Os estudiosos datam esse documento como tendo sido escrito entre 117 e 138 d.e, mas alguns dizem que ele é ainda mais antigo. O fragmento foi encontrado no Egito próximo ao mar Mediterrâneo, e seu provável local de composição foi a Ásia Menor — demonstrando que o evangelho de João foi copiado e levado a lugares distantes logo no início do século 11.

Existem nove fragmentos discutíveis, ainda mais antigos que o fragmento John Rylands, que datam do período que vai do ano 50 ao 70 d.e, encontrados com os Manuscritos do mar Morto. Alguns estudiosos acreditam que esses fragmentos são parte de seis livros do NT, incluindo Marcos, Atos, Romanos, 1 Timóteo, 2Pedro e Tiago. Embora outros estudiosos resistam a essa conclusão (talvez porque admitir isso seria uma afronta à sua inclinação liberal de que o NT foi escrito posteriormente), eles não encontraram nenhum outro texto que não fosse do NT ao qual esses fragmentos pudessem pertencer.

CONFIABILIDADE DO NOVO TESTAMENTO QUANDO COMPARADO COM OUTROS DOCUMENTOS ANTIGOS

Os fragmentos foram encontrados numa caverna que, anteriormente, fora identificada como uma que possuía material cuja datação variava de 50 a.C. a 50 d.C. O primeiro estudioso a identificar esses fragmentos antigos como livros do NT foi José O’Callahan, um destacado paleógrafo espanhol. O New York Times reconheceu as implicações da teoria de O’Callahan ao admitir que, se eles fossem verdadeiros, “então provariam que pelo menos um dos evangelhos — o de S. Marcos — foi escrito apenas alguns anos depois da morte de Jesus”.

Mas mesmo que não fossem fragmentos verdadeiros do NT e se o fragmento John Rylands fosse realmente o mais antigo, o espaço de tempo entre o original e a primeira cópia ainda existente é muitas vezes menor do que qualquer outro do mundo antigo. A Ilíada tem o segundo menor espaço, que é de cerca de 500 anos. A maioria das outras obras antigas está distante mil anos ou mais do original. O espaço do NT, de cerca de 25 anos, pode ser menor (isso não significa que não tenha havido outros manuscritos entre o original e a primeira cópia; eles certamente existiram. Isso simplesmente significa que esses manuscritos deterioraram-se, foram destruídos ou até mesmo não foram descobertos ainda).

Qual é a idade do mais antigo manuscrito de um livro completo do NT?

Manuscritos que formam livros inteiros do NT sobreviveram a partir do ano 200 d.C. E quanto aos mais antigos manuscritos do NT completo? A maioria dos manuscritos do NT, incluindo os quatro evangelhos, sobrevive desde o ano 250, e um manuscrito do NT (incluindo um Antigo Testamento em grego), chamado Códice Vaticano, sobrevive desde o ano 325. Vários outros manuscritos completos sobrevivem desde aquele século. Esses manuscritos possuem ortografia e pontuação características que sugerem ser parte de uma família de manuscritos que pode ter sua origem entre 100 e 150 d.C.

Se esses numerosos e antigos manuscritos fossem tudo o que os estudiosos possuíssem, poderiam reconstruir o NT original com grande precisão. Mas eles também possuem abundantes evidências de apoio do mundo antigo que fazem a reconstituição do NT ser ainda mais precisa. Vamos analisar isso a seguir.

Grande quantidade de manuscritos de apoio. Começando em fevereiro do ano 303 d.C., o imperador romano Diocleciano promulgou três editos de perseguição aos cristãos porque acreditava que a existência do cristianismo estava rompendo a aliança entre Roma e seus deuses. Os editos pediam a destruição das igrejas, dos manuscritos e de livros, assim como a morte dos cristãos.

Centenas, se não milhares, de manuscritos foram destruídos por todo o Império Romano durante essa perseguição, que durou até o ano 311. Mas mesmo que Diocleciano tivesse sido bem-sucedido em varrer da face da Terra todos os manuscritos bíblicos, ele não poderia ter destruído nossa capacidade de reconstruir o NT. Por quê? Porque os pais da igreja primitiva — homens dos séculos 11 e 111 como Justino Mártir, Ireneu, Clemente de Alexandria, Orígenes, Tertuliano e outros — fizeram tantas citações do NT (36.289 vezes, para ser exato) que todos os versículos do NT, com exceção de apenas 11, poderiam ser reconstituídos simplesmente de suas citações. Em outras palavras, você poderia ir até a biblioteca pública, analisar as obras dos pais da igreja primitiva e ler praticamente todo o NT simplesmente com base nas citações que eles fizeram! Desse modo, nós não apenas temos milhares de manuscritos, mas milhares de citações desses manuscritos. Isso torna a reconstrução do texto original praticamente precisa.

Mas quão precisa? Como os originais são reconstruídos e quão preciso é este NT reconstruído?

Como o original é reconstruído?

Esses três fatos — manuscritos em quantidade, antigos e de apoio — ajudam os estudiosos a reconstruírem os manuscritos originais do NT de maneira bem fácil. O processo de comparar muitas cópias e citações fornece uma reconstrução extremamente precisa do original, mesmo que erros fossem cometidos durante a cópia. Como isso funciona? Considere o exemplo a seguir. Suponha que tenhamos quatro diferentes manuscritos, os quais possuem quatro erros diferentes no mesmo versículo, como Filipenses 4.13 (“Tudo posso naquele que me fortalece”). Vejamos as quatro cópias hipotéticas:

  1. Tudo posso naquele que me fortalece
  2. Tudo posso naquele que me fortalece
  3. Tudo posso naquele que me fortalece
  4. Tudo posso naquele que me fortalece

Há algum mistério em relação àquilo que o original dizia? De modo algum.

Pelo processo de comparação e de verificação cruzada, o NT original pode ser reconstruído com grande precisão. A reconstrução do NT é ainda mais fácil que isso, porque existem muito menos erros nos manuscritos verdadeiros do NT do que os que foram representados nesse exemplo.

Vamos presumir por um instante que o NT seja realmente a palavra de Deus.

Os céticos podem perguntar: “Bem, se o NT é realmente a palavra de Deus, então por que Deus não preservou o original?”. Só podemos especular aqui, mas uma possibilidade é porque sua palavra pode ser melhor protegida por meio de cópias do que por meio de documentos originais. Como assim? Porque, se o original estivesse de posse de alguma pessoa, essa pessoa poderia alterá-lo. Mas, se houvesse cópias espalhadas por todo o mundo antigo, não haveria maneira de um escriba ou sacerdote alterar a palavra de Deus. Como vimos, o processo de reconstrução permite que variantes e alterações nas cópias sejam identificadas e corrigidas de maneira bastante simples. Desse modo, ironicamente, o fato de não existirem originais pode preservar a palavra de Deus de uma maneira melhor do que se eles existissem.

Quão precisa é esta reconstrução?

Com o objetivo de abordar a questão da precisão, temos de esclarecer alguns mal-entendidos de muitos críticos em relação a “erros” nos manuscritos bíblicos. Alguns já chegaram a estimar que existem cerca de 200 mil erros nos manuscritos do NT. Primeiro de tudo, eles não são “erros”, mas leituras variantes, a maioria das quais de natureza estritamente gramatical (i.e., pontuação e ortografia). Segundo, essas leituras estão espalhadas por cerca de 5.700 manuscritos, de modo que a variação na ortografia de uma letra de uma palavra em um versículo em 2 mil manuscritos é considerada 2 mil “erros”.

Os especialistas em texto Westcott e Hort estimam que apenas uma em cada 60 dessas variantes tem significância. Isso levaria a um texto com grau de pureza de 98,33%. Philip Schaff calculou que, das 150 mil variantes conhecidas em seus dias, somente 400 mudaram o significado da passagem, apenas 50 foram de real importância e nem mesmo uma sequer afetou “um artigo de fé ou um preceito de obrigação que não seja abundantemente apoiado por outras passagens indubitáveis ou pelo sentido geral do ensinamento das Escrituras”.

Nenhum outro livro antigo é tão bem autenticado. O grande estudioso do NT e professor da Universidade de Princeton, Bruce Metzger, estimou que o Mahabharata, do hinduísmo, foi copiado com apenas 90% de precisão e que a Ilíada de Homero, com cerca de 95%. Por comparação, ele estimou que o NT é cerca de 99,5% preciso. I? Mais uma vez, o 0,5% em questão não afeta uma única doutrina da fé cristã.

Fredric Kenyon, autoridade em manuscritos antigos, resumiu muito bem a situação do NT quando escreveu:

Não se pode afirmar com plena firmeza que, em substância, o texto da Bíblia seja inquestionável. Em especial, essa é a situação do Novo Testamento. O número de manuscritos do NT, de traduções antigas dele e de suas citações pelos antigos autores da igreja é tão grande que é praticamente certo que a verdadeira leitura de toda passagem dúbia esteja preservada em uma ou outra dessas autoridades antigas. Não se pode dizer isso em relação a nenhum outro livro antigo do mundo.

Desse modo, sabemos que possuímos o mesmo NT que foi escrito 2 mil anos atrás. Mas a pergunta seguinte é ainda mais importante: Temos uma cópia precisa da verdade — ou uma mentira? Em outras palavras, o NT é historicamente confiável?

O NT É HISTORICAMENTE CONFIÁVEL?

Quando fazemos a pergunta “O NT é historicamente confiável?”, estamos procurando descobrir se os principais fatos descritos nos documentos do NT realmente aconteceram. Especificamente, houve realmente um homem judeu, há cerca de 2 mil anos, chamado Jesus que ensinou profundas verdades, realizou milagres, foi crucificado pelas autoridades romanas e judaicas por se dizer Deus, que apareceu a muitas testemunhas depois de ter ressuscitado três dias após sua morte?

É importante manter em mente que, nesse ponto, não estamos buscando saber se o NT não possui erros ou se ele é a “palavra de Deus”. Estamos simplesmente tentando descobrir se a narrativa básica é fato, e não ficção. Com o objetivo de descobrir isso, precisamos averiguar que tipos de registros compreendem o NT. Eles são documentos escritos por testemunhas oculares (ou por aqueles que entrevistaram testemunhas oculares) logo depois dos acontecimentos, ou são documentos escritos muito depois, por seguidores tendenciosos que simplesmente embelezaram detalhes sobre a vida de uma personagem histórica real?

Com o objetivo de descobrir isso, nos capítulos seguintes vamos testar os documentos do NT pelo critério que os historiadores freqüentemente usam para determinar se devemos acreditar ou não em determinado documento histórico. Vamos nos referir a esse critério como “testes históricos”. São eles:

  1. Temos um testemunho antigo? De modo geral, quanto mais antigas as fontes, mais preciso é o seu testemunho.
    1. Temos o depoimento de testemunhas oculares? O depoimento das testemunhas oculares normalmente é o melhor meio de estabelecer o que realmente aconteceu.
    2. Temos o depoimento de testemunhas oculares múltiplas e independentes? Testemunhas oculares múltiplas e independentes confirmam que os fatos realmente aconteceram (eles não são ficção) e dão detalhes adicionais que uma única fonte poderia perder (fontes verdadeiramente independentes normalmente contam a mesma história básica, mas com detalhes diferentes. Os historiadores às vezes chamam isso de “coerência com dissimilaridade”) .
    3. As testemunhas oculares são dignas de confiança? Devemos acreditar nelas? O caráter é muito importante.
    4. Temos evidências corroborantes da arqueologia ou de outros autores? Isso traz confirmação adicional.
      1. Temos algum testemunho de algum oponente? Se os oponentes das testemunhas oculares admitem certos fatos que as testemunhas afirmam ser verdadeiros, então tais fatos provavelmente são verdadeiros (se a sua mãe diz, por exemplo, que você é corajoso, isso pode ser verdadeiro; contudo, é provavelmente mais digno de crédito se o seu arquiinimigo disser a mesma coisa).
      2. O testemunho contém fatos ou detalhes que são embaraçosos para os autores? Uma vez que a maioria das pessoas não gosta de registrar informação negativa sobre si mesmas, qualquer testemunho que faça o autor parecer ruim é provavelmente verdadeiro.

Na maioria dos casos, os documentos que satisfazem a maioria ou todos esses testes históricos são considerados confiáveis ainda que com pequena margem de dúvida. Como se saem os documentos do NT? Vamos descobrir neste capítulo e nos três seguintes. Contudo, antes de começarmos o teste histórico número 1 (testemunho antigo), precisamos esclarecer algumas objeções que impedem muitos céticos de até mesmo considerarem a confiabilidade do NT.

Objeções comuns à confiabilidade

A história não pode ser conhecida. O mais recente argumento gerado contra a possibilidade de se considerar a confiabilidade dos documentos do NT é a afirmação de que a história não pode ser conhecida. Ironicamente, essa objeção normalmente vem das mesmas pessoas que dizem saber que a primeira vida foi gerada espontaneamente com base em elementos químicos inorgânicos e que toda a vida subseqüente evoluiu daquela primeira vida, sem nenhuma intervenção inteligente. Eles estão absolutamente seguros sobre essa história a despeito do fato de que não existem testemunhas oculares ou dados corroborantes desses acontecimentos. Contudo, afirmam que a ressurreição de Jesus Cristo — um acontecimento do qual existem testemunhas oculares e dados corroborantes não pode ser conhecida!

A afirmação de que a história não pode ser conhecida vai na direção contrária do bom senso. Não temos certeza de que George Washington foi o primeiro presidente dos Estados Unidos? Que Lincoln foi o 162? Que o Japão atacou Pearl Harbor em 7 de dezembro de 1941? Que o New York Mets venceu a série mundial de beisebol em 1969? É claro que sim. O cético está errado. Nós podemos conhecer e realmente conhecemos a história. De fato, se não pudéssemos conhecer a história, então não poderíamos detectar o revisionismo histórico ou a propaganda histórica, linhas que assumem existir uma história objetiva que pode ser conhecida.

Por que alguém não poderia ter conhecimento de um fato passado? O cético pode dizer: “Porque você não tem acesso a todos os fatos!”. A isso, responderemos: “Então os cientistas não podem saber coisa alguma, porque não têm acesso a todos os fatos”. Isso é obviamente absurdo. Embora não possamos ter acesso a todos os fatos, podemos ser capazes de reunir uma quantidade suficiente deles para estarmos razoavelmente certos daquilo que aconteceu.

Parte da confusão envolve uma falha em definir aquilo que significa “conhecer”. Uma vez que não podemos voltar no tempo e testemunhar os fatos históricos outra vez, nosso conhecimento histórico está baseado na probabilidade. Em outras palavras, usamos o mesmo padrão que um júri usa para determinar se um acusado cometeu um crime: o de dúvidas justificáveis. Se a história não pode ser conhecida, então nenhum júri poderia chegar a um veredicto! Além do mais, um júri faz um julgamento sobre a culpa ou a inocência de alguém baseado no conhecimento de algum fato passado. Os historiadores precisam descobrir fatos passados do mesmo modo que a polícia ou a equipe de criminalística faz: reunindo evidências e entrevistando testemunhas. Quando fazem isso, freqüentem ente usam os sete testes históricos que acabamos de identificar.

Por último, se não podemos conhecer a história, então os céticos não podem afirmar que o cristianismo não seja verdadeiro. Para dizer que o cristianismo não é verdadeiro, o cético precisa conhecer a história. Por quê? Porque toda negativa implica uma afirmação. Para dizer que Jesus não ressuscitou dos mortos (a negação), o cético precisa saber o que realmente aconteceu a ele (a afirmação).

No fim de tudo, os céticos são pegos num dilema. Se disserem que a história não pode ser conhecida, então não podem dizer que a evolução é verdadeira e que o cristianismo é falso. Se admitirem que a história pode ser conhecida, então precisam enfrentar as múltiplas linhas de evidência histórica favorável à criação e ao cristianismo.

Os documentos do Novo Testamento contêm milagres. Os céticos normalmente fazem a seguinte acusação: “O NT contém milagres; portanto, uma grande parte dele só pode ser lenda!”. Já respondemos a essa objeção. Uma vez que Deus existe, os milagres são possíveis. Como veremos no capítulo 13, os eventos do NT estão num contexto em que os milagres não são apenas possíveis, mas foram preditos. Desse modo, a inclusão de milagres não nega a historicidade dos documentos do NT, mas, na verdade, a fortalece (porque registram fatos que foram preditos).

Os autores do Novo Testamento eram tendenciosos. O grande cético David Hume disse que, se vamos considerar as testemunhas dignas de crédito, então elas não devem ser tendenciosas. Desse modo, quando os céticos olham para os documentos do NT, freqüentemente perguntam: “Como você pode dizer que eram confiáveis, uma vez que foram escritos pelos convertidos? Esses são relatos tendenciosos escritos por pessoas tendenciosas”.

É verdade que os autores do NT eram tendenciosos e convertidos. Mas isso não significa que mentiram ou que exageraram. Na verdade, sua conversão e seu viés podem realmente tê-las levado a serem mais precisos. Vamos ver por quê.

Alguns anos atrás, o assim chamado documentário sobre Jesus, transmitido por um canal de televisão, começava com o seguinte comentário do narrador: ”A maior parte daquilo que pensamos saber sobre Jesus vem dos evangelhos do NT:

Mateus, Marcos, Lucas e João. Mas não podemos confiar que esses livros apresentem uma informação precisa, porque foram escritos pelos convertidos.

Bem, o que há de errado com essa lógica? O que há de errado com a lógica é que deixa de fazer a pergunta mais importante: Por que eles se converteram? De fato, a primeira e mais importante pergunta não é “Qual era a crença dos autores do NT?”. A primeira e mais importante pergunta é: “Por que eles se converteram a essas novas crenças?”. Em outras palavras, por que os autores do NT repentinamente abandonaram seu meio de ganhar a vida e suas valiosas tradições religiosas em favor dessas novas crenças?

Eu [Frank] fiz essa pergunta a um casal de negros muçulmanos19 durante um debate no rádio há não muito tempo. Tal como os muçulmanos tradicionais, os negros muçulmanos não acreditam que Jesus tenha sido crucificado, e, assim, não há maneira de ele ter ressuscitado. Tendo isso em mente, perguntei:

— Por que os autores do NT repentinamente se converteram do judaísmo para acreditar que Jesus ressuscitara dos mortos?

— Porque eles queriam ter poder sobre as pessoas! — disse um deles.

— Que poder os autores do NT ganharam ao afirmar que Jesus ressuscitara

dos mortos? — perguntei. — A resposta é “nenhum”. De fato, em vez de ganhar poder, eles receberam exatamente o oposto: submissão, servidão, perseguição, tortura e morte — disse eu. Eles não responderam nada. Então, fiz a pergunta de uma maneira diferente:

— Que possível motivo teriam os autores do NT para fabricar a história da ressurreição se ela não era verdadeira?

Mais uma vez, não tiveram resposta. Por quê? Porque começaram a perceber que os autores do NT tinham todos os motivos naturais para negar a ressurreição, em vez de proclamá-la. Não havia motivação ou incentivo para fabricar a narrativa do NT. Desde a última vez que pensamos nisso, a promessa de submissão, servidão, perseguição, tortura e morte não motivaria ninguém a inventar tal história.

Os autores do NT certamente não tiveram razão para inventar uma nova religião. Devemos nos lembrar de que todos eles (com a possível exceção de Lucas) eram judeus que acreditavam firmemente já possuírem uma religião verdadeira. Aquela religião de quase 2 mil anos afirmava que eles, os judeus, eram o povo escolhido de Deus. Por que os judeus que se converteram ao cristianismo se arriscariam a sofrer perseguição, morte e, talvez, condenação eterna para começar alguma coisa que 1) não era verdadeira e 2) elevou os não-judeus ao mesmo relacionamento exclusivo que eles afirmavam ter com o Criador do Universo? A não ser que a ressurreição realmente tivesse acontecido, por que deixariam, de maneira quase imediata, de observar o sabá, a circuncisão, a lei de Moisés, a centralidade do templo, o sistema sacerdotal e outros ensinamentos do AT? Os autores do NT precisavam ter testemunhado alguma evidência muito forte para abandonar as crenças e as práticas antigas que haviam definido quem eles e seus ancestrais eram por cerca de 2 mil anos.

Pessoas convertidas não são objetivas. Nesse ponto, o cético pode protestar:

“Mas, uma vez que os autores do NT eram convertidos, eles não podem ser objetivos”. Absurdo. As pessoas podem ser objetivas mesmo que não sejam neutras. Um médico pode fornecer um diagnóstico objetivo mesmo que tenha uma grande afeição pelo paciente. Ou seja, pode ser objetivo embora não seja neutro. O fato é que sua paixão pelo paciente pode fazê-lo ser ainda mais diligente ao diagnosticar e tratar a doença de maneira adequada.

Ao escrever este livro, embora certamente não sejamos neutros, estamos apresentando fatos objetivos. Do mesmo modo, os ateus não são neutros, mas também podem apresentar fatos objetivos se optarem por fazê-lo. Os autores do NT poderiam ter feito o mesmo.

A verdade sobre essa questão é que todos os livros são escritos por uma razão, e a maioria dos autores acredita naquilo que está escrevendo! Mas isso não significa que aquilo que eles escrevem seja errado ou não possua um elemento objetivo. Como mencionamos no prefácio, os sobreviventes do Holocausto que escreveram suas experiências certamente não foram observadores neutros. Acreditavam apaixonadamente no propósito de registrar esses fatos, de modo que o mundo jamais se esquecesse do Holocausto, e esperam que ele nunca se repita. Enquanto a paixão pode fazer algumas pessoas exagerarem, ela pode levar outras a serem ainda mais meticulosas e precisas de modo a não perderem a credibilidade e a aceitação da mensagem que desejam comunicar.

A distinção entre a neutralidade e a objetividade dos autores do NT é uma questão extremamente importante. Com muita freqüência, os documentos que compõem o NT são automaticamente considerados tendenciosos e indignos de confiança. Isso é irônico, pois aqueles que sustentam essa visão são freqüentemente tendenciosos. São tendenciosos porque não investigaram primeiramente os documentos do NT ou o contexto no qual eles foram escritos, com o objetivo de fazer uma avaliação isenta de sua probidade.

Como veremos logo a seguir, os documentos do NT não são “propaganda da igreja” ou um monólito de escritos planejados para promover uma teologia construída pela própria igreja. Então, o que são? Essa é a pergunta que vamos abordar no restante deste capítulo e nos três seguintes.

Sendo assim, vamos começar. Sabemos que temos uma cópia precisa do que foi escrito pelos autores do NT. Mas esses documentos são fidedignos? Nossa primeira pergunta lida com o teste histórico número 1: Os documentos do NT são antigos?

OS DOCUMENTOS DO NOVO TESTAMENTO SÃO ANTIGOS?

Sim, mas quão antigos?

Todos os livros do NT foram escritos antes do ano 100 d.C. (cerca de 70 anos depois da morte de Jesus). Como mostra a tabela 9.1, em cartas escritas entre os anos 95 e 110 d.C, três pais da igreja primitiva — Clemente, Inácio e Policarpo — citaram passagens de 25 dos 27 livros do NT. Somente os pequenos livros de Judas e 2João não foram citados, mas certamente já tinham sido escritos (Judas teria escrito sua pequena carta nessa época porque, sendo o meio irmão de Jesus, muito provavelmente já estava morto no ano 100; 2João fora escrita porque ela é anterior a 3João, que é um dos 25 livros citados).

Uma vez que Clemente estava em Roma e Inácio e Policarpo estavam a centenas de quilômetros de distância, em Esmirna, os documentos originais do NT precisariam ter sido escritos muito tempo antes, caso contrário não poderiam ter circulado por todo o mundo antigo daquela época. Portanto, é seguro dizer que todo o NT já havia sido escrito por volta do ano 100 e pelo menos todos os livros que constam na primeira coluna da esquerda foram escritos vários anos antes de 95.

Mas essa é simplesmente a data mais posterior na qual eles poderiam ter sido escritos. A maioria deles foi provavelmente escrita muito tempo antes. Quando? A maioria, se não todos, antes do ano 70 d.C

A maioria desses livros, se não todos, foi escrita antes do ano 70 d.C (cerca de 40 anos depois da morte de Jesus). Imagine isto. Você é um judeu religioso do século I. O centro de sua vida nacional, econômica e religiosa é Jerusalém e, em especial, o templo. Essa tem sido a vida de sua nação, de sua família e de praticamente toda a família judaica por milhares de anos, desde que Salomão construiu o primeiro templo. A maior parte do novo templo, construída pelo rei Herodes, foi completada quando você era criança, mas porções dele ainda estão em construção, iniciada no ano 19 a.C Por toda a sua vida, você freqüentou os cultos e trouxe sacrifícios ali para expiar os pecados que cometera contra Deus. Por quê? Porque você e seus compatriotas consideram esse templo como a habitação terrena do Deus do Universo, o Criador do céu e da terra, a própria Divindade cujo nome é tão santo que você nem ousa pronunciar.

Sendo jovem, você começa a seguir um judeu chamado Jesus, o qual afirma ser o tão esperado Messias predito nas suas Escrituras. Ele realiza milagres, ensina verdades profundas e repreende e confunde os sacerdotes encarregados do templo. De maneira incrível, prediz sua própria morte e ressurreição. Prediz que o próprio templo será destruído antes do fim de sua geração (Mc 13.2,30).

Isso é escandaloso! Jesus é condenado por blasfêmia pelos sacerdotes do seu templo e crucificado na véspera da Páscoa, um dos seus feriados mais sagrados. Ele é enterrado num túmulo judeu, mas, três dias depois, você e os outros seguidores vêem Jesus vivo tal como ele havia predito. Você toca nele, ouve o que diz, e ele continua a realizar milagres, sendo o último deles a sua própria ascensão ao céu. Passados 40 anos, o seu templo é destruído tal como Jesus havia predito, juntamente com toda a cidade e milhares de compatriotas seus.

Pergunta: se você e seus colegas seguidores escrevessem relatos de Jesus depois de a cidade e o templo terem sido destruídos no ano 70 d.C, você não faria pelo menos uma menção da tragédia nacional, humana, econômica e religiosa sem precedentes em algum lugar dos seus escritos, especialmente uma vez que esse Jesus ressurreto havia predito que tudo isso aconteceria? É claro que sim! Bem, aqui está um problema para aqueles que dizem que o NT foi escrito depois do ano 70 d.C: não existe absolutamente nenhuma menção do cumprimento dessa tragédia predita em lugar algum nos documentos do NT. Isso significa que a maioria, se não todos os documentos, deve ter sido escrita antes do ano 70 d.C

Alguns podem levantar uma objeção: “Esse é o argumento do silêncio, e isso não prova nada”. Contudo, na verdade esse não é um argumento do silêncio, pois os documentos do NT falam de Jerusalém e do templo, ou de atividades associadas a eles, como se eles ainda estivessem intactos na época da composição dos textos. Mas mesmo que esse fosse um argumento extraído do silêncio, não significa que esteja errado. Considere estes paralelos modernos. Se um ex-marinheiro a bordo do USS Arizona escrevesse um livro relacionado à história daquele navio e o livro terminasse sem nenhuma menção do navio sendo afundado e do fato de 1.177 marinheiros terem sido mortos em Pearl Harbor, você teria alguma dúvida de que o livro fora escrito antes de 7 de dezembro de 1941? Ou se um morador do World Trade Center escrevesse um livro relatando a história daqueles prédios e o livro terminasse com as torres ainda em pé — sem haver absolutamente nenhuma menção das torres sendo destruídas e de cerca de 3 mil pessoas sendo mortas por terroristas muçulmanos — você teria alguma dúvida de que o livro fora escrito antes de 11 de setembro de 2001? É claro que não.

Bem, o desastre no ano 70 d.C., em termos de vidas, propriedade e abrangência nacional, foi muitas vezes maior do que Pearl Harbor e o Onze de Setembro. Ele marcou o fim da terrível guerra que Josefo — que se rendeu aos romanos no ano 67 — chamou de “a maior” guerra de todos os tempos. Os judeus não perderam apenas um navio ou dois prédios importantes — perderam todo o país, a capital e o templo, que fora o centro da sua vida religiosa, política e econômica por pelo menos 2 mil anos. Além disso, dezenas de milhares de compatriotas foram mortos e centenas de vilas foram queimadas totalmente.

Desse modo, se esperamos que tragédias como Pearl Harbor e o Onze de Setembro sejam mencionadas em escritos relevantes de hoje, certamente deveríamos esperar que os acontecimentos do ano 70 d.C. fossem citados em algum lugar do NT (principalmente pelo fato de esses acontecimentos terem sido previstos por Jesus). Contudo, uma vez que o NT não menciona esses acontecimentos em qualquer lugar que seja, sugerindo que Jerusalém e o templo ainda estavam intactos, podemos concluir com grande grau de certeza que a maioria, se não todos os documentos do NT, deve ter sido escrita antes do ano 70 d.C.

Mas quanto antes?

Muitos dos livros do Novo Testamento foram compostos antes do ano 62 d.C. (cerca de 30 anos depois da morte de Jesus). Imagine o seguinte: você é um médico do século I que resolveu fazer um projeto de pesquisa para registrar os acontecimentos da igreja primitiva. Essa pesquisa vai exigir que você entreviste testemunhas oculares da igreja primitiva e que viaje com o apóstolo Paulo enquanto ele visita novas igrejas por todo o mundo antigo. Você registra fatos importantes da vida da igreja, como o trabalho inicial de João e Pedro, assim como os martírios de Estevão e de Tiago (irmão de João). Na vida de Paulo, você registra tudo, desde sermões, espancamentos e julgamentos até naufrágios e prisões. Você também registra o debate teológico que ele teve com Pedro e Tiago, que é irmão de Jesus e líder da igreja de Jerusalém.

À medida que você descreve muitos desses fatos, sua narrativa torna-se tão rica em detalhes que todo leitor informado saberá que teve acesso ao depoimento das testemunhas oculares ou então que você mesmo foi uma testemunha ocular. Ao seguir Paulo em suas viagens, por exemplo, você deixa de usar o pronome “eles” e passa a usar “nós”, registrando corretamente os nomes de políticos locais, aspectos da linguagem local, padrões meteorológicos do local, topografia local e práticas comerciais locais. Você até mesmo registra a profundidade correta da água a cerca de 400 metros da ilha de Malta, conforme seu navio está prestes a afundar durante uma tormenta! De fato, você registra pelo menos 84 detalhes desse tipo na segunda metade de sua narrativa.

Pergunta: uma vez que está claro que você considera importante registrar todos esses detalhes menores, se o apóstolo Paulo — seu assunto principal fosse executado pelas mãos do imperador romano Nero, você não registraria isso? Ou se o irmão de Jesus, o líder da igreja de Jerusalém, fosse morto nas mãos do Sinédrio, o mesmo corpo jurídico judaico que sentenciou Jesus à morte, você não registraria isso? Claro que sim! Se você deixasse de registrar tais fatos importantes, nós corretamente presumiríamos que você escreveu sua narrativa antes dessas mortes.

Esta é a situação que encontramos no NT. Lucas, o médico, registra meticulosamente todo tipo de detalhes no livro de Atos dos Apóstolos, que é uma crônica da igreja primitiva (você encontrará uma lista de 84 detalhes historicamente confirmados no capítulo seguinte). Lucas registra a morte de dois mártires cristãos (Estevão e Tiago, o irmão de João), mas seu relato termina tendo dois de seus principais líderes (Paulo e Tiago, irmão de Jesus) ainda vivos. Atos termina abruptamente quando Paulo está numa prisão domiciliar em Roma, e não há menção de Tiago ter morrido. Por meio de Clemente de Roma — escrevendo no final do século I — e de outros pais da igreja primitiva, sabemos que Paulo foi executado em algum momento durante o reinado de Nero, que terminou no ano 68 d.C. Sabemos por meio de Josefo que Tiago foi morto no ano 62 d.C. Assim, podemos concluir, acima do que se considera dúvida justificável, que o livro de Atos foi escrito antes do ano 62 d.C.

Se você ainda não está convencido, considere este paralelo moderno: suponha que alguém escreva um livro registrando os fatos que cercaram as principais personagens do movimento pelos direitos civis na década de 1960. O livro começa com o assassínio do presidente John Fitzgerald Kennedy e inclui a lei dos Direitos Civis de 1964, as marchas e os protestos de Martin Luther King Jr., incluindo sua prisão e o seu grande discurso “Eu tenho um sonho” nos jardins de Washington, D.C. Pergunta: se o livro terminasse com Martin Luther King Jr. — o grande líder desse movimento — ainda vivo, você concluiria que o livro foi escrito em qual data? Obviamente em algum momento antes de seu assassinato em abril de 1968. Essa é a mesma situação que encontramos na narrativa de Lucas. Seu livro termina tendo os principais líderes ainda vivos, o que significa que ele foi escrito não depois do ano 62 d.C. (Colin Hemer, historiador e pesquisador clássico, mostra 13 razões adicionais pelas quais o livro de Atos foi escrito por volta do ano 62 d.C.).

Se Atos foi escrito por volta do ano 62 d.C., então o evangelho de Lucas foi escrito antes. Como podemos saber isso? Porque Lucas lembra ao destinatário original do livro de Atos, Teófilo (que provavelmente era um importante oficial romano), aquilo que lhe escrevera anteriormente. O primeiro versículo de Atos diz: “Em meu livro anterior, Teófilo, escrevi a respeito de tudo o que Jesus começou a fazer e a ensinar … “. O “livro anterior” deve ser o evangelho de Lucas, porque Lucas também o endereçou a Teófilo (Lc 1.1-4, v. citação a seguir).

O evangelho de Lucas foi escrito quanto tempo antes? Pareceria plausível dizer que Lucas foi escrito antes ou por volta do ano 60 d.C. Por quê? Porque o ano 62 d.C. é a última data para Atos ter sido escrito, e seria necessário algum tempo entre o primeiro texto de Lucas enviado a Teófilo e o segundo texto. Se Atos não poderia ser escrito depois de 62 d.C. (e muito possivelmente antes disso), então Lucas está corretamente colocado no ano 60 d. e. ou antes.

Essa data também faz sentido à luz da citação que Paulo faz do evangelho de Lucas. Escrevendo em algum momento entre os anos 62 e 65 d.C., Paulo cita Lucas 10.7 e o chama de “Escritura’ (1Tm 5.18). Portanto, o evangelho de Lucas deve ter circulado tempo suficiente antes dessa época para que tanto Paulo quanto Timóteo conhecessem o seu conteúdo e o considerassem Escritura (a propósito, o fato de Paulo ter dito isso não é pouca coisa. Com efeito, ele estava afirmando com ousadia que o evangelho de Lucas era tão inspirado quanto a santa Bíblia judaica — o AT que ele tanto valorizava!).

Se Lucas foi escrito por volta do ano 60 d.C., então Marcos deve ter sido escrito da metade para o fim da década do ano 50 d.C., se não mais cedo. Por quê? Porque Lucas diz que ele obteve conhecimento dos fatos confrontando-os com as fontes das testemunhas oculares:

Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram entre nós, conforme nos foram transmitidos por aqueles que desde o início foram testemunhas oculares e servos da palavra. Eu mesmo investiguei tudo cuidadosamente, desde o começo, e decidi escrever-te um relato ordenado, ó excelentíssimo Teófilo, para que tenhas a certeza das coisas que te foram ensinadas (Lc 1.1-4).

A maioria dos estudiosos acredita que o evangelho de Marcos foi uma dessas fontes de testemunhas oculares. Se aqueles fragmentos dos Manuscritos do mar Morto que mencionamos são realmente do período que vai de 50 a 70 d.C., então certamente Marcos é anterior. Contudo, mesmo que Marcos não fosse anterior a Lucas, o próprio fato de sabermos, ainda que com pequena parcela de dúvida justificável, que Lucas é anterior ao ano 62 d.C. (e provavelmente ao ano 60 d.C.) realmente significa que aquilo que temos meticulosamente registrado são depoimentos de testemunhas oculares do sepultamento e da ressurreição de Jesus, escritos num período de 25 a 30 anos depois da morte dele. Isso é cedo demais para ter-se tornado uma lenda. Também significa que a fonte das testemunhas oculares aponta para mais cedo ainda. Quanto mais cedo?

Alguns livros do Novo Testamento foram escritos nas décadas de 40 e 50 d.C., com base em fontes da década de 30 d.C. (apenas alguns anos depois da morte de Jesus). Tão certo como podemos datar os escritos de Lucas, ninguém duvida — nem mesmo os estudiosos mais liberais — que Paulo escreveu sua primeira carta à igreja de Corinto (que está hoje na Grécia moderna) em algum momento entre os anos 55 e 56 d.C. Em sua carta, Paulo fala sobre problemas morais da igreja e, então, continua, discutindo controvérsias sobre línguas, profecias e a ceia do Senhor. Isso certamente demonstra que a igreja em Corinto estava experimentando algum tipo de atividade miraculosa e já estava observando a ceia do Senhor 25 anos depois da ressurreição de Cristo.

Contudo, o aspecto mais significativo dessa carta é que ela contém o mais antigo e mais autenticado testemunho da própria ressurreição. No capítulo 15 de 1 Coríntios, Paulo escreve o testemunho que recebeu de outros e o testemunho que foi autenticado quando Cristo apareceu-lhe:

Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, segundo as Escrituras, e apareceu a Pedra e depois aos Doze. Depois disso apareceu a mais de quinhentos irmãos de uma só vez, a maioria dos quais ainda vive, embora alguns já tenham adormecido. Depois apareceu a Tiago e, então, a todos os apóstolos; depois destes apareceu também a mim, como a um que nasceu fora de tempo (1Co 15.3-8).

Onde Paulo obteve aquilo que ele “recebeu”? Ele provavelmente o recebeu de Pedro e de Tiago, quando os visitou em Jerusalém, três anos depois de sua conversão (GI1.18). Por que isso é tão importante? Porque, como destaca Gary Habermas, a maioria dos estudiosos (até mesmo os liberais) acredita que esse testemunho era parte de um antigo credo cuja origem remonta à própria ressurreição de Jesus — 18 meses a oito anos depois, mas alguns dizem que foi ainda mais cedo. Não há possibilidade de tal testemunho ser descrito como lenda, porque ele tem sua origem exatamente no momento e no lugar do fato em si. Se havia um lugar onde uma ressurreição lendária não pudesse acontecer, era Jerusalém, porque os judeus e os romanos estavam por demais ansiosos para esmagar o cristianismo e poderiam facilmente tê-la feito apresentando o corpo de Jesus por toda a cidade.

Além disso, perceba que Paulo cita 14 testemunhas oculares cujos nomes são conhecidos: os doze apóstolos, Tiago e o próprio Paulo (o termo “Cefas” é a palavra aramaica equivalente a Pedro) e depois faz referência a uma aparição a mais outras 500 pessoas de uma só vez. Dentro desse grupo, havia um cético, Tiago, e um inimigo declarado, o próprio Paulo. Ao citar os nomes de tantas pessoas que poderiam verificar o que Paulo estava dizendo, ele estava, com efeito, desafiando seus leitores de Corinto a verificar o que dizia. O especialista em Bíblia William Lillie expõe a questão da seguinte maneira:

O que concede uma autoridade especial à lista como evidência histórica é a referência ao fato de a maioria dos 500 irmãos ainda estarem vivos. Com efeito, S. Paulo diz: “Se você não acredita em mim, pergunte a eles”. Tal declaração, numa carta comprovadamente genuína, escrita cerca de 30 anos depois do acontecimento, é praticamente uma evidência tão conclusiva quanto alguém poderia esperar obter de algo que aconteceu cerca de 2 mil anos atrás.

Se a ressurreição de Jesus não tivesse acontecido, por que Paulo daria uma lista de supostas testemunhas oculares? Ele teria perdido imediatamente toda a credibilidade diante de seus leitores da cidade de Corinto ao mentir de maneira tão descarada.

Além de 1 Coríntios, existem diversos outros documentos do NT que foram escritos na década de 50 d.C. ou antes. Gálatas (48 d.C.), 1Tessalonicenses (5054 d.C.) e Romanos (57 e 58 d.C.) encaixam-se nessa categoria. De fato (e sabemos que podemos ficar sozinhos nessa posição!), todas as obras de Paulo precisariam ter sido escritas antes que ele morresse, o que aconteceu em algum momento na década de 60 d. e.

Mas não são apenas os estudiosos conservadores que acreditam nessas datas tão antigas. Até mesmo alguns críticos radicais, como o ateu John A. T. Robinson, admitem que os documentos do NT foram escritos logo. Conhecido por seu papel no lançamento do movimento “a Morte de Deus”, Robinson escreveu um livro revolucionário intitulado Redating the New Testament [Refazendo a datação do Novo Testamento] no qual postula que a maioria dos livros do NT, incluindo os quatro evangelhos, foram escritos em algum momento entre os anos 40 e 65 d.C.

Depois de ver quão bem o NT encaixa-se com os dados arqueológicos e históricos, o grande e outrora liberal arqueólogo William F. Albright escreveu: “Já podemos dizer enfaticamente que não há mais nenhuma base sólida para considerar que algum livro do NT tenha sido escrito depois do ano 80 d.C.”. Em outro lugar, Albright disse: “Na minha opinião, todos os livros do NT foram escritos por um judeu batizado entre os anos 40 e 80 do século I (muito provavelmente em algum momento entre os anos 50 e 75)”.

Desse modo, sabemos, acima do que se considera dúvida justificável, que a maioria dos documentos do NT, se não todos, é antiga. Mas os céticos ainda têm algumas objeções.

Os documentos não são suficientemente antigos

Alguns céticos podem pensar que um período de 15 a 40 anos entre a vida de Cristo e os escritos sobre ele é um período grande demais para que o testemunho seja confiável. Mas estão errados.

Pense nos fatos que aconteceram entre 15 e 40 anos atrás. Quando os historiadores escrevem sobre eles, não dizemos “Oh, isso é impossível! Ninguém pode se lembrar dos fatos que se passaram há tanto tempo!”. Tal ceticismo é claramente injustificável. Os historiadores de hoje escrevem com precisão sobre fatos das décadas de 1970, 80 e 90 consultando suas próprias lembranças, a lembrança das testemunhas oculares e qualquer fonte escrita daquela época.

Esse processo é o mesmo que os autores do NT usaram para registrar seus documentos. Tal como um bom repórter, Lucas entrevistou testemunhas oculares. Como veremos no capítulo seguinte, alguns autores do NT foram eles mesmos testemunhas oculares. Eles podiam lembrar-se de fatos acontecidos 15 a 40 anos antes, assim como você pode. Por que você pode se lembrar de certos fatos de maneira tão viva, mesmo que eles tenham acontecido 15 a 40 anos atrás (se você possui idade suficiente) ou até mais para trás? Você pode ser capaz de se lembrar de certos fatos porque eles causaram um grande impacto emocional sobre você (de fato, aqueles de nós de idade provecta às vezes podem lembrar-se de fatos ocorridos 30 anos atrás melhor do que aquilo que aconteceu há 30 minutos!).

Onde você estava e o que estava fazendo quando o presidente Kennedy foi assassinado? Quando a nave Challenger explodiu? Quando o segundo avião atingiu a torre em Nova York? Por que consegue lembrar-se tão bem desses fatos? Porque eles provocaram um profundo impacto emocional em você. Uma vez que um fato como a ressurreição de Jesus certamente teria causado um profundo impacto emocional nos autores do NT e nas testemunhas oculares que eles podem ter consultado, é fácil entender por que a história de Jesus pôde ser lembrada tão facilmente muitos anos depois, especialmente numa cultura com uma confiança estabelecida no testemunho oral (leia mais sobre isso a seguir).

Além do mais, se as maiores obras do NT são relatos de testemunhas oculares, escritos dentro de um período de duas gerações depois dos fatos, então é muito provável que não sejam lendas. Por quê? Porque a pesquisa histórica indica que um mito não pode começar a se sobrepor aos fatos históricos enquanto as testemunhas oculares ainda estão vivas. Por essa razão, o historiador romano A. N. Sherwin-White chama a visão mitológica do NT de “inacreditável”. Willian Lane Craig escreve: “Os testes mostram que mesmo duas gerações é um período muito curto para que tendências legendárias apaguem o cerne dos fatos históricos”. Dentro dessas duas gerações, as testemunhas oculares ainda estão por perto para corrigir os erros dos revisionistas da história.

Estamos vendo essa tendência exatamente agora com respeito ao Holocausto.

No começo do século XXI, começamos a ver algumas pessoas afirmarem que o Holocausto nunca aconteceu. Por que os revisionistas estão tentando isso agora? Porque a maioria das testemunhas oculares já morreu. Felizmente, uma vez que temos o testemunho escrito das testemunhas oculares do Holocausto, os revisionistas não estão sendo bem-sucedidos em passar adiante suas mentiras como se fossem verdades. O mesmo se confirma com relação ao NT. Se o NT fosse escrito 60 anos depois dos fatos que ele registra, é altamente improvável que os fatos pudessem ser lendários. Como já vimos, todos os documentos do NT foram escritos dentro de um período de 60 anos após os fatos narrados, considerando-se que muitos deles foram escritos antes desse período.

Por que não antes?

Neste momento, o cético pode dizer: “O.k., tudo bem. O NT é antigo, mas ele não é tão antigo quanto eu esperaria. Por que eles não escreveram seu testemunho ainda antes? Se eu visse o que eles disseram que viram, não esperaria 15 a 20 anos para escrevê-lo”.

Existe um número de razões possíveis para a espera.

Em primeiro lugar, uma vez que os autores do NT estavam vivendo numa cultura em que a grande maioria das pessoas não sabia ler, não havia necessidade inicial ou utilidade em fazer-se um registro de forma escrita. Por pura necessidade, as pessoas da Palestina do século I desenvolveram forte capacidade de memorização com o objetivo de lembrar e passar adiante uma informação. Craig escreve:

Numa cultura oral como a da Palestina do primeiro século, a habilidade de memorizar e reter grandes textos de tradição oral era algo altamente valorizado e bastante desenvolvido. Desde os primeiros anos, as crianças no lar, na escola fundamental e na sinagoga eram ensinadas a memorizar corretamente as tradições sagradas. Os discípulos teriam exercido cuidado similar com os ensinamentos de Jesus.

Numa cultura oral como essa, os fatos sobre Jesus podem ter sido colocados numa forma fácil de ser decorada. Existem boas evidências disso. Gary Habermas identificou 41 pequenas sessões do Novo Testamento que parecem ser credos frases compactas que poderiam ser facilmente relembradas e que provavelmente eram passadas adiante de maneira oral antes de serem colocadas em forma escrita (já mencionamos um desses credos — 1Co 15.3-8).

Em segundo lugar, uma vez que alguns dos autores do NT podem ter tido grandes esperanças de que Jesus estava para voltar durante a sua vida, eles não viam uma razão imediata de escrever. Contudo, conforme foram ficando mais velhos, talvez tenham pensado que seria sábio registrar suas observações no papiro.

Em terceiro lugar, à medida que o cristianismo se espalhava por todo o mundo antigo, a escrita tornava-se um meio mais eficiente de se comunicar com a igreja, que se expandia rapidamente. Em outras palavras, o tempo e a distância forçaram os autores do NT a escrever.

No entanto, pode não ter havido um espaço de tempo com relação a pelo menos um dos evangelhos. Se aqueles fragmentos dos Manuscritos do mar Morto são realmente do evangelho de Marcos (e existe uma grande possibilidade que sejam), então esse evangelho pode ter sido escrito nos anos 30 d.C. Por quê? Porque os fragmentos são das cópias, e não do original. Se temos cópias dos anos 50 d.C., então o original deve ser anterior.

Além disso, muitos estudiosos acreditam que realmente havia fontes escritas anteriores aos evangelhos. De fato, nos primeiros quatro versículos de seu evangelho, Lucas diz que verificou outras fontes, aparentemente algumas delas podem ter sido evangelhos mais antigos (e.g., Mateus e Marcos). O evangelho de Marcos teria sido uma dessas fontes? Não sabemos com certeza. Certamente parece que Lucas está falando de várias outras fontes escritas, porque ele diz:

“Muitos já se dedicaram a elaborar um relato dos fatos que se cumpriram entre nós … ” (Lc 1.1). Lucas pode ter se referido ao evangelho de Marcos e a outros depoimentos escritos, incluindo registros públicos do tribunal que julgou Jesus.

Por fim, realmente não importa se havia ou não outras fontes escritas anteriores ao NT. Também não importa se Marcos foi escrito na década de 30 d.C. Por quê? Porque os documentos dos quais realmente temos conhecimento são antigos o suficiente e contêm material-fonte antigo. Como veremos no capítulo seguinte, muitos, se não todos os documentos do NT, foram escritos por testemunhas oculares ou por seus contemporâneos num período de 15 a 40 anos depois de Jesus, e alguns contêm testemunho escrito de origem oral ou outros escritos que aponta diretamente para a sua ressurreição. Em outras palavras, a verdadeira questão não é tanto com relação à data dos escritos, mas à data das fontes usadas nos escritos.

Por que não mais?

Os céticos podem dizer: “Se Jesus realmente ressuscitou dos mortos, não deveria haver mais coisa escrita sobre ele do que realmente existe?”. A resposta é que nós realmente temos mais testemunho do que poderíamos esperar e certamente mais do que suficiente para estabelecer, acima do que se considera dúvida justificável, o que aconteceu. Como já vimos, Jesus é citado por muito mais autores do que um imperador romano de sua época (Jesus é citado por 43 autores, enquanto Tibério é citado por dez, num período de 150 anos após a morte de cada um). Nove desses autores foram testemunhas oculares ou contemporâneos dos acontecimentos e escreveram 27 documentos, dos quais a maioria menciona ou deixa implícita a ressurreição de Jesus. Isso é mais do que suficiente para estabelecer historicidade.

Para aqueles que ainda acham que deveria haver mais material escrito sobre Jesus, o estudioso do NT Craig Blomberg apresenta quatro razões que explicam por que essa idéia não é plausível: 1) o início humilde do cristianismo; 2) a localização remota da Palestina, na fronteira oriental do Império Romano; 3) a pequena porcentagem de obras de historiadores greco-romanos que sobreviveu (devido provavelmente a fatos como perda, degradação, destruição ou as três alternativas juntas) e 4) a falta de atenção dada aos documentos históricos sobreviventes por parte de personagens judaicos em geral.

Todavia, alguns céticos ainda podem pensar que deveria existir o testemunho de alguma daquelas 500 pessoas que supostamente viram o Cristo ressurreto. O cético Farrell Till é um deles. Durante um debate sobre a ressurreição de Jesus que eu [Norm] tive com ele em 1994, Till exigiu: “Mostre-me uma dessas 500 testemunhas ou nos dê alguma coisa que elas tenham escrito, e nós aceitaremos isso como uma prova confiável ou como evidência”.

Essa expectativa não é plausível, por diversas razões. Em primeiro lugar, como já destacamos, a Palestina do século I era uma cultura oral. A maioria das pessoas não sabia ler e lembrava-se das informações e passava-as adiante de maneira oral.

Em segundo lugar, quantas dessas testemunhas oculares predominantemente analfabetas teriam escrito alguma coisa, ainda que soubessem escrever? Mesmo hoje, com uma taxa de analfabetismo muito menor e todas as conveniências da escrita moderna e das ferramentas de pesquisa, quantas pessoas você conhece que já escreveram um livro ou até mesmo um artigo sobre um assunto qualquer? Quantas você conhece que já escreveram um livro ou um artigo sobre um fato histórico contemporâneo, até mesmo algo tão significativo quanto o Onze de Setembro? Provavelmente não muitas e certamente muito menos do que 500 (será que o próprio Farrell Till já escreveu um artigo sobre um fato histórico importante que ele testemunhou?).

Em terceiro lugar, mesmo que alguma daquelas cerca de 500 pessoas tivesse escrito aquilo que viram, por que os céticos esperariam que seu testemunho sobrevivesse por 2 mil anos? O NT sobrevive intacto por causa dos milhares de manuscritos copiados por escribas para uma igreja em crescimento durante vários séculos. Obras históricas de grandes historiadores antigos como Josefo, Tácito e Plínio possuem apenas algumas poucas cópias restantes, e essas cópias distam centenas de anos dos originais. Por que os céticos acham que qualquer coisa poderia ter sido escrita — muito mais que tenha sobrevivido — por um grupo antigo de camponeses galileus analfabetos?

Por fim, sabemos o nome de muitos daqueles 500, e seu testemunho está escrito no NT. Dentre eles, estão Mateus, Marcos, Lucas, João, Pedra, Paulo e Tiago — além de outras nove que são citados em outras lugares como apóstolos (Mt 10 e At 1).

Desse modo, não devemos esperar mais testemunho do que aquilo que temos sobre Jesus. E isso é mais do que suficiente para estabelecer a historicidade.

CONCLUSÃO

Temos muito mais para investigar no que concerne à historicidade do NT.

Mas podemos tirar duas grandes conclusões neste momento:

  1. Temos uma cópia precisa dos documentos originais do NT:

a) Embora os documentos originais do NT não tenham sobrevivido ou ainda não tenham sido encontrados, temos muitas cópias precisas dos documentos originais — muito mais do que as dez melhores peças da literatura antiga combinadas. Além do mais, uma reconstrução praticamente perfeita dos originais pode ser realizada ao comparar-se os milhares de cópias manuscritas que sobreviveram. Descobrimos fragmentos manuscritos do século 11 e alguns talvez tão antigos quanto o material da segunda metade do século I. Não existem obras do mundo antigo que sequer cheguem perto do NT em termos de apoio de manuscritos.

b) A reconstrução também é autenticada por milhares de citações feitas pelos pais da igreja primitiva. De fato, todo o NT, com exceção de poucos versículos, pode ser reconstruído simplesmente das citações que eles fizeram.

  1. Os documentos do NT são antigos e contêm uma fonte ainda mais antiga:

a) Uma vez que os documentos do NT são citados por outras autores por volta do ano 100 d.C., é necessário que tenham sido escritos antes deles.

b)Uma vez que os documentos do NT falam como se o templo e a cidade ainda estivessem em pé na época em que foram escritos — e não há menção do ataque da guerra judaica ou da destruição do templo de Jerusalém -, a maioria dos documentos do NT é provavelmente anterior ao ano 70 d.C.

c) Temos fortíssimas evidências de que o livro de Atos foi escrito por volta do ano 62 d.C., o que significa que o evangelho de Lucas é ainda mais antigo.

d) Temos fontes que chegam até os anos 30 d.C. Praticamente todos os estudiosos concordam que o testemunho da morte, do sepultamento e da ressurreição encontrado em 1 Coríntios 15 vem do tempo desses acontecimentos ou de poucos anos depois deles. Além do mais, existem pelo menos outros 40 credos no NT que parecem possuir uma origem bastante antiga.

Portanto, os documentos são antigos, e as fontes são ainda mais antigas. Mas isso não é suficiente para provar historicidade acima do que se considera dúvida justificável. Para provar historicidade, precisamos ter certeza de que esses documentos realmente contêm o testemunho das testemunhas oculares. Será que eles contêm?

Gary Habermas e John Dominic Crossan: Sobre a Ressurreição de Jesus

Gary Habermas completou a mais ampla investigação já feita até o momento sobre o que os estudiosos acreditam a respeito da ressurreição de Jesus. Habermas reuniu mais de 1.400 obras dos eruditos mais críticos que falam sobre a ressurreição de Jesus, escritas de 1975 a 2003. Na obra The Risen Jesus and Future Hope, [O Jesus ressurreto e a esperança do futuro]

Habermas expõe que quase todos os estudiosos, independentemente do espectro ideológico — desde os ultra liberais até os conservadores defensores da Bíblia -, concordam que os pontos a seguir, todos relacionados a Jesus e ao cristianismo, são fatos históricos reais:
1.A morte de Jesus deu-se por meio da crucificação romana.
2.Ele foi sepultado, muito provavelmente, num túmulo particular.
3. Pouco tempo depois, os discípulos ficaram desanimados, desolados e desacorçoados, tendo perdido a esperança.
4. O túmulo de Jesus foi encontrado vazio pouco tempo depois de seu sepultamento.
5. Os discípulos tiveram experiências que acreditaram ser aparições reais do Jesus ressurreto.
6. Devido a essas experiências, a vida dos discípulos foi totalmente transformada. Depois disso, até mesmo se dispuseram a morrer por sua crença.
7. A proclamação da ressurreição aconteceu logo de início, desde o começo da história da igreja.
8. O testemunho público e a pregação dos discípulos sobre a ressurreição de Jesus aconteceram na cidade de Jerusalém, onde Jesus fora crucificado e sepultado pouco tempo antes.
9. A mensagem do evangelho concentrava-se na pregação da morte e da ressurreição de Jesus.
10. O domingo passou a ser o principal dia de reunião e adoração.
11. Tiago, irmão de Jesus e cético antes desse evento, converteu-se quando acreditou que também vira o Jesus ressurreto.
12. Poucos anos depois, Saulo de Tarso (Paulo) tornou-se cristão devido a uma experiência que ele também acreditou ter sido uma aparição do Jesus ressurreto.
A aceitação desses fatos faz sentido à luz daquilo que vimos até aqui. As evidências nos demonstram os pontos a serem apresentados a seguir.
A história do Novo Testamento não é uma lenda. Os documentos do NT foram escritos exatamente dentro de um período de duas gerações, com base nos eventos, pelas testemunhas oculares ou por seus contemporâneos. A seqüência da história do NT é corroborada por escritores não-cristãos. Além disso, o NT menciona pelo menos 30 personagens históricas que foram confirmadas por fontes externas ao NT. Portanto, a história do NT não pode ser uma lenda.
A história do Novo Testamento não é uma mentira. Os autores do NT incluíram detalhes divergentes e embaraçosos, dizeres difíceis e exigentes e fizeram cuidadosa distinção entre as palavras de Jesus e suas próprias palavras. Eles também se referiram a fatos e a testemunhas oculares que seus leitores já conheciam ou poderiam verificar. De fato, os autores do NT fizeram seus leitores e os mais destacados inimigos do século I verificarem aquilo que disseram. Se isso não é suficiente para confirmar sua fidedignidade, então seu martírio deveria remover qualquer dúvida. Essas testemunhas oculares sofreram perseguição e morte por causa da declaração empírica de que viram, ouviram e tocaram o Jesus ressurreto, embora elas pudessem ter-se salvado simplesmente negando-se a dar o seu testemunho.
A história do Novo Testamento não é um embelezamento. Os autores do NT foram meticulosamente precisos, conforme evidenciado pelos mais de 140 detalhes historicamente confirmados. Registraram milagres nessas narrativas historicamente confirmadas e o fizeram sem maquiagem aparente ou comentário teológico significativo.
Portanto, o Novo Testamento é verdadeiro? Se a maioria dos estudiosos concorda com os 12 fatos relacionados anteriormente porque as evidências mostram que a história do NT não é uma lenda, uma mentira ou um embelezamento, então sabemos, acima do que se considera dúvida justificável, que os autores do NT registraram com precisão aquilo que viram. Por acaso isso significa que todos os acontecimentos do NT são verdadeiros? Não necessariamente. O cético ainda tem uma questão.
A última questão possível para o cético é que os autores do NT foram enganados.
Em outras palavras, talvez os autores do NT estivessem simplesmente errados em relação àquilo que pensaram ter visto.
Dadas as características do NT que já revisamos anteriormente, não parece plausível que os autores do NT tenham sido enganados com relação a acontecimentos comuns e não miraculosos. Eles se mostraram corretos em relação a muitos detalhes históricos. Por que duvidar de suas observações de acontecimentos do dia-a-dia?
Mas teriam eles sido enganados no caso de acontecimentos miraculosos como a ressurreição de Jesus? Talvez realmente tenham crido que Jesus ressuscitara dos mortos — e, por isso, pagaram com a própria vida -, mas estavam errados ou enganados. Talvez existam explicações naturais para todos os milagres que julgavam ter visto.
Os estudiosos mais críticos ignoram isso. Considere o fato número 5 daquela lista de 12 nos quais praticamente todos os estudiosos acreditam: “Os discípulos tiveram experiências que eles acreditaram ser aparições reais do Jesus ressurreto”. Em outras palavras, os estudiosos não estão necessariamente dizendo que Jesus realmente ressuscitou dos mortos (embora alguns considerem que realmente ressuscitou). O consenso mínimo entre praticamente todos os estudiosos é que os discípulos acreditaram que Jesus ressuscitara dos mortos.
Para que testemunhas oculares e contemporâneos dos acontecimentos estejam errados, é preciso haver alguma outra explicação para a ressurreição de Jesus e os outros milagres registrados no NT. Uma vez que a ressurreição de Jesus é o fato central do cristianismo, vamos começar daí. De que maneira os céticos excluem a ressurreição?

Aqui estão as explicações para a ressurreição de Jesus mais freqüentes ente apresentadas pelos céticos.

Teoria da alucinação. Teriam os discípulos sido enganados por alucinações?
Talvez eles pensaram sinceramente que tinham visto o Cristo ressurreto, mas, em vez disso, na verdade estavam experimentando alucinações. Essa teoria tem muitas falhas fatais. Vamos abordar duas delas.
Em primeiro lugar, as alucinações não são experimentadas por grupos, mas apenas por indivíduos. Nesse aspecto, são muito parecidas com sonhos. É por isso que, se um amigo lhe diz pela manhã: “Uau! Esse foi um grande sonho que nós tivemos, não é?”, você não diz “Sim, foi fabuloso! Vamos continuar hoje à noite?”. Não, você acha que seu amigo ficou louco ou que está simplesmente fazendo uma brincadeira. Você não o leva a sério porque sonhos não são experiências coletivas. Quem tem sonhos é o indivíduo, não grupos. As alucinações funcionam da mesma maneira. Se existirem raras condições psicológicas, um indivíduo pode ter uma alucinação, mas seus amigos não a terão. Mesmo que a tiverem, não terão a mesma alucinação.
A teoria da alucinação não funciona porque Jesus não apareceu uma única vez para uma única pessoa — ele apareceu em dezenas de ocasiões diferentes, numa grande variedade de cenários, para diferentes pessoas, durante um período de 40 dias. Ele foi visto por homens e mulheres. Foi visto caminhando, falando e comendo. Foi visto dentro e fora de lugares. Foi visto por muitos e por poucos. Um total de mais de 500 pessoas viu o Jesus ressurreto. Elas não estavam tendo uma alucinação ou vendo um fantasma, porque, em seis das 12 aparições, Jesus foi fisicamente tocado e/ou comeu comida verdadeira (v. tabela 12.1).
A existência do túmulo vazio é a segunda falha fatal da teoria da alucinação.
Se mais de 500 testemunhas oculares tiveram a experiência sem precedentes de ter a mesma alucinação em 12 ocasiões diferentes, então por que as autoridades judaicas ou romanas simplesmente não exibiram o corpo de Jesus pela cidade? Isso teria desferido um golpe fatal no cristianismo de uma vez por todas. As autoridades adorariam ter feito isso, mas, aparentemente, não puderam fazê-lo porque o túmulo estava realmente vazio.
As testemunhas foram ao túmulo errado. Talvez os discípulos tenham ido ao túmulo errado e, então, presumiram que Jesus havia ressuscitado. Essa teoria também possui duas falhas fatais.
Primeira falha: se os discípulos tivessem ido à sepultura errada, as autoridades judaicas e romanas teriam ido à sepultura certa e, então, teriam mostrado o corpo de Jesus na cidade. O túmulo era conhecido pelos judeus porque era um túmulo deles (pertencia a José de Arimatéia, membro do Sinédrio). O túmulo também era conhecido pelos romanos porque colocaram guardas ali. Como destaca William Lane Craig, a teoria do túmulo errado presume que todos os judeus (e os romanos) tiveram um tipo de “amnésia coletiva’ permanente em relação àquilo que eles haviam feito com o corpo de Jesus.
ORDEM DAS DOZE APARIÇÕES DE JESUS CRISTO
Pessoas
Viram
Ouviram
Tocaram
Outras evidências
1 Maria Madalena (Jo 20.10-18)
X
X
X
túmulo vazio
2. Maria Madalena e outra Maria (Mt 28.1-10)
X
X
X
túmulo vazio (e panos no sepulcro também em Lc 24.1-12)
3. Pedro (1Co 15.5) e João (Jo 20.1-10)
X
X
túmulo vazio, panos no sepulcro
4. Dois discípulos (Lc 24.13-35)
X
X
comeram com ele
5. Dez apóstolos (Lc 24.36-49; Jo 20.19-23)
X
X
X**
viram as feridas,comeram
6. Onze apóstolos(Jo 20.24-31)
X
X
X**
viram as feridas
7. Sete apóstolos a o 21)
X
X
comeram
8. Todos os apóstolos (Mt 28.16-20; Mc 16.14-18)
X
X
9. Quinhentos irmãos (1Co 15.6)
X
X*
10. Tiago (1Co 15.7)
X
X*
11. Todos os apóstolos (At 1.4-8)
X
X
comeram com ele
12. Paulo (At 9.1-9; 1Co 15.8)
X
X
* implícito ** deixou que seu corpo fosse tocado
Tabela 12.1
Segunda falha: mesmo que os discípulos realmente tivessem ido ao túmulo errado, a teoria não explica de que maneira o Jesus ressurreto apareceu em 12 diferentes ocasiões. Em outras palavras, são as aparições que devem ser explicadas, e não apenas o túmulo vazio.
Perceba que o túmulo vazio não convenceu a totalidade dos discípulos (com a possível exceção de João) de que Jesus ressuscitara dos mortos. Foram as aparições de Jesus que os fizeram deixar de ser covardes assustados, fugitivos e céticos e se transformar na maior força missionária pacífica da história. Isso é especialmente verdadeiro com relação a um religioso inimigo do cristianismo, Saulo (Paulo). Ele não apenas não foi convencido pelo túmulo vazio, como estava perseguindo os cristãos logo após a ressurreição de Jesus. Foi necessária uma aparição do próprio Jesus para transformar Paulo. Parece que Tiago, o cético irmão de Jesus, também foi convertido depois de uma aparição de Jesus. Como vimos, a conversão de Tiago foi tão dramática que ele se tornou líder da igreja de Jerusalém e, mais tarde, foi martirizado nas mãos do sumo sacerdote.
O resumo é este: mesmo que alguém pudesse dar uma explicação natural para o túmulo vazio, não seria suficiente como prova contrária à ressurreição. Qualquer teoria alternativa da ressurreição também deve excluir as aparições de Jesus. A teoria do túmulo vazio não faz nenhuma das duas coisas.
Teoria do desmaio, do desfalecimento ou da morte aparente. Existe a possibilidade de Jesus não ter realmente morrido na cruz? Talvez Jesus tenha simplesmente desfalecido. Em outras palavras, ele ainda estava vivo quando foi colocado no túmulo, mas, de alguma maneira, Jesus escapou e convenceu seus discípulos de que havia ressuscitado dos mortos. Existem diversos erros fatais nessa teoria também.
Primeiro erro: tanto inimigos quanto amigos acreditaram que Jesus estava morto.
Os romanos, que eram executores profissionais, chicotearam e bateram em Jesus de maneira brutal. Então, depois disso, pregaram cravos rústicos em seus punhos e em seus pés e enfiaram uma lança em seu lado. Eles não quebraram as pernas para apressar sua morte porque sabiam que já estava morto (as vítimas de crucificação freqüentemente morriam por asfixia porque não podiam erguer o corpo para poder respirar. Quebrar as pernas, portanto, apressaria a morte). Além do mais, Pilatos foi verificar para certificar-se de que Jesus estava morto, e a morte de Jesus foi a razão de os discípulos terem perdido toda a esperança.
A técnica brutal de crucificação romana foi verificada por toda a arqueologia e por fontes escritas não-cristãs (v. capo 15, em que temos uma vívida descrição da experiência da crucificação de Jesus). Em 1968, os restos de uma vítima de crucificação do século I foram encontrados numa caverna em Jerusalém. O osso do calcanhar desse homem tinha um prego de quase 18 cm que o atravessava, e seus braços também mostravam evidências de pregos. A lança no coração também foi reconhecida como uma técnica romana de crucificação pelo autor romano Quintiliano (35-95 d.C.). Em função desse tratamento dispensado a Jesus, não é de surpreender que as testemunhas oculares tenham pensado que ele estivesse morto.
Não foram apenas as pessoas do século I que acreditaram que Jesus estava morto: médicos modernos também acreditam que Jesus realmente morreu. Escrevendo em 21 de março de 1986, na edição do Journal of the American Medical Association, três médicos, incluindo um patologista da Clínica Mayo, concluíram:
Está claro que o peso das evidências históricas e médicas indica que Jesus já estava morto antes de receber o ferimento em seu lado e apóia a visão tradicional de que a lança, introduzida entre as costelas do lado direito, provavelmente perfurou não apenas o pulmão direito, mas também o pericárdio e o coração e, portanto, garantiu sua morte. Por conta disso, interpretações baseadas na pressuposição de que Jesus não morreu na cruz parecem não estar de acordo com o conhecimento médico moderno’!
Como indicamos no capítulo anterior, o sangue e a água que saíram da ferida da lança parecem ser outro detalhe genuíno de uma testemunha ocular, relatado pela pena de João. Esse único fato deveria pôr fim a todas as dúvidas sobre a morte de Jesus.
O segundo grande erro na teoria do desfalecimento é que Jesus foi embalsamado com 34 quilos de bandagens e especiarias. É altamente improvável que José de Arimatéia e Nicodemos ao 19.40) pudessem ter embalsamado por engano um Jesus que ainda estivesse vivo.
Terceiro erro: mesmo que todo mundo estivesse errado sobre o fato de Jesus realmente estar morto quando foi para o túmulo, de que maneira um homem gravemente ferido e sangrando ainda estaria vivo 36 horas depois? Ele teria sangrado até morrer naquele túmulo frio, úmido e escuro.
Quarto erro: se ele tivesse sobrevivido ao túmulo frio, úmido e escuro, de que maneira poderia tirar as bandagens, empurrar a pedra para cima e para fora (uma vez que estava dentro do túmulo), passar pelos guardas romanos (que seriam mortos por permitir uma brecha na segurança) e, então, convencer os covardes assustados, fugitivos e céticos de que ele havia triunfado sobre a morte? Mesmo que pudesse sair do túmulo e passar pelos guardas romanos, Jesus seria apenas uma massa mole alquebrada e ensanguentada de homem, da qual os discípulos teriam pena, e não alguém a quem eles adorariam. Eles diriam: “Você pode estar vivo, mas certamente não ressuscitou. Vamos levá-la já para um médico!”.
Quinto erro: a teoria do desfalecimento não pode explicar a brilhante aparição de Jesus a Paulo na estrada de Damasco. O que transformou esse dedicado inimigo do cristianismo logo depois da crucificação? Certamente não foi um ser humano normal que fora curado de sua experiência de crucificação.
A descrição que Paulo faz de sua conversão está registrada duas vezes no livro de Atos, que é historicamente autenticado. No capítulo 22, Paulo fala a uma multidão judaica hostil sobre a aparição de Cristo a ele:
“Por volta do meio-dia, eu me aproximava de Damasco, quando de repente uma forte luz vinda do céu brilhou ao meu redor. Caí por terra e ouvi uma voz que me dizia: ‘Saulo, Saulo, por que você está me perseguindo?’ Então perguntei: ‘Quem és tu, Senhor?’. E ele respondeu: ‘Eu sou Jesus, o Nazareno, a quem você persegue’.” (v. 6-8).
Paulo ficou sem enxergar por três dias e experimentou uma mudança de 180 graus em suas atitudes. Deixou de ser o mais enérgico inimigo do cristianismo para se tornar o seu mais ardente defensor.
A experiência de conversão de Paulo não pode ser explicada por um Jesus desfalecido segurando uma tocha e usando sua “voz de Deus” no meio dos arbustos. Foi uma mostra dramática do poder divino, em plena luz do dia, que mudou dramaticamente um homem e o mundo para sempre.
Sexto erro: vários autores não-cristãos confirmaram que Jesus morreu por crucificação. Dentre eles, incluímos Josefo, Tácito, Talo e o talmude judaico. O talmude judaico, por exemplo, diz que Yeshua Qesus) foi pendurado num madeiro na véspera da Páscoa. Essa não é considerada uma fonte favorável ao cristianismo, de modo que não há razão para duvidar de sua autenticidade.
Por essas e outras razões, poucos estudiosos ainda acreditam na teoria do desfalecimento. Simplesmente existem evidências demais contra ela.
Os discípulos roubaram o corpo. A teoria de que os discípulos roubaram o corpo de Jesus não pode apoiar a última opção dos céticos — a de que os autores do NT foram todos enganados. Por quê? Porque a teoria faz que os autores do NT sejam os enganadores, e não os enganados! Naturalmente, isso é um ataque frontal a todas as evidências que vimos até aqui. A teoria presume a insustentável posição de que os autores do NT eram todos mentirosos. Por alguma razão inexplicável, roubaram o corpo com o objetivo de serem eles mesmos surrados, torturados e martirizados! As pessoas que defendem essa teoria não podem explicar por que qualquer pessoa faria isso. Por qual razão os discípulos embarcariam em tal conluio de autodestruição? E por que todos eles continuaram a dizer que Jesus ressuscitara dos mortos quando poderiam preservar sua vida ao se negarem a dar seu testemunho?
Além do grave conflito de interesse dos discípulos, os defensores dessa ideia não podem explicar outros absurdos exigidos pela teoria. De que maneira, por exemplo, os discípulos passaram pela guarda de elite romana que fora treinada para guardar o túmulo com o penhor da própria vida? Se Jesus nunca ressuscitou dos mortos, então quem apareceu a Paulo, a Tiago e às outras testemunhas oculares? Os autores do NT mentiram sobre sua conversão também? Paulo simplesmente inventou as evidências encontradas em 1 Coríntios? E o que dizer sobre os autores não-cristãos? Teria Josefo mentido sobre Tiago ter sido martirizado pelo Sinédrio? Por acaso o escritor romano Flegon (nasc. c. 80 d.C.) mentiu também quando escreveu suas Crônicas, em que diz: “Jesus, enquanto vivo, não foi de qualquer ajuda para si mesmo, mas, quando ressuscitou depois da morte, exibiu as marcas de sua punição, e mostrou de que maneira suas mãos foram perfuradas pelos pregos”?. Seria preciso mais do que um “milagre” para que tudo isso acontecesse, caso Jesus não tivesse ressuscitado dos mortos. Não temos fé suficiente para acreditar em tudo isso!
Como já vimos, a noção de que os discípulos roubaram o corpo é exatamente a explicação que os judeus ofereceram para justificar o túmulo vazio. Além do fato de os discípulos não terem nenhum motivo ou habilidade para roubar o corpo, essa antiga explicação judaica não foi uma boa mentira por duas outras razões: 1) como os guardas adormecidos poderiam ter visto que os discípulos haviam roubado o corpo? e 2) nenhum guarda romano se deixaria punir com a pena capital por ter dormido no posto (talvez seja por isso, como registra Mateus, que as autoridades judaicas tiveram de pagar os guardas e prometer que os livrariam de problemas com o governador).
Em 1878, foi feita uma fascinante descoberta arqueológica que corrobora a afirmação bíblica de que os judeus estavam espalhando a versão do roubo. Uma placa de mármore de 38 cm por 60 cm foi descoberta em Nazaré com a seguinte inscrição:
Decreto de César: É meu prazer que tumbas e sepulturas permaneçam perpetuamente imperturbadas por aqueles que as construíram para o culto aos seus ancestrais, aos filhos ou aos membros de sua casa. Se, porém, qualquer um fizer acusação de que outro as destruiu ou que, de alguma maneira, tenha extraído o sepultado, ou o tenha maliciosamente transferido para outro lugar com o objetivo de fazer-lhe mal, ou que tenha substituído o selo por um outro, contra este ordeno que seja constituído um tribunal, tanto com relação aos deuses, como em relação ao culto aos mortais. Pois é muito mais obrigatório honrar os sepultados. Que seja absolutamente proibido a qualquer um perturbá-los. Em caso de violação, desejo que o ofensor seja sentenciado à pena capital ou considerado culpado de violação de sepulcro. I
Os estudiosos acreditam que esse edito foi promulgado pelo imperador Tibério, que reinou de 14 a 37 d.C. (durante a maior parte da vida de Cristo), ou pelo imperador Cláudio, que reinou de 41 a 54 d.C. O aspecto notável desse dito é que ele transforma a simples ação de saquear uma sepultura de um ato passível de multa para um ato passível de pena de morte!
Por que o imperador romano se importaria em promulgar um edito tão severo naquele momento, numa área tão remota de seu Império? Embora ninguém saiba com certeza as razões que levaram à promulgação desse edito, existem algumas possibilidades que remetem a Jesus.
Se a inscrição é de Tibério, então é provável que Tibério tenha ouvido falar de Jesus com base em um dos relatórios anuais que Pilatos teria feito. Justino Mártir afirma que foi isso o que aconteceu. Pode ter sido incluída nesse relatório a explicação judaica para o túmulo vazio (os discípulos roubaram o corpo), levando Tibério a impedir qualquer “ressurreição” futura daquele edito.
Se a inscrição é de Cláudio, então o edito pode ter sido parte de sua resposta às revoltas que aconteceram em Roma no ano 49 d.C. Lucas menciona em Atos 18.2 que Cláudio expulsou os judeus de Roma. Isso é confirmado pelo historiador romano Suetônio, que nos diz que “porque os judeus em Roma causavam perturbações contínuas em função da instigação de Crestos, ele [Cláudio] os expulsou da cidade” (Crestos é uma variante do nome Cristo).
Qual a relação entre Cristo e as revoltas judaicas em Roma? Talvez Roma tivesse experimentado o mesmo curso de fatos ocorridos em Tessalônica basicamente no mesmo período. Em Atos 17, Lucas registra que houve um “tumulto” em Tessalônica quando os judeus “ficaram com inveja’ porque Paulo estava pregando que Jesus ressuscitara dos mortos. Aqueles judeus reclamaram com os oficiais da cidade, dizendo: “Esses homens, que têm causado alvoroço por todo o mundo, agora chegaram aqui [ ... ]. Todos eles estão agindo contra os decretos de César, dizendo que existe um outro rei, chamado Jesus” (v. 6,7).
Se foi isso o que realmente aconteceu em Roma, então Cláudio não estava feliz com o grupo que agia contra os seus decretos e que seguia outro rei. Uma vez que já tinha conhecimento dessa nova seita rebelde nascida entre os judeus que acreditavam que seu líder havia ressuscitado, é possível que tenha expulsado todos os judeus de Roma e transformado a violação de sepulturas em crime capital.
Qualquer uma dessas duas possibilidades poderia explicar o tempo, o local e a severidade do edito. Contudo, mesmo que o edito não estivesse ligado ao túmulo vazio de Cristo, já temos boas evidências de que os judeus propagaram a hipótese do roubo (v. capo anterior). A questão principal é que a hipótese do roubo foi uma admissão tácita de que o túmulo estava realmente vazio. Além do mais, por que os judeus inventariam uma explicação para o túmulo vazio se o corpo de Jesus ainda estivesse ali?
Um substituto assumiu o lugar de Jesus na cruz. Essa é a explicação apresentada pelos muçulmanos hoje — Jesus não foi crucificado, mas alguém — como Judas, por exemplo — foi morto em seu lugar. O Alcorão faz a seguinte afirmação sobre Jesus:
Eles não o mataram, não o crucificaram, mais tudo foi feito para que lhes parecesse assim, e aqueles que discordam desse aspecto estão cheios de dúvidas sem conhecimento (correto), mas apenas conjeturas para seguir, pois com certeza eles não o mataram: não, Alá o ressuscitou para si mesmo; e Alá é Exaltado em Poder, Sábio (surata 4.157,158).
Desse modo, de acordo com o Alcorão, parece que Jesus foi crucificado e que Alá o levou diretamente para o céu.
Existem muitos problemas com essa teoria, sem contar que simplesmente não existe evidência alguma que a apoie. Essa afirmação do Alcorão foi escrita mais de 600 anos depois da vida de Jesus. De que maneira isso pode ser considerado uma fonte mais autorizada sobre a vida de Jesus do que os relatos das testemunhas oculares? Essa teoria contradiz todo o depoimento das testemunhas oculares e o testemunho das fontes não-cristãs.
Além do mais, essa teoria levanta mais perguntas do que respostas. Devemos acreditar que a multidão de testemunhas que presenciou algum aspecto da morte de Jesus — os discípulos, os guardas romanos, Pilatos, os judeus, a família e os amigos de Jesus — estava toda errada sobre quem fora morto? De que maneira tantas pessoas poderiam estar erradas quanto a uma simples identificação? Isso é o mesmo que dizer que Abraham Lincoln não foi a pessoa assassinada ao lado de sua esposa numa noite de abril de 1865 no Teatro Ford. Estaria Mary Lincoln errada sobre o homem que estava sentado ao seu lado? O guarda-costas de Lincoln estava errado sobre quem ele estava guardando? Todas as outras pessoas estavam erradas sobre a identidade do presidente também? Não se pode acreditar nisso.
Existem muitas outras perguntas levantadas por essa teoria. Se Jesus não foi morto, então por que o túmulo do homem que realmente foi morto foi encontrado vazio? Por acaso devemos acreditar que o substituto ressuscitou dos mortos? Se foi assim, de que maneira ele o fez? Devemos acreditar que todos os historiadores não-cristãos estão errados sobre a morte de Jesus? E o que devemos fazer com a admissão judaica da morte de Jesus? Estaria o talmude errado ao dizer que Jesus foi pendurado num madeiro na véspera da Páscoa? Em resumo, devemos acreditar que todas as pessoas do século I estavam erradas sobre tudo?
É preciso questionar uma teoria surgida 600 anos depois dos fatos e que pede a você para acreditar que todas as evidências do século I estão erradas. A verdade é que essa teoria contradiz a maioria dos 12 fatos nos quais praticamente todos os estudiosos acreditam (v. o início deste capítulo). Tal como outras teorias alternativas, essa está construída sobre mera especulação, sem nem mesmo uma partícula de comprovação que possa apoiá-la. Portanto, não temos fé suficiente para acreditar nela.
A fé dos discípulos levou-os à crença na ressurreição. John Dominic Crossan é o co-fundador do grupo de estudiosos e críticos de extrema esquerda que chamam a si mesmos de o “Seminário de Jesus”. Eles decidiram que apenas 18% dos dizeres atribuídos a Jesus nos evangelhos são autênticos (leia mais sobre isso no apêndice 3). Não apresentam nenhuma evidência real para o seu ceticismo, apenas teorias especulativas sobre como a fé dos discípulos levou-os à sua crença na ressurreição e em tudo mais no NT.
Essa teoria foi levantada exatamente durante o debate que Crossan teve com William Lane Craig sobre a ressurreição de Jesus. Crossan apresentou a teoria de que os discípulos inventaram a história da ressurreição porque eles “pesquisaram nas Escrituras” depois de sua morte e descobriram que “a perseguição, se não a execução, era muito semelhante a uma espécie de descrição de função dos eleitos de Deus”.
Todo o debate de duas horas girou em torno da resposta de Craig. Ele disse:
“Certo. Isso surgiu depois de terem presenciado as aparições da ressurreição [ ... ]. A fé dos discípulos não levou às aparições [da ressurreição], mas foram as aparições que levaram à sua fé; depois disso é que eles foram pesquisar nas Escrituras”.
O fato é que os discípulos assustados, amedrontados e céticos não inventariam uma história de ressurreição e depois sairiam por aí dispostos a morrer por Jesus.
Em terceiro lugar, antigas fontes não-cristãs sabiam que os autores do NT não estavam apresentando relatos míticos. Como observa Craig L. Blomberg, “os antigos críticos judaicos e pagãos da ressurreição entenderam que os autores dos evangelhos estavam fazendo afirmações históricas, não escrevendo mitos ou lendas. Eles simplesmente discutiam a plausibilidade dessas afirmações”.
Em quarto lugar, nenhum mito grego ou romano falou da encarnação literal de um Deus monoteísta numa forma humana (cf. Jo 1.1-3,14), por meio de um nascimento virginal (Mt 1.18-25), seguido por sua morte e ressurreição física. Os gregos eram politeístas, e não monoteístas como os cristãos do NT. Além do mais, os gregos acreditavam na encarnação em um corpo mortal diferente; os cristãos do NT acreditavam na ressurreição do mesmo corpo físico que se tornava imortal (cf. Lc 24.37; Jo 9.2; Hb 9.27).
Em quinto lugar, o primeiro paralelo real de um deus que morre e ressuscita só aparece depois do ano 150 d.e, mais de cem anos depois da origem do cristianismo. Desse modo, se houve qualquer influência de um sobre o outro, foi a influência do fato histórico do NT sobre a mitologia, e não o inverso.
O único relato conhecido de um deus sobrevivendo à morte que seja anterior ao cristianismo é o culto egípcio ao deus Osíris. Nesse mito, Osíris é cortado em 14 pedaços, espalhado por todo o Egito e, depois, remontado e trazido de volta à vida pela deusa Ísis. Contudo, Os íris não volta realmente à vida física, mas torna-se membro de um submundo de sombras. Como observam Gary Habermas e Michael Licona, “isso é muito diferente do relato da ressurreição de Jesus, no qual ele é o gloriosamente ressurreto Príncipe da vida que foi visto por outros na terra antes de sua ascensão ao céu”.
Por fim, mesmo se existirem mitos sobre deuses morrendo e ressuscitando que sejam anteriores ao cristianismo, isso não significa que os autores do NT copiaram esses mitos. A série de TV de ficção científica Jornada nas estrelas precedeu o programa norte-americano do ônibus espacial, mas isso não significa que as reportagens de jornal sobre as missões do ônibus espacial são influenciadas pelos episódios de Jornada nas estrelas! É preciso olhar para a evidência de cada relato para ver se é histórico ou mítico. Não há testemunhas oculares ou evidências que corroborem a historicidade da ressurreição de Os íris ou de qualquer outro deus pagão. Ninguém acredita que eles sejam realmente figuras históricas. Contudo, como vimos, existem fortes evidências de testemunhas oculares que corroboram a historicidade da morte e da ressurreição de Jesus Cristo.

Os cristãos estão acostumados a “contra-atacar” teorias alternativas da ressurreição. De fato, nós mesmos acabamos de fazer isso ao destacar as inúmeras deficiências das teorias alternativas. Mas isso não é suficiente. Embora os céticos corretamente coloquem o ônus da prova da ressurreição sobre os cristãos (e, como vimos, os cristãos podem satisfazer essa prova com boas evidências), os cristãos precisam colocar o ônus da prova sobre os céticos quanto às suas teorias alternativas. À luz de todas as evidências positivas da ressurreição, os céticos devem mostrar evidências positivas originárias do século I para suas visões alternativas.

Uma coisa é inventar uma teoria alternativa da ressurreição; outra é encontrar evidências do século I para ela. Uma teoria não é uma evidência. É sensato exigir evidências, não apenas teoria. Qualquer um pode inventar uma teoria para explicar um fato histórico qualquer. Por exemplo: você acreditaria numa história que afirmasse que todo o material filmado nos campos de concentração do Holocausto fora encenado e fabricado por judeus com o objetivo de angariar simpatia e apoio para um Estado judeu? É claro que não, porque isso vai de encontro a todas as evidências conhecidas. Para serem levados a sério, aqueles que propõem tal teoria devem apresentar relatórios dignos de crédito e independentes de testemunhas oculares, além de outras evidências corroborantes, para irem na direção oposta aos inúmeros relatos que dizem que o Holocausto foi real e que foi realmente perpetrado pelos nazistas. Mas não existe nenhuma dessas contra-evidências.
Esse é o caso da ressurreição. Embora os céticos tenham formulado diversas teorias alternativas para desacreditar a ressurreição, não há evidência de alguma fonte do século I que apoie qualquer uma dessas teorias. A única teoria que é até mesmo mencionada por uma fonte do século I (os discípulos roubaram o corpo) vem de Mateus e é claramente identificada como mentira. Ninguém do mundo antigo — nem mesmo os inimigos do cristianismo — deu uma explicação alternativa plausível para a ressurreição. Muitas das teorias alternativas formuladas nos 200 anos seguintes estão baseadas no anti-sobrenaturalismo. Uma vez que os estudiosos modernos eliminam filosoficamente os milagres logo de início, eles inventam explicações ad hoc para desacreditar a ressurreição. Como vimos, suas explicações ad hoc contêm inúmeros absurdos e improbabilidades.
Deveríamos perguntar àqueles que possuem teorias alternativas para a ressurreição: “Que evidências você tem para sua teoria? Por favor, poderia citar três ou quatro fontes do século I que apóiem sua teoria?”. Quando os céticos honestos se vêem diante dessa pergunta, normalmente respondem com o silêncio ou admitem de modo gaguejante que não possuem tais evidências, porque elas não existem.
E não é apenas a ressurreição que os céticos precisam explicar. Também precisam explicar os outros 35 milagres que as testemunhas oculares associaram a Jesus. Devemos acreditar que os quatro autores dos evangelhos foram todos enganados acerca de todos aqueles milagres, bem como sobre a ressurreição de Jesus?
Essa teoria de engano em massa precisa de evidência. Possuímos alguma outra fonte do século I que ofereça uma explicação diferente para as obras de Jesus? A única que foi descoberta (e que provavelmente é do século 11) é o !talmude judaico, que admite que Jesus realizou atos incomuns dizendo que ele “praticava feitiçaria’. Mas essa explicação é tão fraca quanto a explicação judaica para a ressurreição (os discípulos roubaram o corpo). Talvez a feitiçaria pudesse explicar alguns dos “milagres” de Jesus, mas o que dizer de todos os 35? Feiticeiros e mágicos não podem realizar o tipo de ato que se diz que Jesus realizou — ressuscitar mortos, dar vista a cegos, caminhar sobre as águas, e assim por diante.
Desse modo, se não existe nenhuma evidência antiga para esse engano coletivo, devemos aceitar os milagres do NT como são apresentados? Por que não? Vivemos num Universo teísta, onde milagres são possíveis. Embora seja verdade que não tenhamos confirmação independente para todos os milagres do NT (porque alguns são mencionados por apenas um autor), certamente temos múltiplas confirmações de muitos deles (até mesmo a ressurreição de Jesus). A quantidade de milagres de Jesus citados por fontes independentes é grande demais para que eles sejam eliminados como se fossem um grande engano. Uma pessoa pode ser enganada uma vez, mas não é possível que vários observadores sejam enganados repetidamente.
O estudioso alemão Wolfgang Trilling escreve: “Estamos convictos e consideramos historicamente correto que Jesus de fato realizou milagres [ ... ]. Os relatos de milagres ocupam tanto espaço nos evangelhos que é impossível que tudo isso pudesse ter sido subsequentemente inventado ou transferido para Jesus”.
William Lane Craig conclui: “O fato de que a obra miraculosa pertence ao Jesus histórico não é mais discutido”. Ou seja, os milagres não são discutidos com bases históricas, mas apenas com bases filosóficas (falaremos sobre isso mais à frente).
O mais importante é que existem muitos milagres e muito testemunho para se acreditar que todas as testemunhas oculares erraram todas as vezes. Com respeito à ressurreição, todas as teorias alternativas possuem erros fatais e temos fortes evidências circunstanciais e de testemunhas oculares de que Jesus realmente ressuscitou dos mortos. Em outras palavras, não apenas carecemos de uma explicação natural para o túmulo vazio, mas temos evidências positivas da ressurreição. A explicação que exige a menor quantidade de fé é a de que Jesus realmente realizou milagres e realmente ressuscitou dos mortos como havia predito anteriormente. Desse modo, não temos fé suficiente para acreditar que os autores do Novo Testamento foram todos enganados.

Se temos uma cópia precisa de um testemunho antigo (cap. 9); se esse testemunho é não apenas antigo, mas provém de testemunhas oculares (cap. 10); se essas testemunhas oculares registraram com precisão aquilo que viram (cap. 11); e se as testemunhas oculares não foram enganadas sobre aquilo que registraram (este capítulo), então por que nem todos os estudiosos aceitam o NT como ele é? Pela mesma razão que os darwinistas recusam-se a reconhecer as evidências que derrotam sua visão: possuem um viés filosófico contrário aos milagres.

Esse viés foi admitido durante um debate entre Craig e Crossan. Craig acredita, como nós, que a evidência da historicidade da ressurreição literal é forte. Por outro lado, Crossan não acredita que Jesus ressuscitou literalmente dos mortos. Leia a seguir um trecho do debate entre os dois homens:
Craig: — Haveria alguma coisa, dr. Crossan, que pudesse convencê-lo do fato histórico de que Jesus ressuscitou dos mortos?
Crossan: — Preciso certificar-me do que estamos falando. Digamos que estamos diante de algum acontecimento do lado de fora do túmulo vazio na manhã do domingo de Páscoa. Se alguém tivesse uma câmera de vídeo, teríamos o registro de alguma coisa saindo do túmulo? É esse o tipo da pergunta?
Craig: — Creio que o que estou perguntando e o que penso que o sr. Buckley [o moderador do debate] está exigindo é isto: que evidência seria necessária para convencê-lo? Ou você possui uma idéia preconcebida sobre a impossibilidade do miraculoso e similares que, de fato, é tão forte que distorce o seu julgamento histórico, de modo que tal fato jamais pudesse ser admitido num tribunal?
Crossan: — Não … Um médico na cidade de Lourdes poderia admitir: “Não possuo uma maneira médica de explicar o que aconteceu”. Essa é uma afirmação correta. Então alguém tem o direito de dizer: “Portanto, eu, pela fé, acredito que Deus interveio aqui”. Mas é uma pressuposição teológica minha de que Deus não opera dessa maneira … O que seria necessário para me provar o que você pergunta? Eu não sei, a não ser que Deus mude o Universo. Eu poderia imaginar descobrir amanhã pela manhã que todas as árvores do lado de fora da minha casa moveram-se 2 metros. Isso exige alguma explicação. Não sei qual é a explicação, mas não presumiria imediatamente que foi um milagre.
A declaração explícita de Crossan de sua pressuposição teológica contra os milagres é uma franca admissão de sua parte. Naturalmente Crossan não está falando em nome de todos os estudiosos céticos. Contudo, certamente a maioria deles nega a leitura direta do NT porque compartilha de seu viés filosófico contra os milagres. Não é que a evidência histórica favorável ao NT seja fraca (na verdade, ela é muito forte). É que excluíram os milagres de antemão. Chegam à conclusão errada porque seu viés os impede de chegar à conclusão correta.

Vamos analisar o comentário final de Crossan sobre as árvores no seu jardim movendo-se 2 metros da noite para o dia. Ele diz que ele”não presumiria imediatamente que foi um milagre”. Bem, nós também, porque a maioria dos fatos realmente possui uma explicação natural (que, conseqüentemente, ajuda os milagres a destacar-se quando ocorrem). Desse modo, faz total sentido procurar uma explicação natural em primeiro lugar.

Mas isso significa que nunca deveríamos concluir que um fato qualquer (como as árvores movendo-se) foi um milagre? Crossan não concluiria isso por causa de sua pressuposição teológica de que Deus “não opera dessa maneira”. Contudo, uma vez que a pressuposição é injustificada — porque Deus existe -, qual seria a conclusão correta? Depende do contexto do fato. Lembre-se do capítulo 5, no qual dissemos que a evidência deve ser interpretada à luz do contexto no qual ela é encontrada.
Desse modo, vamos supor que o evento de Crossan no qual as árvores movem-se aconteceu no seguinte contexto: 200 anos antes, alguém que afirma ser um profeta de Deus escreve uma predição de que todas as árvores numa área de Jerusalém realmente se moveriam 1 metro numa noite, em um ano em particular. Duzentos anos depois, um homem chega para dizer às pessoas da cidade que o milagre do mover das árvores vai acontecer em breve. Esse homem afirma ser Deus, ensina verdades profundas e realiza muitos outros atos incomuns que parecem ser milagres.
Então, numa manhã, diversas testemunhas oculares afirmam que as árvores no jardim de Jerusalém de Crossan — incluindo algumas com raízes profundas, carvalhos com 30 metros de altura — realmente se moveram 1 metro durante a noite, exatamente como o homem-Deus predissera. Essas testemunhas oculares também dizem que esse é apenas um dos mais de 30 milagres realizados por aquele homem-Deus. Então as testemunhas começam a sofrer perseguição e martírio por proclamar tais milagres e recusar-se a negar o seu depoimento. Os oponentes do homem-Deus não negam a evidência sobre as árvores ou os outros milagres, mas oferecem uma explicação natural que possui inúmeros erros fatais. Muitos anos mais tarde, depois que todas as testemunhas morreram, os céticos oferecem explicações naturais adicionais que fatalmente são comprovadas como erros. De fato, nos 1.900 anos seguintes, os céticos tentam explicar o fato de maneira natural, mas nenhum deles consegue.
Pergunta: Dado o contexto, não seria racional presumir que o movimento das árvores foi sobrenatural, em vez de ter uma origem natural? É claro que sim. O contexto faz toda a diferença.
Esse é o caso que temos quanto à ressurreição. Não é simplesmente porque não temos uma explicação natural para o túmulo vazio. É que temos evidências circunstanciais positivas de testemunhas oculares que corroboram favoravelmente o milagre da ressurreição de Jesus. Aqui está o contexto no qual devemos avaliar as evidências.
I. A natureza teísta deste Universo faz milagres serem possíveis. Vivemos num Universo teísta onde milagres são possíveis (na verdade, o maior milagre de todos — a criação do Universo do nada — já aconteceu). Desse modo, Deus pode usar profetas para anunciar sua mensagem e milagres para confirmá-la. Ou seja, um milagre pode ser usado para confirmar a palavra de Deus, por meio de um homem de Deus, ao povo de Deus.
II. Documentos antigos dizem que se devem esperar os milagres. Temos documentos do AT, escritos centenas de anos antes, que predizem que o Messias — um homem que, na verdade, seria Deus — viria, seria morto num momento específico como sacrifício pela humanidade pecaminosa e ressuscitaria dos mortos (v. mais sobre esse assunto no capítulo seguinte).
III. Documentos de testemunhas oculares historicamente confirmados dizem que os milagres são reais. Existem 27 documentos escritos por nove testemunhas oculares ou por seus contemporâneos que descrevem diversos acontecimentos miraculosos. Muitos desses documentos contêm depoimentos historicamente confirmados de testemunhas oculares que remontam aos tempos dos acontecimentos, e essas evidências demonstram que a narrativa não foi inventada, maquiada ou produto de fraude. Sabemos isso porque os documentos do NT satisfazem todos os sete testes de historicidade identificados no capítulo 9. Os documentos do NT:
  1. são antigos (a maioria deles foi escrita 15 a 40 anos depois, num período de no máximo duas gerações depois dos fatos);
    1. possuem depoimento de testemunhas oculares;
  2. possuem depoimento independente de testemunhas oculares de múltiplas fontes;
    1. foram escritos por pessoas dignas de confiança que ensinaram e viveram de acordo com elevados padrões de ética e que morreram por causa de seu testemunho;
  3. descrevem acontecimentos, locais e indivíduos corroborados pela arqueologia e por outros autores;
  4. descrevem alguns acontecimentos que os inimigos tacitamente admitem serem verdadeiros (confirmação do inimigo);
  5. descrevem acontecimentos e detalhes que são embaraçosos para os autores e até mesmo para o próprio Jesus.
Esses documentos historicamente confirmados de testemunhas oculares contam a seguinte história:
  1. No tempo, no local e da maneira predita pelo AT, Jesus chega a Jerusalém e afirma ser o Messias. Ele ensina verdades profundas e, de acordo com numerosas testemunhas oculares independentes, realiza 35 milagres (alguns em grupos de pessoas) e ressuscita dos mortos.
  2. As testemunhas oculares — que antigamente eram covardes e descrentes — repentinamente começam a proclamar a ressurreição de Jesus de maneira ousada, arrostando perseguição e morte (pessoas mal orientadas podem morrer por uma mentira que elas consideram ser verdade, mas não vão morrer por uma mentira que sabem que é uma mentira. Os autores do NT estavam em posição de saber a verdade real sobre a ressurreição).
  3. Na própria cidade da morte e do túmulo de Jesus, um novo movimento (a igreja) nasce e espalha-se rapidamente de maneira pacífica, na crença de que Jesus ressuscitou dos mortos (isso seria difícil de explicar se a ressurreição não tivesse acontecido. Como seria possível o cristianismo começar em uma cidade hostil como Jerusalém se o corpo de Jesus ainda estivesse no túmulo? As hostis autoridades religiosas e governamentais teriam exposto o cristianismo como uma farsa ao apresentarem o corpo).
  4. Os milhares de judeus de Jerusalém, incluindo sacerdotes fariseus, abandonaram cinco de suas crenças e práticas mais estimadas e adotaram novas práticas estranhas ao se converter ao cristianismo.
  5. Saulo, o mais ardoroso inimigo da igreja nascente, converte-se repentinamente e torna-se seu propagador mais produtivo. Ele viaja pelo mundo antigo para proclamar a ressurreição, sofrendo perseguição e martírio (se a ressurreição não tivesse acontecido, então por que o maior inimigo do cristianismo repentinamente se tornaria seu maior líder? Por que sofreria voluntariamente perseguição e morte?).
  6. Tiago, o cético irmão de Jesus, repentinamente se convence de que seu irmão é o Filho de Deus e, então, torna-se o líder da igreja em Jerusalém. Mais tarde, sofre martírio nas mãos do sumo sacerdote (todos nós sabemos que os membros da família podem ser as pessoas mais difíceis de se convencerem de nosso ponto de vista religioso. Tiago começou como um irmão inconvicto de Jesus (Jo 7.5]. Se a ressurreição não tivesse acontecido, então por que Tiago — que foi chamado de “o justo” pelos historiadores Clemente e Hegesipo no século 11 — repentinamente se tornaria crente de que seu irmão realmente era o Messias? A não ser que tenha visto o Cristo ressurreto, por que Tiago se tornaria o líder da igreja em Jerusalém e sofreria a morte por meio de martírio?).
    1. Os inimigos judeus do cristianismo não negam as evidências, mas oferecem justificativas naturais falhas para explicá-la.
IV: Confirmação adicional. As referências coletivas de outros historiadores e de autores antigos confirmam essa linha básica da história dos documentos do NT, e várias descobertas arqueológicas confirmam os detalhes que esses documentos descrevem.
Quando se colocam as evidências no contexto adequado, você pode ver por que não temos fé suficiente para sermos céticos em relação a isso. É muito mais lógico ser cético sobre o ceticismo!
Os céticos que analisam os pontos 11 a IV mostrados anteriormente (incluindo seus subi tens) podem concluir que Jesus não ressuscitou dos mortos. Mas, se o fizerem, então precisarão dar evidências para uma teoria alternativa que possa responder a todas essas questões. Como já vimos, eles falharam terrivelmente. A ressurreição é a melhor explicação para todas as evidências.
Uma vez que existe um Deus capaz de agir, então pode haver atos de Deus.
Quando a intenção de Deus é anunciada antecipadamente e você possui bons depoimentos de testemunhas oculares e evidências que corroboram que tais fatos realmente aconteceram, é preciso ter muito mais fé para negar esses eventos do que para acreditar neles.

Existem duas objeções adicionais que os céticos freqüentemente levantam contra a ressurreição de Jesus e os milagres. A primeira é a demanda por evidência extraordinária.

Evidência extraordinária. Alguns céticos podem admitir que a ressurreição seja possível, mas eles dizem que isso exigiria uma evidência extraordinária para que fosse crível. Ou seja, uma vez que o NT faz afirmações extraordinárias como os milagres -, devemos ter evidências extraordinárias com o objetivo de acreditar nessas afirmações. Essa objeção parece lógica até que se pergunte: “o que significa ‘extraordinário’?”.
Se significa além do natural, então o cético está pedindo que a ressurreição seja confirmada por outro milagre. Como isso poderia funcionar? Com o objetivo de acreditar no primeiro milagre (a ressurreição), o cético precisaria então de um segundo milagre que a apoiasse. Ele então exigiria um terceiro milagre para apoiar o segundo, e isso prosseguiria infinitamente. Assim, por esse critério, o cético nunca acreditaria na ressurreição de Jesus. Existe alguma coisa errada com um padrão de prova que impossibilita que se creia naquilo que realmente aconteceu.
Se “extraordinário” significa repetível como no laboratório, então nenhum fato da história é digno de crédito, porque os fatos históricos não podem ser repetidos. A credibilidade de um fato histórico só pode ser confirmada ao olhar-se para a qualidade das evidências das testemunhas oculares e para a natureza das evidências forenses à luz dos princípios de uniformidade e causalidade (abordamos esses princípios no capo 5). Além disso, os ateus que exigem a repetibilidade dos milagres bíblicos são incoerentes, porque não exigem repetibilidade de “milagres” históricos nos quais eles acreditam — o Big Bang, a geração espontânea da primeira vida e a macroevolução das formas de vida subsequentes.
Se “extraordinário” significa mais do que o comum, então é exatamente o que temos para apoiar a ressurreição. Temos mais documentos de testemunhas oculares e documentos de testemunhas oculares mais antigos sobre a ressurreição de Jesus do que de qualquer outra coisa do mundo antigo. Além do mais, esses documentos incluem mais detalhes históricos e personagens e foram corroborados por mais fontes independentes e externas do que qualquer outra coisa do mundo antigo. Como acabamos de ver, também temos mais do que evidências circunstanciais comuns apoiando a ressurreição de Jesus.
Por fim, as pressuposições dos céticos podem ser contestadas. Não precisamos de evidências “extraordinárias” para acreditar em alguma coisa. Os ateus afirmam isso com base em sua própria visão de mundo. Eles acreditam no Big Bang não porque ele tenha evidências “extraordinárias” favoráveis, mas porque existem boas evidências de que o Universo explodiu e passou a existir do nada. Boas evidências é tudo de que você precisa para acreditar em alguma coisa. Contudo, os ateus não possuem nem mesmo boa evidência para algumas de suas próprias crenças tão preciosas. Os ateus acreditam, por exemplo, na geração espontânea e na macroevolução somente pela fé. Dizemos somente pela fé porque, como vimos nos capítulos 5 e 6, não apenas existe pouca ou nenhuma evidência para a geração espontânea e a macroevolução, mas existem fortes evidências contra essas possibilidades.
Além disso, os céticos não exigem evidências “extraordinárias” para outros fatos “extraordinários” da história. Poucos fatos da história antiga, por exemplo, são mais “extraordinários” do que os feitos de Alexandre, o Grande (356-323 a.C.). Apesar de ter vivido apenas 33 anos, Alexandre alcançou um sucesso sem paralelo. Ele conquistou grande parte do mundo civilizado de sua época, desde a Grécia, indo ao leste da Índia e ao sul do Egito. Contudo, como sabemos tudo isso sobre Alexandre? Não temos fontes da época de sua vida ou de pouco tempo depois de sua morte. Temos apenas fragmentos de duas obras escritas cerca de cem anos depois de sua morte. A verdade é: baseamos quase tudo o que sabemos sobre a vida “extra-ordinária” de Alexandre, o Grande, daquilo que historiadores escreveram cerca de 300 a 500 anos depois de sua morte! À luz das robustas evidências favoráveis à vida de Cristo, qualquer um que duvide da historicidade de Cristo deveria também duvidar da historicidade de Alexandre, o Grande. De fato, para ser coerente, tal cético deveria duvidar de toda a história antiga.
Por que os céticos pedem evidências “extraordinárias” para a vida de Cristo, mas não para a vida de Alexandre, o Grande? Porque se apegam novamente aos milagres. Apesar do fato de os milagres serem possíveis pelo fato de Deus existir — e a despeito do fato de que os milagres foram preditos e depois testemunhados -, os céticos não suportam admitir que os milagres realmente aconteceram. Desse modo, colocam o padrão de credibilidade num nível muito alto. É como se algum cético estivesse dizendo: “Eu não vou acreditar nos milagres porque não vi um deles acontecer. Se Jesus ressurreto aparecesse a mim, então eu acreditaria nele”. Essa então seria uma evidência extraordinária.
Ela seria certamente extraordinária, mas seria realmente necessária? Jesus precisa aparecer a toda pessoa no mundo para que suas declarações sejam dignas de crédito? Por que faria isso? Não precisamos testemunhar todo acontecimento em primeira mão com o objetivo de acreditar que ele realmente aconteceu. De fato, seria fisicamente impossível fazer isso. Acreditamos no testemunho dos outros se são pessoas dignas de confiança e especialmente se o seu testemunho é corroborado por outros dados. É exatamente isso o que acontece com o testemunho dos autores do NT.
Além do mais, como destacamos no capítulo 8, se Deus fosse muito aberto à demonstração de milagres freqüentes, então, em alguns casos, estaria infringindo o nosso livre-arbítrio. Se o propósito desta vida é permitir que façamos escolhas livremente que vão nos preparar para a eternidade, então Deus vai nos dar evidências convincentes — mas não evidências impositivas — de sua existência e de seus propósitos. Portanto, aqueles que querem seguir a Deus podem fazê-lo com confiança, e aqueles que não querem podem suprimir ou ignorar a evidência e viver como se ele não existisse.
Milagres que se auto-cancelam. O grande cético David Hume argumentou que os milagres não podem confirmar a religião de alguém porque são baseados em um testemunho pobre e todas as religiões os possuem. Em outras palavras, as declarações sobre milagres se auto-cancelam. Infelizmente para Hume, sua objeção não descreve o estado real das coisas.
Em primeiro lugar, Hume faz uma generalização precipitada ao dizer que os supostos milagres de todas as religiões são iguais. Como estamos vendo desde o capítulo 9, os milagres associados ao cristianismo não estão baseados em um testemunho pobre. Eles estão baseados em um testemunho antigo, de testemunhas oculares e de múltiplas fontes que não possuem similares em qualquer outra religião mundial. Ou seja, nenhuma outra religião mundial testificou milagres como aqueles presentes no NT.
Em segundo lugar, a objeção de Hume é anterior às descobertas da ciência moderna que confirmam que este é um Universo teísta (caps. 3-6). Uma vez que este é um Universo teísta, o judaísmo e o islamismo são as únicas outras grandes religiões mundiais com possibilidade de serem verdadeiras. Os milagres que confirmam o AT do judaísmo também confirmam o cristianismo. Desse modo, resta o islamismo como a única alternativa possível para “cancelar” os milagres do cristianismo. Contudo, como vimos no capítulo 10, não existem milagres verificáveis confirmando o islamismo. Todos os supostos milagres de Maomé surgiram depois de sua morte e não estão baseados no depoimento de testemunhas oculares.
Por fim, a singularidade, a quantidade e a qualidade dos milagres do NT não podem ser explicadas por qualquer outra coisa que não seja uma causa sobrenatural. Jesus realizou mais de 30 milagres, os quais foram instantâneos, sempre bem-sucedidos e singulares. Alguns foram até mesmo preditos. Os assim chamados milagreiros que afirmam sucesso parcial realizam apenas curas psicossomáticas, estão envolvidos em embuste, realizam sinais satânicos ou estão baseados em acontecimentos que podem ser explicados naturalmente. De fato, nenhum curandeiro contemporâneo jamais afirmou ser capaz de curar todas as doenças (incluindo as “incuráveis”) instantaneamente, com 100% de sucesso. Mas Jesus e os apóstolos fizeram isso. Assim, fica demonstrada a natureza singular e de autenticação divina dos milagres do NT contra todas as afirmações sobrenaturais de qualquer outra religião. Em resumo, nada “cancela” os milagres do NT.

No começo do capítulo 9, dissemos que existem duas perguntas às quais precisamos responder para verificar se o NT é verdadeiramente histórico:

  1. Possuímos cópias precisas dos documentos originais que foram escritos no século I?
  2. Esses documentos falam a verdade?
Como temos observado nos últimos quatro capítulos, há fortes evidências para uma resposta afirmativa a ambas as perguntas. Em outras palavras, podemos ter certeza, ainda que passível de dúvida, de que o NT é historicamente confiável.
Nesse ponto, não estamos dizendo que o NT está isento de erros. Vamos investigar essa questão mais tarde. Por ora, podemos apenas concluir que os principais fatos do NT realmente aconteceram cerca de 2 mil anos atrás. Jesus realmente viveu, ensinou, realizou milagres, morreu crucificado e depois ressuscitou dos mortos.
Se você ainda não se convenceu, considere mais uma peça das evidências corroborantes o incrível impacto da vida de Cristo conforme expresso num pequeno excerto de um sermão freqüentemente intitulado “Uma vida solitária’:
Ele nasceu numa vila obscura, filho de um camponês. Cresceu em outra vila, onde trabalhou como carpinteiro até os 30 anos. Então, por três anos, foi pregador itinerante. Ele nunca escreveu um livro. Nunca teve um escritório. Nunca constituiu família nem teve casa. Ele não foi para a faculdade. Nunca viveu numa cidade grande. Nunca viajou a mais de 300 quilômetros do lugar onde nasceu. Nunca realizou as coisas que normalmente acompanham a grandeza. Ele não tinha credenciais, a não ser ele mesmo. Tinha apenas 33 anos quando a onda da opinião pública voltou-se contra ele. Seus amigos fugiram. Um deles o negou. Foi entregue aos seus inimigos e sofreu zombaria durante seu julgamento. Foi pregado numa cruz entre dois ladrões. Enquanto estava morrendo, por meio de sortes seus executores disputavam suas roupas, a única coisa material que tivera. Quando morreu, foi colocado numa sepultura emprestada, por compaixão de um amigo.
[Vinte] séculos se passaram, e hoje ele é a figura central da raça humana. Sintoma plenamente confiante quando digo que todos os exércitos que já marcharam, todos os navios que já navegaram, todos os parlamentos que já discutiram, todos os reis que já reinaram, colocados juntos, não afetaram a vida do homem nesta Terra tanto quanto aquela vida solitária.
Se não houve ressurreição, de que maneira essa vida poderia ter sido a vida mais influente de todos os tempos? Não temos fé suficiente para acreditar que essa vida solitária de uma vila remota e antiga pudesse ser a mais influente de todos os tempos … A não ser que a ressurreição seja verdadeira.