terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Os Benefícios da Dúvida

Homem ateu é assim chamado aquele que não crê em Deus. Etimologicamente, “Theos”, do grego, significa Deus. Anexando-se o prefixo “a”, o qual indica ausência ou negação, teremos ateu, isto é, sem Deus. No mundo moderno onde vivemos, no qual impera a razão, a lógica e o conhecimento científico, não nos é mais possível estabelecer diferença essencial entre ateus ou crentes.

Os que acreditam em um Deus materializável, prosternando-se e orando diante de seus altares, em seus templos, são também verdadeiros ateus. Apenas deste fato não se dão conta. A seguir tentaremos explicar o nosso ponto de vista. O homem primitivo, sentindo-se indefeso diante do mundo hostil que o rodeia e que desconhece, a tudo teme. Apavoram-no os fenômenos da natureza, tais como as tempestades, os trovões, os relâmpagos e tantos outros os quais julga serem a manifestação digna de um Ser Supremo, muito poderoso e desconhecido. Então, na sua impotência para controlar a natureza, e não encontrando explicações razoáveis para os acontecimentos, volta-se o nosso homem para aquele Ser Poderoso que imagina comandar o mundo. Submisso e suplicante, implora-lhe perdão pelas faltas cometidas, simula preces e oferece-lhe sacrifícios. Com isso, supõe aplacar a ira dos deuses e ganhar-lhes sua benevolência para dias vindouros, Está, assim, lançada a semente da religião que no decorrer do tempo irá ganhando novas formas e sofrerá modificações, de acordo com o próprio homem, suas necessidades e aspirações.

Então perguntaremos, diante de que ou de quem ajoelha-se o homem? Diante de Deus? Não. Por incrível que pareça, o homem ajoelha-se, ainda hoje, diante do altar rústico, erguido pelo temor do homem primitivo castigado pelas forças adversas da natureza, e impotente para contê-las. Não é lógico que o homem que evoluiu conseguindo maravilhas, obtendo os meios necessários para definir e mesmo refrear os furores da natureza, paradoxalmente continue praticando os cultos de desagravo, criados pelos amedrontados ancestrais.

Concluímos do que acima foi dito que os religiosos de qualquer espécie são ateus, porquanto, de acordo com a própria etimologia da palavra ateu, continuam sem Deus. Isto é verdadeiro, porquanto, não é possível a ninguém ter algo inexistente, no caso o Ser Poderoso, Deus ou deuses, conforme prefiram. À medida que o homem foi evoluindo, promoveu sua organização social, inclusive a religiosa. E o homem permaneceu contrito, ajoelhado diante de Deus e do sacerdote. Aos poucos, vai a religião tornando-se um ótimo e cômodo meio de vida para a minoria privilegiada composta pelos sacerdotes, verdadeiro comércio com o qual o povo tem sido espoliado através dos tempos.

Surgiram deuses e religiões idealizadas pelos espertos, a fim de satisfazer a todos os gostos e tendências. Até o século IX, os estudiosos do assunto já haviam catalogado nada menos de 60 mil deuses, sob as mais variadas formas, desde a de animal, semi-animal, até atingir o aspecto integral do corpo humano. Criaram deuses como Baco, o deus do vinho, homenageado com tremendas bebedeiras. Vênus, a deusa do amor. Para reger a cada ato da vida, foram criados deuses especiais; inclusive para cada fenômeno da natureza.

Apesar do fervor com o qual os deuses têm sido incensados através dos tempos, jamais se conseguiu provar que a fé a eles devotada tenha melhorado a sorte do homem e do mundo. Por isso somos levados a crer que todos aqueles que têm adorado aos deuses têm perdido o seu precioso tempo. O homem, com o poder de sua inteligência e imaginação, vai aos poucos adquirindo e sistematizando os seus conhecimentos, tornando-os cultura e ciência. Gradativamente vai levantando o véu do mistério que lhe obscurecera a razão. A explicação dos fatos fundamentada na ciência liberta-o dos temores.

O conhecimento científico, alijando as trevas da ignorância, leva-nos a compreender que os milhares de deuses dos quais temos tido conhecimento são produtos de mentes férteis e pretensiosas, como a do clero e outros interessados em lucros fáceis. A total ausência de uma intervenção direta de Deus nos destinos do homem e do mundo é prova de que o clero conduz o homem por caminho errado. Valendo-se da boa fé do povo incauto é que o clero, em todos os tempos, tem desenvolvido sua atividade parasitária, chorando tanto quanto possível a economia humana. Assim, pode desfrutar de boa vida, luxo e palácios, praticamente sem trabalhar, com o dinheiro que o homem religioso passa-lhe às mãos, julgando assim comprar sua entrada no céu.

O sacerdote é sempre categórico em suas afirmações diante do crente, mostrando-se, contudo, reticente e cauteloso em face do conhecimento científico do homem de saber aprimorado. A este falará sobre tudo, mas evitará abordar o que se refere a Deus, religião ou teologia. Tendo ultrapassado a época do medo, a raça humana não se libertou totalmente do sentimento religioso, porquanto, existem os que se valem do nome de Deus e das religiões para viverem ociosamente, desfrutando de boa posição e respeito, sem, contudo, dar aos homens qualquer contribuição que lhes aproveite para sua felicidade e bem estar. Apenas a promessa de uma boa vida futura, após a morte. Todavia, até esta ser-lhe-á garantida apenas com a condição de suportar, pacientemente, muitos sofrimentos em sua passagem pela terra. Ora, são promessas vãs e mentirosas. Será que o sacerdote daria para alguém o Reino dos Céus, se dele dispusesse? Tudo nos leva a crer que não.

Não acreditamos que as religiões possam desaparecer tão cedo da face da Terra, apesar do aprimoramento, sempre em expansão, do conhecimento científico. As religiões não morrem, modificam-se. Desde os primórdios da humanidade, o aparecimento sempre de novos deuses e modalidades de culto justificam tal afirmativa. Em vista de tantas e tais modificações, é que chegamos à era do advento de Cristo e do cristianismo, religião esta abraçada por boa parte da população do mundo atual, em suas variadas ramificações.

E qual o fundamento sobre o qual foi criada a religião cristã? Nada tem de positivo, palpável ou verdadeiro. É apenas uma lenda o nascimento de Jesus, como toda a vida e os atos a ele imputados. Aqueles que criaram o cristianismo sequer primaram pela originalidade, porquanto, a lenda que envolve a personalidade de Jesus Cristo é apenas copia de tantas outras que relatam o nascimento e tudo quanto se referiu aos deuses criados pelos antigos, tais como Ísis, Osíris, Hórus Átis. Apolo, Mitra, etc.

O homem do nosso século tem, forçosamente, de ser prático. Daí, não poderá fundamentar os atos de sua vida em lendas ou mitos. As lendas possuem, evidentemente, um grande valor, fazem parte do folclore dos povos, influindo na formação de suas culturas. Entretanto, o seu valor cultural não deve ultrapassar o limite lógico e aceitável.

Jesus Cristo Nunca Existiu

Os pesquisadores que se dedicaram ao estudo das origens do cristianismo sabem que, desde o Século II de nossa era, tem sido posta em dúvida a existência de Cristo. Muitos até mesmo entre os cristãos procuram provas históricas e materiais para fundamentar sua crença. Infelizmente, para eles e sua fé, tal fundamento jamais foi conseguido, porquanto, a história cientificamente elaborada denota que a existência de Jesus é real apenas nos escritos e testemunhas daqueles que tiveram interesse religioso e material em prová-la.

Desse modo, a existência, a vida e a obra de Jesus carecem de provas indiscutíveis. Nem mesmo os Evangelhos constituem documento irretorquível. As bibliotecas e museus guardam escritos e documentos de autores que teriam sido contemporâneos de Jesus, os quais não fazem qualquer referência ao mesmo. Por outro lado, a ciência histórica tem-se recusado a dar crédito aos documentos oferecidos pela Igreja, com intenção de provar-lhe a existência física. Ocorre que tais documentos, originariamente, não mencionavam sequer o nome de Jesus; todavia, foram falsificados, rasurados e adulterados visando suprir a ausência de documentação verdadeira.

Por outro lado, muito do que foi escrito para provar a inexistência de Jesus Cristo foi destruído pela Igreja, defensivamente. Assim é que, por falta de documentos verdadeiros e indiscutíveis, a existência de Jesus tem sido posta em dúvida desde os primeiros séculos desta era, apesar de ter a Igreja tentado destruir a tudo e a todos os que tiveram coragem ousaram contestar os seus pontos de vista, os seus dogmas.

Por tudo isso é que o Papa Pio XII, em 955, falando para um Congresso Internacional de História em Roma, disse: “Para os cristãos, o problema da existência de Jesus Cristo concerne à fé, e não à história.

Emílio Bossi, em seu livro intitulado “Jesus Cristo Nunca Existiu”, compara Jesus Cristo a Sócrates, que igualmente nada deixou escrito. No entanto, faz ver que Sócrates só ensinou o que é natural e racional, ao passo que Jesus ter-se-ia apenas preocupado com o sobrenatural. Sócrates teve como discípulos pessoas naturais, de existência comprovada, cujos escritos, produção cultural e filosófica passaram à história como Platão, Xenófanes, Euclides, Esquino, Fédon. Enquanto isso, Jesus teria por discípulos alguns homens analfabetos como ele próprio tê-lo-ia sido, os quais apenas repetiriam os velhos conceitos e preconceitos talmúdicos.

Sócrates, que viveu 5 séculos antes de Cristo e nada escreveu, jamais teve sua existência posta em dúvida. Jesus Cristo, que teria vivido tanto tempo depois, mesmo nada tendo escrito, poderia apesar disso ter deixado provas de sua existência. Todavia, nada tem sido encontrado que mereça fé. Seus discípulos nada escreveram. Os historiadores não lhe fizeram qualquer alusão.

Além disso, sabemos que, desde o Século II, os judeus ortodoxos e muitos homens cultos começaram a contestar a veracidade de existência de tal ser, sob qualquer aspecto, humano ou divino. Estavam, assim, os homens divididos em duas posições: a dos que, afirmando a realidade de sua existência, divindade e propósitos de salvação, perseguiam e matavam impiedosamente aos partidários da posição contrária, ou seja, àqueles cultos e audaciosos que tiveram a coragem de contestá-los.

O imenso poder do Vaticano tornou a libertação do homem da tutela religiosa difícil e lenta. O liberalismo que surgiu nos últimos séculos contribuiu para que homens cultos e desejosos de esclarecer a verdade tentassem, com bastante êxito, mostrar a mistificação que tem sido a base de todas as religiões, inclusive do cristianismo. Surgiram também alguns escritos elucidativos, que por sorte haviam escapado à caça e à queima em praça pública. Fatos e descobertas desta natureza contribuíram decisivamente para que o mundo de hoje tenha uma concepção científica e prática de tudo que o rodeia, bem como de si próprio, de sua vida, direitos e obrigações.

A sociedade atualmente pode estabelecer os seus padrões de vida e moral, e os seus membros podem observá-los e respeitá-los por si mesmos, pelo respeito ao próximo e não pelo temor que lhes incute a religião. Contudo, é lamentavelmente certo que muitos ainda se conservam subjugados pelo espírito de religiosidade, presos a tabus caducos e inaceitáveis.

Jesus Cristo foi apenas uma entidade ideal, criada para fazer cumprir as escrituras, visando dar seqüência ao judaísmo em face da diáspora, destruição do templo e de Jerusalém. Teria sido um arranjo feito em defesa do judaísmo que então morria, surgindo uma nova crença. Ultimamente, têm-se evidenciado as adulterações e falsificações documentárias praticadas pela Igreja, com o intuito de provar a existência real de Cristo. Modernos métodos como, por exemplo, o método comparativo de Hegel, a grafotécnica e muitos outros, denunciaram a má fé dos que implantaram o cristianismo sobre falsas bases com uma doutrina tomada por empréstimos de outros mais vivos e inteligentes do que eles, assim como denunciaram os meios fraudulentos de que se valeram para provar a existência do inexistente.

É de se supor que, após a fuga da Ásia Central, com o tempo os judeus foram abandonando o velho espírito semita, para irem-se adaptando às crenças religiosas dos diversos povos que já viviam na Ásia Menor. Após haverem passado por longo período de cativeiro no Egito, e, posteriormente, por duas vezes na Babilônia, não estranhamos que tenham introduzido no seu judaísmo primitivo as bases das crenças dos povos com os quais conviveram. Sendo um dos povos mais atrasados de então, e na qualidade de cativos, por onde passaram, salvo exceções, sua convivência e ligações seria sempre com a gente inculta, primária e humilde. Assim é que, em vez de aprenderem ciências como astronomia, matemática, sua impressionante legislação, aprenderam as superstições do homem inculto e vulgar.

Quando cativos na Babilônia, os sacerdotes judeus que constituíram a nata, o escol do seu meio social, nas horas vagas, iriam copiando o folclore e tudo o que achassem de mais interessante em matéria de costumes e crenças religiosas, do que resultaria mais tarde compendiarem tudo em um só livro, o qual recebeu o nome de Talmude, o livro do saber, do conhecimento, da aprendizagem. Por uma série de circunstâncias, o judeu foi deixando, aos poucos, a atividade de pastor, agricultor e mesmo de artífice, passando a dedicar-se ao comércio.

A atividade comercial do judeu teve início quando levados cativos para a Babilônia, por Nabucodonosor, e intensificou-se com o decorrer do tempo, e ainda mais com a perseguição que lhe moveria o próprio cristianismo, a partir do século IV. Daí em diante, a preocupação principal do povo judeu foi extinguir de seu meio o analfabetismo, visando com isso o êxito de seus negócios. Deve-se a este fato ter sido o judeu o primeiro povo no meio do qual não haveria nenhum analfabeto. Destarte, chegando a Roma e a Alexandria, encontrariam ali apenas a prática de uma religião de tradição oral, portanto, terreno propício para a introdução de novas superstições religiosas. Dessa conjuntura é que nasceu o cristianismo, o máximo de mistificação religiosa de que se mostrou capaz a mente humana.

O judeu da diáspora conseguiu o seu objetivo. Com sua grande habilidade, em pouco tempo o cristianismo caiu no gosto popular, penetrando na casa do escravo e de seu senhor, invadindo inclusive os palácios imperiais. Crestus, o Messias dos essênios, pelo qual parece terem optado os judeus para a criação do cristianismo, daria origem ao nome de Cristo, cristão e cristianismo. Os essênios haviam-se estabelecido numa instituição comunal, em que os bens pessoais eram repartidos igualmente para todos e as necessidades de cada um tornavam-se responsabilidade de todos.

Tal ideal de vida conquistaria como realmente aconteceu, ao escravo, a plebe, enfim, a gente humilde. Daí, a expansão do cristianismo que, nada tendo de concreto, positivo e provável, assumiu as proporções de que todos temos conhecimento. Não tendo ficado restrita à classe inculta e pobre, como seria de se pensar, começou a ganhar adeptos entre os aristocratas e bem-nascidos.

De tudo o que dissemos, depreende-se que o cristianismo foi uma religião criada pelos judeus, antes de tudo como meio de sobrevivência e enriquecimento. Tudo foi feito e organizado de modo a que o homem se tornasse um instrumento dócil e fácil de manejar, pelas mãos hábeis daqueles aos quais aproveita a religião como fonte de rendimentos.

Métodos modernos como, por exemplo, o método comparativo de Hegel, a grafotécnica, o uso dos isótopos radioativos e radiocarbônicos, denunciaram a má fé daqueles que implantaram o cristianismo, falsificando escritos e documentos na vã tentativa de provar o que lhe era proveitoso. Por meios escusos tais como os citados, a Igreja tornou-se a potência financeira em que hoje se constitui. Finalmente, desde o momento em que surgiu a religião, com ela veio o sacerdote que é uma constante em todos os cultos, ainda que recebam nomes diversos. A figura do sacerdote encarregado do culto divino tem tido sempre a preocupação primordial de atemorizar o espírito dos povos, apresentando-lhes um Deus onipotente, onipresente e, sobretudo, vingativo, que a uns premia com o paraíso e a outros castiga com o inferno de fogo eterno, conforme sejam boas ou más suas ações.

No cristianismo, encontraremos sempre o sacerdote afirmando ter o homem uma alma imortal, a qual responderá após a morte do corpo, diante de Deus, pelas ações praticadas em vida. Como se tudo não bastasse, o paraíso, o purgatório dos católicos e o inferno, há ainda que considerar a admissão do pecado original, segundo o qual todos os homens ao nascer, trazem-no consigo.

Ora, ninguém jamais foi consultado a respeito de seu desejo ou não de nascer. Assim sendo, como atribuir culpa de qualquer natureza a quem não teve a oportunidade de manifestar vontade própria. Quanta injustiça! Condenar inocentes por antecipação. O próprio Deus e o próprio Cristo revoltar-se-iam por certo ante tão injusta legislação, se os próprios existissem.

As Provas e as Contra Provas

A Igreja serviu-se de farta documentação, conforme já mencionamos anteriormente, com intenção de provar a existência de Cristo. No entanto, a história ignora-o completamente. Quanto aos autores profanos que pretensamente teriam escrito a seu respeito, foram nesta parte falsificados. Por outro lado, documentos históricos demonstram sua inexistência. As provas históricas merecem nosso crédito, porque pertencem à categoria dos fatos certos e positivos, e constituem testemunhos concretos e válidos de escritores de determinadas escolas.

A interpretação da Bíblia e da mitologia comparada não resiste a uma confrontação com a história. Flávio Josefo, Justo de Tiberíades, Filon de Alexandria, Tácito, Suetônio e Plínio, o Jovem, teriam feito em seus escritos, referências a Jesus Cristo. Todavia, tais escritos após serem submetidos a exames grafotécnicos, revelaram-se adulterados no todo ou em parte, para não se falar dos que foram totalmente destruídos. Além disso, as referências feitas a Crestus, Cristo ou Jesus, não são feitas exatamente a respeito do Cristo dos Cristãos. Seria mesmo difícil estabelecer qual o Cristo seguido pelos cristãos, visto que esse era um nome comum na Galileia e Judéia.

Segundo Tácito, judeus e egípcios foram expulsos de Roma por formarem uma só e mística superstição cristã. As expulsões ocorreram duas vezes no tempo de Augusto e a terceira vez no governo de Tibério, no ano 19 desta era. Tais expulsões desmentem a existência de Jesus, porquanto, ocorreram quando ainda o nome de cristão aplicava-se a superstição judaico-egípcia, a qual se confundiu com o cristianismo.

Filon de Alexandria, apesar de ter contribuído poderosamente para a formação do cristianismo, seu testemunho é totalmente contrário à existência de Cristo. Filon havia escrito um tratado sobre o Bom Deus — Serapis —, tratado este que foi destruído. Os evangelhos cristãos a ele muito se assemelham, e os falsificadores não hesitaram em atribuir as referências como sendo feitas a Cristo.

Os historiadores mostram que essa religião nasceu em Alexandria, e não em Roma ou Jerusalém. Fazem ver que ela nasceu das ideias de Filon que, platonizando e helenizando o judaísmo, escreveu boa parte do Apocalipse. A mesma transformação que o cristianismo dera ao judaísmo ao introduzir-lhe o paganismo e a idolatria, Filon imprimira a essa crença, até então apenas terapeuta, dando-lhe feição grega, de cunho platônico.

Embora tenha sido de certo modo o precursor do cristianismo, não deixou a menor prova de ter tomado conhecimento da existência de Jesus Cristo, o mago rabi, e isto é lógico porque o cristianismo só iria ser elaborado muito depois de sua morte.

Bastaria o silêncio de Filon para provar estarmos diante de uma nova criação mitológica, de cunho metafísico. Entretanto, escrevendo como cristão, os lançadores do cristianismo louvaram-se nas suas ideias e escritos. Tivesse Jesus realmente existido, jamais Filon deixaria de falar em seu nome, descreveria certamente sua vida miraculosa. Filon relata os principais acontecimentos de seu tempo, do judaísmo e de outras crenças, não mencionando, porém, nada sobre Jesus. Cita Pôncio Pilatos e sua atuação como Procurador da Judeia, mas não se refere ao julgamento de Jesus a que ele teria presidido.

Fala igualmente dos essênios e de sua doutrina comuna dizendo tratar-se de uma seita judia, com mosteiro à margem do Jordão, perto de Jerusalém. Quando no reinado de Calígula esteve em Roma defendendo os judeus, relata diversos acontecimentos da Palestina, mas não menciona nada a respeito de Jesus, seus feitos ou sua sorte e destino.

Filon, que foi um dos judeus mais ilustres de seu tempo, e sempre esteve em dia com os acontecimentos, jamais omitiria qualquer notícia acerca de Jesus, cuja existência, se fosse verdadeira, teria abalado o mundo de então. Impossível admitir-se tal hipótese, portanto.

Por isso é que M. Dide fez ver que, diante do silêncio de homens extraordinários como Filon, os acontecimentos narrados pelos evangelistas não passam de pura fantasia religiosa. Seu silêncio é a sentença de morte da existência de Jesus.

O mesmo silêncio se estende aos apóstolos, assinala Emílio Bossi. Evidencia que tudo quanto está contido nos Evangelhos refere-se a personalidades irreais, ideais, sobrenaturais de inexistentes taumaturgos. O silêncio de Filon e de outros se estende não apenas a Jesus, mas também aos seus pretensos apóstolos, a José, a Maria, seus filhos e toda a sua família.

Flávio Josefo, tendo nascido no ano 37, e escrevendo até 93 sobre judaísmo, cristianismo terapeuta, messias e Cristos, nada disse a respeito de Jesus Cristo. Justo de Tiberíades, igualmente não fala em Jesus Cristo, conquanto houvesse escrito uma história dos judeus, indo de Moisés ao ano 50. Ernest Renan, em sua obra “Vie de Jesus”, apesar de ter tentado biografar Jesus, reconhece o pesado silêncio que fizeram cair sobre o pretenso herói do cristianismo.

Os Gregos, os romanos e os hindus dos séculos I e II jamais ouviram falar na existência física de Jesus Cristo. Nenhum dos historiadores ou escritores, judeus ou romanos, os quais viveram ao tempo em que pretensamente teria vivido Jesus, ocupou-se dele expressamente. Nenhum dedicou-lhe atenção. Todos foram omissos quanto a qualquer movimento religioso ocorrido na Judeia, chefiado por Jesus.

A história não só contesta a tudo o que vem nos Evangelhos, como prova que os documentos em que a Igreja se baseou para formar o cristianismo foram todos inventados ou falsificados no todo ou parte, para esse fim. A Igreja sempre dispôs de uma equipe de falsários, os quais dedicaram-se afanosamente a adulterar e falsificar os documentos antigos com o fim de pô-los de acordo com os seus cânones.

O piedoso e culto bispo de Cesareia, Eusébio, como muitos outros tonsurados, receberam ordens papais para realizar modificações em importantes papéis da época, adulterando-os e emendando-os segundo suas conveniências. Graças a esses criminosos arranjos, a Igreja terminaria autenticando impunemente sua novela religiosa sobre Jesus Cristo, sua família, seus discípulos e o seu tempo.

Conan Doyle imortalizou o seu personagem, Sherlock Holmes, assim como Goethe ao seu Werther. Deram-lhes vida e movimento como se fossem pessoas reais, de carne e ossos. Muitos outros escritores imortalizaram-se também através de suas obras, contudo, sempre ficou patente serem elas pura ficção, sem qualquer elo que as ligue com a vida real. Produzem um trabalho honesto e honrado aqueles que assim procedem, ao contrário daqueles que deturpam os trabalhos assinados por eminentes escritores, com o objetivo premeditado de iludir a boa fé do próximo. E procedimento que, além de criminoso, revela a incapacidade intelectual daqueles que precisam se valer de tais meios para alcançar seus escusos objetivos.

Berson, citado por Jean Guitton em “Jesus”, disse que a inigualável humildade de Jesus dispensaria a historicidade; entretanto, erigiu os Evangelhos como documento indiscutível como prova, o que a ciência histórica de hoje rejeita. Só depois de muito entrado em anos é que se tornaria indiferente para com a pirracenta crença religiosa dos seus antepassados, como aconteceu com mentes excepcionalmente cultas, tornadas ilustres pelo saber e pelo conhecimento e não apenas pelo dinheiro.

Diante da história, do conhecimento racional e científico que presidem aos atos da vida humana, muitos já se convenceram da primária e irreal origem do cristianismo, o qual nada mais é do que uma síntese do judaísmo com o paganismo e a idolatria greco-romana do século I.

Graças ao trabalho de notáveis mestre de Filosofia e Teologia da Escola de Tubíngen, na Alemanha, ficou provado que os Evangelhos e mesmo toda a Bíblia não possuem valor histórico, pondo-se em dúvida conseqüentemente tudo quanto a Igreja impôs como verdade sobre Jesus Cristo. Tudo o que consta dos Evangelhos e do Novo Testamento são apenas arranjos, adaptações e ficções, como o próprio Jesus Cristo o foi.

Através da pesquisa histórica e de exames grafotécnicos ficou evidenciado que os escritos acima referidos são apócrifos. De sorte que, não servindo como documentos autênticos, devem ser rejeitados pela ciência. Jean Guitton diz que o problema de Jesus varia e acordo com o ângulo sob o qual seja examinado: histórico, filosófico ou teológico.

A história exige provas reais, segundo as quais se evidenciem os movimentos da pessoa ou do herói no palco da vida humana, praticando todos os atos a ela concernentes, em todos os seus altos e baixos. Pierre Couchoud, igualmente citado por Guitton, sendo médico e filósofo, considerou Jesus como tendo sido “a maior existência que já houve, o maior habitante da terra”, entretanto, acrescentou: “não existiu no sentido histórico da palavra: não nasceu. Não sofreu sob Pôncio Pilatos, sendo tudo uma fabulação mítica”.

A passagem de Jesus pela terra seria o milagre dos milagres: “o continente, embora fosse o menor, contivera o conteúdo, que era o maior!” A Filosofia quer fatos para examinar e explicar à luz da razão, generalizando-o. No que se refere à existência de Jesus, é patente a impossibilidade de generalização, porquanto, na qualidade de mito, como os milhares que o antecederam, sua personalidade é apenas fictícia, por conseguinte, nenhum material pode oferecer à Filosofia para ser sistematizado, aprofundado ou explicado.

No tocante à Teologia, cabe-lhe apenas a parte doutrinária acerca das coisas divinas. A ela, interessa apenas incutir nas mentes os seus princípios, sem, contudo, procurar neles o que possa existir de concreto, o que inclusive seria contrário aos interesses materiais, daqueles aos quais aproveita a religião. Os Enciclopedistas mostraram como eram tolos e irracionais os dogmas da Igreja, lembrando ainda que ela era um dos mais fortes pilares do feudalismo escravocrata.

Voltaire mostrou as coincidências entre o Evangelho de João e os escritos de Filon, lembrando ter sido ele um filósofo grego de ascendência judia, cujo pai, um outro judeu culto, teria sido contemporâneo de Jesus, se ele tivesse realmente existido. A filosofia religiosa de Filon era a mesma do cristianismo, tanto que inicialmente foi cogitada sua inclusão entre os fundadores da nova crença. Contudo, após exame rigoroso de sua obra, foram encontradas ideias opostas aos interesses materiais dos lideres cristãos da época.

Devemos aos Enciclopedistas, bem como a Voltaire, o incentivo para que muitos pensadores futuros pudessem desenvolver um trabalho livre, na pesquisa da verdade. As convicções de Voltaire são o fruto de profundo estudo das obras de Filon. Os racionalistas, posteriormente, servindo-se de seus escritos, concluíram que a Igreja criou seus dogmas de acordo com a lenda e o mito, impondo-os a ferro e fogo.

Bauer, aplicando os princípios hegelianos na Universidade de Tubingen, concluiu que os Evangelhos haviam sido escritos sob a influência judia, de acordo com seu gosto. Posteriormente, interesses materiais e políticos motivaram alterações nos mesmos. Em vista de tais interesses é que Pedro, o pregador do cristianismo nascente, que era pró-judeu, teve de ser substituído por Paulo, favorável aos romanos. E Marcião teria sido o autor dos escritos atribuídos ao inexistente Paulo.

O mérito da Escola de Tubingen consiste em haver provado que os Evangelhos são apócrifos, e assim não servem como documento aceitável pela história. Levando ao conhecimento do mundo livre que os fundamentos do cristianismo são mistificações puras, os mestres da referida Escola abalaram os alicerces de uma empresa, que há séculos explora a humanidade crente, vendendo o nome de Deus a grosso e a varejo.

Tudo nos leva a crer que, no futuro, o conhecimento científico exigirá bases sólidas para todas as coisas, quando então as religiões não mais prevalecerão, porquanto, não poderão contribuir para a ciência ou para a história, com qualquer argumento sólido e fiel.

Ademais, não nos parece lógico que o homem atual, o qual já atingiu um tão elevado nível de desenvolvimento, o que se verifica em todos os setores do conhecimento, tais como científico, tecnológico e filosófico, permaneça preso a crenças em deuses inexistentes, em mitos e tabus.

Diz-se que a Bíblia, o livro sagrado dos cristãos, do qual se valem eles para provar a existência de seu Deus e Jesus Cristo, seu filho unigênito, foi escrito sob a inspiração divina. O Próprio Deus tê-lo-ia escrito, através de homens inspirados por ele, claro. A doutrina cristã ensina que Deus, além de onipotente, é onipresente e onisciente. Sendo dotado de tais atributos — onisciência e onipresença —, seria de se esperar que Deus, ao ditar aos homens inspirados o que deveriam escrever, não se restringisse apenas ao relato das coisas, fatos ou lugares então conhecidos pelos homens.

Sendo onipresente, deveria estar no universo inteiro. Conhecê-lo e levá-lo ao conhecimento dos homens, e não apenas limitar-se a falar dos povos ou lugares que todos conheciam ou sabiam existir. Sendo onisciente, deveria saber de todas s coisas de modo certo, correto, exato, e assim inspirar ou ensinar.

Todavia, aconteceu justamente o contrário. A Bíblia, escrita por homens inspirados por Deus onipresente e onisciente, está repleta de erros, os mais vulgares e incoerentes, revelando total ignorância acerca da verdade e de tudo mais.

Vejamos apenas um exemplo. Diz a Bíblia que o sol, a lua e as estrelas foram criadas em função da terra: para iluminá-la. Seria o centro do universo, então, o que é totalmente falso. Hoje, ou melhor, há muito tempo, todos sabemos que a terra é apenas um grão de areia perdido na imensidão do universo, sendo mesmo uma das menores porções que o compõe, inclusive dentro do sistema solar de que faz parte.

Como teria Josué feito parar o sol, a fim de prolongar o dia e ganhar sua batalha contra os canamitas, sem acarretar uma catástrofe? Decididamente, quem escreveu tais absurdos, sendo homem, sujeito a falhas e erros, é perdoável. Entretanto, sendo um Deus onipresente e onisciente, ou por sua inspiração, é inconcebível. E mais inconcebível ainda é que o homem moderno permaneça escravo desta ou de qualquer outra religião. Dispondo de modernos meios de difusão e divulgação da cultura, o homem não pode ignorar o quanto é falsa a doutrina cristã, além de absurda, o mesmo estendendo-se a qualquer outra forma de culto ou religião. Como entender que sendo Deus onipresente e onisciente, não saberia que todos os corpos do universo possuem movimento, e que este os mantém dentro de sua órbita, sem atropelos ou abalroamento?

Quando Jeová resolveu disciplinar o comportamento dos hebreus, marcou encontro com Moisés, no Monte Sinai, para lhe entregar as tábuas da lei. Fato idêntico acontecera muito antes, quando Hamurabi teria recebido das mãos do deus Schamash a legislação dos babilônios no século XVII a.C.. A mesma foi encontrada em Susa, uma das grandes metrópoles do então poderoso império babilônio, encontrando-se atualmente guardada no Museu do Louvre, em Paris.

No que concerne aos Evangelhos, foram escritos em número de 315, copiando-se sempre uns aos outros. No Concílio de Niceia, tal número foi reduzido para 40, e destes foram sorteados os 4 que até hoje estão vigorando.

A. Laterre, entre outros escritores, assinala ter sido o Evangelho de Marcos o mais antigo, e haver servido de paradigma para os outros, os quais não guardaram sequer fidelidade ao original, dando margem a choques e entrechoques de doutrina.

Após o Evangelho de Marcos, começaram a surgir os demais que, alcançando elevado número, foram reduzidos. A escolha não visou os melhores, o que seria lógico, mas baseou-se tão-somente no prestigio político dos bispos das regiões onde haviam sido compostos.

A. Laterre patenteou igualmente, em “Jesus e sua doutrina”, que a lenda composta pelos fundadores do cristianismo, para ser admitida pelos homens como verdade, fora copiada de fontes mitológicas muito anteriores ao próprio judaísmo, remontando aos antigos deuses hindus, persas ou chineses.

No século II, quando começou a aparecer a biografia de Jesus, havia apenas o interesse político e material em se manter a sua santa personalidade idealizada. Constantino, no século IV, tendo verificado que suas legiões haviam-se tornado reticentes no cumprimento de suas ordens contra os cristãos, resolveu mudar de tática e aderir ao cristianismo. Percebendo que os bispos de Alexandria, Jerusalém, Edessa e Roma tinham a força necessária para fazer-lhe oposição, sentiu-se na contingência de ceder politicamente, com o objetivo de conseguir obediência total e unificar o império. De sorte que sua adesão ou conversão ao cristianismo não se baseou em uma convicção intima, espiritual, porém, resultou de conveniências políticas.

Embora não crendo na religião cristã, percebeu que a cruz dar-lhe-ia a força que lhe faltava para tornar-se o imperador único e obedecido cegamente. Daí a história do sonho que tivera antes de uma batalha, segundo o qual vira a cruz desenhada no céu e estas palavras escritas abaixo: “in hoc signo vincis”, com este sinal, vencerás. Não era cristão verdadeiro, apenas fingia sê-lo para conseguir os seus objetivos.

Dujardin conta-nos que o cristianismo só surgiu a partir do ano 30, graças a um rito em que se via a morte e a ressurreição de Jesus, o qual seria uma divindade pré-cristã. Nesta seita, os seus adeptos denominavam-se apóstolos, significando missionários, os que traziam uma mensagem nova. Os apóstolos desse Jesus juravam terem-no visto, após sua morte, ressuscitar e ascender ao céu. Entretanto, não era este o Jesus dos cristãos.

O Padre Aífred Loisy, diante do enorme descrédito que o mito do cristianismo vinha sofrendo nos meios cultos de Paris, resolveu pesquisar-lhe as origens, visando assim desfazer as objeções apresentadas de modo seguro e bem fundamentado. Buscava a verdade para mostrá-la aos demais. Entretanto, ao fazer seus estudos, o Padre Loisy constatou que realmente a crítica havia se baseado em fatos incontestáveis. Por uma questão de honra, não poderia ocultar o resultado de suas pesquisas, publicando-o logo em seguida. Sendo tal resultado contrário fundamentalmente aos cânones da Igreja, foi expulso de sua cátedra de Filosofia, na Universidade de Paris, e excomungado pelo Papa, em 1908.

O Pe. Loisy havia concluído que os documentos nos quais a Igreja firmara-se para organizar sua doutrina provieram do ritual essênio. Jesus Cristo não tivera vida física. Era apenas o reaproveitamento da lenda essênia do Crestus, o seu Messias. Verificou-se também que as Paulinianas, de origem insegura, haviam sido refundidas em vários pontos fundamentais e por diversas vezes, antes de serem incluídas definitivamente nos Evangelhos. Do mesmo modo chegou à conclusão de que os Evangelhos não poderiam servir de base para a história, nem para provar a vida de Jesus, dada a sua inautenticidade.

Por sorte sua, já não mais existia a Santa Inquisição; do contrário, o sábio Padre Loisy teria sido queimado vivo. Os documentos relativos ao governo de Pilatos, na Judeia, nada relatam a respeito de alguém que, se intitulando de Jesus Cristo, o Messias ou o enviado de Deus, tenha sido preso, condenado e crucificado com assentimento ou mesmo contra sua vontade, conforme narram os evangelhos. Não tomou conhecimento jamais de que um homem excepcional praticasse coisas maravilhosas e sobrenaturais, ressuscitando mortos e curando doentes ao simples toque de suas mãos, ou com uma palavra, apenas.

Se Pôncio Pilatos, cuja existência é real e historicamente provável, que estava no centro dos acontecimentos da época como governador da Judeia, ignorou completamente a existência tumultuada de Jesus, é que de fato ele não existiu. Alguém que, pelos atos que lhe são atribuídos, chega mesmo ao cúmulo de ser aclamado “Rei dos Judeus” por uma multidão exaltada, como ele o foi, não poderia passar despercebido pelo governador da região.

O imperador Tibério, inclusive, jamais soube de tais ocorrências na Judeia. Estranho que ninguém o informasse de que um povo, que estava sob o seu domínio, aclamava um novo rei. Ilógico. A ele, Tibério, é que caberia nomear um rei, governador ou procurador.

Prosper Alfaric, em L’Ecole de la Raison, assinala as invencíveis dificuldades do cristianismo em conciliar a fé com a razão. Por isso, a nova crença teve de apoderar-se das lendas e crenças dos deuses solares, tais como Osíris, Mitra, Ísis, Átis e Hórus, quando da elaboração de sua doutrina. Expôs, igualmente, que os documentos descobertos em Coumrã, em 1947, eram o elo que faltava para patentear que Cristo é o Crestus dos essênios, uma outra seita judia.

O cristianismo nada mais é, então, do que o sincretismo das diversas seitas judias, misturadas às crenças e religiões dos deuses solares, por serem as religiões que vinham predominando há séculos. A palavra “evangelho” em grego significa “boa nova”, já figura na Odisseia de Homero, Século XII, a.C.. Foi depois encontrada também numa inscrição em Priene, na Jônia, numa frase comemorativa e de endeusamento de Augusto, no seu aniversário, significando a “boa nova” no trono. E isto ocorreu muito antes de idealizarem Jesus Cristo.

Conforme já mencionamos anteriormente, no inicio do cristianismo, os evangelhos eram em número de 315, sendo posteriormente reduzidos para 4, no Concílio de Nicéia. Tal número indica perfeitamente as várias formas de interpretação local das crenças religiosas da orla mediterrânea acerca da ideia messiânica lançada pelos sacerdotes judeus. Sem dúvida, este fato deve ter levado Irineu a escrever o seguinte: “Há apenas 4 Evangelhos, nem mais um, nem menos um, e que só pessoas de espírito leviano, os ignorantes e os insolentes é que andam falseando a verdade”. A verdade da Igreja, dizemos nós.

Havia, então, os Evangelhos dos naziazenos, dos judeus, dos egípcios, dos ebionistas, o de Pedro, o de Barnabé, entre outros, os quais foram queimados, restando apenas os 4 sorteados e oficializados no Concílio de Niceia. Celso, erudito romano, contemporâneo de Irineu, entre os anos 170 e 180, disse: “Certos fiéis modificaram o primeiro texto dos Evangelhos, três, quatro e mais vezes, para poder assim subtrai-los às refutações”.

Foi necessária uma cuidadosa triagem de todos eles, visando retirar as divergências mais acentuadas, sendo adotada a de Hesíquies, de Alexandria; e de Pânfilo, de Cesaréía e a de Luciano, de Antióquia. Mesmo assim, só na de Luciano existem 3500 passagens redigidas diferentemente. Disso resulta que, mesmo para os Padres da Igreja, os Evangelhos não são fonte segura e original.

Os Evangelhos que trazem a palavra “segundo”, que em grego é “cata”, não vieram diretamente dos pretensos evangelistas. A discutível origem dos Evangelhos explica porque os documentos mais antigos não fazem referência à vida terrena de Jesus. Nos Evangelhos, as contradições são encontradas com muita freqüência. Em Marcos, por exemplo, em 1:1-17: “a linhagem de Jesus vem de Abraão, em 42 gerações”; ao passo que em Lucas 2:23-28 lê-se que proviera diretamente de Adão e Eva, sendo que de Abraão a Jesus teriam havido 43 gerações.

Eusébio, comentando o assunto e não sabendo como dirimir a questão, disse: “Seja lá o que for, só o Evangelho anuncia a verdade”.(?) Tais divergências, entretanto, parecem indicar que os Evangelhos não se destinavam inicialmente à posteridade, visando tão-somente a catequese imediata de povos isolados uns dos outros. Os escritos destinados a um povo dificilmente seriam conhecidos dos outros.

O Evangelho de Mateus teria sido destinado aos judeus, arranjado para agradá-los. Por isso, não fala nos vaticínios nem no Messias. Por isso ainda é que puseram na boca de Jesus as palavras seguintes: “Não vim para abolir as leis dos profetas, mas sim para cumpri-las”. Tudo indica ter sido feito em Alexandria, porquanto, o original em hebraico jamais existiu. Baur provou, entretanto, que as Epístolas são anteriores aos Evangelhos e o Apocalipse, o mais antigo de todos, do ano 68. Todos os escritos do cristianismo desse tempo falam apenas no Logos, o Cordeiro Pascoal, imolado desde o princípio dos tempos, referindo-se à personalidade ideal de Jesus Cristo.

Justino, filósofo e apologista cristão, escrevendo em torno do ano 150, não emprega a palavra Evangelho nem uma vez. Isto mostra que ele, ainda nessa época, ignorava-a, não tendo conhecimento de sua existência. Justino ignorava igualmente as paulinianas, Paulo e os Atos dos apóstolos, o que prova que foram inventados posteriormente.

Marcião, no ano de 140, trouxe as Epístolas a Roma, as quais não foram inicialmente consideradas merecedoras de fé. Sofreu rigorosa triagem, sendo cortada muita coisa que não convinha à Igreja. Marcião fora contemporâneo de Justino. As Epístolas trazidas por ele eram endereçadas aos Romanos, aos Gálatas e aos Coríntios. Apresentavam Jesus como um Deus encarnado. Teria nascido de uma mulher e sofrera o martírio para resgatar os pecados da humanidade, isto é, dos ocidentais, porque os orientais não tomaram conhecimento da personalidade de Jesus, seus milagres e sua pregação e do seu romance religioso.

Engels constatou que as Epístolas são 60 anos mais novas do que o Apocalipse. E, ainda, os cristãos contrários ao bispo de Roma rejeitaram-nas durante séculos. Foi o que se deu com os ebionitas e os severianos, conforme Eusébio escreveu e Justino confirmou. O Apocalipse fala em um cordeiro com sete cornos e sete olhos, o qual foi imolado desde a fundação do mundo (13-8). O Apocalipse foi composto apenas em 68, sendo o mais antigo de todos os escritos cristãos.

Lutero e Swinglio disseram que o Apocalipse foi incluído nos Evangelhos por engano, tendo a Igreja de inventar, por isso, a ordem cronológica dos seus livros. Hoje se pode provar que o Apocalipse surgiu entre os anos 68 e 70; os Evangelhos, no século II, e os Atos dos Apóstolos são os mais recentes de todos. Eusébio em sua “História Eclesiástica”, 4-23, diz: “Compus as Epistolas conforme a vontade do irmão: mas os ‘apóstolos do diabo’ tacharam-nas de inverídicas contando-lhes certas coisas e acrescentando outras”.

Irineu, ao mesmo tempo, ordenava ao copista: “Confronta toda cópia com este original utilizado por ti, e corrige-a cuidadosamente”. Não te esqueças de reproduzir em tua cópia o pedido que te faço. Essas citações servem para medirmos que tipo de santidade havia entre os bispos e seus calígrafos, na arte eusebiana de eméritos falsificadores de documentos importantes.

Com isto, deram autenticidade a todas as invencionices do cristianismo e legitimaram sua liderança na posse material do que pertencia aos outros. Irineu ainda registrou o seguinte: “Ouvi dizer que não acreditam esteja isto nos Evangelhos, se não se encontrar nos arquivos”. Ao que Eusébio respondera: “É preciso demonstrá-lo”.

Uma excelente prova da existência de Jesus seria uma comunicação feita por Pilatos a seu respeito. Entretanto, tal documento não existe. Justino, instado pelos falsificadores, referiu-se a Jesus, contudo, dada a sua honradez pessoal, no caso do seu escrito ser autêntico, fê-lo de modo inseguro e hesitante. Tertuliano, que é mais seguro do que ele, afirmou que esse valioso documento deverá ser encontrado nos arquivos imperiais. Contudo, a Igreja apesar de haver se apoderado de Roma a partir do século IV, não teve a coragem de apresentar essa indispensável joia documentária, a qual de certo seria refutada pela ciência e pelo conhecimento.

Mesmo assim, a partir do século IV, essa prova espúria foi produzida; contudo, a Igreja não teve a petulância de submetê-la à grafotécnica. Daniel Rops, embora fosse um apaixonado cristão, reconheceu a veracidade dessa falsificação dizendo que: “a que arranjaram era uma carta enviada a Cláudio, que reinou de 41 a 44, e não a Tibério, sob cujo governo Pilatos fora Procurador da Judeia”.

No Apocalipse João, escreveu: “Se alguém acrescentar alguma coisa nisto, Deus castigará com as penas descritas neste livro; se alguém cortar qualquer coisa, Deus cortará sua parte na árvore da vida e na cidade santa descrita neste livro”. Ai está mais uma prova de como as falsificações eram usuais na fase da Igreja nascente. O mais interessante é essa gente falar em Deus, como se fosse coisa cuja existência já tivesse sido provada, não se justificando mais que o conhecimento e a razão estudassem as bases dessa existência.

Os padres mostravam-se estar de tal modo familiarizados com Deus e sua vontade que por isso achavam certo e justo julgar e queimar vivos a todos os que deles discordassem. Entretanto, embora dessem a impressão de estar em contato com Deus, usavam de processos criminosos, dos quais todos os ociosos usam para sacar contra o seu meio social. Assim é que hoje se pode provar que o cristianismo foi construído sobre um terreno atapetado de mentiras, falsificações e mistificações.

O Novo Testamento atualmente oficializado é cópia de um texto grego do século IV. É exatamente o sinótico descoberto em 1859, em um convento do Monte Sinai, onde vem informada a origem grega. Os originais do mesmo estão guardados nos museus do Vaticano e de Londres. Foram publicados com as devidas correções, feitas por Hesíquios, de Alexandria.

Um papiro encontrado no Egito, em 1931, apresenta-nos uma ordem cronológica totalmente diferente da oficializada pela Igreja. Atualmente, as fontes testamentárias aceitáveis são as do século II em diante, provindas de Justino, Taciano, Atenágoras, Irineu e outros, os quais são considerados os verdadeiros criadores do cristianismo.

Taciano foi o “bem amado” discípulo de Justino. Ele, entretanto, omite a genealogia de Jesus, dizendo apenas que ele descendia de reis judeus, de modo muito vago, divergindo assim da orientação oficializada. Irineu foi que sistematizou o cristianismo. Foi ele a fonte em que Eusébio inspirou-se. Por isso é que daí em diante seria obrigatória a confrontação entre os dois textos. O bispo de Cesareia fora encarregado pelo todo poderoso bispo de Roma de falsificar tudo quanto prejudicasse os interesses materiais da Igreja de então. De modo que, por onde passou a mão de Eusébio, foi tudo conspurcado criminosamente contra a verdade.

Eusébio foi realmente um bispo que cria apaixonadamente na divindade de Jesus Cristo, contudo, já conhecia o poder que possuía o bispo de Roma. Graças a Eusébio e outros iguais a ele, tornou-se uma temeridade descrer-se na verdade oficializada pela Igreja. Após tantas falsificações, todos ficaram realmente inseguros quanto à verdadeira origem do cristianismo, tal a tumultuação impressa por Eusébio.

Tertuliano e Clemente de Alexandria lutaram um pouco para sanar essas fontes, anulando boa parte do que restara das criminosas unhas de Eusébio. Jacob Buckhardt, examinando essa documentação, concluiu que o Novo Testamento merece confiança.

Em Coumrã, em 1947, como á vimos, foram encontrados documentos com escrita em hebraico e não em grego, falando em Crestus não em Cristo. Ali, Habacuc refere-se à perseguição sofrida por essa seita judia, assim como a morte de Crestus, igualmente traído por Judas, um sacerdote dissidente. A Igreja, ao ter conhecimento da existência de tais documentos, pretendeu informar que Crestus era o Cristo de sua criação, contudo, verificou-se que eles datavam de pelo menos um século antes do lançamento do romance do Gólgota. Além disso, continham revelações contrárias aos interesses da Igreja. Eles relatam as lutas de morte em que viviam as diversas seitas do judaísmo.

A Didaquê não pôde entrar nos Evangelhos, devendo silenciar completamente a respeito da pretensa passagem de Jesus pela terra. De qualquer forma, a lenda que existia em torno no nome de Crestus foi aproveitada na época porque, sendo uma seita comunista, suas pregações iriam servir para atrair ao cristianismo a atenção dos escravos, em luta contra os seus senhores, a eterna luta do pobre contra o rico.

Escavações feitas em Jerusalém desenterraram velhos cemitérios, onde foram encontradas muitas cruzes do século I e mesmo anteriores. Todavia, apesar de já ser usada nessa época, só a partir do século IV é que a Igreja iria oficializá-la como seu emblema. Levantamentos arqueológicos posteriores provariam que a cruz já era um piedoso emblema usado desde há milênios.

Orígenes, polemizando contra Celso, um dos mais cultos escritores romanos de seu tempo, e que mais combateram as bases falsas da Igreja e de Jesus Cristo, acusa Flávio Josefo por não haver admitido a existência de Jesus. Flávio não poderia referir-se a Jesus nem ao cristianismo porque ambos foram arranjados depois de sua morte. Assim, os livros de Flávio que falam de Jesus foram compostos, ou melhor, falsificados muito tempo após sua morte, no decorrer do século III, conforme as conclusões alcançadas pelos mestres da Escola de Tubingen.

Sêneca, que foi preceptor de Nero, suicidando-se para não ser assassinado por ele, já pensava mais ou menos como os cristãos. Do que se conclui que as ideias de que se serviu o cristianismo para se fundamentar são emprestadas das lendas que giravam em torno de outros Cristos Messias, assim como de outros cultos. Nada tendo, portanto, de original. Sêneca acreditava em um Deus único e imaterializável.

Por tudo isso, vemos que os líderes do cristianismo nada mais fizeram do que se apropriar das ideias já existentes. Apenas tiveram o cuidado de promover as modificações necessárias, com vistas a melhor consecução dos seus objetivos materiais. Sêneca, embora não fazendo em seus escritos qualquer alusão à existência de Jesus Cristo, teve muitos de seus escritos aproveitados pelo cristianismo nascente.

Em Tácito, escritor do século II, encontram-se referências a respeito de Jesus e seus adeptos. Contudo, exames grafotécnicos demonstraram que tais referências são falsas, e resultam de visível adulteração dos seus escritos. Suetônio, que existiu quando Jesus teria vivido, escreveu a “História dos Doze Césares”, relatando os fatos de seu tempo. Referindo-se aos judeus e sua religião, apenas falou em “distúrbios de judeus exaltados em torno de Crestus”. Por aí se vê que ele não se referia aos cristãos, porquanto, eles sempre se mostraram humildes e obedientes à ordem constituída, evidentemente a fim de passar, tanto quanto possível, despercebidos. Desse modo, iriam solapando o poder imperial, manhosamente, como realmente aconteceu.

Suetônio escreveu ainda que haviam supliciado alguns cristãos que eram gente que se dedicava demasiado a tolas superstições, orientadas por uma ideia malfazeja. Disse mais que Nero tivera de mandar expulsar os judeus de Roma, porque eles estavam sempre se sublevando, instigados por Crestus. Os cristãos estavam sempre organizados de modo a atrair aos escravos, sem, contudo, desagradar às autoridades. Assim sendo, jamais provocariam tumultos. Os cristãos aos quais Suetônio refere-se poderiam ser os zilotas, os essênios ou os terapeutas, mas nunca os cristãos de Jesus Cristo, porquanto, conforme já dissemos acima, os cristãos eram ensinados a não provocar desordens.

Plínio, o Jovem, viveu entre os anos 62 e 113, tendo sido sub-pretor da Bitínia. Na carta enviada ao imperador, perguntava como agir em relação aos cristãos, ao que Trajano teria respondido que agisse apenas contra os que não renegassem à nova fé. Entretanto, não ficou evidenciado a quais cristãos, exatamente, eram feitas as referências: se aos crestãos ou aos cristãos. De qualquer forma, a carta em questão, após ser submetida a exames grafotécnicos e métodos rádio-carbônicos, revelou haver sido falsificada.

Justiniano, Imperador romano, mandou queimar os escritos de Porfírio, através de um edito, em 448, alegando que: “impelido pela loucura, escrevera contra a santa fé cristã”.

Vespasiano, ao morrer, disse: “Que desgraça! Acreditei que me havia tornado um deus imortal!”. Suas palavras justificam-se pela credulidade supersticiosa. Partindo do preceito ensinado pelos judeus, aliás, um falso preceito, de que Cristo havia subido ao céu com corpo e alma, não seria de estranhar que os imperadores pretendessem tornar-se deuses, a fim de escapar ao inapelável destino dos que nascem: a morte.

Calígula, por isso, fizera-se coroar como Deus-Sol, o Sol Invictus, o Helius. Nessa época o Império romano, embora em declínio, ainda dominava uma porção de províncias afastadas de Roma. O homem espoliado pela força bruta, unificada em torno das regiões, sentindo não ser possível contar com a justiça humana, passa a esperar pela justiça dos deuses. Mas, mesmo assim, teriam de apelar para os deuses dos pobres e não dos ricos, privilegiados e poderosos.

Conta a lenda que Osíris, o deus solar dos egípcios, foi morto por seu irmão Seth, o qual dividiu o corpo em 14 pedaços e os espalhou pelo mundo afora. Ísis, sua esposa e irmã, saiu em busca dos pedaços, levando seu filho Hórus ao colo. Todos os anos o povo fazia a festa de Ísis, relembrando o acontecimento. Havendo conseguido juntar todas a partes do corpo, Osíris ressuscitou, passando a ser incensado como o deus da morte e da sombra. Fora uma ressurreição conseguida pelo amor da esposa. Ísis separou a terra do céu, traçou a órbita dos astros, criou a navegação e destruiu todos os tiranos. Comandava os rios, as vagas e os ventos. Seu culto assemelhava-se muito ao de Astartê, de Adônis e de Átis, religiões muito aparentadas entre si, dominando toda a orla do Mediterrâneo. Seu culto era uma reminiscência do culto de Tamus, um deus babilônio, cuja doutrina ensinava que os deuses nasciam e renasciam, ressuscitando-se.

O judaísmo e, mais tarde, o cristianismo, beberam dessas fontes grande parte da sua liturgia. No cristianismo, encontramos Ísis representada pela Virgem Maria e Hórus transformado em Jesus Cristo. Maria e Jesus, fugindo de Herodes e indo para o Egito, é a mesma lenda de Ísis e Hórus, fugindo de Seth.

O Deus-Homem que morria e ressuscitava já era uma velha “crença religiosa” naqueles tempos. O cristianismo apenas deu novos nomes e novas roupagens aos deuses de velhas crenças. A revelação de Deus aos homens é outra lenda cuja origem perde-se na noite dos tempos. Muitos séculos antes do surgimento do judaísmo, Zoroastro ou Zaratrusta havia criado uma religião, segundo a qual havia uma eterna luta entre o bem e o mal. Aura Mazzda ou Ormuzd, o deus do fogo e da luz, representava o bem em luta contra Angra Maniú ou Iarina, o deus das trevas. Nessa luta, Ormuzd foi auxiliado por seu filho Mitra, o espírito do bem e da justiça, mediador entre Ormuzd e os homens. Ormuzd mandou seu filho à terra, o qual nasceu de uma virgem pura e bela, que o concebeu através de um raio de sol. Morreu e ressuscitou em seguida.

Essa religião foi levada para Sicília pelos marinheiros persas, nos últimos séculos da era passada.

Inventando o cristianismo, os judeus nada mais fizeram do que sincretizar o judaísmo ortodoxo com a religião de Mitra, sem esquecer de Osíris e Átis, cujas religiões eram também muito aceitas em Roma e Alexandria. Vestígios do mitraísmo foram encontrados em escavações recentes, feitas em Óstia, os quais datam do século I. O mitraísmo era praticado em catacumbas, em grutas e em subterrâneos. O cristianismo copiou-lhe a prática. Daí porque disseram ter Jesus nascido em uma gruta e, nos primeiros tempos, o cristianismo foi praticado em catacumbas.

Assim sendo, os cristãos foram para as catacumbas, não fugindo das autoridades imperiais, mas tão-somente para observar o ritual mitraico. Os mitraicos também davam seus banquetes subterrâneos, eram os banquetes pessoais, comuns nos ritos solares e no judaísmo. Em ambos, havia o rito do pão e do vinho.

Mitra, o Sol Invictos, era festejado em dezembro, como Jesus. Outras aproximações entre o culto de Mitra e o de Jesus, no cristianismo: o uso da cruz do Sol Radiante, a cruz do Sol Invictus a qual expandia raios; o uso da pia batismal com a água benta, as refeições comunais, a destinação do domingo para o descanso em homenagem ao Senhor; a águia e o touro do ritual mitraico foram tomados para símbolos dos evangelistas Marcos e Lucas. Antigos quadros e painéis trazem a figura dos evangelistas com a cabeça desses animais.

Do judaísmo, copiaram a crença da imortalidade da alma, a vida no além, o Inferno, o diabo, a ressurreição, o dia do juízo; práticas e crenças igualmente existentes no mitraísmo. Graças a esses espertos arranjos, durante muito tempo, o crente frequentou indiferentemente o templo cristão, de Mitra ou de Ísis, crendo estar na Igreja antiga, onde iam consultar o oráculo.

Por isso, Teofilo, em Alexandria, mandou construir um templo cristão ao lado de um templo de Ísis, onde se anunciava o oráculo quando as profecias vinham de uma revelação astral, mediante a camuflagem das vozes de antigos bispos ali enterrados. Uma das coisas que favoreceram o cristianismo foi a abolição do sacrifício sangrento. Muitos correram a abraçar a nova crença para escapar da morte em um desses atos propiciatórios.

Spinoza e Hobbes, no século XVIII, mostraram que o Pentateuco foi composto no século II a.C. graças ao que o sacerdote judeu havia aprendido no cativeiro babilônio, fato que aconteceu no século IV a.C. Em seguida, mostraram uma série de contradições quanto à cronologia. Em uma das fontes, apresentam Adão e Eva como tendo sido criados ao mesmo tempo, enquanto em outra informam que ela havia sido feita de uma costela de Adão. Em uma, o homem aparece antes dos outros animais, na outra os animais surgem primeiro.

Levantamentos arqueológicos do começo do século XX, levados a efeito nos subsolos da Babilônia, provaram que o Deuteronômio resultou, em grande parte, do que os sacerdotes judeus haviam copiado da legislação religiosa, civil e criminal de Hamurabi, a qual por sua vez resultara do que se sabia da civilização acádia, e que naqueles tempos já era vetusta. Isaías, ao profetizar acerca de diversos reis de várias épocas, mostra que seu nome foi inventado séculos depois dos fatos haverem ocorrido. Um desses reis foi Dano, rei persa que governou em 538 a.C., quando libertou os judeus do cativeiro.

Herodes morreu no ano IV a.C., foi responsabilizado pela matança dos inocentes, para compor o controvertido romance da fuga para o Egito. Tudo o que até agora temos relatado constitui provas evidentes de que a Bíblia não tem a antiguidade nem a veracidade que lhe pretendem imprimir. Os zilotas que seguiam a linha comunista dos essênios combatiam tanto os judeus ricos como a ocupação romana. Os essênios, ao professar, faziam votos de pobreza, quando juravam nada contar da seita para os estranhos e nada ocultar dos companheiros. Era um dos ramos do judaísmo em que não mais se oferecia sacrifício sangrento, o que foi copiado pelo cristianismo.

Os Evangelhos foram compostos para enquadrar Jesus no que está previsto no versículo 17 do salmo 22. De modo que Jesus não passou de um ator arranjado para representar o drama do Gólgota. Cumpriu as Escritas como ator e não como sujeito de uma vida real. Reimarus, filósofo alemão que morreu em 1768, estudou a fundo a história de Jesus. Chegou a conclusões irrefutáveis, que assombraram a Igreja muito mais do que Copérnico ou Darwin. Disse que, se Jesus tivesse mesmo existido, seria, quando muito, um político ambicioso que fracassara completamente em suas conspirações contra o governo.

Emmanuel Kant foi o primeiro filósofo que conseguiu racional e inteligentemente expulsar Jesus da história humana, através de uma impressionante e profunda exegese do herói do cristianismo. Volney, em “As Rumas de Palmira”, após regressar de uma longa viagem de pesquisas sobre Antiguidade clássica pelo Oriente Médio, elaborou o trabalho acima referido, no qual nega a existência física de Jesus Cristo.

Arthur Drews igualmente viveu muitos anos na Palestina dedicando-se ao estudo de sua história antiga; concluiu que Jesus Cristo jamais foi um acontecimento palestino. Examinou todos os lugares pelos quais os evangelistas pretenderam tivesse Jesus passado. Constatou, então, que o cristianismo foi totalmente estruturado em mitos; entretanto, organizado de modo a assumir o aspecto de verdade incontestável, a ser imposta pela Igreja. Todavia, para sorte nossa, homens estudiosos e inteligentes contestam as falsas verdades elaboradas pelo cristianismo, com argumentos irretorquíveis.

Dupuis disse que, aqueles que fizeram de Jesus um homem, conseguiram enganar tanto quanto os que o transformaram em um deus. Em suas observações, deixa patente que o romance de Jesus nada mais é do que a repetição das velhas lendas dos deuses solares. Vejamos suas palavras: “Quando tivermos feito ver que a pretensa história de um deus que nasceu de uma virgem, no solstício do inverno, depois de haver descido aos infernos, de um deus que arrasta consigo um cortejo de doze apóstolos, — os doze signos solares — cujo chefe tem todos os atributos de Jano, um deus vencedor do deus das trevas, que faz transitar o homem império da luz e que repara os males da natureza, não passa de uma fábula solar… ser-lhe-á pouco menos indiferente examinar se houve algum príncipe chamado Hércules, visto haver-se provado que o ser consagrado por um culto, sob o nome de Jesus Cristo, é o Sol, e que o maravilhoso da lenda ou do poema tem por objeto este astro, então parecerá que os cristãos tem a mesma religião que os índios do Peru, a quem os primeiros fizeram degolar”.

Albert Kalthoft diz que Jesus personifica o movimento sócio-econômico que no século I sublevava o escravo, o pobre e o proletário. O seu messianismo foi espertamente aproveitado pelos líderes dos judeus da diáspora, aqueles que exploravam a desgraça do judeu pobre em benefício próprio. Acrescenta que a divergência que existe entre os quatro evangelistas resulta das várias tendências daquele movimento social revolucionário nascido em Roma, do qual a versão palestina é apenas o reflexo.

Salonmon Reinach, em “Orheus”, salienta o completo silêncio dos autores contemporâneos de Jesus Cristo acerca de sua pretensa existência. Tal silêncio verifica-se tanto entre os escritores judeus como entre os não judeus. Examina em profundidade as “Acta Pilati” e constata que os acontecimentos que o cristianismo situou em seu governo não foram do que ressuscitou no equinócio da primavera, de seu conhecimento, e assim sendo Pilatos jamais soube qualquer coisa a respeito de Jesus Cristo.

Pierre Louis Couchoud afirma que a existência real de Jesus é indemonstrável, do ponto de vista histórico. E acrescenta que as referências feitas por Flávio Josefo a Jesus não passam de falsificação de textos, sobejamente provada hoje pelos peritos da crítica histórica. Os maiores movimentos históricos tiveram como origem os mitos, cujo papel social é dar forma aos anseios inconscientes do povo. Compara, inclusive, a lenda de Jesus com a de Guilherme Tell, na Suíça. Todos sabem tratar-se de uma lenda nacional, todavia, Guilherme Tell é ali reverenciado como herói verdadeiro e real. Seu nome promove a união política dos cantões, embora falem línguas diferentes.

É possível que o mesmo aconteça em relação a Jesus e o cristianismo. Estando em jogo interesses de ordem social, política e, sobretudo, econômica, os líderes cristãos preferem deixar o mito de pé, pois enquanto houver cristãos, sua profissão estará garantida e os lucros continuarão sendo por eles auferidos.

O que se faz necessário é que o povo seja esclarecido acerca dos assuntos de crenças e religiões nos termos da verdade, da razão e da lógica, a fim de que, se libertando dos velhos preconceitos e tabus, possa enfim ver o mundo e as coisas em sua realidade objetiva.

E não ignoramos qual a realidade objetiva que predomina no cristianismo: é a exploração dos menos aquinhoados intelectual e economicamente. Quem mais contribui para as campanhas da Igreja são aqueles que menos possuem, cuja mente encontra-se obstruída pelas ideias e crenças religiosas. Sua pobreza material alia-se à pobreza intelectual.

Uma boa dose de conhecimentos científicos é certamente a melhor maneira de remover os obstáculos à libertação do homem, criados pelos lideres religiosos, em suas pregações. Entretanto, sabemos que nem sempre é possível a aquisição de tais conhecimentos. Muitos são os fatores que se interpõem entre o homem pobre, o operário, o trabalhador, e a cultura. Um desses fatores, por sinal, muito ponderável, é o econômico-financeiro. Como fazer para ir à escola, comprar livros, etc, se tem que trabalhar duro pela vida, e o que ganha mal dá para sobreviver?

Bem poucos são os que conseguem reunir os conhecimentos necessários que lhe permitam enxergar mais longe e romper as invisíveis cadeias que os prendem aos dogmas e preconceitos ultrapassados pela razão e pela ciência.

O mais cômodo para aqueles deserdados será esperar a recompensa das agruras da vida no céu, após a morte. Afinal de contas, os padres e os pastores estão aí para isto: vender Deus e o céu a grosso e no varejo.

Tobias Barreto escreveu estes inolvidáveis versos:

Se é sempre o mesmo engodo;
Se o homem chora e continua escravo;
De que foi que Jesus salvar-nos veio?

Poderá alguém responder a tal interrogação satisfatoriamente? Provavelmente não.

É possível que, movido pela mesma razão, Proudhon tenha escrito: “Os que me falam em religião querem o meu dinheiro ou a minha liberdade”. Desta forma, em poucas palavras, ficou bem claro o sentido e o objetivo da religião: subtrair ao indivíduo a sua liberdade de pensamento e de ação, e, com ela, o seu dinheiro.

As Falsificações

Vimos, assim, que os únicos autores que poderiam ter escrito a respeito de Jesus Cristo, e como tal foram apresentados pela Igreja, foram Flávio Josefo, Tácito Suetonio e Plínio. Invocando o testamento de tais escritores, pretendeu a Igreja provar que Jesus Cristo teve existência física, e incutir como verdade na mente dos povos todo o romance que gira em torno da personalidade fictícia de Jesus.

Contudo, a ciência histórica, através de métodos modernos de pesquisa, demonstra hoje que os autores em questão foram falsificados em seus escritos. Estão evidenciadas súbitas mudanças de assunto para intercalações feitas posteriormente por terceiros. Após a prática da fraude, o regresso ao assunto originalmente abordado pelo autor.

Tomemos, primeiramente, Flávio Josefo como exemplo. Ele escreveu a história dos acontecimentos judeus na época em que pretensamente Jesus teria existido. Os falsificadores aproveitaram-se então de seus escritos e acrescentaram: “Naquele tempo nasceu Jesus, homem sábio, se é que se pode chamar homem, realizando coisas admiráveis e ensinando a todos os que quisessem inspirar-se na verdade. Não foi só seguido por muitos hebreus, como por alguns gregos. Era o Cristo. Sendo acusado por nossos chefes do nosso país ante Pilatos, este o fez sacrificar. Seus seguidores não o abandonaram nem mesmo após sua morte. Vivo e ressuscitado, reapareceu ao terceiro dia após sua morte, como o haviam predito os santos profetas, quando realiza outras mil coisas milagrosas. A sociedade cristã, que ainda hoje subsiste, tomou dele o nome que usa”.

Depois deste trecho, passa a expor um assunto bem diferente no qual refere-se a castigos militares infligidos ao populacho de Jerusalém. Mais adiante, fala de alguém que conseguira seus intentos junto a uma certa dama fazendo-se passar como sendo a humanização do deus Anubis, graças aos ardis dos sacerdotes de Ísis. As palavras a Flávio atribuídas são as de um apaixonado cristão. Flávio jamais escreveria tais palavras, porquanto, além de ser um judeu convicto, era um homem culto e dotado de uma inteligência excepcional.

O próprio Padre Gillet reconheceu em seus escritos ter havido falsificações nos textos de Flávio, afirmando ser inacreditável que ele seja o autor das citações que lhe foram imputadas. Além disso, as polêmicas de Justino, Tertuliano, Orígenes e Cipriano contra os judeus e os pagãos demonstram que Flávio não escreveu nem uma só palavra a respeito de Jesus. Estranhando o seu silêncio, classificaram-no de partidário e faccioso. No entanto, um escritor com o seu mérito escreveria livros inteiros acerca de Jesus, e não apenas um trecho. Bastaria, para isto, que o fato realmente tivesse acontecido. Seu silêncio, no caso, é mais eloquente do que as próprias palavras.

Exibindo os escritos de Flávio, Fócio afirmava que nenhum judeu contemporâneo de Jesus ocupara-se dele. A luta de Fócio, que viveu entre os anos de 820 a 895, e foi patriarca de Constantinopla, teve ensejo justamente por achar desnecessário a Igreja lançar mãos de meios escusos para provar a existência de Jesus. Disse que bastaria um exemplar autêntico não adulterado pela Igreja e fora do seu alcance para por em evidência as fraudes praticadas com o objetivo de dominar de qualquer forma. Embora crendo em Jesus Cristo, combateu vivamente os meios sub-reptícios empregados pelos Papas, razão porque foi destituído do patriarcado bizantino e excomungado. De suas 280 obras, apenas restou o “Myriobiblion”, tendo o resto sido consumido, provavelmente por ordem do Papa.

Tácito escreveu: “Nero, sem armar grande ruído, submeteu a processos e a penas extraordinárias aos que o vulgo chamava de cristãos, por causa do ódio que sentiam por suas atrapalhadas. O autor fora Cristo, a quem, no reinado de Tibério, Pôncio Pilatos supliciara. Apenas reprimida essa perniciosa superstição, fez novamente das suas, não só na Judeia, de onde proviera todo o mal, senão na própria Roma, para onde de confluíram de todos os pontos os sectários, fazendo coisas as mais audazes e vergonhosas. Pela confissão dos presos e pelo juízo popular, viu-se tratar-se de incendiários professando um ódio mortal ao Gênero humano”.

Conhecendo muito bem o grego e o latim, Tácito não confundiria referências feitas aos seguidores de Cristo com os de Crestus. As incoerências observadas nessa intercalação demonstram não se tratar dos cristãos de Cristo, nem a ele se referir. Lendo-se o livro em questão, percebe-se perfeitamente o momento da interpelação. Afirmar que fora Cristo o instigador dos arruaceiros é uma calúnia contra o próprio Cristo. E conforme já referimos anteriormente, os cristãos seguidores de Cristo eram muito pacatos e não procuravam despertar atenção das autoridades para si. Como dizer em um dado momento que eles eram retraídos e, em seguida, envolvê-los em brigas e coisas piores? É apenas mais uma das contradições de que está repleta a história da Igreja.

Ganeval afirma que foram expulsos de Roma os hebreus e os egípcios, por seguirem a mesma superstição. Deduz-se então que não se referia aos cristãos, seguidores de Jesus Cristo. Referia-se aos Essênios, seguidores de Crestus, vindos de Alexandria. A Igreja não conseguiu por as mãos nos livros de Ganeval, o que contribuiu ponderavelmente para lançar uma luz sobre a verdade. Por intermédio de seus escritos, surgiu a possibilidade de provar-se a quais cristãos, exatamente, referia-se Tácito.

Suetônio teria sido mais breve em seu comentário a respeito do assunto. Escreveu que “Roma expulsou os judeus instigados por Crestus, porque promoviam tumultos”. É evidente, também, a falsificação praticada em uma carta de Plínio a Trajano, quando perguntava o que fazer aos cristãos, assunto já abordado anteriormente. O referido texto, após competente exame grafotécnico, revelou-se adulterado. É como se Plínio quisesse demonstrar, não apenas a existência histórica de Jesus, mas sua divindade, simbolizando a adoração dos cristãos. É o quanto basta para evidenciar a fraude.

Se Jesus Cristo realmente tivesse existido, a Igreja não teria necessidade de falsificar os escritos desses escritores e historiadores. Haveria, certamente, farta e autêntica documentação a seu respeito, detalhando sua vida, suas obras, seus ensinamentos e sua morte. Aqueles que o omitiram, se tivesse de fato existido, teriam falado dele abundantemente. Os mínimos detalhes de sua maravilhosa vida seriam objeto de vasta explanação. Entretanto, em documentos históricos não se encontram referências dignas de crédito, autênticas e aceitáveis pela história. Em tais documentos, tudo o que fala de Jesus e sua vida é produto da má-fé, da burla, de adulterações e intercalações determinadas pelos líderes cristãos. Tudo foi feito de modo a ocultar a verdade. Quando a verdade esta ausente ou oculta, a mentira prevalece. E há um provérbio popular que diz: “A mentira tem pernas curtas”. Significa que ela não vai muito longe, sem que não seja apanhada. Em relação ao cristianismo, isto já aconteceu. Um número crescente de pessoas vai, a cada dia que passa, tomando conhecimento da verdade. E, assim, restam baldados os esforços da Igreja, no que concerne aos ardis empregados na camuflagem da verdade, visando alcançar escusos objetivos.

O Doloroso Silêncio Histórico

A existência de Jesus Cristo é um fato jamais registrado pela história. Os documentos históricos que o mencionam foram falsificados por ordem da Igreja, num esforço para provar sua pretensa existência, apesar de possuir provas de que Jesus é um mito. E assim agiu, movida pelo desejo de resguardar interesses materiais. Ganeval apontou a semelhança entre o culto de Jesus Cristo e o de Serapis. Ambos são uma reencarnação do deus “Phalus”, que, por sua vez, era uma das formas de representação do deus Sol.

Irineu chegou a afirmar que o deus dos cristãos não era homem nem mulher. Papias cita trechos dos Evangelhos, mostrando que se referiam ao Cristo egípcio. Referindo-se ao “logos”, que seria Jesus Cristo, disse ter sido ele apenas uma emanação de Deus, produzida à semelhança do Sol. É bom lembrar que essas opiniões divergentes entre si são de três teólogos do cristianismo. Essas opiniões foram emitidas quando estava acesa a luta de desmentidos recíprocos da Igreja contra os seus numerosos opositores, ou seja, os que desmentiam a existência física de Jesus. Então, criaram uma filosofia abstrata, baseando-se nos escritos de Filon.

Ganeval, baseando-se em Fócio, disse que Eudosino, Agápio, Carino, Eulógio e outros teólogos do cristianismo primitivo não tiveram um conceito real nem físico de Jesus Cristo. Disse mais, que Epifânio, falando sobre as seitas heréticas dos marcionítas, valentinianos, saturninos, simonianos e outros, falava que o redentor dos cristãos era Horus, o filho de Ísis, um dos três deuses da trindade egípcia, que mais tarde viria a ser Serapis.

Ganeval afirmou ainda que os docetistas negavam a realidade de Jesus, e, para refutar a negação, o IV Evangelho põe em relevo a lança que fez sair água e sangue do corpo de Jesus, com o intuito de provar sua existência física. Segundo Jerônimo, esses docetistas teriam sido contemporâneos dos apóstolos. Lembra ainda que o imperador Adriano, viajando em 131 para Alexandria, declara que “o deus dos cristãos era Serapis, e que os devotos de Serapis eram os mesmos que se chamavam os bispos de cristãos”.

Adriano, decerto, estava com a verdade. Documentos daquela época informam que existiam os atuais Evangelhos, assim como Tácito informa que os hebreus e os egípcios formavam uma só superstição. Os escritos de Filon não se referem a Jesus Cristo, conforme pretenderam fazer crer os falsificadores, mas a Serapis. Quando havia referências aos cristãos terapeutas, afirmavam que se falava dos cristãos de Jesus.

Por sua vez, Clemente de Alexandria e Orígenes escreveram negando Jesus e falando em Cristo, o qual seria Crestus. No entender de Fócio, tudo isso não passava de fabulação mítica, não tendo existido Jesus nem Cristo, de que a Igreja criou o seu Jesus Cristo.

Duquis e Volney, fazendo o estudo da mitologia comparada, mostram de onde retiraram Jesus Cristo: do próprio mito. Filon, escrevendo a respeito dos cristãos terapeutas, disse que o seu teor de vida era semelhante ao dos cristãos e essênios. Abandonavam bens e família para seguir apaixonadamente aos sacerdotes. Epifânio escreveu que os cristãos terapeutas viviam junto do lago Mareótides, tendo os seus Evangelhos e os seus apóstolos. É sobre esses cristãos que Filon escreveu. Se os cristãos seguidores de Jesus Cristo já existissem, Filon não poderia deixar de falar deles. Quando do pretenso nascimento de Cristo, Filon contava apenas 25 anos de idade. Os Evangelhos, tendo surgido muito tempo após a morte de Filon e de Jesus, não poderiam ser os do cristianismo por ele referido.

Clemente de Alexandria e Orígenes não criam na encarnação nem na reencarnação, motivo porque não creram na encarnação de Jesus Cristo, embora fossem padres da Igreja. Orígenes morreu em 254.

Fócio escreveu sobre “Disputas” de Clemente e afirmou que ele negara a doutrina do “Logos”, dizendo que o “Verbo” jamais se encarnou, afirmação igualmente feita por Ganeval. Analisando os quatro volumes de “Principia”, de Orígenes, percebe-se que o “Logos” ou o “Verbo” era o mesmo sopro de Jeová, referido por Moisés. Fócio, tendo-se escandalizado com isso, disse que Orígenes era um blasfemo.

Apenas analisando como se referia ao Verbo, a Crestus e ao Salvador, é que se pode excluir a possibilidade da existência física de Jesus. Tratá-lo-iam de modo bem diferente, se tivesse realmente existido.

Um Jesus Cristo Não Histórico

A história, conforme mencionamos, não tem registro da existência de Jesus Cristo. Os autores que temos em apreço e que seriam seus contemporâneos omitiram-se completamente. Os documentos históricos que o mencionam, fazem-no esporadicamente, e bem assim revelam-se rasurados e falsificados, motivo pelo qual de nada adiantam, neste sentido, para a história. É óbvio, portanto, que a história não poderia registrar um evento que não aconteceu.

Tomando conta da história, o cristianismo deixou-a na contingência de referir o nome de Jesus Cristo como sendo um deus antropomorfizado, mas nunca uma pessoa de carne e ossos que tenha realmente vivido.

Ao fazê-lo, principia por um estudo filológico e etimológico dos termos “Jesus” e “Cristo”, e termina mostrando que os dois nomes foram reunidos em um só, para ser dado posteriormente a um indivíduo. O termo “Jesus” significa salvador, enquanto que “Cristo” é o ungido do Senhor, o “oint” dos judeus, o Messias esperado doe judeus. Nesse estudo, a história mostra que a crença messiânica havia tomado a orla do Mediterrâneo a partir do século II antes de nossa era. O norte da África, o sul da Europa, a Ásia Menor, estavam todos repletos de Messias e Cristos, e de milhares de pessoas que os seguiam e neles criam.

Ao referir-se aos pretensos Messias, o Talmude deu esse nome até mesmo a diversos reis pagãos, como no caso de Ciro, conforme está em Isaias 44:1, ou ao rei de Tiro, como está em Ezequiel 28:14 e nos Salmos, quando se verifica que os nomes de Jesus e de Cristo já vinham sendo atribuídos a diversos líderes religiosos da Antiguidade.

As fontes pesquisadas pela história mostraram que Jesus Cristo, ao ser estudado como fato histórico, só pode ser encarado como sendo o “ungido do Senhor”, uma personalidade de existência abstrata apenas, não tendo possuído contextura física pelo que deixou de ser histórico. É apenas uma figura simbólica, através da qual a humanidade tem sido ludibriada de há muitos séculos.

Cumprindo seu dever de informar, a história põe diante dos olhos do crente e do estudioso as provas de que foi a luta dos líderes cristãos a partir do século II para que o mito Jesus Cristo adquirisse a consistência granítica que levou a crença religiosa dos europeus da Idade Média sob o guante do criminoso absolutismo dos reis e dos Papas de então.

Este estudo demonstra que Jesus Cristo foi concebido no século II para cumprir um programa messiânico elaborado pelos profetas e pelos compiladores do Velho Testamento e das lendas, sob o seu pretenso nome. Vê-se, então, que os passos de Jesus pela terra aconteceram conforme o Talmud, para que se cumprissem as profecias que o judaísmo havia inventado.

Jesus Cristo pode ser considerado o ator no palco. Representou o drama do Gólgota e retirou-se da cena ao fim da peça. Mateus 1:2 descreve-nos um Jesus Cristo que nasce milagrosamente, apenas para que se cumprissem as escrituras. Em 2:5 diz que nasceu em Belém, porque foi ali que os profetas previram que nasceria. Em 2:14 deixa-o fugir para o Egito, para justificar estas palavras: “Meu filho será chamado do Egito”. Em 2:23 faz José regressar a Nazaré porque Jesus deveria ser nazareno. Em 3:3 promove o encontro de Jesus com João Batista, porque Isaías predissera-o. Em 4:4 Jesus foi tentado pelo diabo, porque as escrituras afirmaram que tal aconteceria e que ele resistiria. Em 4:14 leva Jesus para Carfanaum para conferir outra predição de Isaías. Em 4:12 Jesus diz que não se deve fazer aos outros senão aquilo que gostaríamos que a nós fosse feito, porque isto também estava na lei dos profetas. Em 7:17 Jesus cura os endemoniados, conforme predissera Isaías. Em 11:10-14 Jesus palestra com João Batista porque assim predissera Elias. Em 12:17 Jesus cura as multidões, quando pede que não propalem isso, igualmente dando cumprimento às palavras de Isaías. Em 12:40 permanece sepultado durante três dias porque os deuses do paganismo, os deuses solares ou redentores, também estiveram; como Jonas, que foi engolido por uma baleia, a qual depois de três dias jogou para fora, intacto como se nada tivesse acontecido. E tudo isto aconteceu em um mar onde não há possibilidade de vida para esse cetáceo, portanto, só poderia acontecer graças aos milagres bíblicos. Em 13:14 diz que Jesus falava por meio de parábolas, como Buda também o fez. Assim também falavam os antigos taumaturgos, para que apenas os sacerdotes entendessem; assim só eles seriam capazes de interpretar para os incautos e crédulos religiosos, e, afinal, porque Isaías assim o previa. Em 21:14 Jesus entra em Jerusalém montado em um burreco, conforme as profecias. Em 26:54 Jesus diz que não foi preso pelo povo quando junto dele se assentou no templo para ensinar, porque também estava previsto. Em 27:9 Judas trai a Jesus, vendendo-o por trinta dinheiros e recebendo à vista o preço da traição. Em 27:15 os soldados repartem entre si as roupas do crucificado.

Apenas o cumprimento desta profecia choca-se frontalmente com a história. E, de acordo com ela, nessa época não havia legionários romanos na Palestina. Lucas 23:27 diz que Jesus mandou comprar espadas, para que assim fosse confundido com os malfeitores comuns, porque assim estava previsto. Em seguida, diz que Jesus, ao ensinar aos seus apóstolos, afirmava que tudo o que lhe acontecesse, era para que estivesse de acordo com o que escreveram Moisés e os profetas, e como estava descrito nos salmos. Em 24:44-46 diz que Jesus afirmou “Como era necessário que Cristo padecesse e ressuscitasse ao terceiro dia, dentre os mortos”.

Para ficar de acordo com as previsões testamentárias, João 19:27 diz que Jesus teve sede e pediu água. Em 19:30, ao beber a água, disse que era vinagre e exclamou: “Tudo se cumpriu”. Em 19:32-37 diz que não lhe quebraram nenhum osso, apenas o feriram com a lança para verificar se havia expirado. E isto também estava predito. Por ai, percebe-se que tudo ali é puro simbolismo, e que Jesus foi idealizado apenas para cumprir as escrituras. Está ai uma prova de que a existência de Jesus nada mais é do que uma fabulação evangélica. Do mesmo modo que inventaram as profecias, inventaram alguém para cumpri-las. Tanto é verdade, que os judeus que ainda hoje acreditam em profecias, não aceitaram Jesus como tendo sido o Messias prometido pelo Talmude.

Além disso, os seus escritores esgotaram todos os argumentos possíveis com o fim de provar que Jesus não foi um acontecimento palestino, e que não passou de um romance escrito pelos judeus dispersos e dos que se aproveitaram do messianismo judeu para criar uma empresa comercial, como tem sido o Vaticano.

O messianismo não foi uma lenda que tenha atingido a todas as classes sociais judias. Essa lenda foi criada pelos sacerdotes judeus visando com isso ajudar ao povo da rua a suportar melhor as agruras da pobreza e não reagir contra as classes privilegiadas. Essas promessas são cumpridas pelos sacerdotes, a seu modo, a fim de que o pobre viva de esperanças e não sinta que o rico continua metendo as mãos em seus bolsos, impunemente. O homem do povo raramente compreende a finalidade desse tipo de engodo.

O Talmude traz uma porção de profecias, e ao mesmo tempo critica aos que lhes dão crédito. A crítica representa uma evolução do pensamento das lideranças judias. Um estudo comparado do judaísmo e do cristianismo mostra a enorme quantidade de crendices dessas religiões forjadas pelos seus líderes e afastadas pela evolução do conhecimento.

Em nossos dias, o conhecimento atingiu um ponto em que a própria Igreja começou a relegar para um canto os seus ídolos de aspecto humano. O conhecimento humano terminara por vencer definitivamente, provando que todos os deuses e ídolos têm os pés de barro. Nossos antepassados viram muitos ídolos cair. Certas práticas e crenças religiosas ainda permanecem válidas porque os sacerdotes, como bons psicólogos que são, observam o desenvolvimento mental do povo e sabem que uns encontram a verdade, enquanto outros, jamais conseguiram alcançá-la.

Idealizando um Jesus Cristo adaptado às profecias talmúdicas, criaram um personagem incoerente e inseguro, o que nos dá a medida exata do quilate mental dos seus criadores. Podiam ser espertos, mas nunca inteligentes ou cultos.

Não deve ter sido tarefa das mais fáceis a de adaptar um Cristo vindo para cumprir as profecias no fanatismo das populações ignaras. Foi um trabalho de titãs não acorrentados à verdade, nem à sinceridade que o homem deve ao seu semelhante. Nunca foi fácil transformar uma fantasia em realidade. Por isso, o cristianismo teve de valer-se da espada de Constantino e das armas de seus legionários para impor dogmaticamente o que a razão e o conhecimento jamais aceitariam passivamente. Nos dois primeiros séculos do cristianismo, cada qual queria ser o primeiro e mandar mais e, se possível, ficar sozinho. Tivemos muitos reis e Papas analfabetos, atestando o primarismo dos judeus dispersos, como dos lideres europeus da época do lançamento do cristianismo.

Tentando racionar a teologia do judaísmo e do cristianismo, fizeram de Jeová um deus absurdo e de Jesus um ser irreal, ambos incoerentes, o que se tornou a essência do Talmude e dos Evangelhos. Através de Jesus Cristo, valorizaram as profecias do pretenso profeta Isaías, revitalizando assim o judaísmo e dando seriedade ao Talmude, fazendo dos Evangelhos um amontoado de mentiras e de impossíveis humanos. Assim é que criaram um relato inconsistente, que desmorona completamente em face de uma análise mais profunda.

Scherer escreveu que Jesus não foi um filósofo nem fundador de uma religião. Foi apenas Messias. O sentido da vida de Jesus era apenas dar cumprimento às profecias messiânicas, e tal ideia é o centro dos fatos evangélicos, a razão de ser Jesus. Tendo vindo ao mundo tão-somente para cumprir as profecias, deixou de ser humano e tornou-se um fantasma, ou um símbolo do que nunca teve existência real.

A vida de Jesus e de seus apóstolos desenrola-se apenas como uma peça teatral, na qual Jesus acumula os papéis de deus e de homem. Um dia o público há de convencer-se de que esteve diante de um ser bíblico, sem uma realidade histórica.

Segundo Arthur Weigal, o único testemunho escrito por quem teria convivido com Jesus teria sido a epístola atribuída a Pedro. Teria surgido quando começaram as pretensas perseguições aos cristãos, na qual ele os animava. Entretanto, como a existência de Pedro é igualmente lendária, a epístola em questão não merece fé, tendo sido composta por qualquer cristão, menos pelo mitológico Pedro.

Os escritos de Tácito, dadas as adulterações sofridas, carecem de valor histórico. Dai não se poder admitir como verdade que Nero, entre os anos 54 e 68, tenha realmente perseguido aos seguidores de Jesus Cristo. Tertuliano, entretanto, afirma que Pedro foi martirizado no governo de Nero.

Contudo, vários pesquisadores, entre os quais Holmann e Weizsacker, demonstraram que essas perseguições somente começaram a partir do século II. Irineu, no ano 180, achava que a epístola de Pedro fora escrita em 83, mas não por Pedro. Nesta epístola, Pedro dizia que “Jesus sofreu por nós, deixando-nos um exemplo”. Acrescentara ter sido testemunha pessoal dos seus sofrimentos, após os quais subiu ao céu, de onde voltaria em breve. No entanto, sua volta não ocorreu até hoje, apesar de terem se passado dois mil anos. A falta de cumprimento dessa promessa invalida todas as suas afirmações.

Disse Pedro, ainda, que Jesus mandou que se amasse uns aos outros, pagando o mal com o bem, retribuindo a injúria com a bênção. Recomendou a caridade, a hospitalidade e a humildade; o dever de evitar o mal, fazer o bem e buscar a paz, assim como a abstinência da ambição da carne, evitar o rancor, a inveja e a maledicência; a submissão às autoridades, crer em Deus e honrar o rei.

As epístolas de Paulo viriam em segundo lugar, como importância histórica. Pedro teria aprendido a doutrina cristã na convivência direta com Jesus. Suas epístolas seriam consideradas autênticas por terem sido escritas 20 ou 30 anos após a crucificação. Pedro, assim como Paulo, afirmaram que Jesus voltaria em breve para julgar a humanidade. Contudo, ambos estavam enganados e enganaram aos outros. Paulo teria conhecido pessoalmente a Pedro e a Jaques, um dos irmãos de Jesus Cristo, assim como referia-se a outras pessoas que teriam convivido com Jesus. A crucificação e a ressurreição teriam sido fatos indiscutíveis para Pedro e Paulo, cujos escritos estariam muito próximos dos acontecimentos.

Paulo, em I Coríntios 11:1, diz: “Imitam-me como se fosse Jesus”. Teria pregado o amor, a paz, a temperança, a caridade, a alegria, a paciência, a doçura, a confiança e a boa vontade. A lei divina deveria ser interpretada segundo o espírito e não conforme a letra. “Amarás ao próximo como a ti mesmo”, seria um amor paciente, caridoso e humilde.

As epístolas procuraram estabelecer a historicidade de Jesus, assim como revelar muitos pontos do seu caráter. Jesus teria vivido apenas para redimir a humanidade, não teria pecado, sendo, sem dúvida alguma, o filho de Deus. Papias, em 140, escreveu que Mateus havia colecionado as máximas de Jesus, e Marcos recolhera muitas notas para o Evangelho. Assim, os Evangelhos seriam o espelho de Jesus, contado pelos apóstolos, espalhando entre os homens o ideal de perfeição moral e mental.

As curas, milagres e pregações de Jesus, em pouco tempo, haviam espalhado o seu nome, galvanizando as multidões, todos sentiam que havia surgido o Messias. Assumiu o papel de Messias e com isso entusiasmou a multidão, pelo que entrou em Jerusalém cercado da emoção e do respeito do povo. Ao anoitecer abandonou a cidade, e, no dia seguinte, ao regressar, encontra muita agitação. As autoridades haviam tomado medidas contra ele. Dois dias antes da páscoa, tomou sua última refeição com os companheiros e ali permaneceu a espera dos acontecimentos, sabendo que o seu reino não era deste mundo. À noite, foi preso, e, no dia seguinte, julgado. O povo quis que o sacrificassem em lugar de Bar Abbas. Seria o sacrifício pascal, rito multimilenar que iria mais uma vez acontecer. Após a morte, sai do sepulcro, ressuscitado, e vai ao encontro dos apóstolos, pede comida, e depois de permanecer algum tempo com eles, ascende ao céu prometendo voltar em breve.

Foi este o retrato feito de Jesus Cristo pelo cristianismo, e que ainda hoje milhões de pessoas adoram. Entre nós, são bem poucos os que põem em dúvida a veracidade desse romance contado pelos judeus da diáspora e aproveitado por seus seguidores latinos.

No entanto, a razão e o conhecimento estão se encarregando de destruir a pretensa veracidade desse conto. Muitas coisas consideradas como milagres são hoje conseguidas naturalmente através da ciência, da tecnologia moderna, da medicina, do conhecimento científico em todas as suas modalidades, e mesmo através da hipnose. Diante das conquistas que o homem tem feito, é possível que ele abra os olhos para a verdade e perceba então que Deus jamais se preocupou com sua sorte e com o mundo. A história desmente peremptoriamente que Deus tenha comparecido ao mundo nos momentos de festa ou de dor. O homem foi abandonado à própria sorte e tem lutado muito para sobreviver através dos tempos, e tem obtido sucesso porque está sempre acumulando conhecimentos, os quais emprega em situações futuras.

Diante de tudo o que foi exposto, só nos resta dizer que a história, em dois mil anos, não encontrou uma única prova ou documento que mereça crédito no que diz respeito à vida de Jesus. Sua existência é fictícia e só encontra agasalho no seio da mitologia. Seu nascimento, sua vida, sua morte, sua família, seus discípulos, tudo, enfim, que lhe diz respeito, tem analogia com as crenças, ritos e lendas dos deuses solares, adorados sob diversos nomes e modalidades e por povos diversos, também.

Dele, a história nada sabe.

Jesus e o Tempo

O mítico dia do nascimento de Jesus Cristo foi oficializado por Dionísio, o Pequeno, no século VI, que marcou no ano 1 do século I, correspondendo ao ano 753 da fundação de Roma, com um erro de previsão calculado em seis anos. Para chegar a essa artificiosa fixação, serviu-se de diversos sistemas de cálculo. Calvísio e Moestrin contaram até 132 sistemas e Fabrício arredondou para 200.

Para uns, teria sido entre 6 e 10 de janeiro, para outros, 19 ou 20 de abril, enquanto outros ainda situavam entre 20 e 25 de março. Os cristãos orientais determinaram a data entre 1 e 8 de janeiro, enquanto os ocidentais escolheram a 6 de janeiro.

Em 375, São João Crisóstomo escreveu que a data de 25 de dezembro foi introduzida pelos orientais. Entretanto, antes do ano 354, Roma já o havia fixado para esta mesma data, segundo o calendário de Bucer. Essas diferenças foram o resultado da preocupação da Igreja em fazer com que o nascimento de Jesus coincidisse e se confundisse com os dos deuses solares, os deuses salvadores, e especialmente com o Deus Invictus, que era Mitra. E era justamente ao mitraismo que a religião cristã pretendia absorver.

No dia 25 de dezembro todas as cidades do império romano estavam iluminadas e enfeitadas para festejar o nascimento de Mitra. A preocupação de ligar o nascimento de Jesus ao de Mitra denota o artificialismo que fundamentou o cristianismo. Foi a divinização do deus dos cristãos às custas da luz do Sol dos pagãos.

Foi um dos grandes trabalhos de mistificação da Igreja a confluência dos dois nascimentos para a mesma data. Assim, o nascimento do novo deus apagava da memória do povo a lembrança de Mitra, no fim do inverno.

A tradição religiosa, desde milênios, fizera com que todos os deuses redentores nascessem em 25 de dezembro. Quanto ao lugar de nascimento de Jesus, disseram ter sido em Belém, para combinar com as previsões messiânicas que, fazendo de Jesus um descendente de David, teria a adesão dos judeus incautos.

O II e o IV Evangelhos não mencionam o assunto, enquanto o I e o III aludem ao caso, mas se contradizem. Uns dizem que os pais de Jesus moravam em Belém, enquanto outros afirmam que eles ali estavam de passagem. Essa insegurança deve-se ao fato de pretenderem ligar a vida de Jesus à de David, conforme as profecias. Todavia, isto confundia as tendências históricas ligadas ao nascimento dos deuses solares. A preocupação apologética, contudo, invalidou a pretensão histórica.

De tudo isto resultou que a história pode hoje provar que tudo aquilo que se refere a Jesus é puro convencionalismo, e sua existência é apenas ideal e não real. De modo que a morte dos inocentes nada mais é do que a repetição da matança das criancinhas egípcias, contada no Êxodo. A estrela só pôde ser inventada porque naquele tempo o homem ainda não sabia o que era uma estrela; tanto assim que a Bíblia afirma que Josué fez parar o sol com um aceno de sua mão apenas. Assim, a estrela que guiou os magos é coisa realmente absurda. Antes de tudo, ninguém soube realmente de onde vieram esses reis e onde eram os seus países.

Outros fenômenos relatados como terremotos, trevas e trovões, assinalados pelo Bíblia, não o são pela história dos judeus nem dos romanos. Só os interessados no mito puderam ver tais acontecimentos. Os escritores que relataram fatos ocorridos na Palestina e no Império Romano não transmitiram estes fatos que teriam ocorrido na morte de Jesus à posteridade. Muita coisa pode ter acontecido naqueles tempos, menos as que estão nos Evangelhos.

Pilatos, por exemplo, morreu ignorando a existência de Jesus. Os legionários romanos jamais receberam ordens para prendê-lo. Nenhum movimento social, político ou religioso contrário às normas da ocupação surgiu na Judeia, para justificar a condenação de seu líder por Pilatos.

Entretanto, Jesus teria sido julgado e condenado pelos sacerdotes judeus, pois Pilatos deixara o caso praticamente em suas mãos e do povo, lavando as suas próprias. Nem Pilatos, nem Caiaz, nem Hannã deixaram qualquer referência acerca desse processo. Nenhum deles poderia dizer qual a aparência física de Jesus. Tertuliano, baseando-se em Isaías, disse que ele era feio, ao passo que Agostinho afirmou que ele era bonito. Uns afirmaram que era imberbe, outros que era barbado. Sua cabeleira espessa e barba fechada resultaram de uma convenção realizada no século XII. O Santo Sudário retrata um Jesus Barbudo.

Nada do que se refere a Jesus pode ser considerado ponto pacífico. Tudo é discrepante e contraditório. Ora, se aqueles que tinham e os que ainda têm interesse em defender a veracidade da existência de Jesus não conseguiram chegar a um acordo no que lhe diz respeito, isso não é bom sinal.

Moy escreveu: “Desde que se queira tocar em qualquer coisa real na vida de Jesus, esbarra-se logo na contradição e incoerência”. Por isso, até o aspecto físico de Jesus tornou-se discutível, o que ajuda a provar que ele nunca existiu. De acordo com a história, não se pode aceitar o que está escrito nos evangelhos coma prova de sua existência. Também a Igreja não dispõe de argumentos válidos, nesse sentido. A arqueologia, por outro lado, nada encontrou até aqui capaz de elucidar a questão.

De tudo isto depreendemos que a existência física de Jesus jamais poderá ser provada de modo irrefutável, e, por conseguinte, é muito difícil ser acatada por homens cultos e amantes da verdade. O romance, as lendas, os contos, a ficção, interessam como cultura, como expressão do pensamento de um povo, e desse modo são perfeitamente aceitos. Entretanto, a apresentação de tais modalidades de cultura como fatos reais, consumados e verdadeiros e como tal serem impostos ao povo, é condenável.

A atitude do cristianismo tem sido, através dos tempos, justamente a que nós acabamos de condenar: a imposição das lendas, do romance e da novela como realidade palpável, como fato verdadeiro e incontestável.

Em sua “Vida de Jesus”, Strauss diz: “Poucas coisas são certas, nas quais a ortodoxia se apoia de preferência — as milagrosas e as sobrehumanas —, as quais jamais aconteceram. A pretensão de que a salvação humana dependa da fé em coisas das quais uma parte é certamente fictícia, outra sendo incerta, é um absurdo, que em nossos dias nem sequer devemos nos preocupar, refutando-o”.

Ernest Havet, comparando Jesus com Sócrates, diz que Sócrates é um personagem real, enquanto Jesus é apenas ideal. Homens como Platão e Xenófanes, os quais conviveram com Sócrates, deixaram o seu testemunho a respeito do mesmo. Em seus escritos relatam tudo sobre Sócrates: a vida, o pensamento, os ensinamentos e a morte. E nada do que lhe diz respeito foi adulterado, e, portanto, é autêntico, verdadeiro e indiscutível.

Quanto a Jesus, não teve existência real, e aqueles aos quais se atribui escritos e referências em relação a ele, uns foram adulterados em seus escritos, outros não existiram. Pílatos, que teria autorizado seu sacrifício, omite o fato quando relata os principais acontecimentos de seu governo. Por acaso mandaria matar um deus, e não saberia? Assim, quem descreveu Jesus, apenas imaginou o que ele teria sido, não foi sua testemunha.

Renan disse em sua “Vida de Jesus”: “Nossa admiração por Jesus não desapareceria nem mesmo quando a ciência nada pudesse decidir de certo, e chegasse forçosamente às negações”. Termina dizendo que o divino encontrado pelos cristãos em Jesus é o mesmo que a beleza de Beatriz, que apenas resultou do pensamento de Dante ou de seu gênio literário. Da mesma forma, as belezas de Cristina residem nos sonhos religiosos dos hindus. As maravilhas de Jesus e a beleza de Maria são produtos do gênio inventivo da liderança oradora dos mitos Jesus e Maria.

Se de ambos apenas se diz o bem, há sinal que eles não tiveram existência real. Jesus Cristo é uma criação do homem, o qual esteve em cena apenas para realizar as profecias dos primários profetas judeus. Esta é também a opinião de Didon, exposta em seu livro “Vida de Jesus”. Diz ele que é suspeita a sonegação de quase trinta anos da vida de Jesus à história evangélica.

“Nós apenas sabemos um nada da vida de Jesus”, escreveu Miron. Os redatores dos Evangelhos e os primeiros autores eclesiásticos, recolhendo as tradições correntes na comunidade cristã, podem ter adquirido alguns fragmentos da verdade; mas como assegurar que, entre tantos elementos mitológicos e legendários, haja algo de verdade? Assim, a vida de Jesus em si é impossível.

Acontece com Cristo o mesmo que acontece com todos os entes legendários: quanto mais os buscamos, menos os encontramos. A tentativa feita até aqui de colar na história, de arrebatar às trevas da teologia, um personagem que até a idade de trinta anos é absolutamente desconhecido, e que depois da referida idade aparece fazendo impossíveis humanos — os milagres — é absurda e ridícula.

Labanca, em “Jesus Cristo”, impugna a possibilidade de uma biografia científica de Jesus, baseando-se na inautenticidade dos Evangelhos, uma vez que os mesmos não tiveram finalidade histórica, mas tão-somente religiosa e propagandística. Jesus não está nos Evangelhos por causa de sua esquisita divindade, mas porque isso convém aos seus lançadores e aos que ainda hoje vivem do seu nome, como rendoso meio de vida.

Jesus Cristo nos Evangelhos

Assim como a história não tomou conhecimento da existência de Jesus, os Evangelhos igualmente desconhecem-no como homem, introduzindo-o apenas como um deus. Maurice Vernés mostrou com rara mestria que o Velho Testamento não passa de um livro profético de origem apenas sacerdotal, fazendo ver que tudo que ai está contido não é histórico, sendo apenas simbólico e teológico. O mesmo acontece com o Novo Testamento e os Evangelhos. Tudo na Bíblia é duvidoso, incerto e sobrenatural.

Tratando dos Evangelhos, mostra que sua origem foi mantida anônima, talvez de propósito, não se podendo saber realmente quem os escreveu. Por isso, eles começam com a palavra “segundo”; Evangelho segundo Mateus; segundo Marcos. Daí se deduz que não foram eles os autores desses Evangelhos, foram, no máximo, os divulgadores.

Igualmente deixaram em dúvida a época em que foram escritos. A referência mais antiga aos Evangelhos é a de Papias, bispo de Yerápoles, o qual foi martirizado por Marco Aurélio entre 161 e 180. Seu livro faz parte da biblioteca do Vaticano. Irineu e Eusébio foram os primeiros a atribuir a Marcos e a Mateus a autoria dos Evangelhos, mas ambos permanecem desconhecidos da história, como o próprio Jesus Cristo. Destarte, pouco ou nenhum valor têm os Evangelhos como testemunha dos acontecimentos. Se só foram compostos no século III ou IV, ninguém pode garantir se os originais teriam realmente existido.

Os primitivos cristãos quase não escreveram, e os raros escritos desapareceram. Por outro lado, no Concílio de Niceia foram destruídos todos os Evangelhos. Esse Concílio foi convocado por Constantino, que era pagão. Daí, devem ter sido compostos outros Evangelhos para serem aprovados por ele ou pelo Concílio. Com isto, perderam sua autenticidade, deixando de ser impostos pela fé para serem-no pela espada.

Celso, no século II, combateu o cristianismo argumentando somente com as incoerências dos Evangelhos. Irineu diz que foram escolhidos os quatro Evangelhos, não porque fossem os melhores ou verdadeiros, mas apenas porque esses provieram de fontes defendidas por forças políticas muito poderosas da época. Os bispos que os apoiaram tinham muito poder político. Informam ainda que antes do Concílio de Niceia os bispos serviam-se indiferentemente de todos os Evangelhos então existentes, os quais alcançaram o número de 315. Até então eles se equivaliam para os arranjos da Igreja. Mesmo assim, os quatro Evangelhos adotados conservaram muitas das lendas contidas nos demais que foram recusados. De qualquer forma, era e continuam sendo todos anônimos, inseguros e inautênticos. Os adotados foram sorteados, e não escolhidos de acordo com fatores valorativos. Mesmo estes adotados desde o Concílio de Niceia sofreram a ação dos falsificadores que neles introduziram o que mais convinha à época, ou apenas a sua opinião pessoal.

Esta é a história dos Evangelhos que, através dos tempos, vêm sofrendo a ação das conveniências políticas e econômicas. Embora a Igreja houvesse se tornado a senhora da Europa, nem por isso preocupou-se em tornar os Evangelhos menos incoerentes. Sentiu-se tão firme que julgou que sua firmeza seria eterna.

Os argumentos mais poderosos contra a autenticidade dos Evangelhos residem em suas contradições, incoerências, discordâncias e erros quanto a datas e lugares, e na imoralidade de pretender dar cunho de verdade a velhos e pueris arranjados dos profetas judeus. Essa puerilidade avoluma-se à medida que a crítica verifica o esforço evangélico em tornar realidade os sonhos infantis de uma população ignorante. Para justificar sua ignorância, se dizem inspirados pelo Espírito Santo, o qual também é uma ficção religiosa, resultante da velha lenda judia segundo a qual o mundo era dominado por dois espíritos opositores entre si: o espírito do bem e o do mal. Adquiriram essa crença no convívio com os persas, os egípcios e os hindus.

Os egípcios tiveram também os seus sacerdotes, os quais escreveram os livros religiosos como o “Livro dos Mortos”, sob a inspiração do deus Anubis. Hamurabi impôs suas leis como tendo sido oriundas do deus Schamash. Moisés, descendo do Monte Sinai, trouxe as tábuas da lei como tendo sido ditadas a ele por Jeová. Maomé, igualmente, foi ouvir do anjo Gabriel, em um morro perto de Meca, boa parte do Alcorão. Allah teria mandado suas ordens por Gabriel.

O conhecimento mostra que as religiões, para se firmarem, têm-se valido muito mais da força física do que da fé. Quanto à verdade, esta não existe em suas proposições básicas. De modo que, Anubis, Schamash, Allah e Jeová nada mais são do que o Espírito Santo sob outros nomes.

Stefanoni demonstrou que todos esses escritos não representam o Espírito Santo, mas o espírito dominante em cada época ou lugar. Assim surgiram os Evangelhos, os quais, como Jesus Cristo, foram inventados para atender a certos fins materiais, nem sempre confessáveis.

“Não creria nos Evangelhos, se a isso não me visse obrigado pela autoridade da Igreja”. São palavras de Sto. Agostinho. Com sua cultura e inteligência, poderia hoje estar no rol dos que não creem.

Jesus Cristo é um Milagre

No que diz respeito a Jesus Cristo, a teologia toma em consideração, sobretudo, o aspecto sobrenatural e os seus milagres. João Evangelista foi trazido para a cena a fim de criar o Logos, o Jesus metafísico, destruindo, assim, o Jesus-Homem. As contradições surgidas em torno de um Jesus saído da mente de pessoas primárias e incultas tornaram-no muito vulnerável à crítica dos mais bem dotados em conhecimento. Então vem João e substitui o humano pelo divino, por ser o mais seguro. O mesmo iria fazer a Igreja no século XV, quando, para abafar, grita contra os que haviam queimado miseravelmente uma heroína nacional dos franceses, tiraram o uniforme do corpo carbonizado de Joana D’Aro e vestiram-lhe a túnica dos santos. O mesmo aconteceu com Jesus: teve de deixar queimar a pele humana que lhe haviam dado, para revestir-se com a pele divina.

A Igreja, na impossibilidade de provar a existência de Jesus-Homem, inventou o Jesus-Deus. Assim atende melhor à ignorância pública e fecha a boca dos incrédulos. Do que relatamos, conclui-se que, no caso de Joana D’Arc, a igreja obteve os resultados esperados. Contudo, continua com as mesmas dificuldades para provar que Jesus Cristo, como homem ou como deus, tenha vivido fisicamente. E não é só. Ela não tem conseguido provar nada do que tem ensinado e imposto como verdade. Falta-lhe argumentos sérios e convincentes para confrontar com o conhecimento científico e com a história sem que sejam refutados.

A Igreja tudo fez para tornar Jesus Cristo a base e a razão de ser do cristianismo. E isto satisfez plenamente a seus interesses materiais nestes dois milênios de vida. Da mesma forma, os portugueses, os espanhóis e os ingleses, de Bíblia na mão e cruz no peito, foram à longínqua África para arrastar o negro como escravo, para garantir a infra-estrutura econômica do continente americano. Jamais se preocuparam em saber se o pobre coitado queria separar-se de seus entes queridos, nem o que estes iriam sofrer com a separação.

A Igreja está realmente atravessando uma crise. Acontece que os processos tecnológicos e científicos descortinam para o homem novos horizontes, e então ele percebe que foi iludido miseravelmente. Sua fé, sua crença e seu deus morrem porque não têm mais razão de ser.

Jesus Cristo foi inicialmente um deus tribal, que teria vindo ao mundo por causa das desgraças dos judeus. Eles sonhavam ser donos do mundo, mas, mesmo assim, foram expulsos até mesmo de sua própria terra. Contudo, o cristianismo ganhou a Europa, com a adesão dos reis e imperadores.

Renan, não conseguindo encontrar o Jesus-Divino, tentou ressuscitar o Jesus-Homem. Mas o que conseguiu foi apenas descrever uma esquisita tragédia humana, cujo epílogo ocorreu no céu. Jesus teria sido um altruísta mandado à terra para que se tornasse uma chave capaz de abrir o céu. Teria sido o homem ideal com que o religioso sonha desde seus primórdios. Existindo o homem ideal, cuja idealidade ficasse comprovada, o histórico seria dispensável. Mas, ao tentar evidenciar um desses dois aspectos, Renan perdeu ambos. Mostrou então que, para provar o lado divino de Jesus, compuseram os Evangelhos. Seu objetivo: relatar exclusivamente a vida de um homem milagroso e não de um homem natural.

Elaborando os Evangelhos, cometeram tantos erros e contradições, que acabaram por destruir, de vez, a Jesus. A exegese da vida de Jesus, baseada no conhecimento e na lógica, separando-se o ideal do real, eles destroem-se mutuamente. Quem descreve o Jesus real, não poderá tocar o ideal, e vice-versa, porque um desmente o outro.

Em suma, os Evangelhos não satisfazem aos estudiosos da verdade livre de preconceitos, destruindo o material e o ideal postos na personalidade mítica de Jesus. A fabulação tanto recobre o humano como o divino.

Verificamos, então, estarmos em presença de mais um deus redentor ou solar. Jesus, através dos Evangelhos, pode ser Brama, Buda, Krishna, Mitra, Horus, Júpiter, Serapis, Apolo ou Zeus. Apenas deram-lhe novas roupas. O Cristo descrito por João Evangelista aproxima-se mais desses deuses redentores do que o dos outros evangelistas. É um novo deus oriental, lutando para prevalecer no ocidente como antes tinha lutado para impor-se no oriente. É um novo subproduto do dogmatismo religioso dos orientais, em sua irracional e absurda metafísica. Por isso, criaram um Jesus divino, não por causa dos seus pretensos milagres, mas por ser o Logos, o Verbo feito carne. Essa essência divina é que possibilitou os milagres. É um deus antropomorfizado, feito conforme o multimilenar figurino idealizado pelo clero oriental. Jesus não fez milagres, ele é o próprio milagre. Nasceu de um milagre, viveu de milagres e foi para o céu milagrosamente, de corpo e alma, realizando assim mais uma das velhas pretensões dos criadores de religiões: a imortalidade da alma humana.

Sendo Jesus essencialmente o milagre, não poderá ser histórico, visto não ter sido um homem normal, comum, passando pela vida sem se prender às necessidades básicas da vida humana. Jesus foi idealizado exclusivamente para dar cumprimento às profecias do judaísmo, é o que verificamos através dos Evangelhos. Tudo quanto ele fez já estava predito, muito antes do seu nascimento.

Jesus surgiu no cenário do mundo, não como autor do seu romance, mas tão-somente como ator para representar a peça escrita, não se sabe bem onde, em Roma ou, talvez, Alexandria. O judaísmo forneceu o enredo, o Vaticano ficou com a bilheteria. E, para garantir o êxito total da peça, a Igreja estabeleceu um rigoroso policiamento da plateia, através da confissão auricular. Nem o marido escapava à delação da esposa ou do próprio filho. O pensamento livre foi transformado em crime de morte. Os direitos da pessoa humana, calcados aos pés. Nunca a mentira foi imposta de modo tão selvagem como aconteceu durante séculos com as mentiras elaboradas pelo cristianismo. À menor suspeita, a polícia tonsurada invadia o recinto e arrastava o petulante para um escuro e nauseabundo calabouço onde as mais infames torturas eram infligidas ao acusado. Depois, arrastavam-no à praça pública para ser queimado vivo, o que, decerto, causava muito prazer ao populacho cristão.

Desse modo, a Igreja tornou-se um verdugo desumano, exercendo o seu poder de modo impiedoso e implacável, ao mesmo tempo em que escrevia uma das mais terríveis páginas da história da humanidade.

Durante muito tempo o sentimento de humanidade esteve ausente da Europa, e a mentira triunfava sobre a verdade. Milhares de infelizes foram sacrificados porque ousaram dizer a verdade. O poder público apoiava a farsa religiosa, e era praticamente controlado pela Igreja. Aquele que ousasse apontar as inverdades, as incoerências e o irracionalismo básicos do catolicismo, seria eliminado. Tudo foi feito para evitar que o cristianismo fracassasse, devido à fragilidade de seus fundamentos. O que a Igreja jura de mãos postas ser a verdade, é desmentido pelo conhecimento, pela ciência e pela razão.

Jesus Cristo, um Mito Bíblico

Folheando as páginas da história humana, e não encontrando aí qualquer referência à passagem de Jesus pela terra, nós, estudiosos do assunto, convencer-nos-emos de que ele nada mais é do que um mito bíblico. Pesquisando os Evangelhos na esperança de encontrar algo de positivo, deparamo-nos mais uma vez com o simbolismo e a mitologia. A história que o envolve desde o nascimento até a morte é a mesma do surgimento de inúmeros deuses solares ou redentores.

É de se notar o cuidado que tiveram os compiladores dos Evangelhos para não permitir que Jesus praticasse senão o que estava estabelecido pelas profecias do judaísmo. Assim, a vida de Jesus nada mais é do que as profecias postas em prática. O cristianismo e os Evangelhos são um modo de reavivamento da chama do judaísmo, ante a destruição do templo de Jerusalém. É uma transformação do judaísmo, de modo a existir dentro dos muros de Roma, de onde, posteriormente, ultrapassou os limites, alcançando boa parte do mundo.

O sofrimento que o judaísmo infligiu ao povo pobre deveria ser o suficiente para que se acabasse definitivamente. Acreditamos que a ambição de Constantino é que deu lugar ao alastramento do cristianismo, ou, melhor dizendo, do judaísmo sob novas roupagens e novo enredo. Não fosse isso, a falta de cumprimento das pretensas promessas de Abraão, de Moisés e do próprio Jesus Cristo já teria feito com que o judaísmo e o cristianismo fossem varridos da memória do homem. De há muito o homem estaria convencido da falsidade que é a base da religião.

Idealizaram o cristianismo que, baseado no primarismo da maioria, deu novo alento ao judaísmo, criando assim, o capitalismo e a espoliação internacional. O liberalismo que surgiu graças ao monumental trabalho dos enciclopedistas, é que possibilitou ao homem uma nova perspectiva de vida. A partir do enciclopedismo, os judeus e o judaísmo deixaram de ser perseguidos por algum tempo, e com isto, quase perdeu sua razão de ser.

Ao surgir Hitler e seu irracional nazismo, encontrou quase a totalidade dos judeus alemães integrada de corpo e alma na pátria alemã. O Fuhrer deu então um novo alento ao judaísmo, ao persegui-lo de modo desumano. Graças à perseguição de que foram vítimas os judeus de toda a Europa durante a guerra de 1940, surgiu a justificativa internacional para que se criasse o Estado de Israel. Talvez o Estado de Israel, revivendo sua velha megalomania racial, invalide em sangue a tendência natural para a socialização do mundo e universalização do conhecimento. A socialização do mundo acabaria com a irracional e absurda ideia de ser o judeu um bi-pátrida. Nasça onde nascer, não se integra no meio em que nasce e vive. Daí a perseguição.

Os judeus ricos de todo o mundo carreiam para Israel todo o seu dinheiro e, com ele, a tecnologia e o conhecimento alugados. Graças a isto, poderá embasar ali os seus mísseis teleguiados, tudo quanto houver de mais avançado na química, física e eletrônica. Assim, terão meios de garantir a manutenção da sócio-economia estruturada no capitalismo. Esta é uma situação realmente grave, a qual poderá tornar-se dramática no porvir. O poder econômico concentrado em poucas mãos é uma ameaça contra o homem e sua liberdade.

Apesar de o cristianismo liderar o movimento que faz do homem e do seu destino o centro das preocupações das altas lideranças sociais, a grande maioria dos homens está marginalizada, porque o poder econômico do mundo acumula-se em poucas mãos. E, se permanecemos crendo em tudo quanto criaram os judeus de dois milênios atrás, isso é sinal de que não evoluímos o bastante para justificar o decurso de tanto tempo. Se o progresso científico e a tecnologia avançada não conseguirem libertar-nos dos mitos, estará patente mais uma vez o estado pueril em que ainda se encontra o desenvolvimento mental do homem. O homem não será de todo livre enquanto permanecer preso às convenções religiosas, as quais possuem como único fundamento o mito e a lenda.

Se assim falamos, não é que estejamos sendo movidos por um antissemitismo ou um anticlericalismo doentio; de modo algum isto é verdadeiro. O que nos motiva tomar em pauta o assunto é o desejo de ver um crescente número de pessoas partilhar conosco do conhecimento da verdade.

Temos dito repetidas vezes que tudo aquilo em que se fundamenta o cristianismo é apenas uma compilação de velhas lendas dos deuses adorados por diversos povos. Strauss diz que saiu do Velho Testamento a pretensão de que Jesus encarnar-se-ia em Maria, através do Espírito Santo. Em números, 24:17 estava previsto que uma estrela guiaria os reis magos.

Cantu lembra que, juntando-se os livros do Velho Testamento com os do Novo, teremos 72 livros, o mesmo número de anciãos teria Moisés escolhido para subir com ele ao Monte Sinai. O Velho Testamento previa que o povo seguiria a Jesus, mesmo sem conhecê-lo. Seriam os peixes retirados da água pelos apóstolos, e os mesmos da pescaria de São Jerônimo. Moisés teria feito da pedra o símbolo da força de Jeová, por isto, Jesus devia dar a Pedro as chaves do céu.

Oseias 11:1 e Jeremias 31:15-16-4-10-28 profetizam que o Messias seria chamado por Jeová, do Egito, ligado ao pranto de Raquel pelo assassinato dos filhos. Então arranjaram a terrível matança dos inocentes, a qual consta apenas em dois evangelhos, sendo silenciado o assunto pelos outros dois e pelos relatos enviados a Roma.

Strauss lembra também que a discussão de Jesus com doutores do templo, assim como a passagem de Ana e Semeão, bem como a circuncisão, estava tudo previsto no Velho Testamento. Diz ainda que teria ido para Nazaré após o regresso do Egito apenas para que os Evangelhos pudessem atribuir-lhe a alcunha de nazareno. Entretanto, Nazaré não existia, pelo menos naquela época; era uma cidade fantasma, só passando a existir nas páginas dos Evangelhos. Assim, Jesus foi nazareno, não por ter nascido em Nazaré, visto que não poderia nascer em dois lugares, como também não poderia nascer em uma cidade que não existia. Ele foi nazareno por ter sido um comunista essênio. A anunciação e o nascimento de João Batista foram copiados do Talmud.

As tentações de Jesus pelo demônio, no deserto, segundo Emilio Bossi, foram copiadas das Escrituras. Os quarenta dias passados no deserto são oriundos do cabalismo de Roma e da crença dos babilônios, os quais atribuíam a esse número força cabalística. Por isso, tal número repete-se várias vezes no decorrer das dissertações bíblicas: o dilúvio descrito na Bíblia durou quarenta dias; Moisés esteve quarenta anos na corte do Faraó; passou quarenta anos no deserto, e os ninivitas jejuaram quarenta dias.

Ezequiel teria sido conduzido por um espírito de um lugar para outro, através do espaço. Abraão teria sido tentado pelo demônio; os mesmos episódios passaram ao Novo Testamento, tendo Jesus como protagonista. Perguntamos nós: por que tais coisas não mais se repetem? A resposta só pode ser esta: elas jamais aconteceram. Tudo isto não passa de lendas ou sonhos, os quais foram impostos como fatos reais.

O Talmud diz: “Então se abrirão os olhos aos cegos e os ouvidos aos surdos”. Jesus teria de dizer: “Então o coxo pulará como o cervo e a língua dos mudos se soltará”.

Em Lucas 4:27 Jesus cura Naamã, reproduzindo uma cura efetuada por Eliseu, de um outro leproso. Elias e Eliseu ressuscitaram mortos, por seu lado, Jesus ressuscitaria a Lázaro. Os discípulos de Jesus, não sabendo como curar os endemoniados, recorrem ao Mestre. Passagem semelhante está em Eliseu, cujo servo teria recorrido a ele para curar o filho da sunamita. A multiplicação dos pães e dos peixes é a repetição de Moisés no deserto, fazendo cair maná e cordonizes. Moisés transformou as águas do rio em sangue e Jesus transforma a água em vinho.

Em Jeremias 7:11 e Isaías 56:7 está escrito que o templo não deve se converter em um covil de ladrões, o que leva os evangelistas a dizer que Jesus expulsou os mercadores do templo.

A transfiguração de Jesus é a mesma coisa que aconteceu a Moisés, ao subir ao Monte Sinai, quando encontrou com Jeová. Aliás, Moisés havia prometido que viria um profeta semelhante a ele. A traição de Judas repete o mesmo acontecimento em relação a Crestus.

A prisão de Jesus foi descrita de modo igual no Talmud. A fuga dos apóstolos estava prevista por Isaías. Jesus foi crucificado na Páscoa, representando o cordeiro pascal.

Essas comparações patenteiam a existência do cristianismo muito antes de Filon. Donde se deduz que Jesus foi inventado de acordo com as Escrituras, sem esquecer de anexar as ideias de Filon ao relato de sua pretensa vida. Fócio demonstrou que os Evangelhos foram copiados de Filon. São Clemente e Orígenes, embora fossem padres da Igreja, orientaram-se por Filon e não pelo bispo de Roma.

Estas citações seriam suficientes para se provar que Jesus jamais existiu. É apenas um produto da mente clerical, a qual o compôs baseada em mitos e lendas.

As Contradições sobre Jesus Cristo

Como tudo o mais que se refere à existência de Jesus na terra, também a sua ascendência é objeto de controvérsias. Segundo Mateus e Lucas, Jesus descende ao mesmo tempo de David e do Espírito Santo. Entretanto, como filho do Espírito Santo, não poderá descender de José, consequentemente deixa de ser descendente de David e o Messias esperado pelos judeus. Assim, Jesus ficará sendo apenas Filho de Deus, ou Deus, visto ser uma das três pessoas da trindade divina.

Em ambos os evangelhos acima citados há referências quanto a data de nascimento de Jesus, mas tais referências são contraditórias o Jesus descrito por Mateus teria onze anos quando nasceu o de Lucas. Mateus diz que José e Maria fugiram apressadamente de Belém, sem passar por Jerusalém, indo direto para o Egito, após a adoração dos Reis Magos. Herodes iria mandar matar as criancinhas. Todavia, Lucas diz que o casal estivera em Jerusalém e acrescenta a narração da cena de que participaram Ana e Semeão. De modo que um evangelista desmente o outro. Lucas não alude à matança das criancinhas, nem à fuga para o Egito.

Por outro lado, Marcos e João não se reportam à infância de Jesus, passando a narrar os acontecimentos de sua vida a partir do seu batismo por João Batista.

Mateus que conta o regresso de Jesus, vindo do Egito e indo para Nazaré, deixa-o no esquecimento, voltando a ocupar-se dele somente depois dos seus trinta anos, quando ele procura João Batista. Diz ainda que João já o conhecia e, por isto, não o queria batizar, por ser um espírito superior ao seu.

Lucas narra a discussão de Jesus com os doutores da lei, aos doze anos de idade. Sendo perguntado pela mãe sobre o que estava ali fazendo, teria respondido que se ocupava com os assuntos do pai.

Emilio Bossi, referindo-se a esta passagem, estranha a atividade da mãe. Se o filho nascera milagrosamente, e ela não o ignora, só poderia esperar dele uma sequência de atos milagrosos. Mesmo a sua presença no templo, entre os doutores, não deveria causar preocupação à sua mãe, visto saber ela que o filho não era uma criança qualquer, e sim um Deus.

Lucas diz que os samaritanos não deram boa acolhida a Jesus, o que muito irritara a João. Contudo, João, o Evangelista, diz que os samaritanos deram-lhe ótima acolhida e, inclusive, chamaram-no de salvador do mundo.

Os evangelistas divergem também quanto ao relato da instituição da eucaristia. Três deles afirmam que Jesus instituiu-a no dia da Páscoa, enquanto João afirma que foi antes. Enquanto os três descrevem como aconteceu, João silencia.

Na última noite Jesus estava muito triste, como, aliás, permaneceria até a morte. Pondo o rosto em terra, orou durante muito tempo. Segundo os evangelistas, ele estava de tal modo triste e conturbado que teria suado sangue, coisa, aliás, muito estranha, nunca verificada cientificamente.

Enquanto isto, seus companheiros dormiam despreocupadamente, não se incomodando com os sofrimentos do Mestre. Entretanto João não fala sobre esse estado de alma do Mestre. Pelo contrário, diz que Jesus passara a noite conversando, quando se mostrava entusiasta de sua causa e completamente tranquilo. Lucas, Mateus e Marcos afirmam que o beijo de Judas denunciara-o aos que vieram prendê-lo. Todavia, João diz que foi o próprio Jesus quem se dirigiu aos soldados dizendo-lhes tranquilamente: “Sou eu”.

Lucas é o único que fala no episódio da ida de Jesus de Pilatos para Herodes Antipas. Os outros caem em contradição quanto à hora do julgamento pelo Conselho dos Sacerdotes em presença do povo. João não fala a respeito do depoimento de Cireneu, nem na beberagem que teriam dado a Jesus. Omite-se ainda quanto à discussão dos dois ladrões, crucificados com Jesus, e quanto à inscrição posta sobre a cruz.

De forma que seu relato é bastante diferente daquilo que os outros contaram. E as divergências continuam ainda no que concerne ao quebramento das pernas, ao embalsamamento, à natureza do sepulcro e ao tempo exato em que ele esteve enterrado. Quanto ao embalsamamento, por exemplo, há muita coisa que não foi dita. Teriam retirado seu cérebro e intestinos como se procede normalmente nesses casos? Se a resposta for positiva, como explicar o fato de Jesus, após a ressurreição, pedir comida? Como se vê, as verdades bíblicas são além de controvertidas, incompreensíveis.

Lucas diz que Jesus referiu-se aos que sofrem de fome sede, enquanto Mateus diz que ele se referia aos que têm fome e sede de justiça, aos pobres de espírito. Uns afirmam que Jesus tratara os publicanos com desprezo e ódio, outros dizem que ele se mostrou amigável em relação a eles. Para uns, Jesus teria dito que publicassem as boas obras, para outros, que nada dissessem a respeito. Uma hora Jesus aconselha o uso da força física e da resistência, mandando até que comprassem espada; noutra, ameaça os que pretendem usar a força.

Marcos, Mateus e Lucas dizem que Jesus recomendara o sacrifício. Entretanto, não tomou parte em nenhum deles.

Mateus diz que Jesus afirmou não ter vindo para abolir a lei nem os profetas, enquanto Lucas diz que ele afirmara que isso já estava no passado, já tivera o seu tempo. Os três afirmam ainda que Jesus apenas pregara na Galileia, tendo ido raramente a Jerusalém, onde era praticamente desconhecido. Todavia, João diz que ele ia constantemente a Jerusalém, onde realizara os principais atos de sua vida. As coisas ficam de modo que não se sabe quem disse a verdade, ou, melhor dizendo, não sabemos quem mais mentiu. Ora, se Jesus tivesse realmente praticado os principais atos de sua vida em Jerusalém, seria conhecido suficientemente, e, então, não teriam que pagar a Judas 30 dinheiros para entregar o Mestre.

João, que teria sido o precursor do Messias, não se fez cristão, não seguiu a Jesus, pregando apenas o judaísmo no aspecto próprio. Entretanto, depois de preso, enviou um mensageiro a Jesus, indagando-lhe: “És tu que hás de vir, ou teremos de esperar um outro?”, ao que Jesus teria respondido: “Você é o profeta Elias”. Talvez houvesse esquecido que o próprio João antes já declarara isso mesmo. Contam os Evangelhos que, desde a hora sexta até Jesus exalar o último suspiro, a terra cobriu-se de trevas. Contudo, nenhum escritor da época comenta tal acontecimento.

Marcos 25:25 diz que Jesus foi sacrificado às 9 horas. João diz que ao meio dia ele ainda não havia sido condenado à morte, e acrescenta que, a esta hora, Pilatos tê-lo-ia apresentado ao povo exclamando: “Eis aqui o vosso rei”!

Emilio Bossi assinala detalhadamente todas estas contradições, e as que se deram após a pretensa ressurreição, dizendo que nada do que vem nos Evangelhos deve ser levado a sério. O sobrenatural é o clima em que se encontra a Bíblia, e esta é apenas o resultado da combinação de crenças e superstições religiosas dos judeus com as de outros povos com os quais conviveram.

As Contradições Evangélicas

Mateus e Marcos afirmam enfaticamente que os discípulos de Jesus abandonaram tudo para segui-lo, sem sequer perguntar antes quem era ele. Em Mateus, lê-se que Jesus teria afirmado que não viera para abolir as leis de Moisés. Contudo, esta seria uma afirmativa sem sentido algum, visto que hoje sabemos que os livros atribuídos a Moisés são apócrifos.

Segundo João, quando Jesus falou ao povo, foi por este acatado e proclamado rei de Israel, aos gritos de “Hosanna”. Mas, um pouco adiante, ele se contradiz, afirmando que o povo não acreditou em Jesus, e imprecando contra ele, ameaçava-o a ponto de ele haver procurado esconder-se.

Mateus diz que Jesus entrara em Jerusalém, vitoriosamente, quando a multidão tê-lo-ia recebido de modo festivo, e marchando com ele, juncava o chão com folhas, flores e com os próprios mantos, gritando: “Hosanna ao Filho de David! Bendito seja o que vem em nome do Senhor!” Aos que perguntavam quem era, respondiam “Este é Jesus, o profeta de Nazaré da Galileia”. No entanto, outros evangelistas afirmam que ele era um desconhecido em Jerusalém.

Disseram que Pilatos estava convencido da inocência de Jesus, razão porque teria tentado salvá-lo, abandonando-o logo a seguir, indefeso e moralmente arrasado.

João faz supor que Pilatos teria deixado matar a Jesus, temendo que denunciassem sua parcialidade ao imperador. Se ele não castigasse a um insurreto que se intitulara rei dos judeus, estaria traindo a César. No entanto, tal atitude por parte de Pilatos não combina com o seu retrato moral, pintado por Filon. Era um homem duro e tão desumano quanto Tibério. A vida de mais um ou menos um judeu, para ambos, era coisa da somenos importância. Filon faz de Pilatos um carrasco, e mostra que ele, em Jerusalém, agia com carta branca. Além disso, as reações de Pilatos com Tibério eram quase fraternais e ele era um delegado de absoluta confiança do imperador. Mas, como os Evangelhos foram compostos dentro dos muros de Roma, teriam de ser de modo a não desagradar às autoridades Imperiais. Pilatos foi posto nisso apenas porque os bens e a vida dos judeus estavam sob sua custódia. Entretanto, como a ocupação romana foi feita em defesa dos judeus ricos, contra os judeus pobres e os salteadores do deserto, as autoridades romanas temiam muito mais ao povo do que a Roma.

Além disso, muitas eram as razões para não gostarem de Pilatos nem de Herodes Antipas. Eles eram antipáticos aos judeus pobres, por isso teriam temido a ira popular. Esta é a razão apresentada pelos historiadores que levam a sério os Evangelhos, justificando assim o perdão do criminoso Bar Abbas e a condenação do inocente Jesus. Entretanto, se as legiões romanas realmente ali estivessem naquela época, nem Pilatos nem Herodes tomariam em consideração a opinião do povo, porque se sentiriam garantidos nos seus postos.

Além disso, a opinião popular é fator ainda bem novo na técnica de formação dos governos. Tudo o que sabemos é o que está nos Evangelhos. Jesus era um homem do povo e um dos que temiam o governo. Por isso é que em Marcos, 16:7 encontraremos Jesus aconselhando os discípulos a fuga. Em Lucas 10:4 Jesus está aconselhando aos discípulos a não falarem a ninguém em suas viagens.

Em Mateus 35:23 encontraremos Jesus reprovando os judeus que haviam assassinado Zacarias, filho de Baraquias, entre o adro do templo e o altar. A história, no entanto, afirma ser esse episódio imaginário. Flávio Josefo relata um acontecimento semelhante, registrado no ano 67, 34 anos após a pretensa morte de Jesus, referindo-se no caso a um homem chamado Baruch. Isto evidencia o descuido dos compiladores dos Evangelhos, que os compuseram sem levar em conta que, no futuro, as contradições neles encontradas seriam a prova da inautenticidade dos fatos relatados.

Nicodemos, que teria sido um fariseu rico, membro de Senedrin, homem de costumes morigerados e de boa-fé, não se fez cristão, apesar de ter agido em defesa de Jesus contra os próprios judeus. Por certo ele, como João Batista, não se convenceram da pretensa divindade de Jesus Cristo, nem mesmo se entusiasmaram com suas pregações.

Outra ficção evangélica é debitada a Paulo, o qual inventou um Apolo, que não figura entre os apóstolos e em nenhum outro relato. Em Atos dos Apóstolos 18, lê-se: “Veio de Éfeso um judeu de nome Apolo, de Alexandria, homem eloquente e muito douto nas Escrituras. Este era instruído no caminho do Senhor, falando com fervor de espírito, ensinando com diligência o que era de Jesus, e somente conhecia João Batista. Com grande veemência convencia publicamente os judeus, mostrando-lhes pelas Escrituras que Jesus era o Cristo”. Seria um judeu fiel ao judaísmo que, segundo Paulo, procurava levar seus próprios patrícios para o Cristo? Na epístola I aos Coríntios, diz que: “Apolo era igual a Jesus”.

Paulo, já no fim do seu apostolado, afirma que o imperador Agripa era um fariseu convicto, e que sua religião era a melhor que então existia. Era, assim, um divulgador do cristianismo afirmando a excelência do farisaísmo. Falando de Jesus, Paulo descreve apenas um personagem teológico e não histórico. Não se refere ao pai nem à mãe de Jesus, sendo um ser fantástico, uma encarnação da divindade que viera cumprir um sacrifício expiatório, mas não se reporta ao modo como teria sido possível a encarnação. Não diz sequer a data em que Jesus teria nascido. Não relata como nem quando foi crucificado. No entanto, estes dados têm muita importância para definir Jesus como homem ou como um ser sobrenatural. Está patente, desse modo, que Paulo é uma figura tão mitológica quanto o próprio Jesus.

Em Atos dos Apóstolos 28:15 e em 45 Paulo diz que, quando chegou a Pozzuoli, ele e os seus companheiros foram ali bem recebidos, havendo muita gente à beira da estrada esperando-os. Entretanto, chegando a Roma, teve de defender-se das acusações de haver ofendido em Jerusalém ao povo e aos ritos romanos.

Na Epístola aos Romanos 1:8 Paulo diz que a fé dos cristãos de Roma alcançara todo o mundo, razão porque encerraria sua missão tão logo regressasse da Espanha, onde saudaria um grande número de fiéis. Mas, se assim fosse, por que Paulo teve de se defender perante os cristãos de Roma, contra o seu próprio judaísmo?

Com pouco tempo Paulo já pensava encerrar sua missão porque o cristianismo já se universalizara. Entretanto, ele continuava considerando como melhor religião o farisaísmo. O cristianismo a que Paulo referia-se deveria ser anterior a Jesus Cristo, que era o seguido pelos cristãos de Roma, e não pelos cristãos dos lugares por onde Paulo havia passado pregando.

Eusébio disse que o cristianismo de Paulo era o terapeuta do Egito, e Tácito disse que os hebreus e os egípcios formavam uma só superstição.

Algumas Fontes do Cristianismo

O passado religioso do homem está repleto de deuses solares e redentores. Na índia, temos Vishnu, um deus que se reencarnou nove vezes para sofrer pelos pecados dos homens. No oitavo avatar foi Krishna e, no nono, Buda. Krishna foi igualmente um deus redentor, nascido de uma virgem pura e bela, chamada Devanaguy. Sua vinda messiânica foi predita com muita antecedência, conforme se vê no Atharva, no Vedangas e no Vedanta. O deus Vishnu teria aparecido a Lacmy, mãe da virgem Devanaguy, informando que a filha iria ter um filho-deus, e qual o nome que deveria dar-lhe. Mandou que não deixasse a filha casar-se, para que se cumprissem os desígnios de deus. Tal teria acontecido 3.500 anos a.C. no Palácio de Madura. O filho de Devanaguy destronaria seu tio. Para evitar que acontecesse o que estava anunciado, Devanaguy teria sido encerrada em uma torre, com guardas na porta. Mas, apesar de tudo, a profecia de Poulastrya cumpriu-se, “O espírito divino de Vishnu atravessou o muro e se uniu à sua amada”. Certa noite ouviu-se uma música celestial e uma luz iluminou a prisão, quando Viscohnu apareceu em toda a sua majestade e esplendor. O espírito e a luz de deus ofuscaram a virgem, encarnando-se. E ela concebeu. Uma forte ventania rompeu a muralha da prisão quando Krishna nasceu. A virgem foi arrebatada para Nanda, onde Krishna foi criado, lugar este ignorado do rajá.

Os pastores teriam recebido aviso celeste do nascimento de Krishna, e então teriam ido adorá-lo, levando-lhe presentes. Então o rajá mandou matar todas as criancinhas recém-nascidas, mas Krishna conseguiu escapar. Aos 16 anos, Krishna abandonou a família e saiu pela Índia pregando sua doutrina, ressuscitando os mortos e curando os doentes. Todo o mundo corria para vê-lo e ouvi-lo. E todos diziam: “Este é o redentor prometido a nossos pais”. Cercou-se de discípulos, aos quais falava por meio de parábolas, para que assim só eles pudessem continuar pregando suas ideias.

Certo dia os soldados quiseram matar Krishna, quando seus discípulos amedrontados fugiram. O Mestre repreendendo-os, e chamou-os de homens de pouca fé, com o que reagiram e expulsaram os soldados. Crendo que Krishna fosse uma das muitas transmigrações divinas, chamaram-no “Jazeu”, o nascido da fé. As mulheres do povo perfumavam-no e incensavam-no, adorando-o.

Chegando sua hora, Krishna foi para as margens do rio Ganges, entrando na água. De uma árvore, atiraram-lhe uma flecha que o matou. O assassino teria sido condenado a vagar pelo mundo. Quando os discípulos procuraram recolher o corpo, não o encontraram mais porque, então, já teria subido para o céu.

Depois Vishnu tê-lo-ia mandado novamente à terra pela nona vez, receberia o nome de Buda. O nascimento de Buda teria sido, igualmente, revelado em sonhos à sua mãe. Nasceu em um palácio, sendo filho de um príncipe hindu. Ao nascer, uma luz maravilhosa teria iluminado o mundo. Os cegos enxergaram, os surdos ouviram, os mudos falaram, os paralíticos andaram, os presos foram soltos e uma brisa agradável correu pelo mundo. A terra deu mais frutos, as flores ganharam mais cores e fragrância, levando ao céu um inebriante perfume. Espíritos protetores vigiaram o palácio, para que nada de mal acontecesse à mãe. Buda, logo ao nascer, pôs-se de pé maravilhando os presentes.

Uma estrela brilhante teria surgido no céu no dia do seu nascimento. Nasceu também, nesse mesmo dia, a árvore de Bó, a cuja sombra o menino deus descansaria. Entre os que foram ver Buda, estava um velho que, como Semeão, recebeu o dom da profecia. Sua tristeza seria não poder assistir à glória de Buda por ser muito velho.

Buda teria maravilhado os doutores da lei com a sua sabedoria. Com poucos anos de idade, teria começado sua pregação. Teria ficado durante 49 dias sob árvore de Bó, e sido tentado várias vezes pelo demônio. Pregando em Benares, convertera muita gente. O mais célebre de seus discursos recebeu o nome de “Sermão da Montanha”. Após sua morte apareceria também aos seus discípulos, trazendo a cabeça aureolada. Davadatta trai-lo-ia do mesmo modo que Judas a Jesus. Nada tendo escrito, os seus discípulos recolheriam os seus ensinamentos orais. Buda também tivera os seus discípulos prediletos, e seria um revoltado contra o poder abusivo dos sacerdotes bramânicos. Mais tarde, o budismo ficaria dividido em muitas seitas, como o cristianismo.

Quando missionários cristãos estiveram na índia, ficaram impressionados e começaram a perceber como nasceu o romance da vida de Jesus. O Papa do budismo, o Dalai-Lama, também se diz ser infalível.

Mitra, um deus redentor dos persas, foi o traço de união entre o cristianismo e o budismo. Cristo foi um novo avatar, destinado aos ocidentais. Mitra era o intermediário entre Ormuzd e o homem. Era chamado de Senhor e nasceu em uma gruta, no dia 25 de dezembro. Sua mãe também era virgem antes e depois do parto. Uma estrela teria surgido no Oriente, anunciando seu nascimento. Vieram os magos com presentes de incenso, ouro e mirra, e adoraram-no. Teria vivido e morrido como Jesus. Após a morte, a ressurreição em seguida.

Fírmico descreveu como era a cerimônia dos sacerdotes persas, carregando a imagem de Mitra em um andor pelas ruas, externando profunda dor por sua morte

Por outro lado, festejavam alegremente a ressurreição, acendendo os círios pascais e ungindo a imagem com perfumes. O Sumo Sacerdote gritava para os crentes que Mitra ressuscitara, indo para o céu para proteger a humanidade.

Os ritos do budismo, do mitraísmo e do cristianismo são muito semelhantes. Horus foi o deus solar e redentor dos egípcios. Horus, como os deuses já citados, também nasceria de uma virgem. O nascimento de Horus era festejado a 25 de dezembro.

Amenófis III criou um mito religioso, que depois foi adaptado ao cristianismo. Trata-se da anunciação, concepção, nascimento e adoração de Iath. Nas paredes do templo, em Luxor, encontram-se os referidos mistérios.

Baco, o deus do vinho, foi também um deus salvador. Teria feito muitos milagres, inclusive a transformação da água em vinho e a multiplicação dos peixes. Em criança, também quiseram matá-lo.

Adonis era festejado durante oito dias, sendo quatro de dor e quatro de alegria; as mulheres faziam as lamentações, como as carpideiras pagas de Portugal. O rito do Santo Sepulcro foi copiado do de Adonis. Apagavam todos os círios, ficando apenas um aceso, o qual representava a esperança da ressurreição. O círio aceso ficava semiescondido, só reaparecendo totalmente no momento da ressurreição, quando então o pranto das mulheres era substituído por uma grande alegria.

Também os fenícios, muitos milênios antes, já tinham o rito da paixão, do qual copiaram o rito da paixão de Cristo.

Todos os deuses redentores passaram pelo inferno, durante os três dias entre a morte e a ressurreição. Isto é o que teria acontecido com Baco, Osiris, Krishna, Mitra e Adonis. Nestes três dias, os crentes visitavam os seus defuntos, segundo Dupuis, em “L’ Origine des tous les cultes”.

Todos os deuses redentores eram também deuses-sol, como Átis, na Frígia; Balenho, entre os celtas; Joel, entre os germanos; Fo, entre os chineses.

Assim, antes de Jesus Cristo, o mundo já tivera inúmeros redentores. Com este ligeiro apanhado da mitologia dos deuses, deixamos patente a origem do romance do Gólgota. Acreditamos ter esclarecido quais as fontes onde os criadores do cristianismo foram buscar inspiração.

Jesus Cristo, uma Cópia Religiosa

O precedente estudo permite-nos constatar que, nas diversas épocas da história, as religiões transformam-se, variando em razão da complexidade cada vez maior das sociedades em que elas existem.

Vimos que a crença em um deus redentor é muito anterior ao judaísmo, sempre ligada à ânsia da necessidade de redenção das tremendas aflições do populacho. Quanto a Jesus Cristo, resultou de uma série de mitos, que os hebreus copiaram dos babilônicos, dos egípcios e de outros povos, visando com isto dar consistência ao judaísmo.

Estudos filológicos forneceram as bases para o estabelecimento de um traço de união entre as crenças dos deuses orientais e o judaísmo. Tomemos, por exemplo, as palavras Ahoura-Mazzda e Jeová, que significam “O que é”. Partindo de velhas lendas orientais, e baseando-se na origem comum da palavra, foi compilado o Gênese, numa tentativa de explicar a criação do mundo. Segundo o Zend-Avesta, o Ser Eterno criou o céu e a terra, o sol a lua, as estrelas, tudo em seis períodos, aparecendo o homem por último.

O descanso foi posto no sétimo dia. Manu havia ensinado, muito antes, que no começo tudo era trevas, quando Bhrama dispersou-as, criou e movimentou a água, em seguida produziu os deuses secundários, os anjos dirigidos por Mossura, os quais posteriormente rebelar-se-iam contra Deus. Veio então Shiva, e arrojou-os ao inferno. Shiva tornou-se a terceira pessoa da Santíssima Trindade Bhramânica em consequência das sucessivas invasões bárbaras sofridas pela Índia. Os bárbaros, crendo em Shiva, o deus da lascívia e do sensualismo, impuseram sua inclusão, com o que surgiu a trindade divina de Bhrama.

Manu ensinara igualmente que Deus criara o homem e a mulher, fazendo-os apenas inferior a Devas, isto é, Deus. O primeiro homem recebera o nome de Adima ou Adam, e a primeira mulher, Heva, significando o complemento da vida. Foram postos no paraíso celeste e receberam ordem de procriar. Deveriam adorar a Deus, não podendo sair do paraíso. Mas, um dia, indo ver o que havia fora dali, desapareceram. Bhrama perdoou-os, mas expulsou-os, condenando-os a trabalhar para viver. E disse que, por haverem desobedecido, a terra tornar-se-ia má, porque o espírito do mal dela se apoderara.

Entretanto, mandaria seu filho Vishnu que, se encarnando em uma virgem, redimiria a humanidade, libertando-a definitivamente do pecado da desobediência.

Ormuzd teria prometido ao primeiro casal humano que, se fossem bons, seriam felizes na terra. Mas Arimã mandou que um demônio em forma de serpente aconselhasse a desobedecerem a deus. Comeram os frutos que Arimã lhes deu, acabou a felicidade humana, e todos os que nascessem daí em diante seriam infelizes. Sendo levados cativos para a Babilônia, os judeus ali encontraram tal lenda. Libertos, voltando à Judeia, trouxeram essa crendice, como também a crença da imortalidade da alma e da vida futura, dos espíritos bons e espíritos maus, surgindo daí os anjos Gabriel, Miguel e Rafael, os querubins e serafins. Nasceu daí o mito do diabo, o anjo rebelado.

A palavra paraíso é o termo persa que significa jardim. Os persas, os hindus, os egípcios e os gregos criam no paraíso. Da mesma forma, todos eles criam no inferno. Entretanto, as crenças antigas desconheciam as penas eternas, que foram criadas pelo cristianismo, aliás, uma das poucas coisas originárias dessa crença. Também o purgatório, naturalmente, é outra novidade do cristianismo, sendo desconhecido do judaísmo. A ideia do purgatório vem de Platão, que havia dividido as almas em puras, curáveis e incuráveis.

Os filhos de Adima e Heva haviam-se tornado numerosos e maus. Por isso, Deus mandou o dilúvio para matá-los. Mas deu ordem a Vadasuata para construir um barco e nele entrar com a família, devido ao fato de ser um homem virtuoso. Deveria levar consigo, além da família, um casal de cada espécie de animal existente: esta é a história do dilúvio relatada nos Vedas, e que foi incluída na Bíblia dos cristãos.

As origens do cristianismo repousam, incontestavelmente, nas lendas e crenças dos deuses mitológicos, não apenas dos judeus, mas também de outros povos.

Os caldeus e os fenícios, como os judeus, haviam-se especializado no comércio, e por dever de ofício, alfabetizaram-se. Assim, sabendo ler e escrever, puderam copiar as lendas e o folclore dos povos com os quais comerciavam e conviviam, os quais puderam adquirir longevidade e fixar-se melhor na memória humana.

Sendo comerciantes por excelência, os judeus perceberam que a religião poderia tornar-se uma boa mercadoria, através da qual adviria o domínio de muitos povos e vontades. Desta forma, tendo compilado o que julgaram mais interessante ou mais proveitoso em relação aos seus propósitos, passaram a difundir pelo mundo as suas ideias religiosas. Com isto, o conhecimento e a razão foram substituídos pelas crendices e superstições religiosas.

Desde há muito a religião tem servido para moderar os impulsos humanos, sobretudo daqueles que pertencem a uma classe social menos favorecida.

Salientamos o prejuízo que o mundo tem sofrido com o rebaixamento mental imposto com as crenças e superstições religiosas, com o que o conhecimento sofre uma estagnação sensível.

No entanto, o homem tem-se deixado levar pelas crenças e práticas religiosas sem que nenhum benefício lhe advenha em retribuição. O homem tem feito tudo por si mesmo, apesar de sua religiosidade. A única classe beneficiada realmente com a religião é a dos sacerdote.

Retornamos ao assunto em pauta, após uma rápida digressão. A Bíblia cita dez patriarcas que teriam morrido em idade avançada, antes do dilúvio. Contudo, essa lenda provém da tradição caldáica, segundo a qual dez reis governaram durante 432 anos. Da mesma forma, as lendas hindus, egípcias, árabes, chinesas ou germânicas fazem referência a homens que teriam tido uma longa vida, como a do Matusalém da Bíblia.

Igualmente, a lenda de Abraão, que deveria sacrificar o seu filho Isaac, procede de lendas anteriores ao judaísmo. O livro das profecias hindus relata uma história igual. Ramatsariar conta que Adgitata, protegido de Bhrama, por ser um homem de bem, teve um filho que nasceu tão milagrosamente como Jesus. Entretanto, Bhrama, para experimentá-lo, ordena-lhe que sacrificasse o filho. Ele obedece, mas Bhrama impede-o no momento exato, seu filho seria o pai de uma virgem, a qual, por sua vez, seria a mãe de deus-homem.

José e a mulher de Putifar foi a cópia de uma velha lenda egípcia, conforme documentos recentemente traduzidos. Era uma história intitulada “Os dois irmãos”.

Emílio Bossi, relatando o achado, dá a palavra a Jacolliot: “Um homem da Índia fez leis políticas e religiosas; chamava-se Manu. Esse mesmo Manu foi o legislador egípcio, Manas. Um cretense vai ao Egito estudar as instituições que pretende dar ao seu pais, e a história confirma-nos isto dizendo que esse cretense foi Minos. Enfim, o libertador dos escravos judeus chamava-se Moisés, que teria recebido as leis das mãos do próprio Jeová. Temos, então, Manu, Manes, Minos e Moisés, os quatro nomes que predominaram no mundo antigo. Aparecem nos albores de quatro diversos povos para representar o mesmo papel, rodeados da mesma auréola misteriosa, os quatro são legisladores, grandes sacerdotes e fundadores das sociedades teocráticas e sacerdotais. Esses quatro nomes têm a mesma raiz sânscrita. O hinduismo deu origem ao judaísmo. Por isso, de Jeseu Krishna fizeram Jesus Cristo”.

Documentos recentemente estudados mostram terem sido os hindus os prováveis colonizadores do Egito. A documentação demonstra que o conhecimento nasceu do saber hindu.

A assiriologia mostra que a lenda de Moisés foi copiada da de Sargão I, rei acádio, que igualmente teria sido salvo em um cesto deixado no rio, à deriva.

A lenda de Sansão é outro exemplo. Sansão representa o sol. O poder que lhe foi atribuído é o mesmo dos deuses solares. E, assim, examinando os escritos de antigas civilizações, chegamos ao conhecimento das origens de tudo o que a Bíblia narra como fatos reais. Concluímos então que Jesus Cristo nada mais representa que uma cópia das lendas e mitos dos deuses adorados por povos os mais remotos e variados.

Os Deuses Redentores

Percebendo a importância da luz do sol sobre a terra, o homem imaginou que essa luz seria uma emanação protetora de Deus. Da ideia de que existia um único sol, surgiu o monoteísmo, isto é, a crença em um só Deus.

Das palavras Devv e Divv, que em sânscrito significam sol e luminoso, originou-se a palavra deus. Daí, em grego, a palavra Zeus; em latim, deo; para os irlandeses, dias; em italiano dio, etc.

A parte do tempo em que a terra recebe a luz do sol recebeu o nome dia em oposição ao período de trevas, a noite. O dia teria sido um presente divino, graças à luz solar. Conseguindo produzir o fogo, aumentou a crença humana no deus sol. Graças ao fogo, o homem pôde libertar-se de um dos seus maiores inimigos, que era o frio, assim como passou a cozinhar os seus alimentos. Devendo cada vez mais a vida ao calor, a gratidão do homem para com o sol cresceu ainda mais. Foi assim que nasceu o mito solar, do qual Jesus Cristo é o último rebento.

Por uma série de ilações, chegaram igualmente à concepção do significado místico da cruz. Dos raios solares foi criada uma cruz, espargindo raios por todos os lados. Da mesma forma foi a ideia do Espírito Santo, um espírito benfazejo, que irradia a bondade divina. Depois a sequência mística do sol, o fogo e o vento, dando origem a Salvitri, Agni e Vayu, do mito védico.

O rito védico celebra o nascimento de Salvitri, o deus-sol, em 25 de dezembro, no solstício, quando aparecem as refulgentes estrelas. As estrelas trazem a boa nova, a perspectiva de boas colheitas. Daí os sacrifícios e os ritos propiciatórios oferecidos ao deus-sol.

Assim os cristãos encontraram o seu Jesus Cristo.

A vida dos deuses redentores é a vida do sol. Por isso, todos eles tiveram suas datas de nascimento fixadas em 25 de dezembro: Mitra, Horus e Jesus Cristo. Também é simbólica a ressurreição na primavera, tempo da germinação e das folhas novas. Baseando-se nisto, Aristóteles e Platão admitiram uma certa racionalidade dos que adoravam o sol.

Heródoto e Estrabão diziam que Mitra era o deus-sol, tendo por emblema um sol radiante. Plutarco conta que o culto de Mitra veio para a Sicília trazido pelos piratas do mar. Em escavações feitas no solo italiano, foram encontradas placas de barro solidificados ao sol trazendo esta inscrição: “Deo Soli Invicto Mitrae”, lembrando o deus dos persas.

Niceto escreveu que certos povos adoraram a Mitra como o deus do fogo, outros como sendo o deus-sol.

Júlio Fírmino Materno disse que Mitra era a personificação do deus fogo, enquanto Aquelau considerava-o o deus-sol.

São Paulino descreveu os mistérios de Mitra como sendo os de um deus solar e redentor. Karneki, rei hindo-escita, no começo de nossa era, mandou cunhar moedas em que se vê a efígie de Mitra dentro de um sol radiante. Mitra ainda era representado com um disco solar na cabeça, segurando um globo com a mão esquerda. Do mesmo modo os cristãos representam Jesus Cristo. Era o Senhor. Ao surgir o cristianismo, os cristãos primitivos ainda chamavam o sol de “Dominus”, com o que, lentamente, foi absorvendo o ritual mitráico.

No Egito, o sol era o “Pai Celestial”. Um obelisco trazido para o Circo Máximo de Roma trazia esta inscrição: “O grande Deus, o justo Deus, o todo esplendente”, tendo um sol espargindo seus raios para todos os lados.

Da mesma forma, todos os deuses dos índios americanos pertenciam ao rito solar, assim como os deuses dos hindus, dos chineses e japoneses. Os caldeus, adorando o sol como seu deus, dedicaram-lhe a cidade de Sípara, onde ardia o fogo sagrado, eternamente, em sua honra. Em Edessa e em Palmira foram encontrados templos dedicados ao deus-sol. Orfeu considerava o sol como sendo o deus maior. Agamenon disse que o sol era o deus que tudo via e de que tudo provinha.

Os judeus e os líderes do cristianismo, para a formação deste, só tiveram de adaptar as crenças e rituais antigos a um novo personagem: Jesus Cristo. Toda a roupagem necessária para vestir o novo deus preexistia. Apenas fazia-se necessário amoldá-la um pouco.

Jesus Cristo É um Mito Solar

Tendo em vista o completo silêncio histórico a respeito de Jesus Cristo, bem como as evidentes ligações deste com o mito dos deuses-solares, Dupuis escreveu o seguinte: “Um deus nascido de uma virgem, no solstício do inverno, que ressuscita na Páscoa, no equinócio da primavera, depois de haver descido ao inferno; um deus que leva atrás de si doze apóstolos, correspondentes às doze constelações; que põe o homem sob o império da luz, não pode ser mais que um deus solar, copiado de tantos outros deuses heliosísticos em que abundavam as religiões orientais. No céu da esfera armilar dos magos e dos caldeus via-se um menino colocado entre os braços de uma virgem celestial, a que Eratóstenes dá como Ísis, mãe de Horus. Seu nascimento foi a 25 de dezembro. Era a virgem das constelações zodiacais. Graças aos raios solares, a virgem pôde ser mãe sem deixar de ser virgem… Via-se uma jovem ‘Seclanidas de Darzana’, que em árabe é ‘Adrenadefa’, e significa virgem pura, casta, imaculada e bela… Está assentada e dá de mamar a um filho que alguns chamam de Jesus e, nós, de Cristo”.

Já vimos que Jesus repete todos os mistérios dos deuses solares e redentores, pelo que Heródoto, Plutarco, Lactâncio e Firmico puderam afirmar que esse deus redentor é o sol. De modo que Jesus é apenas mais um deus solar.

Ainda hoje, grande parte do rito cristão é de origem solar. Na Bíblia, encontramos estas palavras: “Deus estabeleceu sua tenda no sol”, e ainda: “Sobre vós que temeis o meu nome, levantar-se-á o sol da justiça e vossa vida estará em seus raios”.

João diz que “o verbo é a lei, a luz e a vida, a luz que Ilumina a vista de todos os mortais, a luz do mundo”. E ainda chama a Jesus de o “cordeiro”, o “Agnus Dei qui tollit peccata mundi”. Com isto, o Apocalipse fez de Jesus o “cordeiro pascal”, e a Igreja adorou-o sob a forma de um cordeiro até o ano de 680. Era o Cristo o Áries zodiacal, vindo de Agnus, com a significação de fogo, o sol condensado.

Origenes justificava a adoração do sol tendo em vista a sua luz sensível e também pelo aspecto espiritual.

Tertuliano reconheceu que o dogma da ressurreição tem sua origem na religião persa de Mitra. Para S. Crisóstomo, Jesus era o sol da justiça, para Sinésio, o sol intelectual. Fírmico Materno descreveu Jesus baixando ao inferno, esplendente como o sol.

O domingo, o dia do Senhor, o dia do descanso, procede de Dominus, o deus-sol, o Senhor.

Segundo Teodoro e Cirilo, para o maniqueus Cristo era o sol. Os Saturnilianos acreditavam que a alma tinha substância solar, deixando o corpo e voltando para o sol, de onde proviera, após a morte.

O antigo rito do batismo determinava que o catecúmeno voltasse o rosto em primeiro lugar para o ocidente, para retirar de si a satanás, símbolo das trevas.

Igualmente, as festas do sábado santo são reminiscências do mito da luta do sol contra as trevas, na Páscoa. As orações desse ofício são cópia dos hinos védicos. A palavra aleluia, que era o grito de alegria dos persas, adoradores do sol, quando na Páscoa festejavam a sua volta, significa: elevado e brilhante.

Foram necessários muitos séculos para que a igreja pudesse alienar um pouco do que lembrava que o seu culto era de um deus solar. Entretanto, a história escrita é inflexível, e demonstra que todos os deuses redentores ou solares foram tão adorados quanto o mitológico Jesus Cristo. E embora tenha havido longas fases em que foram impostos a ferro e fogo, nem por isto deixaram de cair, nada mais sendo hoje do que o pó do passado religioso do homem.

O certo é que Jesus Cristo é mitológico de origem, natureza e significação. O seu surgimento ocorreu para atender à tendência religiosa e mística da maioria, que ainda hoje teme as realidades da vida e, portanto, procura, para orientar-se, algo fora da esfera humana, na esperança de assim conseguir superar a si mesmo e aos obstáculos que surgem quotidianamente.

O cristianismo é produto de tendências naturais de uma época, aproveitadas espertamente pelos líderes do cristianismo. O judeu pobre e oprimido, não tendo para quem apelar, passou a esperar de Deus aquilo que o seu semelhante lhe negava. O sacerdote, valendo-se do deplorável estado de espírito de uma população faminta e, sobretudo, desesperançada, ressuscitou um dentre os velhos deuses para restaurar a esperança do povo judeu. E, assim, surgiu mais um mito solar, mais um deus com todos os atributos divinos, tal como os que antecederam. O novo deus solar em questão é Jesus Cristo.

Outras Fontes do Cristianismo

Conforme temos dito repetidas vezes, o cristianismo tomou por empréstimo tudo quanto se fez necessário à sua formação. Assim, todos os ensinamentos atribuídos a Cristo foram copiados dos povos com os quais os judeus tiveram convivência. A sua moral, a moral que Cristo teria ensinado, aprendeu-a com os filósofos que o antecederam em muitos séculos.

De sorte que não há inovações em nenhum setor ou aspecto do cristianismo. Antigos povos, milênios antes, adoraram seus deuses semelhantemente.

Dentre as máximas adotadas pelo cristianismo, comentaremos a seguinte: “Não faças aos outros o que não queres que a ti seja feito”. Este ensinamento não teria partido de Jesus, conforme pretendem os cristãos, não sendo sequer uma máxima cristã, originariamente.

Encontrá-la-emos em Confúcio, e ainda no bramanismo, no budismo e no mazdeismo, fundado por Zoroastro. Era uma orientação filosófica e religiosa, adotada pelos hindus. A originalidade do cristianismo consistiu apenas em criar as penas eternas, um absurdo desumano e irracional. Enquanto isso, o mazdeismo cria a possibilidade de regeneração do pior bandido, admitindo mesmo a sua plena reintegração no seio da sociedade.

O perdão aos inimigos foi, muito antes de Jesus, aconselhado por Pitágoras. Os egípcios religiosos praticavam uma moral muito elevada. No “Livro dos Mortos” encontramos a confissão negativa, de acordo com a qual a alma do morto comparecia ante o tribunal de Osiris e proferia em alta voz as suas más ações.

O sentimento de igualdade e fraternidade para com os homens foi ensinado por Filon. O cristianismo adotou os seus ensinamentos, atribuindo-os a Jesus. São de Filon as seguintes palavras: “Os que exaltam as grandezas do mundo como sendo um bem, devem ser reprimidos.”; “A distinção humana está na inteligência e na justiça, embora partam do nosso escravo, comprado com o nosso dinheiro.”; “Porque hás de ser sempre orgulhoso e te achares superior aos outros?”; “Quem te trouxe ao mundo? Nu vieste, nu morrerás, não recebendo de Deus senão o tempo entre o nascimento e a morte, para que o apliques na concórdia e na justiça, repudiando todos os vícios e todas as qualidades que tornam o homem um animal”; “A boa vontade e o amor entre os homens são a fonte de todos os bens que podem existir”. Como vemos, não há nada de novo no cristianismo.

Platão salientou a felicidade que existe na prática da virtude. Ensinou a tolerância à injúria e aos maus tratos, e condenou o suicídio. Recomendou o humanismo, a castidade e o pudor, e condenou a volúpia, a vingança e o apego demasiado aos bens. Sua moral baseou-se na exaltação da alma, no desprezo dos sentidos e na vida contemplativa. O Padre Nosso foi copiado de Platão. Quem conhece bem a obra de Platão percebe os traços comuns entre a mesma e o cristianismo. Filon inspirou-se em Platão e, a Igreja, na obra de Filon, que helenizou o judaísmo.

Aristóteles afirmou que a comunidade repousa no amor e na justiça. Admitia a escravatura, mas libertou os seus escravos. Poderiam existir escravos, mas não a seu serviço. A comunidade deveria instruir a todos, independentemente da classe social, com o que ensinou o evangelho aos Evangelhos.

A abolição do sacrifício sangrento não foi introduzida pelo cristianismo. Não lhe cabe tal mérito. Gélon, da Sicília, firmando a paz com os cartagineses, estipulou como condição a supressão do sacrifício de vidas animais aos seus deuses.

Sêneca aconselhava o domínio das paixões, a insensibilidade à dor e ao prazer. Recomendava igualmente a indulgência para com os escravos, dizendo que todos os homens são iguais. Referia-se ao céu como fazem os cristãos, afirmando que todos são filhos de um mesmo pai. Concebia como pátria o Universo. Os homens deveriam se ajudar e se amar mutuamente. Enquanto isso, o humanismo cristão limitou-se apenas aos irmãos de fé. O bem visa somente a salvação da alma, o que é egoísmo, nunca humanismo. Sêneca manifestou-se contrário à pena de morte; o cristianismo, ao contrario, é responsável por inúmeras execuções. Admitia a tolerância mesmo em face da culpa. Em vez de perseguir e punir, por que não persuadir, ensinar e converter?

Epíteto e Marco Aurélio foram bons professores dos cristãos. Os filósofos greco-romanos foram grandes mestres da moral cristã e da consolação, sem que para isto criassem empresas, negócios ou castas. O cristianismo existente antes de Jesus Cristo já pregava a moral anterior ao martírio do Gólgota. A moral cristã não veio de Jesus Cristo nem dos Evangelhos, mas nasceu da tendência natural para o aperfeiçoamento do homem. Não fosse a destruição sistemática de antigas bibliotecas, determinada pelo clero no intuito de preservar os seus escusos interesses, hoje seria possível patentear com documentos à mão que a moral anterior à cristã era bem melhor do que esta, tendo-lhe servido de modelo. Assim, vê-se que a moral jamais foi patrimônio de castas ou de indivíduos, sendo uma lenta conquista da humanidade, com ou sem religião, e mesmo contra ela. Por isso é que o mundo racionaliza-se continuamente, e avança sempre no sentido do seu aperfeiçoamento. A bondade humana independe da ideia religiosa. A razão ensina-nos o que devemos ao nosso meio social, independentemente da fé e da religião. Para justificar o aparecimento de Jesus, fez-se necessário recorrer a uma moral que, no entanto, já era um patrimônio da humanidade. Jesus nada mais foi do que a materialização de qualidades que já existiam. Por isso, mesmo em moral, Jesus foi ator, não autor. O cristianismo apenas sistematizou e industrializou essa velha moral, estabelecendo-a como um rendoso comércio. A Igreja é responsável pela deturpação dessa moral. Havia a moral pela moral, que foi substituída pela moral bíblica, em que só se é bom para ganhar o céu.

Superpondo-se um grupo empresarialmente forte, extinguiu-se a moral individual.

Judaísmo e Cristianismo

Pesquisas recentes e estudos comparados têm demonstrado que a mitologia judaico-cristã é bem anterior ao próprio judaísmo, quando se percebe que dogmas como o da imortalidade da alma, da ressurreição e do Verbo encarnado são muito anteriores ao cristianismo.

A imortalidade da alma já era multimilenar quando os judeus foram levados cativos para a Babilônia. Zoroastro ensinara, muito antes, ser a alma imortal, e que essa imortalidade seria produto de uma opção humana. O livre arbítrio levaria o homem a escolher uma vida que o levaria ou não à imortalidade. O erro e o mal produziriam a morte definitiva, a prática do bem, a imortalidade.

Do mesmo modo, na Ciropédia, bem anterior a Zoroastro, lê-se que Ciro, moribundo, disse: “Não creio que a alma que vive em um corpo mortal se extinga desde que saia dele, e que a capacidade de pensar desapareça apenas porque deixou o corpo que não tem como pensar por si mesmo”. Por outro lado Einstein, pouco antes de morrer, declarou não crer que algo sobrasse do ser vivo após a morte.

Os egípcios, os hindus, os sumérios, os hititas e os fenícios criam na imortalidade da alma.

A ressurreição foi um dos fundamentos do Zend-Avesta. Zoroastro também ensinou que o fim do mundo seria precedido por um grande acontecimento, a ser predito por profetas. Os persas tiveram os seus profetas, que foram Ascedermani e Ascerdemat, os quais passaram à Bíblia sob os novos nomes de Enock e Elias, entidades míticas, como se vê. Desses mitos surgiram o Talmude e os Evangelhos, o que mostra que, em religião, a ideia original pertence à noite dos tempos.

A doutrina do Verbo já era antiqüíssima no Egito. Deus teria gerado Kneph — a palavra, o Verbo —, que é igual ao pai. Da união de Deus com o Verbo nasceu o fogo, a vida, Fta, a vida de todos os seres.

O monoteísmo e a Santíssima Trindade eram crenças muito antigas na Índia. Os deuses únicos e os deuses secundários são uma velha doutrina oriental. A religião greco-romana já possuía o seu Apolo e Zeus, acolitados por uma porção de deuses secundários. Essas velhas lendas deram origem ao Deus do cristianismo, com toda sua corte de santos e anjos. O politeísmo de há muito vinha caminhando para o monoteísmo. Os gregos já haviam concebido a ideia de um intermediário entre os homens e Júpiter, que era Apolo, tendo-se encarnado para redimir os homens.

Porfírio citou o seguinte oráculo de Serapis: “Deus é antes e depois e ao mesmo tempo, é o Verbo e o Espírito, como um e outro”.

O mundo antigo cria em um Deus único, pai de todas as coisas, afirmou Máximo de Tiro. O povo então já dizia: Deus o sabe! Deus o quer! Deus o abençoe! Os oráculos só se referiam a Deus e não aos deuses.

Os apologistas do cristianismo, tais como Eusébio, Agostinho, Lactâncio, Justino, Atanásio e muitos outros, ensinavam que unidade de Deus era conhecida desde a mais remota antiguidade. Os órficos, inclusive, admitiam-na.

Na Bíblia, ao ser traduzido para o grego e para o latim, o nome de Deus passou a ser muitas vezes Senhor, Dominus, para ficar conforme o nome do Deus-sol do mitraísmo.

O amor a Deus foi a base de todas as religiões copiadas pelo judaísmo. Isaías falava de Deus como Pai Celestial. Ezequiel dizia que Deus não queria a morte do pecador, preferindo antes a sua conversão. O justo viverá eternamente pela fé. São palavras de Habacuc, repetidas por Paulo em Gálatas 3:2.

Como vimos, a doutrina do Verbo vem de Platão, tendo sido este o intermediário entre os metafísicos e os cristãos. Foi ele quem concebeu a ideia da separação do corpo e da alma, e pôs aquele na dependência desta. Na sua opinião, a terra era o desterro da alma. Foi o criador do sistema filosófico da decadência moral do homem, fazendo dos sentidos uma ameaça, do mundo um mal, e da eternidade o delírio, o sonho.

Cícero e Sêneca tinham ideias cristãs, mas não conheceram a Jesus Cristo nem ao cristianismo. Agostinho leu as obras de Cícero e trocou o maniqueísmo pelo cristianismo. A Igreja procurou destruir as principais obras de Cícero e de Sêneca para que a posteridade não percebesse que eles não tinham sido cristãos seguidores de Cristo, mas apenas que as suas ideias coincidiam com as que o cristianismo esposou.

O cristianismo nasceu da helenização do judaísmo. Os cristãos terapeutas abandonaram o judaísmo ortodoxo porque este tinha posto de lado o culto nacional do templo e o sacrifício Pascal, retirando-se para uma vida contemplativa nos montes, longe dos homens e dos negócios. Estabeleceram uma sociedade comunal, considerando o casamento um apego à carne, um empecilho à salvação da alma, com o que proscreveram os principais prazeres da vida, exaltando o celibato e a pobreza, como os essênios, além de aconselhar a caridade.

Eusébio chamou aos terapeutas de cristãos sem Cristo. Para ele, um terapeuta era um autêntico cristão. Isto levou Strauss a escrever: “Os terapeutas, os essênios e os cristãos dão sempre muito o que pensar”.

A doutrina dos essênios, a moral dos terapeutas, a encarnação do Verbo, vinda do judaísmo helenizado, é o cristianismo de Filon. Desse modo, Filon foi criador do cristianismo, sem o saber. Ele refere-se ao Verbo nos termos da mitologia egípcia, sem, contudo, mencionar a crença em Jesus Cristo.

Salomão fez da sabedoria divina a criação. O Livro da Sabedoria define a natureza desse principio intermediário, transformando o pensamento vago do rei judeu sobre a sabedoria da doutrina do Verbo.

Sirac, em “Eclesiástico”, faz a doutrina do Verbo ser mais precisa: “A sabedoria vem de Deus, estando sempre com ele. Foi criada antes de todas as coisas. A voz da inteligência existe desde o principio. O Verbo de Deus, no mais alto do céu, é a fonte da sabedora”! Filon disse que o Verbo se fizera humano. Segundo ele, Deus era infalível e inacessível à inteligência humana, não nos alcançando senão pela graça divina. Para ele, ainda, o Verbo não era apenas a palavra, mas a imagem visível de Deus. O Verbo seria o Ungido do Senhor, o ideal da natureza, o Adão Celeste, é a doutrina da encarnação do Verbo, tomando a forma humana. O Verbo é o intermediário entre Deus e os homens. Diz ainda que o Verbo é o pão da vida. Por ai vemos que não foi o Cristo o criador do cristianismo, mas este é que o criou.

Clemente de Alexandria, Origenes ou Paulo, assim como os primeiros padres do cristianismo, jamais se referiram a Jesus Cristo como tendo sido um homem que tivesse caminhado do Horto ao Gólgota, mas tiveram-no apenas como o Verbo, conforme a doutrina de Platão e de Filon.

O Cristianismo sem Jesus Cristo

Está patente a existência do cristianismo sem Cristo. A existência do clero, por outro lado, foi uma exigência bramânica. Pregando por meio de parábolas, os sacerdotes faziam-se necessários para esclarecer o sentido das mesmas. Justifica-se, assim, o pagamento com as esmolas dos crentes. Ensinavam a religião e apoderavam-se do dinheiro. Suas terras e os templos já eram isentos dos impostos. O sumo-sacerdote não se casava e era venerado como um deus.

No budismo, tanto os bonzos como os mosteiros são mantidos pela comunidade, e os monges, igualmente, não se casam. O Dalai-Lama é o Vigário de Deus, o sucessor de Fó, sendo Infalível como o Papa se diz ser. Nos mosteiros todos se chamam de irmãos.

O clero persa era dividido em ordens hierárquicas, e tinha o direito a um décimo da renda da comunidade. Os magos persas, como os profetas judeus, eram puros e não trabalhavam.

No Egito, a classe mais alta era a dos sacerdotes. Elegiam o rei e limitavam a sua ação. O povo arrendava as terras do templo. Só o clero ensinava a religião e presidia aos sacrifícios. O regime era teocrata e todos tinham de submeter-se às regras eclesiásticas. O sacerdote era o adivinho, fazia os oráculos, as profecias, os sortilégios e os exorcismos. Afirmava ter força sobre a natureza, para o bem da humanidade.

Os brâmanes procuravam afugentar os malefícios e as maldições. Para isto, cultivam certas plantas, como o lótus e o cânhamo, das quais faziam licores como o “amrita”, que possuía virtudes milagrosas. Tinham as mesmas modalidades de expiação ainda hoje adotadas pelo cristianismo.

As mortificações hindus são as mesmas praticadas pelos cristãos medievais. Certos crentes carregaram durante toda a vida enormes colares de ferro, outros, pesadas correntes de ferro. Alguns se marcavam com o ferro em brasa, avivando a ferida todos os dias. Muitos vão rolando deitados até Benares, pagar ali suas promessas. Também usam sandálias cravadas de finos pregos, os quais entram pelas solas dos pés.

No Egito, os sacerdotes de Ísis açoitavam-se em sua honra, expiando, com isso, suas próprias culpas e as do povo.

Entre os gregos havia a água lustral para as expiações e para as propiciações. Os sacerdotes de Dodona feriam-se e os de Diana praticavam tais coisas em seus corpos, que às vezes punham em perigo a própria vida.

Os romanos procuravam livrar-se das calamidades públicas oferecendo aos seus deuses sacrifícios humanos. Os Indostânicos tornavam-se celibatários, pediam esmolas, jejuavam e isolavam-se do convívio com outras Pessoas.

No budismo, as crianças eram ensinadas a fazer votos de castidade. O governo concedia honras especiais ao que chegavam aos 40 anos castos. No Egito, existiam mosteiros apropriados para os que faziam votos de castidade. Também os sacerdotes de Baco, na Grécia, faziam tais votos. Os sacerdotes de Cibele eram castos e castrados. Em Roma, as vestais viviam em mosteiros, indo para eles até aos seis anos de idade, e juravam não deixar extinguir-se o fogo sagrado e manterem-se virgens. A que faltasse ao juramento seria enterrada viva e, o amante, condenado à morte.

Os budistas consagravam o pão e o vinho, representando o corpo e o sangue de Agni, quando os bonzos aspergiam os crentes. Enquanto aspergem água lustral, cantam hinos ao sol e ao Fogo, o “Kirie Eleison” que os católicos copiaram e cantam ou recitam durante a missa. Inicialmente o sacrifício constava da imolação de uma pessoa, a qual posteriormente foi substituída pela hóstia. Tal como o padre católico, o sacerdote budista também lava as mãos antes das libações. A cerimônia budista é em tudo semelhante à missa da Igreja Católica.

Os persas tinham, em seus ritos religiosos, a eucaristia, ou seja, a mesma oferenda do pão e do vinho que também consta do ritual da missa, bem como o Pater Noster, o Credo e o Confiteor.

Na Grécia, rezava-se pela manhã e à noite. Os etruscos juntavam as mãos quando oravam. Também a confissão lá era praticada pelos persas. O ritual do catolicismo tem muito do ritual mitraico, assim como a vestimenta dos sacerdotes católicos foi copiada do figurino dos sacerdotes de Mitra.

Muitas das religiões pré-cristãs já festejavam a Páscoa e a Natividade. Os persas inclusive dedicaram um dia aos mortos. E, no dia em que o filho começava a receber instrução religiosa, havia festa na casa dos pais.

Entre os gregos, cada dia da semana era dedicado a um deus.

Os Hindus viviam peregrinando de um templo para outro. Criam na existência de dias bons e dias maus, como também em sortilégios e malefícios. Cada pessoa era dedicada a um anjo que a protegia desde o nascimento. Benziam as vacas, os instrumentos agrícolas e animais domésticos.

A história do passado religioso do homem está repleta de virgens puras e belas, que são as mães dos deuses. Maria, mãe de Jesus Cristo, é apenas mais uma dentre tantas outras.

Igualmente, as procissões constituem práticas multimilenares. É antiquíssima tal modalidade de culto. Juno e Diana passearam em andores durante muitos séculos. As cidades sempre se enfeitaram à passagem dos santos e dos deuses.

Por aí vemos que nem Jesus nem o cristianismo têm nada de original. A veneração das imagens já era muito anterior ao cristianismo. Por outro lado, o judaísmo, que as baniu, não foi, entretanto, o primeiro a tomar tal atitude. Plutarco disse que os tebanos não as usavam, assim como Numa Pompílio proibiu os romanos de usarem-nas, durante o seu governo. O batismo era uma cerimônia praticada pelos antigos muito antes de se cogitar, sequer, do nome de cristão. Os hindus lavam o recém-nascido em água lustral, dando-lhe um nome de um gênio protetor. Aos oito anos, a criança aprende a recitar os hinos ao Deus-Sol. A extrema-unção também, de há muito antes do cristianismo, era praticada pelos hindus.

Copiando detalhes dos ritos e cultos de uma grande variedade de seitas, o cristianismo constituiu o seu próprio ritual, tudo girando em torno do Deus-Sol, no qual, por fim, vestiram a roupa de Jesus Cristo.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

UFC (Unidade da Fé Cristã) Crossan X Craig


O Credo niceno afirma:

Cremos em um só Deus, Pai, Todo-Poderoso,

Criador do céu e da terra, de todas as coisas, visíveis e invisíveis.

Cremos em um só Senhor, Jesus Cristo, Filho unigênito de Deus,

gerado do Pai antes de todos os séculos, Deus de Deus, Luz da luz,

verdadeiro Deus de verdadeiro Deus, gerado, não criado,

de uma só substância com o Pai.

Por ele todas as coisas foram feitas [...]

pelo poder do Espírito Santo se encarnou,

no seio da Virgem Maria,

e se fez homem.

Por nós foi crucificado sob Pôncio Pilatos;

padeceu a morte e foi sepultado.

Ressuscitou dos mortos ao terceiro dia, conforme as Escrituras;

e subiu aos céus, onde está assentado à direita do Pai.

Como devemos entender esse credo que, em si, é uma tentativa de expressar o cerne da fé cristã — o “cristianismo puro e simples”, como disse C. S. Lewis?

O nascimento virginal e a encarnação (“se encarnou, no seio da Virgem Maria”), a crucificação de Jesus (“Por nós foi crucificado”) e a ressurreição física (“Ressuscitou dos mortos ao terceiro dia”) devem todos ser considerados fatos realmente his­tóricos, ocorridos no espaço-tempo? Ou são de algum modo mitológicos ou metafóricos, por expressarem verdades mais profundas e supra-históricas?

Em sua obra Metaphor of God incarnate [A metáfora do Deus encarnado], John Hick, filósofo da religião, recomenda a segunda abordagem. Somente tal visão faz sentido à luz da nova consciência global, o que deve despertar em nós uma consciência sensível a outras crenças e culturas. Desse modo, devemos falar de encarnação somente no sentido de que Jesus, em sua acessibilidade e receptividade à vontade de Deus, encarnou o amor divino por meio de seu próprio amor altruísta.

Em contrapartida, cristãos de todos os séculos consideram o nascimento virginal, a encarnação, a expiação e a ressurreição fatos reais e históricos. O Credo Niceno serviu de padrão para a igreja defi­nir aquilo em que o cristão deve crer. Rejeitar suas declarações, fun­damentais para o cristianismo, era chamar anátema sobre si mesmo, ser rotulado de herege. Essa era uma das conseqüências de eliminar da história a fé cristã. De fato, se as doutrinas do credo são mitos ou metáforas, então a fé cristã, crida há séculos, fica enfraquecida: “E, se Cristo não ressuscitou, a vossa fé é inútil e ainda estais nos vossos pecados” (1Co 15.17).

Até uma época relativamente recente, os cristãos acreditavam não haver separação entre o Jesus da história e o Cristo da fé. Era tido como certo que o segundo dependia do primeiro. Contudo, no decorrer dos últimos duzentos anos ou mais, cristãos tradicionais tiveram de contender com um suposto desencontro entre o Jesus da história e o Cristo da fé. A íntima ligação entre o Jesus da história e o Cristo da fé resume o tema principal deste livro, ideia que toma a forma de uma discussão entre teólogos conservadores e liberais — entre os proponentes da posição evangélica ortodoxa e os parti­cipantes do Jesus Seminar [Seminário Jesus] — sobre a identidade do verdadeiro Jesus. Embora eu me sinta à vontade com o primeiro grupo, estou convencido da necessidade de interação entre pontos de vista opostos ou diversos. Normalmente precisamos dos opo­nentes intelectuais para ser levados a pensar mais claramente sobre nossa própria posição — e para nos afastarmos das caricaturas ou dos estereótipos.

O Cristo da fé e o Jesus da história

Antes de entrarmos em questões específicas, convém fornecer um breve panorama histórico. No decorrer dos últimos duzentos anos, três personagens moldaram significativamente o debate que cerca a distinção entre o Jesus da história e o Cristo da fé: David Friedrich Strauss, Martin Kähler e Rudolf Bultmann. Strauss (1808-1874) foi o primeiro a fazer distinção entre teologia e história, entre o Cristo da fé e o Jesus da história.

Strauss tentou enfraquecer a com­preensão sobrenatural dos Evangelhos em sua obra Das Leben Jesu, kritisch bearbeitet, publicada originalmente em 1835 e mais tarde traduzida para o inglês pelo romancista George Eliot. A visão tradi­cional de Jesus como o Deus-homem dos milagres dos Evangelhos pertencia à categoria do mito. Esses mitos, embora expressassem ideias importantes, não deveriam ser considerados fatos históricos no espaço-tempo. Se possível, deveriam ser esmiuçados com o obje­tivo de adequadamente remontar o Jesus histórico. Strauss sustentava que, se admitirmos o ponto de vista mítico, “desaparecem”, então, em um só golpe, “as inúmeras discrepâncias e contradições cronológicas das histórias do Evangelho, incapazes de jamais ser harmoni­zadas de outra forma”.

Na visão de Strauss, os Evangelhos “apresentam verdades religiosas, não históricas”. Ainda que essas verdades religiosas possam ter relação com a história, não devem ser avaliadas como história formal. Ao usar o termo mito, Strauss quis dizer que os fatos registrados não haviam acontecido de verdade, mas representavam as crenças da igreja primitiva projetadas retroativamente.

Naturalmente, o pensamento de Strauss não surgiu do nada. O racionalismo iluminista e a tese de G. W. F. Hegel sobre a revelação gradual da história influen­ciaram seu pensamento de maneira significativa. Anteriormente, Hermann Samuel Reimarus (falecido em 1768) lançara a busca pelo Jesus histórico, argumentando que Jesus tentou estabelecer um reino messiânico terreno, mas morreu desiludido e aban­donado por Deus. Temos aqui os primórdios de uma distinção entre o Cristo dos Evangelhos e o Jesus da história. Com Strauss, porém, essa demarcação se tornaria bastante clara.

Ou seja, a origem das verda­des teológicas sobre Cristo não deve ser encontrada na história, mas na construção feita pela igreja primitiva dos mitos a ele relacionados. De acordo com Strauss, “essas narrativas, como todas as outras lendas, foram montadas por estágios, por meio de passos cujos rastros não podem mais ser seguidos; gradualmente adquiriram coerência e, após muito tempo, receberam forma fixa nos Evangelhos escritos”.

No período entre a formação da primeira comunidade cristã e a criação dos Evangelhos ocorreu a “transferência para Jesus das lendas messiânicas, quase todas já formadas”.8 Dessa forma, pouquíssimos mitos dos Evangelhos eram “inteiramente novos”. Foram o resultado de uma “onda de entusiasmo religioso” que compensava a “conhecida carência religiosa do período [i.e., a Palestina do primeiro século]”. Strauss concluiu que a causa de tal entusiasmo não deve necessariamente ser atribuída aos milagres do Evangelho.

Em Strauss, portanto, vemos um enorme abismo entre fé e histó­ria. Para ele, no fundo, o Jesus da história e o Cristo da fé nem mesmo remotamente correspondem um ao outro, como era tradicionalmente aceito. Por sinal, Strauss considerava sua visão de que a Bíblia contém mitos “diretamente oposta às convicções do crente cristão”.

Depois de Strauss, essa bifurcação da história e da fé foi levada adiante basicamente por Martin Kähler (1835-1912). Em 1896, Kähler escreveu um pequeno livro intitulado The so-called historical Jesus and the historic, biblical Christ [O chamado Jesus histórico e o Cristo bíblico e histórico], que teve influência significativa sobre a cristologia do século XX.

Alarmado com o subjetivismo de alguns teólogos do século xix (Friedrich Schleiermacher, Albrecht Ritschl e Wilhelm Hermann), Kähler procurou oferecer uma abordagem mais frutífera com o objetivo de preservar a fé.

Entendia ter duas tarefas: “1) cri­ticar e rejeitar os aspectos errôneos da forma [histórica] de abordar a vida de Jesus e 2) estabelecer a validade de uma abordagem alter­nativa. A segunda sendo a mais importante”. Kähler denunciou a busca pelo Jesus da história com todos os métodos histórico-críticos, por considerá-la mal concebida, uma vez que “oculta de nós o Cristo vivo”. Depender da pesquisa histórica para lançar os fundamentos de nossa fé “não fornecerá apoio verdadeiro”. Para Kähler, o Jesus histórico era simplesmente uma invenção dos críticos acadêmicos. Em vez disso, Kähler concentrou-se no Cristo da Bíblia. Kähler presumiu que “não temos fontes para uma biografia de Jesus de Nazaré que se equipare aos padrões da ciência histórica contemporânea”. Isso não é o mesmo que dizer que os Evangelhos sejam insatisfatórios para os propósitos da fé. Afinal de contas, os Evangelhos foram escritos como testemunhos ou confissões a partir da perspectiva da fé: “Os apóstolos já acreditavam em Cristo quando escreveram sobre ele; portanto, o testemunho deles já era uma forma de teologia dogmática”.

Para Kähler, o verdadeiro Cristo é o Cristo pregado. O Cristo dos credos cristãos não é de forma alguma o Jesus histórico da erudição crítica. A distinção de Kähler (embora não faça separação) entre o Jesus da história e o Cristo da fé permitiu que ele pensasse na fé cristã baseada neste e não naquele: a fé cristã se baseia não em quem Cristo foi, mas no que atualmente faz pelos crentes. O método histó­rico tem pouca importância para a fé; não pode fazer nada para estabe­lecer ou negar a fé. De certo modo, a tentativa intelectual de recuperar o Jesus histórico é uma violação da justificação pela graça por meio da fé. Envolver-se nessa empreitada é adicionar obras à graça! No entanto, uma vez que uma pessoa entenda por fé que Deus, por meio de Cristo, estendeu sua graça a mim (pro me), então — supostamente — Jesus não precisa estar tão firmemente enraizado na história.

O que exatamente Kähler se propôs realizar não é tão perceptí­vel. O que está claro, porém, é que ele contribuiu significativamente para a dicotomia entre o Cristo da fé e o Jesus da história — dicotomia que desde esse momento moldou os estudos e a teologia siste­mática do Novo Testamento.

O foco de Kähler no Cristo pregado precedeu a obra de Rudolf Bultmann (1884-1976). Assim como Kähler, Bultmann via na busca pelo Jesus histórico um ataque à doutrina de Paulo sobre a justificação pela fé. Para ele, se alguém buscasse nas averiguações ou probabilidades históricas a segurança para a fé, isso significaria o fracasso da própria fé. A fé genuína não precisa de reforço por parte da história. Por conseguinte, Bultmann não queria conhecer Cristo “segundo os padrões humanos” (2Co 5.16). Em vez disso, afirmava que tudo o que podemos saber sobre Jesus a partir da his­tória é que (daβ) ele existiu. Ninguém pode se aventurar além disso.

Paul Tillich, que foi aluno de Kähler, assim escreve no prefácio de The so-called historical Jesus: “Kähler era um pensador absolutamente sistemático que desenvolveu suas ideias sob influência do princípio dos Reformadores — ‘jus­tificação pela graça por meio da fé’ — sem repetir as formulações tradicionais da ortodoxia protestante”. Tillich acrescenta que Kähler procurou aplicar esse princípio da Reforma ao “posicionamento do homem moderno entre a fé e a dúvida”. Até mesmo quem duvida do que a Escritura ou os credos afirmam ainda pode ser “aceito por Deus” e pode “combinar a certeza da aceitação com a realidade até mesmo de uma dúvida radical”.

Conseqüentemente, os Evangelhos precisam ser “demitizados”, ou seja, o núcleo fundamental precisa ser extraído da casca obsoleta do sobrenaturalismo primitivo, que inclui os milagres e exorcismos. De­clarando que a cosmologia do Novo Testamento é essencialmente mítica em caráter e que os milagres dos Evangelhos são pré-científi­cos e primitivos, Bultmann fez sua famosa afirmação: “É impossível usar a luz elétrica, o telégrafo, submeter-nos às descobertas médicas e cirúrgicas da atualidade e, ao mesmo tempo, crer no mundo do Novo Testamento, cheio de demônios e espíritos. Podemos achar possível lidar com eles em nossa vida, mas esperar que outros o façam é tornar a fé cristã ininteligível e inaceitável para o mundo moderno”.

O evangelho (ou kerygma), sustentava Bultmann, está envolto em mito, o que não apresenta “uma imagem objetiva do mundo como ele é”.

Conseqüentemente, não devemos objetivar Deus com a linguagem; não devemos transformá-lo em objeto. No entanto, assim que removermos a casca — os mitos — que cercam o Jesus divinizado e miraculoso se chegará ao núcleo fundamental da mensagem cristã: Deus agiu de maneira redentora em Jesus, e nós, percebendo nossa condição desesperadora, somos salvos ao aceitar pela fé o dom da graça de Deus. Bultmann também tentou trazer um componente existencial à fé: deparamos com Cristo pessoal­mente, no presente, quando atendemos à pregação do evangelho; logo, entramos numa existência verdadeiramente humana.

Somente ao demitizar é que a pregação cristã pode tornar-se aceitável aos ouvidos modernos. A mensagem cristã deve elimi­nar toda referência a espíritos (malignos ou benignos), à historici­dade dos milagres do Novo Testamento e à doutrina da expiação de pecados com sangue. Essa erradicação também não pode ser seletiva: “A visão mítica do mundo deve ser aceita ou rejeitada por inteiro”. Não há meio-termo.

Por conseguinte, a pesquisa histórica não pode ajudar a funda­mentar ou reforçar nossa fé. Em vez disso, devemos abraçar a mensa­gem salvadora do evangelho sem referência a tal pesquisa. Bultmann declarou que “precisamos descobrir se o Novo Testamento oferece ao homem uma compreensão de si mesmo que o desafie a uma decisão existencial genuína”. Portanto, a genuína fé salvadora não depende de fatos históricos sobre Jesus de Nazaré.

Embora as motivações de Bultmann e Kähler para separar a fé em relação à história fossem distintas das de Strauss, o resultado foi o mesmo: todos eliminaram “a teologia e a fé do domínio pú­blico da investigação e do debate”.

Isso até que uma importante mudança de rumo aconteceu, quando, em 1953, Ernst Käsemann fez sua palestra sobre “o problema do Jesus histórico”. Ele declarou que, sem uma sólida ligação entre o Jesus da história e o Cristo da fé, o cristianismo desmoronaria em direção ao docetismo — a fé em uma quimera. Desde essa época, a maré virou nas pesquisas sobre a vida de Jesus: passou a haver uma crença cada vez maior entre os especialistas do Novo Testamento de que os Evangelhos oferecem informações históricas úteis e, de modo geral, confiáveis. O que ne­les lemos sobre Jesus encaixa-se muito bem com o que conhecemos sobre o ambiente do judaísmo da Palestina do primeiro século. Em decorrência da reaproximação do Jesus da história ao Cristo da fé, a pesquisa sobre a vida de Jesus afastou-se dos pressupostos teológico-filosóficos e encaminhou-se para uma orientação mais histórica.

Strauss buscou fazer uma separação entre história e mito e, desse modo, quis destruir a fé cristã, ao passo que Kähler e Bultmann queriam abrir espaço para a fé cristã autêntica, resgatando-a das preocupações históricas.

Surge então o Jesus Seminar. Objeto de muita atenção da mídia, ele indiscutivelmente reviveu a distinção entre o Jesus da história e o Cristo da fé. John Dominic Crossan, cofundador e ex-diretor do Jesus Seminar e participante deste volume, declara, por exemplo, em sua obra Jesus: a revolutionary biography que os Evangelhos, quando lidos comparativamente, contradizem uns aos outros; ou seja, ofere­cem diferentes interpretações de Jesus. Para resolver essa situação, Crossan tenta, com a utilização de “teoria e método” corretos, apre­sentar um retrato imparcial de Jesus que não seja encoberto pelas interpretações que os credos fornecem sobre ele.

Outros participantes do Jesus Seminar têm argumentado que o Jesus histórico deve ser resgatado das camadas de incrustação teológica adicionadas por seus seguidores. Aquilo que os cristãos normalmente acreditam sobre Cristo está muito longe do Jesus da história. Marcus Borg, outro colaborador deste volume, escreve: “É simplesmente incrível a ideia de que o Filho unigênito tenha vindo a este planeta oferecer a vida em sacrifício pelos pecados do mundo, que Deus não poderia nos perdoar sem isso ter acontecido e que somos salvos ao crer nessa história”. Diga-se de passagem, pedir às pessoas que creiam nisso representa um obstáculo para que abracem a fé cristã. O destaque conferido a tais argumentos tem contribuído para voltar a atenção novamente à dicotomia entre história e fé.

O debate

Em outubro de 1994, Dick Staub, apresentador de um programa de rádio na região de Chicago, convidou Crossan para debater na Moody Memorial Church com o filósofo cristão de posicionamento evangélico ortodoxo William Lane Craig. Crossan e Craig decidiram qual abordagem seria a mais adequada para chegarem a um retrato preciso do Jesus histórico. O colunista e autor William F. Buckley Jr., cuja simpatia claramente pende mais para o lado de Craig que de Crossan (como fica evidente no debate), participou como moderador.

O debate, patrocinado pela Turner-Welninski & Associates, foi um animado intercâmbio entre perspectivas cristãs conservadoras e liberais sobre a identidade do verdadeiro Jesus. O título do debate, Will the real Jesus please stand up? [O verdadeiro Jesus pode, por favor, se pôr de pé?] teve como base o popular programa da televisão americana To tell the truth [Dizer a verdade]. Nesse programa, três pessoas, cada uma delas afirmando ser determinado indivíduo, eram questionadas por um grupo de celebridades. Então, com base nas respostas, os participantes escolhiam qual das três pessoas cada um considerava estar dizendo a verdade. O clímax acontecia quando o apresentador dizia com entonação dramática “O verdadeiro _____ pode, por favor, se pôr de pé?”, e o verdadeiro _____ se levantava. Este livro faz uma pergunta semelhante sobre Jesus: quem é o verdadeiro Jesus? O Jesus que os cristãos têm ado­rado através dos séculos é uma figura lendária ou mitológica sim­plesmente exagerada por seguidores bem-intencionados? Ou ele é “o Cristo, o Filho do Deus vivo” (Mt 16.16)?

Dois defensores da posição evangélica ortodoxa e dois partici­pantes do Jesus Seminar foram convidados a oferecer uma resposta ao debate e, em particular, responder às seguintes perguntas:

1. Até que ponto podemos distinguir entre o Jesus da história e o Cristo da fé? Se essa é uma distinção legítima, quais linhas de demarcação devem ser usadas para substanciá-la?

2. O miraculoso (i.e., a intervenção divina sobrenatural) exerce, de algum modo, um papel legítimo na explicação dos dados históricos da primeira Páscoa?

O título do debate tornou-se também o título do livro em inglês.

3. Qual construção — a de Craig ou a de Crossan — melhor se encaixa nos fatos concernentes à ressurreição de Jesus? Da perspectiva do historiador, para qual lado pende a balança das probabilidades?

Além disso, todos os entrevistados levantaram questões signifi­cativas sobre a abordagem ou a metodologia correta na interpretação dos Evangelhos.

Falando com base em seu histórico católico e em suas intera­ções com partidários de outras religiões, Robert Miller, do Jesus Seminar, expressa suas dúvidas sobre a validade da apologética cristã, empreendimento no qual Craig regularmente se envolve. Ele apresenta o contra-exemplo da apologética muçulmana, que oferece a singularidade do Alcorão, a mensagem radical de Maomé e o notável crescimento do islã primitivo como provas de sua veraci­dade. Além disso, levanta questões sobre incongruências nas nar­rativas da ressurreição presentes nos Evangelhos e sobre a natureza apocalíptica de passagens como Mateus 27.51-53, dois pontos que colocam em questionamento a historicidade ou a natureza literal dos Evangelhos.

O ensaio de Craig Blomberg aborda indiretamente algumas das preocupações que Miller levanta, como, por exemplo, a confiabilidade geral dos Evangelhos e o papel da apologética cristã. Tam­bém argumenta que, ainda que a fé exija que caminhemos para além daquilo que a evidência histórica possa mostrar, não se trata de um salto absurdo: “A evidência histórica presta um grande serviço na direção de demonstrar nossa crença; por conseguinte, a fé necessária para preencher a lacuna restante é perfeitamente cabível”.

O terceiro participante, Marcus Borg, do Jesus Seminar, destaca que, embora Crossan e Craig confirmem a ressurreição, “cada um quer dizer algo diferente”. De acordo com Borg, metáforas como a história da Páscoa podem ser verdadeiras sem que se leve em conta o que aconteceu com o corpo de Jesus: “Se algo aconteceu ao corpo de Jesus, isso é irrelevante para a verdade da Páscoa”. O importante é que os seguidores de Jesus, tanto os do primeiro século como os de hoje, o experimentem como uma realidade viva após sua morte.

Os dois evangélicos ortodoxos foram incentivados a ler as respostas um do outro ao debate, o mesmo acontecendo com os dois membros do Jesus Seminar. O propósito era minimizar a superposição de conteúdo. Já Crossan e Craig não leram as reflexões finais um do outro antes da publicação do livro. O JESUS DOS EVANGELHOS: MITO OU REALIDADE?

O último participante é outro evangélico ortodoxo, Ben Witherington III. Ele dedica muita atenção a temas como a importância dos fatos históricos para a própria existência do cristianismo, a materialidade da ressurreição de Jesus e a importância teológica de sua ressurreição. Rejeitar a compreensão tradicional da ressurreição de Jesus a favor de uma compreensão metafórica é abraçar uma visão que Witherington chama de “ressurreição light”.

Depois de apresentar algumas explicações sobre seu debate com Craig, Crossan oferece uma breve reflexão final que esboça os pressupostos histórico-teológicos de ambos os lados do debate. Ele vê esses pressupostos como elemento crítico do debate e incen­tiva a existência de mais discussão entre os ramos conservador e liberal do cristianismo.

Além de defender a apologética cristã, a reflexão final de Craig defende uma cristologia indiscutível com base no consenso dos estu­diosos da atualidade. Ele destaca que o que fez no debate foi tomar quatro fatos bem estabelecidos sobre Jesus e depois inferir a melhor explicação: a ressurreição física de Jesus, que é um imprimátur divino da vida e do ministério de Jesus.

O que se espera é que o vigor e a franqueza deste debate, bem como as respostas, estimulem uma interação futura entre os dois gru­pos. Não há dúvida de que a maioria dos leitores desta obra estará ou no campo liberal, ou no conservador. É fácil fechar-se dentro de uma posição em particular, a ponto de não mais levar a sério os pontos de vista divergentes. Em seu tratado sobre o Espírito Santo, Basílio, o Grande, escreveu: “A verdade é sempre uma presa difícil e, portanto, devemos procurar suas pegadas em todo lugar”. Seja qual for o lado em que os leitores se encontrem, é minha oração que este livro ajude a esclarecer sua compreensão sobre quem é o verdadeiro Jesus — ainda que isso signifique colocar de lado certas ideias e pressupo­sições com o objetivo de buscar as pegadas da verdade.

Cumpre salientar que Crossan declinou da oportunidade de expandir sua reflexão final, que é consideravelmente menor que a de Craig, por considerar que a questão dos pressupostos histórico-teológicos era o aspecto mais importante a ser abordado no debate. Ele não acreditou que a discussão dos detalhes do debate seria frutífera.

SOBRE OS PARTICIPANTES William F. Buckley Jr. é colunista, fundador e editor da revista National Review, além de ser apresentador do programa televisivo de entrevistas chamado Firing Line. Obteve o grau de Bacharel em Humanidades com honra em Ciências Políticas, Economia e História na Universidade Yale. Buckley escreveu as obras God and man at Yale [Deus e o homem em Yale]; Right reason [Razão acertada]; Gratitude: reflections on what we owe to our country [Gratidão: reflexões sobre o que devemos a nosso país]; In search of anti-semitism [Em busca do antissemitismo] e Brothers no more [Nunca mais irmãos]. Reside na cidade de Nova York com a esposa, Patricia. William Lane Craig obteve o doutorado em Filosofia pela Univer­sidade de Birmingham, Inglaterra, e outro doutorado, em Teologia, pela Universidade de Munique, onde, como membro da Fundação Alexander von Humboldt, pesquisou amplamente a historicidade da ressurreição de Jesus. Craig tem atuado como professor visitante do Higher Institute of Philosophy na Universidade de Louvain, sen­do atualmente professor pesquisador da Talbot School of Theology. Escreveu mais de uma dezena de livros, dentre os quais Em guarda, Apologética para questões difíceis da vida, A veracidade da fé cristã, Filo­sofia e cosmovisão cristã (em coautoria com James P. Moreland) (todos publicados pela Vida Nova), Ensaios apologéticos (em coautoria com Moreland e Francis J. Beckwith, da Hagnos) e Assessing the New Testament evidence for the historicity of the resurrection of Jesus [Ava­liando as evidências neotestamentárias da historicidade da ressurreição de| O JESUS DOS EVANGELHOS: MITO OU REALIDADE? Jesus]. Vive em Marietta, na Geórgia (eua), com a esposa, Jan, seus dois filhos, Charity e John.John Dominic Crossan é um dos membros cofundadores do Jesus Seminar, além de ter sido um de seus diretores. É também presi­dente da Seção do Jesus Histórico da Sociedade de Literatura Bíbli­ca. Obteve doutorado em Teologia na Maynooth College, Irlanda. Seus estudos pós-doutorais concentraram-se na área de pesquisa bíblica do Instituto Bíblico Pontifício, em Roma, e em pesquisa arqueológica na École Biblique, em Jerusalém. Crossan tem lecio­nado em diversos seminários na região de Chicago e foi professor de Estudos Religiosos na Universidade DePaul por 26 anos. Es­creveu uma série de livros sobre o Jesus histórico — mais recen­temente, títulos de grande vendagem, como The historical Jesus: the life of a Mediterranean Jewish peasant [O Jesus histórico: a vida de um camponês judeu do Mediterrâneo]; Who killed Jesus? Exposing the roots of anti-semitism in the gospel story of the death of Jesus [Quem matou Jesus? Desmascarando as raízes do antissemitismo no relato da morte de Jesus presente no evangelho] e Jesus, uma biografia revolucionária. Crossan e a esposa, Sarah, residem atualmente na Flórida.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

...O Início O Meio e O Fim...


...O Início o meio e o fim...

Dentro de cada um de nós há pelo menos uma vaga esperança de um mundo novo. Não importa se somos ignorantes ou letrados, pobres ou ricos, pagãos ou cristãos. O fenômeno é tão antigo quanto a mais antiga civilização. Até Karl Marx, que tentou destruir a religião, chamando-a de “o ópio do povo”, dizia que a história caminha para a remissão do homem de todas as injustiças, mazelas e desigualdades. Embora por vias totalmente opostas, o cristão também nutre essa visão escatológica, que termina com “novos céus e nova terra” (2 Pe 3.13).

Muito antes de Cristo, os chamados pagãos tinham uma coleção de mitos que anunciavam profundas mudanças escatológicas. Na mitologia romana, Anquises, aquele pastor de Tróia que se casou com a deusa Vênus, explicava ao filho Enéias: “A maioria das almas anseia, mais cedo ou mais tarde, pelo céu aberto, e vêm para beber o esquecimento e nascer outra vez”.

Segundo a mitologia escandinava, haverá primeiro uma catástrofe: “A terra será submergida pelo mar. O sol se tornará preto. As estrelas brilhantes cairão do céu. O próprio céu se queimará. A morte chegará aos deuses, aos gigantes, aos duendes e anões, aos homens e mulheres, aos filhos e filhas de Ask e Embla.” Mas, depois, “a terra se erguerá uma segunda vez, bela e verde. Balder e Hoder, filhos de Odin, voltarão a viver. Os rios se encherão de peixes e os campos de milho. E pelos campos da nova terra, admirados com o que foi e o que será, os filhos de Lif e Lifthrasil encontrarão na grama o tabuleiro de ouro onde os deuses jogavam seus jogos, e se lembrarão de Odin, o Mais Alto, o Pai de Tudo, e de seus filhos em sua glória, nos palácios dourados de Asgard.”

E na mitologia iraniana, “quando o tempo se aproximar do fim, Saoshyant, o sábio, virá para preparar o mundo para ser renovado e ajudar Ahura Mazda, aquele que sabe, a destruir o cruel Ahriman. Então o tempo chegará ao fim e haverá um novo começo para o mundo. Saoshyant levantará os mortos, Ahura Mazda unirá corpo e alma. O novo mundo será imortal. Aqueles que viveram até a idade adulta, serão trazidos de volta na idade de 40 anos; aqueles que morreram crianças serão trazidos com a idade de 15 anos; todos viverão felizes com suas famílias e amigos.”
Ontem, os indígenas brasileiros alimentavam a esperança de “uma terra sem males”. Hoje, os esotéricos alimentam a esperança de “uma era de ouro”, a era de Aquário, quando desaparecerão a fome global, a ameaça de guerra nuclear, a destruição do meio ambiente, a Aids, a criminalidade etc.

O animal não tem esperança, nem sabe o que é esperança. A esperança é um fantástico problema do ser humano, “o único animal que tem a curiosidade de querer saber de onde vem, para onde vai e o que é que é”. E, na vida, “só existe um homem perdido: aquele que perdeu a esperança”.
A revista Época em uma de suas edições fez a clássica pergunta “Para onde caminha a humanidade?” e obteve a seguinte resposta: “Para a utopia dos vales, onde corre o leite, o mel, ou para a barbárie, para a emancipação de todos os sentidos, ou para a destruição do homem pelo homem”. Mesmo que estejamos caminhando para “a destruição do homem pelo homem”, mesmo que experimentemos uma catástrofe mundial (de acordo com a mitologia escandinava), mesmo que o nosso planeta seja incendiado — “nós, porém, segundo a promessa de Deus, esperamos novos céus e nova terra, nos quais habita a justiça”. (2 Pe 3.13).

Na esperança cristã, a humanidade caminha para um mundo novo. Mas não será por meio da evolução, das reencarnações, das religiões, da globalização, da guerra, do terrorismo, do pacifismo, da falida ONU, do nirvana nem do esforço humano. Será por meio de uma intervenção direta de Deus, por ocasião da parúsia de Jesus Cristo.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Jesus Histórico. Uma Brevíssima Introdução


Caros amigos e seguidores do blog: Em Busca do Jesus Histórico.
É com muito prazer que apresento a terceira obra da Editora Klíne: Jesus Histórico. Uma Brevíssima Introdução, escrito pelos Profs. Drs. André Leonardo Chevitarese (UFRJ) e Pedro Paulo A. Funari (Unicamp).
embuscadojesushistorico@mls.com.br
Este livro procura mostrar como Jesus de Nazaré, o homem que viveu há dois mil anos, um personagem histórico, pode ser estudado e conhecido. Não se busca, aqui, abranger o cristianismo, a religião que se originou, de alguma forma, do homem de Nazaré, a não ser na medida em que a confissão cristã influi na pesquisa sobre o Jesus Histórico. Nossa meta é mostrar o que se sabe e quais as discussões, por parte dos estudiosos, sobre a vida de Jesus.
Alguns temas abordados:
I. Introdução: Jesus, um Homem
II. Como Conhecer O Jesus Histórico
III. A Vida De Jesus
IV. A Busca Do Jesus Histórico
V. As Dúvidas sobre A Possibilidade de Conhecer o Jesus Histórico
VI. A Renovação No Interesse Pelo Jesus Histórico
VII. O Seminário de Jesus
VIII. Tendências Atuais
IX. Conclusão: O Jesus Histórico e o Cristo Da Fé
Cronologia
Referências
Bibliografia