sábado, 13 de março de 2010

A Base da Hipótese Documental

Texto Base:
“Falou mais Deus a Moisés, e disse-lhe: Eu sou Iavé. Eu apareci a

Abraão, a Isaque e a Jacó, como El Shadday; mas pelo meu

nome , Iavé, não lhes fui conhecido.” (Êxodo 6:2,3)

O propósito deste ensaio, como se vê por seu título, é demonstrar a base da Hipótese Documental. Primeiramente, deixo claro que essa é uma teoria científica; não é um dogma religioso, nem uma verdade de fé. Sendo assim, está sujeita a críticas e modificações. Diversos expositores da Hipótese têm idéias próprias, e podem chegar a discordar entre si em diversos pontos. Em outros pontos, contudo, concordam unanimemente. Consequentemente, está sujeita a desenvolvimento, conforme novos argumentos se acrescentam e velhos argumentos mostram-se imperfeitos. Fique claro que a Hipótese busca uma explicação racional da realidade das Escrituras, e não simplesmente agrupar suposições.

A Hipótese, contudo, tem um peso forte sobre o Judaísmo e o Cristianismo. Questões como, por exemplo, as citações do Pentateuco feitas por autores do Novo Testameto, devem ser consideradas conforme o contexto histórico e social da Igreja dos primeiros séculos. A Hipótese Documental, portanto, desconsidera completamente a inerrância das Escrituras; não se nega o valor espiritual e a inspiração das Escrituras, mas que estas sejam completamente inerrantes. Em outros pontos, por exemplo, a Hipótese até corrobora com a doutrina do Cristianismo (Romanos 8:3; Hebreus 7:16), embora pareça uma tendência marcionista, ou mesmo anti-semita. Em muitos pontos, contudo, a Hipótese é uma pedra no papato, como no caso dos dogmas legalistas pregados por muitas denominações da atualidade.

Antes, porém, de apresentarmos a Hipótese em si, é preciso lançar seus fundamentos, sobre os quais a Hipótese será construída. Sendo assim, não são suposições, mas conclusões tiradas à partir das Escrituras do Velho Testamento. A doutrina do Novo Testamento é completamente desconsiderada neste ensaio, uma vez que é posterior. O Antigo Testamento diz respeito à religião judaica, não ao Evangelho (Romanos 7:1-4)! Harmonização doutrinária entre o Evangelho e a Hipótese Documental (lembrando que esta última não é dogma religioso) é um assunto para outro ensaio.

Pessoalmente: Não creio inteiramente na Hipótese Documental. É um ótimo método-sistema; explica muito bem a relação, por exemplo, entre Samuel, Reis e Crônicas. Mas também é um pouco simplista em alguns pontos, especialmente por tratar as fontes como manuscritos; creio que a formação do Hexateuco foi muito mais lenta e passou por muito mais revisões, até formar o atual texto, coerente e harmônico em muitos pontos, mas ainda cheio de discrepâncias. Esse é o problema em discorrer sobre um tempo desconhecido, um contexto desconhecido e pessoas desconhecidas; não creio que a arqueologia vá, algum dia, confirmar a Hipótese Documental inteiramente, mas tenho sim a experança de que ela conforme o efeito tremendo causado na religião judaica pelo Exílio.

Será adotado, para o conjunto dos seis primeiros livros do Antigo Testamento (Gênesis, Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio, Josué), o termo 'Hexateuco', levando em conta o acrescimo de 'Josué' à Torá em Josué 24:26.

Além disso, a seguinte terminologia será empregada para as secções da Lei de Moisés:

Decálogo Ético: Êxodo 20:1-17 (também Deuteronômio 5:6-21).

Livro do Concerto: Êxodo caps. 21, 22 e 23. Leis altamente casuísticas e de caráter jurídico (processual-penal); perceba-se que diversos crimes recebem punições diferentes em outras áreas da Lei. (Nome deriva de Êxodo 24:7)

Decálogo Ritual: Êxodo 34.

Código Deuteronômico (Deuteronomic Code): Deuteronômio, caps. 12 a 26. São leis com um caráter mais social e congregacional. O código em si é mais avançado que o Livro do Concerto; não é simplesmente um conjunto de diversas leis-mandamentos justapostos: trata-se de um método-modelo de integração de toda a congregação judaica. Seu ponto principal a ser considerado é a unificação do culto (capítulo 12). Seus crimes tem, de modo geral, uma única punição: a morte (17:2-7; cf. Hebreus 10:28).

Lei Sacerdotal (Priestly Code): Todos os demais mandamentos, mas em especial os dos livros de Levítico e Números. No geral, regem a ordem no Templo e no Tabernáculo, os sacrifícios, ofertas e holocaustos, e a vida dos sacerdotes, lhes concedendo certos direitos e sustento. A secção dos capítulos 17 a 26 de Levítico é chamada 'Lei da Santidade', e parece ser anterior ao texto de Levítico.
Texto Massorético = TM
Septuaginta = LXX

I – Datando o Antigo Testamento
(ou De como eu resolvi começar pela parte mais chata)

Datar alguns livros do Antigo Testamento é importantíssimo para a crítica textual do Hexateuco, uma vez que esses livros carregam (ou não) o testemunho não apenas da época acerca da qual falam, mas PRINCIPALMENTE acerca da época em que foram escritos. Um livro escrito em 100 a.C. não pode prestar um testemunho válido acerca do Hexateuco; a imparcialidade estaria em jogo. Semelhantemente, um livro escrito em uma época anterior ao Hexateuco também não pode testemunhar. Esse é o ponto, como veremos ao longo deste ensaio.

É evidente que alguns livros podem sofrer adulterações posteriores no intuito de: a) harmonizar as discrepâncias; b) defender uma idéia mais recente. Um exemplo para os cristãos: o Evangelho conforme Lucas do cânon de Marcion. Este Evangelho é uma versão do Evangelho conforme Lucas da qual foram removidos os antecedentes judaicos de Jesus; a idéia de Márcion era defender um credo contrário às idéias judaicas. Portanto, mesmo livros velhos podem carregar informações incorretas (adultérios, interpolações, deleções, conflações, etc...), mas ainda assim carregam bom testemunho se considerados em seu todo e ao lado de outros livros da mesma época, ou em contraste com livros de épocas diferentes.
Vale salientar que deleções são sempre o método mais razoável e menos arriscado de adulterar o texto original; é muito mais simples apagar um versículo incômodo que adicionar uma perícope desejada.

Os livros a serem considerados, neste ponto, são Juízes; I e II Samuel, I e II Reis, I e II Crônicas, Esdras-Neemias e Ezequiel. Todos esses livros são importantíssimos na crítica textual da Lei de Moisés. Suas datações serão fundamentais quando considerarmos a Parte IV – Testemunhos dos Livros Históricos e Ezequiel.

Juízes: Datar este livro é muito complicado. Se o leitor observar atentamente, este livro tem duas introduções (1:1-2:5 vs 2:6-3:7), o que nos leva a pensar que o livro é a união de duas obras distintas, ou que o core (parte principal, o esqueleto do livro) sofreu adições; a primeira introdução parece ser um resumo do livro de Josué. Provavelmente uma das duas obras foi escrita durante a monarquia (17:6; 18:1; 19:1; 21:25), ou seja, depois de ter terminado o período dos Juízes; depois da expulsão dos Jebuseus (1:21; cf. 2 Samuel 5:6), ou antes da expulsão dos Jebuseus (1:8). Parace também ter sido escrito bem depois da queda de Samaria, ou seja, a queda do Reino do Norte (722 a.C.; 18:30). O autor de Juízes parece ter copiado o autor de Josué, ou vice-versa, ou mesmo ambos copiaram da mesma fonte no que tange a morte de Josué (2:6-9; Josué 24:29-31) e a questão de Otniel (1:11-15; Josué 15:15-19).
Além disso, os capítulos finais (17 a 21) são um apêndice que não trata dos juízes em si.

I e II Samuel: Evidentemente escrito após a morte de Davi, e provavelmente bem depois (1 Samuel 9:9). Analisando 1 Samuel 27:6, fica evidente que foi escrito após a divisão dos reinos (Norte e Sul; 931 a.C.), mas provavelmente antes do exílio babilônico (587 a.C.). Isto não significa, porém, que o livro não tenha sofrido modificações posteriores em certos detalhes.

I e II Reis: Pelo último capítulo de II Reis fica demonstrado que esta obra foi escrita após o começo do exílio (587 a.C), e após o início do reinado de Amel-Marduk (2 Reis 25:27; 562 a.C.). Aparentemente não há motivos para crer que este livro tenha sido escrito após o fim do Exílio (537 a.C.); conforme se observa nos Salmos exílicos e em diversos pontos proféticos, a esperança da libertação era muito grande; muito provavelmente o evento da libertação estaria estampado em 2 Reis da mesma forma que está em 2 Crônicas e Esdras. Note-se também que há semelhança incrível entre 2 Reis 24:18-20; 25:ff e o último capítulo do livro do profeta Jeremias.

I e II Crônicas: Escritos, com certeza, após o Exílio Babilônico, como se mostra pelos versículos finais (2 Crônicas 36:22,23).

Se as genealogias da primeira parte de 1 Crônicas realmente fazem parte do trabalho original, então o livro foi escrito muito após o Exílio Babilônico (este finda em 537 a.C.), uma vez que mostra a descendência de Zorobabel (1 Crônicas 3:19-ss). Existe também a possibilidade de que os dois livros de Crônicas, Esdras e Neemias, fizessem parte de uma só obra. Teoricamente, esta obra teria sido dividida ao meio, levando o final de Crônicas a ficar incompleto, mas tendo sido reescrito em Esdras o que naquele sobrou (compare 2 Crônicas 36:22,23 a Esdras 1:1-4). Se for verdade, então Crônicas não pode ser mais antigo que Esdras-Neemias.De todo modo, a questão da genealogia me parece ter a palavra final, evidenciando que este livro, da forma como se nos apresenta hoje, foi escrito por volta do século IV a.C. (537 a.C., menos 120-180 anos das genealogias). O escritor das Crônicas será chamado, daqui em diante, Cronista.

Esdras-Neemias: Originalmente um único livro, embora contenha relatos diferentes. Pela data retratada nos livros, só pode ter sido escrito a partir do século V a.C, provavelmente século IV a.C., o que coloca Crônicas e Esdras-Neemias na mesma época, evidenciando a teoria sobre a unidade na obra (embora o livro hipotético Crônicas-Esdras-Neemias provavelmente seja uma compilação).Ezequiel: Não parecem haver métodos seguros para datar o livro, mas tanto sua história quanto sua mensagem têm significado no contexto do Exílio. Há uma forte unidade no estilo, evidenciando que possivelmente toda a obra tenha realmente sido escrita por Ezequiel ou um possível discípulo (não antes de 571 a.C., conforme Ez 29:17).

II – Autoria Não-Mosaica: Evidências Externas
(ou De como os profetas denunciam os sacerdotes)

Analizemos agora o que dizem alguns livros proféticos acerca do Hexateuco. Fique claro, a princípio, o papel do profetismo no Israel antigo. Os profetas (nabiy) não eram simplesmente videntes, sábios ou membros de uma ordem clerical. Eles eram pessoas comuns dentre a sociedade, que recebiam um chamado de Deus para corrigir o povo. Uma leitura do livro de Jeremias mostra perfeitamente este caráter; o profeta não necessariamente era um douto, sacerdote ou nobre. Sua vocação ministerial desconsidera seus antecedentes. O profeta é chamado, acima de tudo, para pregar, seja pela ameaça (como os Pesos contra as Nações, em Jeremias, Isaías, Ezequiel), seja pela promessa, muitas vezes messiânica.

Não está em jogo, aqui, determinar se o profeta era ou não inspirado pelo Espírito de Deus, mas sim demonstrar seu caráter: o mártir-pregador fervoroso em favor da ortodoxia da religião judaica, no melhor estilo Elias e Eliseu. Este caráter fica evidente não só na mensagem de Jeremias, mas especialmente quando observamos como a profecia em si é encarada em Amós 7:14,15: não um vaticínio, mas, como foi dito, uma correção. Os profetas eram, em si, a crítica (antítese) à situação: o clero e a família real.

Sendo assim, o profeta estaria pronto e preparado para corrigir todos os erros doutrinários cometidos em seu tempo. Nos relatos deixados pelo profeta (ou por seus discípulos), traços da pregação original do profeta, contra os erros contemporâneos, nos ajudam na crítica do Hexateuco.

Nunca existiu, é claro, profeta contra a Lei de Moisés; tais profetas, se existiram, não poderiam ter perpetuado seus escritos, umas vez que a Bíblia hebraica, através de Esdras e dos escribas, foi mantida pelo partido favorável ao Templo e o sacerdócio. Um suposto grupo de profetas contrários à religião estabelecida seriam caçados e teriam seus escritos (caso existam) queimados.

Um ponto importantíssimo aqui é o Exílio Babilônico: escritos proféticos que antes dele seriam taxados como, digamos, 'heréticos', após ele poderiam ser reconhecidos como canônicos, se fossem mantidos nas mãos da elite sacerdotal letrada, uma vez que não mais os profetas escritores teriam reconhecimento, por já estarem mortos. Antes do Exílio, a mensagem de Jeremias era repudiada; depois, contudo, sua mensagem recebeu valor, no sentido de mostrar o cumprimento das profecias de Levítico e Deuteronômio contra a idolatria do povo. É muito mais facil aceitar uma mensagem DEPOIS que ela se cumpre, ou seja, se mostra verdadeira.

Sim, não existiu profeta contra a Lei de Moisés. Nem tudo, porém, que os sacerdotes defendiam como sendo Lei de Moisés era aceito pelos profetas.

As religiões do oriente próximo tinham muitas semelhanças, o que evidenciavam: a) uma origem comum; ou b) sincretismo religioso. Os sacerdotes judaicos, como seres humanos, poderiam realizar inovações no culto, tornando-o mais formal. Inovações não apenas no sentido de mudar as formas de adoração, mas também de se beneficiarem. Características dos cultos mesopotâmicos, siríacos, canaaneus e egípicios poderiam ser assimiladas pelos sacerdotes, tanto ao longo da formação do povo judaico quanto nas relações entre os povos.

O processo passado pela “Igreja Judaica” (i.e., a congregação e o sacerdócio do Templo) foi a mesma vivida pela Igreja Católica: formalização do culto e assimilação de características pagãs. Aqui papel fundamental, não apenas por aproximar o povo judaico do culto mesopotâmico, mas também por fazer com que as novas gerações não tivessem contato com o culto anterior, pré-exílico (Ageu 2:3). São 50 anos longe da própria terra, vivendo em uma terra idólatra estrangeira; tentativas de manter as tradições poderiam ter sido realizadas por fanáticos, e por sacerdotes com interesses próprios, uma vez que o sacerdote judaico depende do culto.

Perceba: Neste ponto, considerar o texto/manuscrito (LXX, TM, Mar Morto) a ser usado é fundamental. Passagens como Jeremias 33:14-26, que defende o culto judaico, simplesmente inexistem na LXX, que é mais antiga que o TM (sendo este medieval), e que em diversos pontos concorda com os escritos do Mar Morto (embora estes últimos sejam dos sectários Essênios).
Analise, agora, detalhadamente, cada uma destas passagens: Isaías 1:11-15; 5:24; 24:5; 58:3-7; 66:1-3; Jeremias 6:19,20; 7:21-23; 18:18; Oséias 2:11; 4:6-10,19 (compare este capítulo a Jr 22:16); 6:6; 8:1,12,13; 9:4,5; 14:2; Amós 5:21-27; Miquéias 6:6-8,16.

Nestas passagens existe uma forte crítica à forma de culto judaica (ou melhor, originalmente não-judaica).

O sacrifício de animais sempre fez parte, na história da humanidade, da adoração. Apenas formas mais modernas ou exóticas aboliram esta prática. O sacrifício de animais não está diretamente associado à expiação de pecados, mas sim na adoração expontânea, buscando de determinada divindade (no caso dos judeus, Iavé Deus) o seu favor, a sua atenção.

Nota: Cabe aqui diferenciar sacrifício (korban) e holocausto (olah). O sacrifício é uma espécie de ceia em que parte do alimento é oferecido a Deus, retirando o sangue e oferecendo a gordura. O resto é comido pelos que oferecem o sacrifício, tendo a participação do sacerdote. Já o holocausto é uma versão em que há dedicação completa a Deus, jogada no fogo; o sacrificante não come do alimento. O Código Deuteronômico estabelece que os sacrifícios só podem ser realizados no lugar escolhido por Deus (Dt 12); todas as outras 'casas de sacrifício' (ilegais) são chamadas “altos” (bamoth), e foram rejeitadas pelos profetas. O Código Sacerdotal presume a existência da unidade de culto.

E, desta forma, genericamente e pela evolução do culto, a expiação de pecados surge como uma forma de buscar a atenção de uma divindade que, segundo os sacerdotes, está zangada. Irada com seu povo, e sem vontade de atender a simples orações. Veja que as passagens bíblicas sitadas são, em sua maioria, pré-exílicas, cada uma refletindo a perspectiva de sua época: Isaías é contra. Jeremias, Oséias e Miquéias não são contra, mas deixam claro que o culto não é o sacrifício de animais. Portanto, se os profetas são contra certa forma de adoração, isto significa que o culto estabelecido está sofrendo inovações. Independe de os profetas serem inspirados ou não; eles apenas estão agindo como testemunhas de seu tempo, e colocando o nome do Senhor onde o nome do Senhor realmente deve ser colocado: contra a falsidade e 'heresia'.
Existem, evidentemente, passagens nos profetas em que eles se mostram favoraveis aos sacrifícios. Um destes profetas é Ezequiel, contemporâneo de Jeremias, além dos profetas pós-exílicos de modo geral. Os últimos 9 capítulos de Ezequiel tratam justamente do culto; falaremos mais acerca deste assunto na parte.

IV - Testemunho dos Livros Históricos e Ezequiel

De todo modo, os profetas citados servem de evidência de que, em seu tempo, certas formas estão sendo inseridas no culto. Por conseguinte, estas formas não se encontram na Lei de Moisés. Veja que Lei de Moisés não significa necessariamente certos livros da bíblia, mas a Lei que vigorava no tempo desses profetas, atribuida a Moisés. Propor origem divina/heróica às leis sempre foi uma forma de outorgá-las: assim como foi com Licurgo em Esparta, também foi com Hamurábi entre entre os babilônicos. Princípio semelhante foi usado pelo teórico absolutista Jacques Bossuet para justificar o direito do monarca.

Perceba: Há muitas semelhanças entre a Lei de Moisés e os códigos mesopotâmicos, em especial o de Hamurábi. Ambas obras são atribuidas a legisladores apontados por Deus, e escritas em tábuas de pedra. Existem muitas semelhanças entre o Livro do Concerto e as leis do código de Hamurábi, especialmente por serem casuísticas. O código de Hamurábi, contudo, é muito mais antigo.

III – Autoria Não-Mosaica: Evidências Internas
(ou De como o Hexateuco deixa claro que foi escrito enquanto o povo
já estava na terra de Canaã, durante ou depois da monarquia)

A Hipótese Documental lida justamente com a autoria do Hexateuco. Não existe, do começo ao fim do Hexateuco, qualquer prova de que a autoria seja mosaica. Pelo contrário, existem evidências fortes de o Pentateuco ter sido escrito séculos DEPOIS da morte de Moisés. Atribuir a autoria a Moisés é uma tradição judaica mantida pelo cristianismo; o texto em si não clama a autoria de Moisés. Existem, é verdade, certas passagens em que Moisés mostra-se escritor (Ex 24:4; Nm 33:2; Dt 31:9,22); mas isto não prova que Moisés realmente escreveu os livros que temos em nossas mãos.

A evidência mais conhecida é a do último capítulo de Deuteronômio, em que fica provado a obra (ao menos este capítulo) não ser de autoria mosaica. Ao contrário do que podem querer teorias harmonizantes, este capítulo não poderia ter sido “profeticamente” escrito, porque o texto trata claramente a morte de Moisés como um evento de um passado um tanto distante (Deuteronômio 34:6,10-12).

Uma das mais fortes (e conhecidas) evidências (já identificadas pelos rabinos judaicos) se encontra, ao mesmo tempo, em Gn 12:6 e 36:31, em que eventos que, pela perspectiva de Moisés, são futuros, mas estão relatados como passados. Moisés não falaria de “reis de Israel” no passado se estivesse escrevendo sobre o futuro; tampouco falaria dos canaaneus como habitantes passados da terra se em seu presente eles ainda estivessem lá, e só no futuro viesse a ocupação da terra.

Ver também Êxodo 16:35, que não é outra coisa, senão uma retrospectiva, assim como Números 15:32 só pode ter sido escrito quanto o povo não mais estava no deserto. Ver Gênesis 32:32. Semelhantemente no cântico de Êxodo 15, algumas partes estão na perspectiva de judeus vivendo na terra de Canaã.

Gênesis 14:14 só pode ter sido escrito após Dã tomar sua herança, ou mesmo após boa parte do período dos Juízes (Jz 18:29), a menos que seja uma “atualização escribal”, o que simplesmente provaria que a Bíblia é alterável. Aliás, o caso de Dã é uma contradição bíblica: compare Josué 19:40-ss a Juízes 18:1; independente de qual destas duas passagens seja mais histórica (aparentemente a de 'Juízes'), o termo Dã em Gênesis só pode ter sido escrito após (não antes) o evento de Josué. Possivelmente também Gênesis 23:2, pelo mesmo motivo, deve ter sido escrito após o evento de Josué 14:14,15.

Números 21:14 cita uma fonte; ora, como pode Números ter sido escrito por Moisés se já havia, àquele tempo, um livro que falasse acerca do mesmo assunto? Se o livro das Guerras do Senhor, hoje desaparecido, foi escrito por Moisés (cf. Ex 17), então Números não foi. Se este livro não foi escrito por Moisés, tampouco Números foi; à épooa em que Números foi escrito, o livro perdido já deveria estar popularizado, ou ao menos conhecido entre a casta sacerdotal. Pelo nome, parecem ser anais de guerra, talvez uma fonte que relate as guerras nais quais o Senhor teria ajudado o povo de Israel (guerras contra os cananeus).

É interessante notar como em Êxodo 11:3 e Números 12:3, fala-se muito bem acerca de Moisés. Teria Moisés se exaltado ao ponto de pensar ser o homem mais manso da face da Terra?

Há também inconsistências internas que evidenciam mais de um autor, ou redação gradual:

Compare:

- Êxodo 16:31 a Números 11:8

- Êxodo 18:17,24 a Deuteronômio 1:9-18 e a Números 11:16

- Êxodo 34:17-26 a Exodo 23

- Levítico 18 a Levítico 20

- Números 20:1,22-28 a Números 33:38

- Deuteronômio 3:14 a Juízes 10:3,4

- Deuteronômio 9:1 a Josué 1:1,2

Compare Êxodo 20:11; 31:17 a Deuteronômio 5:15. São expostos dois diferentes motivos para a guarda do sétimo dia. Em Êxodo, o motivo da guarda é lembrar que a criação foi de seis dias, e ao sétimo Deus descansou. Já em Deuteronômio, o motivo da guarda é lembrar a libertação da casa da escravidão, descansando em um dia em que eles deveriam estar na escravidão. Na antiguidade, os judeus não eram os únicos a guardarem o sétimo dia; também os assírios guardavam o sétimo dia, mesmo não conhecendo a Lei. Essas passagens, evidentemente, são de autores diferentes.

Deste modo, além de Moisés não ser o escritor do Hexateuco, existiu mais de um autor.

IV – Testemunho dos Livros Históricos e Ezequiel
(ou De como a Lei foi gradualmente introduzida pelos
sacerdotes, antes e depois do Exílio)

Tratemos agora dos outros livros do Antigo Testamento, usando o mesmo método empregado pelos profetas, mas desta vez analisando não a pregação profética, mas sim o estilo e a narrativa. Recomenda-se que, antecipadamente, o leitor estude estes livros históricos, percebendo as características de cada um, e a forma como o culto e a Lei são tratados, levando em conta as datações da Parte I.

Juízes – Trata da tomada da terra de Canaã, como um processo lento e tribal, sem haver uma unidade entre os israelitas (unidade esta que só passou a existir com a monarquia); neste sentido, é muito mais histórico que Josué. Cada Juíz mostra autoridade sobre sua tribo (heróis regionais). No corpo do livro (capítulos 3 a 16), as formas de adoração são mais expontâneas. Qualquer um pode sacrificar a Deus em qualquer lugar, e existe uma consciência um tanto henoteísta (11:24). Tendências henoteístas (monolatria inclusiva) estão presentes em muitas partes da bíblia hebraica [Jó 3:8; 26:12,13; 40:15ss; 41; Sl 74:13,14; 82:1; 89:10 (TM); 104:26; Is 27:1; 51:9 (TM); Hc 3:5 (TM)]. É uma religião puramente dinâmica e expontânea, sem formalização. Todo lugar é lugar de adoração e sacrifício (Jz 6:19-21; 13:19).

Não há evidência do Tabernáculo e de uma ordem sacerdotal separada: era possível para um membro da tribo de Judá se tornar levita (17:7). A distinção entre levita e sacerdote é cronologicamente posterior, como será visto. Juízes 17:3-6,10-13; 18:30,31 evidencia a forma livre como a adoração era feita; até mesmo imagens de escultura eram permitidas, algo reprovável por Deuteronômio 16:22.

Porém, nos capítulos 19 a 21 (apêndices), está claramente presente a idéia de unidade de culto (adoração institucionalizada): A Congregação (20:1,2,26), tendo como harmonização os versículos 19:1 e 21:25.

I e II Samuel – Trata do período final dos Juízes e da ascenção monarquia, com ênfase em Davi e sua relação com Saul. Os sacrifícios, assim como em Juízes, podem ser realizados em qualquer lugar e por qualquer um, sem dogmas; o sacerdote não exerce função de “sacrificador”, mas de ministro do Templo. Samuel, mesmo não sendo da tribo de Levi (1 Samuel 1:1), é ministro na Casa de Deus em Siló (1 Samuel 2:18; Jeremias 7:12). Evidentemente não existia, assim como em Juízes, à época em que o livro foi escrito, a idéia de que somente membros da tribo de Levi poderiam ser sacerdotes: em 2 Samuel 8:18, o termo hebreu usado é kohen, traduzido 744 vezes como sacerdote, na Bíblia. Além disso, os pães da proposição os quais não era lícito comer senão só aos sacerdotes são dados para Davi e seus companheiros comerem (1 Samuel 21:1-6; cf. Lucas 6:4), contrariando a Lei (Levítico 22), como se este mandamento ainda não existisse.

I e II Reis – As “crônicas” da Monarquia. Aqui, diferentemente de Juízes e I e II Samuel, já existe formalização do culto, embora não tão profunda quanto a do Código Sacerdotal. O autor é suficientemente sincero para admitir que o povo do período dos Reis sacrificava nos altos (1 Reis 3:2,3; 22:44; 2 Reis 12:3,4; 15:4,35), contrariando Deuteronômio 12, algo que para ele era errado. Ou seja: quando o livro de Reis foi escrito, o Código Deuteronômico estava em vigor, mas na época da qual o livro fala, este mandamento estava sendo ignorado. Além disso (importantíssimo), 2 Reis 14:6, citando Deuteronômio 24:16, evidencia que o Código Deuteronômico já estava em vigor quando o livro de Reis foi escrito.

Outro ponto muito importante é que o autor usa os meses pelos nomes (1 Reis 6:1,37,38; 8:2), como Aviv (Abibe), Ziv (Zife), Eitanin, Bul, como acontece no Código Deuteronômico (Dt 16:1). Os livros escritos após o Exílio babilônico esquecem os nomes judaicos dos meses, chamando os meses pelo número (cf. Es 3:1,6,8; 6:19; 7:8,9; 10:9,16,17; Ne 8:1,2,14,31) ou por nomes siro-babilônios (Ne 1:1; Et 1:1; 3:7; Zc 1:7), justamente porque o calendário judaico anterior ao Exílio não poderia mais estar em vigor, tendo o povo judeu estado sob cativeiro na Babilônia. Algumas partes de I e II Reis, contudo, já começa a enumerar os mêses.

2 Reis relatava um fato que é também muito importante: 2 Reis 22:8-20. Durante a reforma do rei Josias (fim do século VII a.C.), foi achado o livro da Lei, livro este que era desconhecido dos sacerdotes e escribas da época (caso contrário não seria necessário um profeta para identificá-lo, uma vez que todos leram o livro), ou seja, a Lei até então era oral; não haviam mandamentos escritos como os desse livro, que condenassem práticas da época como o sacrifício em bamah (cf. 2 Reis 23). O Código Deuteronômico se encaixa perfeitamente neste contexto; embora a obra dos Reis ignore o Código Sacerdotal, ela foi escrita sob o Código Deuteronômico, e o “livro da Torá” encontrado condena os altos, assim como o Código Deuteronômico (Dt 12).

Veja que desde o período dos Juízes até aquele momento não se havia realizado Páscoa (2 Reis 23:21-23), concordando com o resto das narrativas, exceto Crônicas. Jeremias também evidencia que durante o Exílio o Código Deuteronômico já estava em vigência (Jr 34:13,14; Dt 15).

Ezequiel – Os nove últimos capítulos do livro do profeta Ezequiel propoem uma “Torá” relacionada à organização da adoração do Templo, tendo como cabeça não o sumo-sacerdote, mas o príncipe.

É evidente que a Torá de Ezequiel não está em acordo com o Código Sacerdotal; não exatamente se contradizem, mas só é possível usar UM código de uma vez: ou o de Ezequiel, ou o Sacerdotal (compare, por exemplo, Ezequiel 46:6 a Números 28:11). Isto implica em dizer que até o tempo de Ezequiel não existia um código de leis com vigência sobre a ordem no Templo. É impossível harmonizá-los de forma que o código de Ezequiel seja apenas mandamentos para um “futuro messiânico”; a Torá de Ezequiel deveria ser usada quando o povo retornar para sua terra, por seus contemporâneos (Ez 43:11). Vale salientar que o código presente em Ezequiel, embora não seja harmônico com o Código Sacerdotal, é harmônico com o Código Deuteronômico, sendo que por I e II Reis já foi evidenciada a existência do Código Deuteronômico antes e durante o exílio, ou seja, durante a vida de Ezequiel.

Outro ponto a ser considerado é o lugar de destaque que Ezequiel confere aos sacerdotes de Jerusalém, da linhagem de Zadoque (40:46; 43:19; 44:15), daqui em diante chamados zadoquitas. Leia atentamente Ezequiel 48:11: os outros levitas são considerados igualmente sacerdotes, mas Ezequiel introduz um novo conceito, uma nova idéia: a de que a partir de então somente os zadoquitas (ques são descendentes de Arão) podem ser sacerdotes; os sacerdotes de OUTROS TEMPLOS, ou seja, dos bamoth (sing. bamah), que não obedecem Deuteronômio 12, são considerados a partir daí simples levitas, não mais sacerdotes, como eram no período dos Juízes. Ezequiel ainda usa a fórmula presente no Código Deuteronômico (Dt 17:9,18; 18:1; 24:8; 27:9; Js 3:3; 8:33; Jr 33:18): “sacerdotes levitas”, nunca “sacerdotes e levitas” (esta segunda fórmula superabunda em Crônicas).

Desta forma, os ex-sacerdotes, agora simples levitas sujeitos aos sacerdotes de Jerusalém, passam a sobreviver de alguns direitos concedidos pela Lei, conforme será explicado mais adiante. Perceba: o próprio Ezequiel era um sacerdote.

I e II Crônicas – Releitura de I e II Samuel e I e II Reis. O culto é o foco desta obra; o povo de Israel, ao contrário de Samuel e Reis, vive completamente em torno da Lei de Moisés e age como um só corpo (para o bem ou para o mal). Em todos os pontos nos quais este livro contradiz, modifica, acrescenta ou remove algo de I e II Samuel ou I e II Reis é no intuito de: a) exaltar a monarquia de Judá em detrimento da de Samaria; b) harmonizar os eventos com os mandamentos da Lei de Moisés; c) forjar direito divino e respaldo “histórico” para os sacerdotes zadoquitas.
Para isso, são removidas histórias que dão pouca glória aos reis, como o sangrento caso de Davi com Bateseba, e a não menos sangrenta e puramente histórica ascenção de Salomão (não necessariamente verdadeira, mas aparenta ser muito real), forçando uma unção de Davi a Salomão antes de sua morte. Davi chega até mesmo a realizar uma grande preparação para o Templo, associando os sacerdotes de Jereusalém à cabeça da família real, uma vez que colocar o próprio Davi como contrutor do Templo seria uma harmonização inaceitável. Em I e II Samuel e I e II Reis, vemos os sacerdotes sujeitos ao monarca; em Crônicas, os sacerdotes são sujeitos apenas ao seu próprio rei, o sumo-sacerdote.

Outro ponto interessante é como a festa dos Tabernáculos, que em 2 Reis 8:65,66 está de acordo com o Código Deuteronômico (Dt 16:13-15), aqui (2 Cr 7:8-10) é realizada como no Código Sacerdotal (Lv 23:33-36).

São tantos pontos que é recomendável ao leitor realizar um estudo comparativo profundo, buscando todas as diferenças: a explicação geralmente será de que em Crônicas a nova versão da história é muito mais vantajosa à elite sacerdotal e à linhagem davídica, de um modo ou de outro, removendo (ou separando) o secular e exaltando o heróico. Listas de 'contradições' preparadas por céticos e ateus são úteis neste intuito, mas geralmente só cobrem as contradições mais simples e básicas, ignorando contradições com grande peso contextual.

Esdras-Neemias: Assim como nas Crônicas, o povo vive em torno do Templo e da Lei, do mesmo modo que vemos nos profetas pós-exílicos (Ag 2:1-9; Zc 6:9-15; 14:16ss; Ml 2:4-7; 4:4). Apresentam, sob o Templo de Zorobabel, a Lei sendo outorgada por Esdras (cf. Neemias caps. 8, 9 e 10). É interessante perceber que o capítulo 10 de Neemias concorda muito bem com o Código Sacerdotal, com exceção de um ponto: o versículo 32 (cf. Ex 30:15), mostrando que os sacerdotes, por seu próprio interesse, elevaram uma taxa já estabelecida quando Neemias foi escrito (de 1/3 para ½). Além deste ponto, existe um outro detalhe acerca do qual trataremos na parte VI – Evolução da Lei. 8:17 evidencia que a festa dos Tabernáculos (da qual tratamos nas Crônicas) não estava sendo corretamente guardada.

Consideremos agora todos os pontos apresentados.
- Os livros escritos antes do Exílio desconhecem a Torá que temos em nossas Bíblias;
- Os livros escritos durante o Exílio conhecem parte da Torá que temos em nossas Bíblias;
- Os livros escritos depois do Exílio conhecem a Torá.

Está clara e evidente a evolução da religião judaica na antigüidade. Esta religião passou por um lento processo de formalização, acelerado pelo Exílio babilônico. Durante o Exílio, para manter as tradições (e, assim, a unidade judaica em meio ao paganismo), houve a normatização do culto, mas que só entrou em pleno vigor com a reconstução do Templo.

Ezequiel é a ponte entre o Código Deuteronômico (daqui em diante chamado D), já conhecido, embora paralisado pelo cativeiro, e o que viria depois: o Código Sacerdotal (daqui em diante chamado P). As revisões eram realizadas por sacerdotes-escribas.

Nota: O Código Deuteronômico e D não são exatamente a mesma coisa. O Código Deuteronômico é apenas um conjunto de leis; D é este conjunto somado à narrativa que o cerca no livro de Deuteronômio (e possivelmente Josué e outros livros).

V – A Natureza Tripla de Gênesis e da narrativa do
Hexateuco
(ou De como aquelas contradições são naturais)

O livro de Gênesis apresenta diversas repetições; são as mesmas histórias sendo contadas de duas ou três formas diferentes. Qualquer um que já leu este livro pode ter percebido a semelhança, por exemplo, entre as três histórias d'a esposa confundida com irmã, que ocorrem duas vezes com Abraão (Gn 12:10-20; 20:1-8) e uma vez com Isaque (Gn 26:6-11), sendo duas destas histórias acontecidas em Gerar, com o rei filisteu Abimeleque. Não é incomum vermos histórias serem contadas de modos diferentes e com características diferentes quando as ouvimos em lugares diferentes; se o modo como cada história é contado for escrito em um lugar diferente, e essas narrativas eventualmente fossem unidas por um 'historiador' que não citasse suas fontes e não quisesse determinar a mais histórica, as três seriam colocadas lado a lado como 'coincidências'. Não é muito diferente disso que aparentemente as três histórias presentes em Gênesis vieram a unir-se.
Mais exemplos:
- Gn 21:31 vs Gn 26:33
- Gn 6:5-8 vs 6:11-13.

Em todas essas passagens existe um padrão: os nomes de Deus. Não é segredo que em Gênesis porções inteiras (como o primeiro capítulo, até Gn 2:3) usem para Deus o nome El ou Elohim, enquanto outras (a partir de Gn 2:3) usem o tetragrama YHWH (Iavé).

O chamado de Abraão é feito em Gn 12, e até o capítulo 16 (com exceção da perícope de Melquisedeque) usa-se o nome YHWH. Já no capítulo 17, o nome usado para Deus é Elohim (Deus). Embora o termo El Shaddai (traduzido como “Deus Todo-poderoso”) apareça no TM, este capítulo apresenta o nome Deus (ThEOS) em seu lugar na LXX (“Eu sou teu Deus”; EGW EIMI hO ThEOS SOY), que é mais antiga, ou seja, entre os capítulos 16 e 18 está novamente relatado o chamado de Abraão, mas desta vez usando um nome diferente para Deus. Também Genesis 21:5-34 predominantemente chama Deus como Elohim, não YHWH (veja que Gn 21:1-4 é outra versão da mesma história, usando YHWH, e não Elohim como nome). Porções da história de José favorecem o nome Elohim. Ora, as passagens do princípio de Gênesis (os primeiros três capítulos) são na realidade duas diferentes histórias da Criação, uma mais simples (o Hino da Criação), cronologicamente distintas no que tange à ordem em que cada coisa foi criada.

Neste sentido, Êxodo 6:2,3, em especial a versão encontrada na LXX, é um divisor de águas. Quando, em Gênesis 17:1 (LXX), Deus diz “Eu sou teu Deus”, é a isso que Êxodo 6:2,3 se refere quando diz que diz se apresentou aos patriarcas como “Deus deles”; conferir também Gn 35:11 na LXX.

Essas passagens que apresentam nomes diferentes para Deus também têm características diferentes. Segue um sumário dessas cacterísticas:

Favorecem o nome ELOHIM:

- Deus aparece em sonhos ou envia anjos, e é superior e inatingível.
- Moralidade (Abraão não mentiu, apenas falou uma 'meia-verdade').
- Temor a Deus.
- Deus se arrepende.
- Patriarcas são profetas.
- Concerto Mosaico.
- Favorece Israel (Reino do Norte) e os sacerdotes de Siló. Provavelmente escrito durante o Reino do Norte: 922 a.C. a 722 a.C.
- Vocabulário: “Horebe”; “amorreus”.

Favorecem o nome YHWH:

- Deus manifesta-se.
- Promessas e ameaças.
- O monte de Deus se chama Sinai.
- Concerto Abraâmico.
- Favorece Judá (Reino do Sul) e os sacerdotes de Jerusalém.
- Vocabulário: “Sinai”; “Conhecer” (sexo); “achar graça”; “cananeus”; “Reuel/Hobabe”; “Israel” (em vez de Jacó); “Edom”.

A partir de agora grupo que favorece o nome YHWH serão chamadas J (do inglês Jehovist, ou “Javísta”), o grupo que usa o nome ELOHIM será chamado E (do inglês Elohist, ou “Eloísta”). Contudo, não são apenas duas as fontes usadas na composição de Gênesis. Como foi mostrado na história repetida com Abraão (2) e Isaque (1), existêm ao menos três fontes distintas na narrativa de Gênesis. A terceira fonte, que usa ambos os nomes, tem características próprias. Esta fonte é a narração do já falado Código Sacerdotal, a partir de agora chamado P (do inglês Priestly Code).
Características de P:

- Deus é visto como punitivo, e não mostra misericórdia gratuita.
- Bênçãos hereditárias.
- Usa diversos nomes para Deus, variando conforme a época, mas em especial 'Deus Todo-poderoso' no TM (equivalente a “teu Deus” ou “Deus deles [Abraão, Isaque, Jacó]” na LXX).
- Genealogias.
- Sacerdotes. Estes são colocados como sendo o único caminho para Deus (cf. Nm 16:46-49).
- Circuncisão.
- Eventos religiosos e culto.
- A 'presença' de Deus habita em determinados lugares, como a terra de Canaã como um todo ou especificamente a Casa de Deus (Gn 4:6; 46:4; Ex 15:17; compare a Jonas 1:1-10 e Oséias 9:3-5;15).
- Meses chamados pelos números.
- Concede aos antigos características da lei judaica (ex: Gn 32:32).- Associa o sacerdócio a Arão. Somente os levitas descendentes de Arão poderiam ser sacerdotes.
- Vocabulário: “Frutificai e multiplicai-vos”; “gerações”; “até o dia de hoje”; “estabelecer concerto”, “Eu sou o Senhor vosso Deus”, “santidade”; “congregação”.

Aliás, o vocábulo “congregação” (EDAH pelo TM; EKKLESIA na LXX) é fundamental, uma vez que o Exílio jogou o povo de Israel no meio dos pagãos. Aqueles que buscaram ser fiéias ao ideal nacionalista evidentemente buscaram manter unidade mesmo em terra estrangeira, por meio de costumes e até mesmo aparência distintas. A 'congregação', portanto, é um fenômeno sociológico impresso em P. Efetivamente P geralmente impõe regras não para o indivíduo, mas para o povo. Mesmo os mandamentos com relação a barba e cabelo visam uma unidade. Há muito pouco espaço para individualismo.

P, por ter sido escrito posteriormente, usa diversos nomes para Deus (Elohim em Gênesis 1:1-2:3; El Shaddai ao longo dos patriarcas; YHWH quando revela seu nome em Êxodo 6:2,3). Perceba-se que essas fontes não incluem apenas Gênesis. De Êxodo a Números essas três fontes são usadas. Deuteronômio é praticamente isolado deste todo.

Sendo assim, a narrativa dos quatro primeiros livros da Bíblia é tripla; em alguns pontos, como a subida ao Horebe/Sinai e o Dilúvio, duas narrativas se misturam e se confundem. Leve-se em conta que o redator do texto não simplesmente copiou justapondo as narrativas; ele revisou o texto em si. Em algum momento da história (provavelmente após a queda de Samaria, 722 a.C., quando os fugitivos de Israel vieram a Judá) J e E vieram a se fundir, formando o JE (Javístico). Partes das narrativas originais se perderam entre correções, redações ou imprevistos. Fazem parte de JE, por exemplo, os Decálogos e o Livro do Concerto. Como foi visto anteriormente, o P só foi introduzido ao Hexateuco após (ou ao longo) o Exílio Babilônico. Nesse período já vigorava D. Veja que, ao contrário de P, que se mistura e confunde com JE, D é praticamente isolado.

Temas comuns em D:

- Na narrativa: “portas” (= cidade), “braço estendido” (+ “grandes espantos”), “casa da servidão”. O texto é desfavorável a Arão e ao sacerdócio aarônico, se comparado ao que é apresentado em JE.
- Na legislação: “portas” (= cidade).
Após todas as fontes serem unidade (primeiramente J e E, e depois D, e, por fim, P), o Hexateuco passou por uma revisão final. Este revisor é conhecido como R.

VI – A Evolução da Lei
(ou De como aquelas OUTRAS contradições TAMBÉM são naturais)

Como vimos, os mandamentos foram gradualmente incorporados à Lei. Não devemos ignorar que, mesmo havendo um código escrito, existiam também mandamentos orais. D não era suficiente para reger a ordem do Templo. Naturalmente muitos mandamentos de P já existiam e eram ensinados oralmente, embora talvez não dogmaticamente. Características não relacionadas ao culto, como a barba (Lv 19:27; 21:5), já eram parte da cultura judaica (Is 7:20; 15:2); os acadianos, assim como os hebreus, eram barbados; esse era um dos traços que os diferenciavam dos sumérios. Era uma característica puramente semítica. Também o pudor (Gn 9:22-27; Lv 18:6-18; 20:11-21; Dt 22:30; 27:20) já fazia parte da religião judaica oralmente (Is 3:17; Os 2:9; Mq 1:1; Na 3:5; Hc 2:15); são costumes que acabaram sendo deixados por escrito e passados adiante.

Existem diversos mandamentos que, ao longo da evolução da Lei de Moisés, foram modificados, seja porque seu cumprimento pleno não mais era possível (diferença socio-econômica entre Judá pré-exílio e pós-exílio), seja por interesse da classe sacerdotal (impostos), ou até mesmo pelo rebuscamento natural do culto, acumulando características. Analisemos agora alguns pontos.

O dízimo, muito diferente do que se prega nas igrejas da atualidade, não é uma taxa de 10% sobre a renda. Conforme D nos apresenta, o dízimo é apenas um tipo especial de sacrifício, feito a cada ano ou acada três anos (Dt 14:22-28; 26:12), sacrifício este em forma de 10% da colheita, jamais do dinheiro. A Torá desconhece completamente o dízimo em forma de dinheiro; na realidade, tal coisa inexiste na Bíblia.

O dízimo era trazido a Jerusalém (Dt 12) e lá oferecido como qualquer sacrifício, ou seja: o dizimista comia seu próprio dízimo. Era um banquete sacrificial, jamais um holocausto. Os levitas, os órfãos e as viúvas, conforme vemos em Deuteronômio, eram convidados para o banquete do dízimo; não constituia numa forma de sustento do sacerdote; estes viviam viviam do que pudessem conseguir nos sacrifícios e de convites para banquetes sacrificiais (cf. Dt 18:1,3,18; Lv 7:34; Dt 12:12,18-ss; Ez 44:29); quando não podiam exercer suas funções, eles até mesmo mendigavam, como se vê no Peso profético de 1 Samuel 2:36. Ver também Juízes 17:10 (a praxis antiga). Uma vez que D extingue os bamoth, ele concede aos ex-sacerdotes (agora levitas) um modo de sobrevivência, através do dízimo. Em P, além da colheita, o dízimo se estende aos animais: Em Nm 18 e Ne 10:38,39, esta característica não aparece; surge em Levítico 27:32 (veja, porém, Samuel 8:17).

Em JE e D, os sacerdotes não recebem as primícias: Ex 22:29; Dt 15:19,20. Essas primícias iriam para Deus, queimadas. Já em P, é para eles as primícias: Nm 18:15-ss. Vê-se aqui claramente o interesse sacerdotal, até mesmo porque sua subsistência estava ameaçada. Ezequiel reconhece JE e D, mas não P (44:28-31), sendo esta mais outra evidência de que P é posterior a D e JE, bem como posterior a Ezequiel, que é do princípio do Exílio. Cf. Ne 10:37 (já presente a característica).

JE desconhece o dízimo; o mais próximo seria a oferta dos primogênitos (dos animais), primícias (da plantação) e o melhor do fruto (Ex 22:29; 23:19; 34:26). Deste modo, as taxas progrediram da seguinte forma:
JE: Primícias/primogênitos e o melhor do fruto oferecidos a Deus.

D: Primícias/primogênitos, o melhor do fruto e o dízimo oferecidos a Deus, embora do último participem os levitas. Dos frutos, o sacerdote fica com uma pequena porção (reshith). Cf. Dt 14:22,23; 15:19-22; 26:1-4;10,11.

P: Tanto o dízimo quanto o reshith para o sacerdote (Nm 17:12-21). Desta vez é Deus quem fica com uma pequena porção (Nm 15:20). Em D (Dt 26), as primícias são uma solenidade; em Ne 10:35, são uma taxa anual.
As cidades-santuários nas quais os ex-sacerdotes ministravam (altos, bamoth, ilegais em D) agora são transformadas nas 48 'cidades levíticas'. Veja que em D, existe a semelhança com as cidades de refúgio. A conexão entre ambas (cidade levítica vs cidade de refúgio) se encontra na legislação primitiva: Ex 21:4 (cf. 1 Reis 2:28). Os altares e santuários funcionavam como forma de abrigo para fugitivos. Ver Josué 20 e 21 (diversas cidades contadas ao mesmo tempo em ambas as categorias). Essas cidades eram reconhecidamente altos sacrificiais, como se pode ver nos livros históricos. Antes da dominação dos hebreus, esses altos eram cidades-santuários das religiões cananéias, dedicadas a Iavé pelos dominadores.

Especial: Uma evidência de que D é realmente anterior a P está justamente nessas cidades. Enquanto D oferece três cidades e dá possibilidade de mais três (Dt 19:2,8,9), P estabelece o número de seis cidades (Nm 35:13), contemplando o passado através do futuro. Cf. Dt 4:41-43; Jos 20:7,8.

O calendário judaico gira em torno das três solenidades principais: Colheita (asiph), Sega (qacir) e Pães Asmos (maccoth). Diversas passagens da Lei mostram isso: Ex 23:14,17; 34:23,24; Dt 16:16. Como se pode ver pelos nomes, são festas com características puramente agriculturais. Era de se esperar que estas festas, sendo comemorações da plantação, não tivessem datas fixas, mas variassem de um dia para outro tanto quanto a 'colheita' e a 'sega' propriamente ditas variam, e verdadeiramente é assim que JE (cf. Livro do Concerto e Decálogo Ritual) as apresenta. Não existem datas fixas; existem apenas mêses/estações, como mês judaico pré-exílico de Aviv, no caso da festa dos Asmos, e o 'fim do ano' para a festa da Colheita.

Já em JE, a festa da Sega é chamada festa das Semanas (shavuoth), porque ocorre sete semanas (49 dias) após a festa dos asmos. A Páscoa (pesach) é uma festa entrelaçada à festa dos Pães Asmos, e é a abertura das semanas, enquanto o Pentecostes é o fechamento. O Livro do Concerto (Êxodo caps. 21, 22 e 23), contudo, não conhece a Páscoa.

Já em D, mudanças começam a ocorrer. A festa da Sega passa a ser chamada exclusivamente festa das Semanas, enquanto a festa da Colheita passa a se chamar exclusivamente Tabernáculos (Dt 16:13,16). 2 Crônicas 8:13 usa esta mesma nomenclatura. Veja que esta é uma inovação de D: em JE não haviam 'tabernáculos' nesta festa, demonstrando o real sentido que o autor de Neemias inconscientemente deixa passar em Ne 8:14,17. Provavelmente em sua época existiam relatos afirmando que Josué guardou esta festa. 1 Reis 8:65,66, por também ter sido escrito após D, já apresenta a inovação das “cabanas”. Esta inovação, contudo, é na lesgislação, e não na praxis. Já havia esse costume, como mostra Oséias 12:9b.

Em P, as festas já estão datadas no calendário: Lv 23:5,34. A quê se deve este fenômeno? Novamente, a causa é o Exílio Babilônico, associado à centralização do culto em Deuteronômio 12. O período de cativeiro fez com que o modo de vida de Israel mudasse. Eles deixaram de ser um povo agropecuarista para se tornarem urbano-mercantis; os antigos proprietários não tiveram suas terras de volta, cinquenta anos depois. As festas não poderiam ter mais seu antigo significado; a vida não mais estava diretamente associada ao primitivo modo de produção asiático. Portanto, as datações das festas de acordo com a natureza era agora impossível; era preciso normatizar as datas de acordo com um calendário (no caso, o calendário babilônico). Esta normatização foi feita pela elite sacerdotal.

Uma outra consequência foi justamente o aumento das taxas, uma vez que os zadoquitas dependiam das colheitas, agora reduzidas.

Consequentemente, isso acelerou o processo de urbanização, pois haviam grandes dificuldades para os grandes produtores. Não se deve, contudo, imaginar que todos os hebreus de toda Palestina fossem perfeitamente obedientes à Torá. Tendo D centralizado o culto em Jerusalém, não seria possível, mesmo com um monarca forte, obrigar toda população a obedecer. Após o Exílio não houvem nem mesmo tal monarca; o rei do segundo templo é o sumo-sacerdote (Zc 6:9-15). O Templo e a casa real oficialmente se separam.

As solenidades não eram mais comemorações da agricultura. Agora eram dias de festas realizadas em Jerusalém.

Veja a evolução da Páscoa:

-em D: Dt 16:4,8.
- em P: Ex 12:18; Lv 23:6; Nm 28:17.

Perceba: a Páscoa de Dt 16 é a mesma de Josias (2 Reis 23:21,22).

A Festa dos Tabernáculos passa de sete (D, 1 Reis 8:65,66) para oito dias (P, 2 Crônicas 7:9), como foi mostrado. Ezequiel mostra, neste ponto, semelhanças com P: Ezequiel 45:21-25.

P introduz duas novas festas (Lv 23; Nm 28; 29): Dia da Expiação (Yom Kippur) e Festa das Trombetas (Yom Teruah). Nenhuma destas festas tem qualquer significado para os hebreus agricultores anteriores ao Exílio. Há também evolução no caso do Ano Sabático e o Ano do Jubileu. Veja que o Ano Sabático só poderia ser obedecido quando o povo não mais fosse dependente do campo. P introduz também novas formas de sacrifício, como a oficialização do uso do incenso..

VII – Considerações Finais

Uma coisa não deve ser ignorada: só está sendo considerada, dentro da Hipótese, o judaísmo considerado 'ortodoxo' de cada época. Todas as religiões produzem ramos sectários. Um evento de peso tão grande para a religião judaica como o Exílio exterminaria diversos ramos do judaísmo pré-exílico. Algumas vertentes, é claro, sobreviveriam durante o exílio, sofreriam metamorfoses e uniões. O que sobreviveu deu origem ao judaísmo do segundo Templo; não se deve tratar P como o trabalho de uma única vertente.

Por exemplo, o judaísmo rabinico descende do farisaísmo. Sabemos que durante a época de Jesus existiram diversos movimentos sectários além do farisaísmo, cada um com características e crenças próprias (e mesmo escrituras diferentes), mas foi este que sobreviveu à diáspora. É impossível precisar quantos ramos do judaísmo existiam na época do primeiro Templo. Talvez cada região tivesse sua própria midrash. Assim como as culturas babilônica, persa e helenística serviram para moldar o judaísmo da “era dos apocalipses”, também as culturas com as quais Israel teve contato maior (canaaneus, fenícios, sírios) moldaram o judaísmo pré-exílico. Embora o atual judaísmo ortodoxo pareça estático, ao longo do tempo sempre houve abertura para novas práticas, como o Hannukkah e o Purim.
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Recomendações:

- TRACTATUS THEOLOGICO-POLITICUSPor Baruch Spinoza (1670)
- PROLEGOMENA TO THE HISTORY OF ISRAELPor Julius Wellhausen (1883)
Ambas as obras podem ser encontradas na internet.

A obra de Spinoza traz uma crítica ao judaísmo e origina diversos argumentos que eu usei para provar que Moisés não foi o escritor da Torá. Já a obra de Wellhausen, além de posterior no tempo (mais de dois séculos), foi escrita num período em que houve muita pesquisa na área.

Para leitores com conhecimento de alemão, seria interessante ler também outros livros de Wellhausen, bem como de Karl H. Graf (aliás, os alemães foram muito frutíferos nesta área, sobretudo no século XIX). Wellhausen dedica um capítulo da Prolegomena a rebater os argumentos de Graf, que propunha uma hipótese diferente. A hipótese documental também é conhecida, pelo trabalho de ambos, como Hipótese de Graf-Wellhausen.



O Enigma do dia seguinte

No dia da prosperidade goza do bem,
mas no dia da adversidade considera:
Deus fez a este
em oposição àquele,
para que o homem nada
descubra
do que há de vir depois
dele.
Eclesiastes 7.14
E disse mais o sábio de sobrenome Qoelet:

“Tudo sucede igualmente a todos;
o mesmo sucede ao justo e ao ímpio,
ao bom e ao mau, ao puro e ao impuro.
Assim ao que sacrifica como ao que não sacrifica;
assim ao bom
como ao pecador,
ao que jura
como ao que teme o
juramento.
Este é o mal que há em tudo o
que se faz debaixo do sol; que a
todos sucede o mesmo...”
Eclesiastes 9.2:3

Dou Graças a Deus por Ele ter mudado o meu coração, pois em tempos atrás, essas palavras aliadas a outras passagens onde não existe distinção entre justos e ímpios, onde homens, mulheres e crianças, tementes a Deus ou não, tem suas vidas ceifadas pela praga, pela guerra, pela fome, pela sede, pela peste, representavam em minha vida um grande obstáculo para que pudesse contemplar a Bondade de Deus.

Lembro-me de alguns textos onde descarreguei toda a minha indignação e ódio contra Deus, pois não aceitava que nações inteiras pudessem estar fadadas ao "descaso de Deus", entregues a uma vida de dor e sofrimento permanente (Os profetas de Jó e O Senhor de todas as Vontades).

Foram muitos dias e noites "lutando contra Deus" tentando "ensinar" a Ele que, se eu sendo pecador, limitado e egoísta tenho compaixão pelo sofrimento humano. Por que Ele se mostra indiferente diante da agonia do mundo?

Senti na pele a frustração de Moisés, a aflição de Davi, a perturbação de Asafe, a amargura de Jó, o lamento de Jeremias, a vergonha de Oséias, a decepção de Habacuque, e a angústia de Paulo. Homens de Deus que por algum momento se sentiram "traídos ou abandonados por Deus".

Dias atrás, conversava com um amigo de infância, falávamos do nosso passado, das aventuras de nossa adolescência. E em determinado momento comentei que gostaria de voltar no tempo, porém, com a percepção que tenho hoje da vida. E meu amigo ponderou: Não seria a mesma coisa, pois sabendo diante mão do início, meio, e fim das coisas, não haveria a mesma alegria e o mistério que a vida nos oculta.

Fui para casa e meditei sem parar sobre o que meu amigo acabara de me dizer “o mistério que a vida nos oculta”.

Isso me fez lembrar um livro chamado O Doador. É a história de um menino chamado Jonas que vive num mundo onde não há pobreza, crime, doença, fome, divórcio, medo ou dor. Todos têm família, saúde, emprego, educação e lazer. As pessoas são treinadas para manter seus sentimentos sob controle. As regras de conduta são invioláveis. Ele também é escolhido para desempenhar um papel especial: o de recebedor de Memórias. Isso significa que será o único a guardar lembranças do passado e a ter conhecimento de sensações, experiências e sentimentos humanos que foram banidos daquele mundo. Porém, á medida que seu treinamento progride, ele começa a desvendar os sombrios segredos que se escondem sob aquela frágil perfeição.

Aos poucos ele passa a questionar o alto preço que sua sociedade paga para eliminar o sofrimento. E até que ponto evitar a dor pode nos tornar mais felizes? Ou, se vale à pena abrir mão das emoções para permanecer no caminho certo? Também, não são os sonhos, os desejos e as angústias que dão sentido a nossa vida?

Então, qual é a necessidade do sofrimento na vida do Homem?
Devemos encarar o sofrimento como algo inerente à vida?
Ter uma concepção filosófica de que o sofrimento é conseqüência do livre-arbítrio humano?
Ou tratá-lo apenas como uma falta de perfeição?

Ainda que seja possível optar por mais de uma resposta, resta apenas uma certeza, o sofrimento humano existe, e muitas vezes acontece, permanece ou desaparece sem dar explicação.

Algumas perguntas para sempre ficarão sem respostas, pois, a vida é cheia de mistérios e o mistério nos cerca. E ele faz parte do ciclo da vida de poder viver.

Entretanto, a maioria de nós deseja ver a vida esmiuçada em pequeninas partes, precisamos do significado e interpretação sobre o nosso passado, presente, e futuro. Para que não sejamos emboscados pela incerteza, pela dor, pelo luto, pela miséria, pela traição, pela perda. E, por isso, ficamos desapontados constantemente, pois a vida não é assim. Ela é oculta e misteriosa, enigmática e zombadora, sem sentimento e impiedosa.

Se quisermos viver uma vida sem angústias e medos precisamos estar conscientes para admitir esse grande mistério de saber que nada sabemos. Temos de aceitar o fato de que nunca saberemos tudo que gostaríamos de saber. E muitas situações estarão sempre fora do alcance da nossa compreensão, e algumas questões estarão eternamente além de nosso entendimento.

Não tenho certeza quanto ao fato de se compreender e aceitar essa verdade torna a vida muito mais simples, todavia, tornam as palavras de Jesus incontestáveis “... basta a cada dia o seu próprio mal”.

AMÉM!

quinta-feira, 11 de março de 2010

Cânon do AT


Definição:

O termo cânon (kanwn) ou qoneh (hnq) vem da língua semítica, ou sumérica (assírio-babilônica) e significa vara de medir ou régua, especialmente usada para manter algo em linha reta. Entretanto no grego, dá a idéia de vara, nível, esquadro, isto é, a meta a ser atingida, a medida infalível, chegando dessa forma ao criterion (krithrion). No hebraico a raiz da palavra é junco ou cana, isto é, uma vara. Estes eram utilizados como instrumentos para medir.

Em cronologia significava uma tabela de datas e em literatura, uma lista de obras que podiam ser atribuídas a um certo autor. Os cânones literários são importantes porque só as obras genuínas de um autor podem revelar o seu pensamento.

Os clássicos gregos usavam o cânon como sentido figurado de regra, norma ou padrão. Aristóteles chama o homem de bom cânon ou metron (metron) da verdade. A Estátua do Lanceiro, por Policleitos, era considerada cânon ou padrão de beleza física. Os clássicos eram chamados cânones ou modelos de excelência. Na gramática era aplicada às regras da declinação, conjugação e sintaxe. No calendário os cânones eram as datas mestras, certas e firmes, das quais se partia para o cálculo dos períodos intermediários.

O termo cânon aparece no NT apenas em II Coríntios 10.13,15 e em Gálatas 6.16. Este conceito de regra ou padrão que a palavra cânon tem, dá um caráter de norma e era considerado, até mesmo, em outras escrituras. O Direito Canônico e a Literatura utilizaram-no como uma medida diretiva ordenadora.

Com o passar dos tempos o termo cânon passou a designar o corpo de escritos que dá autoridade normativa para a fé cristã, tendo em contraste os escritos que não o são, mesmo sendo contemporâneos. Somente no século IV é que o conceito cânon foi aplicado à Bíblia pelo Concílio de Laodicéia (360) e por Atanásio referindo-se aos livros que a Igreja reconhecia serem, oficialmente, o padrão de conduta e fé.

Sendo assim, cânon são os livros aceitos pela igreja primitiva como Escrituras divinamente inspiradas. O termo cânon deixou, então, de ser a vara de medir para se tornar o padrão. Se cânon significa isto, canonização significa ser oficialmente reconhecido como guia ou regra autorizada em matéria de fé e prática.

A Canonização do AT

O aparecimento do cânon constitui, antes, um longo processo histórico no qual se pode distinguir três estágios: a tradição oral que é resultante da revelação como seu pressuposto, o trabalho de compilação dos escritos sagrados como uma espécie de pré-história e a formação propriamente dita do cânon.

A formação do cânon do AT foi o resultado de uma decisão dogmática que fixou o conjunto das Sagradas Escrituras, determinando-lhe o número e os limites, razão pela qual se postulava um período definido da revelação (de Moisés até Artaxerxes I). As razões para isto estão ligadas à situação histórica. Em certa época surgiu um movimento apocalíptico com a pretensão de possuir o dom da inspiração e misturava, de novo, idéias de crenças estranhas com as próprias, fazendo assim, reviver novamente o perigo do sincretismo religioso.

Para que tivessem valores, os seus escritos, tinham que suplantar a própria Lei. Por isso eram atribuídos as personalidades que viveram antes de Moisés (Adão, Henoc, Noé, os patriarcas), para parecerem mais antigos do que a Lei de Moisés. Outro que era considerado um perigo eram os escritos de Qumran, mas o cristianismo, que se sentiu ameaçado principalmente por haver adotado a tradução grega dos LXX, começou a fazer uma concorrência com as Escrituras Hebraicas. Visando não haver um esvaziamento ou uma desagregação interna ou externa para o judaísmo fiel à Lei.

Os fariseus definiram e impuseram o conceito de cânon, apesar da resistência dos saduceus que só reconheciam a Torá. Esta corrente distinguia entre a literatura sagrada e a profana, e incluíram na primeira 24 escritos.

Nas Escrituras Hebraicas há 39 livros que os judeus aceitaram como canônicos. Estes são os mesmos que foram aceitos pela Igreja Apostólica e Protestante desde os dias da Reforma. A estes a Igreja Romana adicionou 14 outros livros, ou porções de livros que são os apócrifos e os considera como tendo igual autoridade aos demais.

O Cânon Hebraico

A divisão que consta nas escrituras hebraicas encontra-se em três partes:

- Lei (Pentateuco): Gênesis (no princípio - tyvarB); Êxodo (estes são os nomes - tAmv hLaw); Levítico (e chamou - arqYw); Números (no deserto - rBdyw); Deuteronômio (estas são as palavras - ~yrbDh hLa); sempre designados pelas primeiras palavras dos textos.
- Profetas (Nebiûm - ~ayBn):
1) anteriores: Josué; Juízes; Samuel; Reis; em ambos os 1ºs e 2ºs estão reunidos num só.
2) posteriores: Isaías; Jeremias; Ezequiel; os doze profetas, na ordem retomada pela Vulgata: Oséias; Joel; Amós; Obadias; Jonas; Miquéias; Naum; Habacuque; Sofonias; Ageu; Zacarias; Malaquias.
- Escritos (Kethûbbîm - ~ybWtK, ou Hagiógrafos): Salmos; Jó; Provérbios; Rute; Cantares; Eclesiastes (Coélet); Lamentações; Ester; (estes cinco últimos são conhecidos como cinco rolos ou Megillath - tLgm) Daniel; Edras-Neemias; Crônicas.
A princípio esta coleção continha apenas 24 livros, mas para debater os apologistas cristãos, que apelavam ao AT na sua polêmica contra o judaísmo, mudou para esta ordem.
Os Megillath ou cinco rolos, eram destinados a serem lidos nas principais festas do ano. Desta forma: Cantares para a Festa da Páscoa; Rute para a Festa das Semanas ou da Colheita; Lamentações para a Festa da Celebração do Jejum em memória da Destruição de Jerusalém; Eclesiastespara a Festa dos Tabernáculos (cabana de folhagem); Ester para a Festa dos Purim.

A LXX

- Legislação e História: Gênesis; Êxodo; Levítico; Números; Deuteronômio; Josué; Juízes; Rute; quatro "livros dos Reinos" I, II (Sm), III, IV (Rs); I, II Paralipômenos - paraleipomhna - coisas omitidas - (Cr); I, II Esdras (1º é apócrifo e o 2º é Ed e Ne juntos); Ester, com fragmentos próprios do grego; Judite; I, II, III, IV Macabeus (3º e 4º são apócrifos);
- Poetas e Profetas: Salmos; Odes (apócrifo); Provérbios de Salomão; Eclesiastes; Cântico dos cânticos; Jó; Livro da Sabedoria (Sabedoria de Salomão - apócrifo); Eclesiástico (Sabedoria de Sirac - apócrifo); Salmos de Salomão (apócrifo); Doze profetas menores (Dódeka profeton - dwdeka profhton) na seguinte ordem: Oséias; Amós; Miquéias; Joel; Obadias; Jonas; Naum; Habacuque; Sofonias; Ageu; Zacarias; Malaquias; e ainda, Isaías; Jeeremias; Baruc (apócrifo); Lamentações; Carta de Jeremias (ou Baruc 6 - apócrifo); Ezequiel; Susana (que é Dn 13 - apócrifo); Daniel 1-12 (3:24-90 é próprio do grego); Bel e o Dragão (que é Dn 14 - apócrifo).
A edição massorética do AT é diferente em algumas particularidades da ordem dos livros seguida na LXX e também da ordem das Igrejas Protestantes. Os compiladores da LXX seguiram um arranjo quase tópico.
A única diferença na Vulgata para a LXX é que I e II Esdras são iguais a Esdras e Neemias, e as partes apócrifas III e IV Esdras são colocadas depois dos livros do NT, como também a Oração de Manassés. E ainda, os profetas maiores vêm antes dos profetas menores. Já na Bíblia Protestante segue-se a mesma ordem tópica de arranjo da Vulgata, omitindo apenas as partes apócrifas, mas o conteúdo segue o Texto Massorético.

Os Antilegômenos

Antilegômenos são os livros contra os quais se fala. No decorrer do 2º século d.C. em certos círculos judaicos alguns livros exprimiram dúvidas quanto à sua canonicidade. São eles:
- Eclesiastes: a crítica baseava-se no seu pessimismo, epicurismo (doutrina de Epicuro, filósofo materialista grego (341-270 a.C.), e de seus seguidores, entre os quais se distingue Lucrécio, poeta latino (98-55 a.C.), caracterizada, na física, pelo atomismo, e na moral, pela identificação do bem soberano com o prazer, o qual, concretamente, há de ser encontrado na prática da virtude e na cultura do espírito. É errôneo identificar o epicurismo com o hedonismo) e na sua negação da vida no porvir;
- Cânticos dos Cânticos: a crítica baseava-se nas passagens que falam da atração física em expressões idiomáticas fortes e entusiásticas que chegam à beira do erótico. Entretanto o rabino Hillel identificou Salomão com Iavé e Sulamita com Israel, mudando assim toda a interpretação através desta grotesca alegoria;
- Ester: a crítica baseava-se no não aparecimento do nome de Iavé no livro;
- Ezequiel: a crítica baseava-se nas diferenças existentes nos detalhes entre o Templo e o ritual dos últimos dias, descritos nos 10 capítulos finais, e àqueles do Tabernáculo Mosaico e do Templo de Salomão;
- Provérbios: a crítica baseava-se em alguns preceitos que parecem ser contraditórios como em 26.4,5 "Não respondas ao tolo segundo a sua estultícia, para que também não te faças semelhante a ele. Responde ao tolo segundo a sua estultícia, para que ele não seja sábio aos seus próprios olhos".

O Cânon de Alexandria

Era formado por um grupo de judeus que falava o grego e vivia na Alexandria e nas proximidades do Egito. Tinha um Templo e produzia literatura religiosa, seleções com tratados gregos e hebraicos. Apesar de considerar sagrados todos os livros da Bíblia Hebraica, incluíam também os livros apócrifos.

O Cânon Palestinense

Na Palestina a maioria dos livros já era aceita pelos judeus.
Depois da destruição de Jerusalém e do Templo em 70 d.C., os eruditos judeus mudaram-se para Jâmnia, para o estudo e o ensino das Escrituras. Em 90 d.C., um concílio de líderes judeus, Concílio de Jâmnia, discutiu quais os livros que deveriam ser inclusos no cânon do AT e reconheceu oficialmente os 24 do AT hebraico.

Alguns foram contra porque diziam que o concílio não representava o judaísmo oficialmente, mas este foi o cânon que constituiu a Bíblia Hebraica e conseqüentemente a evangélica no século XVI.
O cânon alexandrino, também chamado de deuterocanon (deuterokanwn), possui 24 livros; o palestinense, protocanon (protokanwn), possui 22 livros. Os concílios Florentino e de Trento tomaram este como obrigatório. Sabe-se que o palestinense, através da versão dos LXX, tornou-se a base da Vulgata.

O Concílio de Trento enumerou 21 livros históricos, 7 didáticos, 17 proféticos, sendo que 8 destes são chamados pela Igreja católica de deuterocanônicos (apokrufoj), isto é, segundo cânon; os biblistas protestantes os chamam de escritos apócrifos. Para os católicos estes são escritos apocalípticos do judaísmo tardio, os quais por sua vez, são chamados pelos teólogos protestantes de pseudo-epígrafos (yeudw epigrafw), já que seus autores se apresentam sob pseudônimo (yeudwnumoj).

Outras formas de Cânon
O Cânon de IV Esdras

Há uma teoria do cânon de IV Esdras datada de 30 anos após a destruição de Jerusalém no ano 557 a.C., onde diz que Esdras foi inspirado pelo Espírito e ditou aos seus cinco escribas num espaço de 40 dias os escritos do AT destruídos pelo fogo.

Foram publicados 24 dos escritos compostos por Esdras, enquanto que os outros 70 podiam ser somente acessíveis aos sábios de Israel. Este último grupo designa a literatura apocalíptica, extracanônica, do judaísmo tardio. Segundo esta teoria os escritos foram compostos num simples espaço de tempo, dando ênfase à inspiração divina e conseqüentemente, uma santidade particular nos textos (2º século). Esta teoria de inspiração foi adotada pelo cristianismo, Igreja da Idade Média e da Moderna, da mesma forma como pelos exegetas judeus e protestantes até o iluminismo. Com o iluminismo o que era místico tornou-se racional e passou a se fazer justiça à realidade histórica.

O Cânon Samaritano

Os samaritanos aceitavam apenas os 5 livros da Torá, Pentateuco, como canônicos.
De caráter não canônico há uma exposição histórica que vai de Josué até à Idade Média, passando pelos imperadores romanos e traz, para o período bíblico, partes consideráveis dos livros históricos do AT. Este é mais conhecido como livro de Josué. Outro livro não canônico e importante é a versão samaritana da história de Moisés, que se encontra na Doutrina de Marqã - Memar Marqã, que apareceu nos primeiros séculos do cristianismo.

O Cânon Judaísmo Helenístico

É o cânon alexandrino da versão dos LXX.

O Cânon do Cristianismo

A princípio não aceitou a teoria dos fariseus e nem se prendeu a nenhum cânon, se prendia mais à LXX do que ao cânon hebraico.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Lendo e Compreendendo Sobre Moisés

Bíblia não diz que a ordem de faraó de matar os filhos homens dos israelitas foi cumprida.

Sifrá e Puá, eram as duas parteiras hebréias a quem Faraó deu esta ordem nefanda. “Quando servirdes de parteiras às hebréias, examinai. Se for filho, matai-o. Mas se for filha, que viva”. (Êxodo 1.16).

As parteiras, porém, temeram a Deus, e desobedeceram aquela ordem. Por causa disto Deus as abençoou muito e lhes concedeu uma bênção especial. “e porque as parteiras temeram a Deus, Ele LHES CONSTITUIU FAMÍLIA”. (Êxodo 1.21).

Por que será que Deus constituiu família para aquelas parteiras? É claro que, se Ele lhes constituiu família, é porque antes elas não tinham famílias.

Seriam por acaso, casadas, mas estéreis? Seriam solteironas que haviam abraçado a profissão de parteira como sublimação? Seriam elas irmãs?

É muito provável que eram ambas casadas, mas estéreis, e que, ao preservarem as crianças hebréias, ganharam do senhor a bênção de terem suas vidas enriquecidas com filhos.

A Bíblia não diz que o cesto onde Moisés foi colocado saiu boiando pelo rio Nilo.

São muitas as pregações e estudos bíblicos que falam do episódio do nascimento de Moisés e de ele ter sido encontrado pela filha de Faraó.

Nestas narrativas em sermões, estudos e livros, contam que Moisés foi colocado em um cesto bem forrado e calafetado e ele foi colocado à deriva no rio.

A filha de Faraó não desceu ao Nilo para tomar banho, uma vez que ele era infestado de crocodilos e isto era um perigo muito grande. A Bíblia diz que ela desceu para lavar-se.

Quando Moisés, com três meses, foi colocado no cesto, a Bíblia não diz que ele foi lançado nas águas. Nossas traduções em português, umas dizem que ele foi colocado em um “carriçal” e a outra diz que ele foi colocado “nos juncos”. Ambas dizem que ele foi colocado À BEIRA DO RIO e não dentro dele. Confira Êxodo 2.1-5 e você terá a confirmação disto.

A Bíblia não diz que Moisés nada sabia de sua ascendência judaica.
Isto é uma deslavada ilusão, pois quem cuidou de Moisés durante os primeiros anos de sua vida foi a própria mãe dele, paga pela filha do Faraó. Em Atos 7.23-25 lemos algo que mostra, com clareza que Moisés conhecia muito bem a sua origem. “E, quando completou a idade de quarenta anos, veio-lhe ao coração ir visitar seus irmãos, os filhos de Israel. E, vendo maltratado um deles, o defendeu, e vingou o ofendido, matando o egípcio. E ele cuidava que seus irmãos entenderiam que Deus lhes havia de dar a liberdade pela sua mão; mas eles não entenderam”. Em Hebreus 11.24, lemos também: “Pela fé Moisés, sendo já grande, recusou ser chamado filho da filha de Faraó”.

A Bíblia não diz que Moisés era um dos candidatos ao trono faraônico.

A Bíblia não diz nada a este respeito. Não existe qualquer razão para crer-se que Moisés, pelo fato de ter sido adotado, tornou-se herdeiro da coroa. Como os monarcas naquele tempo geravam muitos filhos, nada indica que faltava algum herdeiro masculino para a coroa.

A Bíblia não diz que Moisés viveu a vida inteira com sua esposa Zípora.

“E aconteceu no caminho, numa estalagem, que o Senhor o encontrou e o quis matar. Então Zípora tomou uma pedra aguda, circuncidou o prepúcio de seu filho, o lançou a seus pés e disse. Certamente me és um esposo sanguinário. E DESVIOU-SE DELE. Então ela disse. Esposo sanguinário, por causa da circuncisão”. (Êxodo 4.24-26).

Este curto relato parece ter sido algo tremendamente decisivo na vida de Moisés e Zípora, algo que mudou um bocado seus destinos. Depois deste incidente, não vemos mais Zípora seguindo com Moisés para a missão tão grande que ia ser realizada no Egito.

Moisés simplesmente mandou-a de volta para a casa do sogro. Muito tempo depois, já tendo tirado o povo do Egito, Moisés passa novamente por Midiã e ali encontra-se com o sogro. Vamos ver o que aconteceu então.

“Ora, Jetro, sacerdote de Midiã, sogro de Moisés, ouviu todas as cousas que Deus tinha feito a Moisés e a Israel seu povo. Como o Senhor tinha tirado a Israel do Egito. E Jetro, sogro de Moisés, tomou a Zípora, a mulher de Moisés, DEPOIS QUE ELE LHA ENVIARA.

"Veio Jetro, sogro de Moisés, com os filhos e a mulher deste, a Moisés no deserto onde ele se achava acampado, junto ao monte de Deus, e mandou dizer a Moisés. Eu, teu sogro Jetro, venho a ti, com a tua mulher e seus dois filhos”. (Êxodo 18.1-6).

Vemos, pois, sem qualquer sombra de dúvidas, que Moisés tinha mandado Zípora de volta. Depois disto, Moisés fala com Deus no monte Sinai, segue adiante sua jornada e missão, e não vemos mais qualquer referência a Zípora.

Parece, então, que ele a deixou definitivamente. Em outra ocasião vemos que Moisés necessitou de uma companheira e ele simplesmente casou-se novamente. Eis o relato.

“E falaram Miriã e Aarão contra Moisés, por causa da mulher cusita que tomara, porquanto tinha tomado a mulher cusita”. (Números 12.1).

"Cusita”, refere-se ao povo da Etiópia, país da África, de pele negra como o azeviche. Não podemos afirmar que havia, implícita na revolta de Miriã e Aarão contra Moisés, qualquer preconceito racial ou étnico. Talvez estivessem querendo ser mais santos do que Moisés, o que demonstra o contexto.

Recente publicação evangélica, em sua seção de Perguntas e Respostas, respondendo a uma pergunta de certo leitor a respeito deste assunto, afirma que Zípora e a mulher cusita ERAM A MESMA PESSOA!!!

Observando um mapa das terras da Antigüidade, descobrimos que Midiã estava muito distante da Etiópia, sendo totalmente impossível tal possibilidade.

A Bíblia não diz que o Faraó sobreviveu à destruição de seu exército no Mar Vermelho. Isto é uma inverdade completa, pois o faraó e seus soldados morreram ali. Veja o que diz Êxodo 14.28 e o Salmo 136.15. “Porque as águas, tornando, cobriram os carros e os cavaleiros de todo o exército de Faraó, que os haviam seguido no mar; nenhum deles ficou”. “Mas derrubou a Faraó com o seu exército no Mar Vermelho; porque a sua benignidade dura para sempre”.

A vara de Moisés não virou serpente diante do Faraó.

É muito comum acreditar-se, e até muitos pregam, que Moisés lançou a vara DELE diante de Faraó e ela se transformou em serpente. Isto, porém, JAMAIS ACONTECEU! A vara que se transformou em serpente foi a de Arão e não a de Moisés. Foi Arão quem lançou a vara diante de Faraó, por ordem de Deus, através de Moisés.

O mais incrível, porém verdadeiro, é que foi Arão também quem tocou com a vara nas águas, as quais se transformaram em sangue. Confira com o texto da Bíblia:

"E o Senhor falou a Moisés e a Arão, dizendo: Quando Faraó vos falar, dizendo: Fazei por vós algum milagre, dirás a Arão: Toma a TUA vara, e lança-a diante de Faraó, e se tornará em serpente. E Faraó também chamou os sábios e encantadores e os magos do Egito fizeram também o mesmo com os seus encantamentos. Porque cada um lançou sua vara e tornaram-se em serpentes. mas A VARA DE ARÃO tragou as varas deles.

Disse mais o Senhor a Moisés: Dize a Arão: Toma tu a vara, e estende a tua mão sobre as águas do Egito, sobre as suas correntes, sobre os seus rios, sobre os seus tanques e sobre todo o ajuntamento das suas águas, para que se tornem em sangue. e haja sangue em toda a terra do Egito, assim nos vasos de madeira como nos de pedra.

E Moisés e Arão fizeram assim como o Senhor tinha mandado. e levantou a vara, e feriu as águas que estavam no rio, diante dos olhos de Faraó, e diante dos olhos de seus servos e todas as águas do rio se tornaram em sangue." (Êxodo 8-12,19,20).

Além disso, foi Arão quem, por ordem de Deus, fez vir rãs sobre o Egito e feriu o pó da terra, transformando-o em piolhos.

Moisés esteve presente quando tudo isto aconteceu. Porém, foi pelas mãos de Arão, seu irmão, e com a vara de Arão e não pelas mãos de Moisés e com a vara de Moisés que tais coisas aconteceram. Veja também este texto:

"E disse mais o Senhor a Moisés: Dize a Arão: Estende a tua vara e fere o pó da terra, para que se torne em piolhos por toda a terra do Egito. E fizeram assim: porque Arão estendeu a sua mão com a sua vara e feriu o pó da terra, e havia muitos piolhos nos homens e no gado. todo o pó da terra se tornou em piolhos em toda a terra do Egito." (Êxodo 8:16,17).

Houve uma praga, a das úlceras, sobre os homens e os animais, que foi gerada por cinza do forno, que Moisés e Arão tomaram seus punhos cheios e MOISÉS a lançou para cima. (Êxodo 9:8-10).

As pragas que foram concitadas por Moisés, foram: a das úlceras, conforme vimos acima, a da saraiva (Êxodo 9:23)., a dos gafanhotos (Êxodo 10:13). e a das trevas (Êxodo 10:22). Portanto quatro pragas. Arão, por sua vez, concitou três pragas. Isto soma sete pragas. E as outras três?

As outras três foram realizadas diretamente por Deus, sem qualquer um dos dois varões - Moisés ou Arão - levantarem a mão ou utilizarem a vara. Estas foram: a praga das moscas, a da peste nos animais e a da morte dos primogênitos.


quinta-feira, 4 de março de 2010

E, após tudo isto, se fez assim...

Final de batalha, momento de recolher a bandeira, de abandonar os mortos, de contar os vivos, de entoar um cântico de choro ou riso.

No caminho de volta se vê uma trilha de sangue e suor marcado de pólvoras e dor. O que resta agora é pôr as medalhas no que sobrou, onde cada membro arrancado vale uma medalha, menos um membro uma medalha a menos, dois membros duas medalhas.

O campo de batalha já virou passado estará apenas na memória dos vivos à lembrança dos mortos.

Se houve algum enterro é pouco provável, se existe algum ressentimento é quase impossível, pois, na memória de cada sobrevivente só existe a certeza do dever cumprido. E, para que está voz de comando seja executada não há nada ou ninguém que possa impedir, ainda que pereçam vidas, mesmo que desabem sonhos, por mais que rolem as lágrimas.

Estes são os dominadores deste mundo, todos com o mesmo perfil, desde, o início dos tempos, autoritários, soberbos, bárbaros, algozes de crianças, velhos e jovens, pessoas ingratas, mentirosas, e insensíveis.

É, assim, como nos sentimos em nossas batalhas interiores, o campo de batalha é a nossa mente, nossas bandeiras são os nossos ideais, os mortos são as nossas decepções, os vivos são as nossas conquistas.

E ao final de cada conflito que travamos com o nosso maior inimigo, um ser invisível, silencioso, chamado “consciência”, seremos contados entre os mortos ou vivos. Receberemos medalhas por nossas vitórias ou seremos abandonados com os nossos fracassos. É a luta diária de o Homem ter de matar ou morrer.

Então, certo dia, Alguém alertou para que não ajuntássemos tesouros neste mundo, onde a traça, a ferrugem e o ladrão se apossam, mas, para que ajuntássemos nosso tesouro num lugar onde a traça, a ferrugem e o ladrão não podem roubar. Todavia, este lugar seguro continua sendo rejeitado, e poucos são os que têm guardado lá o seu depósito.

E, se aproxima o tempo onde Aquele que julgará este mundo virá. E aquele Grande Dia virá como um ladrão. E terrível coisa será se o nosso depósito não estiver bem guardado nas mãos Daquele que têm as chaves da Vida e da Morte.

Então, guardemos o nosso depósito nas mãos do Único que pode guardá-lo, até o Grande Dia, a saber, Jesus Cristo.


Amém!








Rio 03/03/2010
23h21min
4° Feira.

segunda-feira, 1 de março de 2010

A Impaciência de Jó

"Porque não morri ao nascer? Por que não expirei ao sair do ventre? [...] ou por que não fui oculto no chão como um aborto, como uma criança que nunca viu a luz?" (3:11, 16)

Pobre Jó! O homem cuja paciência é tão citada e admirada, na verdade, por muitas vezes a perdeu completamente. É tola a tentativa moderna de querer transformar Jó num sofredor resignado. Ele nunca o foi. É verdade que em um momento declarou: "O Senhor deu e o Senhor o to­mou; bendito seja o nome do Senhor" (1:21), mas também é verdade que em outros momentos ele reclamou de Deus: "Clamo a Ti, ó Deus, mas não me respondes; ponho de pé, mas para mim não atentas. Tomas-te Cruel para comigo; com a força da tua mão me atacas" (30:20, 21).

Jó não compreendia o que estava acontecendo, afinal tudo aquilo não tinha lógica. "Porque estou sofrendo?". Era o seu conflito. O homem de Uz que no passado considerava-se protegido e guiado por Deus, que era farto e próspero e cuja vida fora respeitada por jovens, anciãos, príncipes, pobres, viúvas, órfãos, necessitados, estrangeiros, além de ser temido pelos inimigos (29: 1­-25).Ora, este homem que outrora tão importante e destacado fora, no presente amarga o desprezo de muitos que o conhecia (30:1-31).Jó, que estava sendo provado por Deus, não suportando seu sofrimento amaldiçoa o próprio nascimento: "Pereça o dia em que nasci, e a noite em que se disse: Foi concebido um homem!" (3:3).

Jó sentia-se afligido por Deus, sentia-se entrincheirado sem ter por onde escapar. Vejamos a sua agonia:

"Sabei que Deus é quem me oprimiu, e com sua rede me cercou. Embora eu clame: Violência! Não sou ouvido; embora grite por socorro, não há justiça. O meu caminho Ele entrincheirou, e não posso passar; nas minhas veredas pôs trevas. Da minha honra me despojou, e tirou da minha cabeça a coroa; quebra-me de todas os lados e eu me vou; arranca a minha esperança, como a uma árvore. Faz inflamar contra mim a sua ira, e me considera como um de seus inimigos.

Juntas vêm as suas tropas; preparam contra mim os seus caminhos, e se acampam ao redor da minha tenda. Pôs longe de mim a meus irmãos; os que me conhecem torna­ram-se estranhos para mim. Os meus parentes me aban­donaram; os conhecidos se esqueceram de mim. Os meus domésticos e as minhas servas me têm por estranho; vim a ser estrangeiro aos seus olhos. Chamo a meu criado, e ele não me responde; tenho de suplicar com a minha boca. O meu hálito é intolerável à minha mulher; sou repugnante a meus próprios irmãos. Até os pequeninos me desprezam; levantando -me eu falam contra mim. Todos os que eu amava se tornaram contra mim" (19:6-19). Estas não são palavras de um homem equilibrado, paciente e resignado, e sim de alguém totalmente furioso e esgotado, à beira do precipício emocional. Ele sentia-se injustiçado por Deus, abandonado pelos amigos e parentes, incompreendido por Elifaz, Bildade e Zofar que não fizeram outra coisa senão acusá-lo. O rancor tomou conta de seu coração: " Por que não morri?"Sua pergunta reflete a sua ira, sua inconformidade e seu deses­pero.

Gosto desse Jó! Pois seu drama é semelhante aos nossos no que diz respeito à incapacidade de reagir com serenidade aos conflitos da vida, principalmente quando sua causa é sem sentido e misteriosa.

Gosto de Jó porque ele não finge um estado de contentamento; gosto de Jó porque ele não tem medo de expor sua raiva e discordância quanto aos eventos trágicos que lhe sobrevieram; gosto de Jó porque ele não é um holograma, uma miragem, uma abstração; gosto de Jó porque ele é humano; gosto de Jó porque ele sabe chorar e sentir dor; gosto de Jó porque ele se revolta; gosto de Jó porque ele não passa um verniz espiritual em seu rosto; gosto de Jó porque ele é sincero com Deus e Deus o entende; gosto de Jó porque ele se parece comigo; gosto de Jó não por causa de sua paciência e sim pela sua impaciência, sua luta com Deus, seu desabafo e seus desaforos. Jó esperava "grandes coisas" da parte de Deus e, quando, ao invés dessas grandes coisas, o que veio foi derrota, morte, luta, prostração e dor, ele se fere, assim como acontece também conosco. Gosto de Jó porque me identifico com ele, pois sua reação é parecida com a de milhares de crentes que também choram e sangram machucados com as provações que encaram no caminho da fé.

Jó é um belo e clássico exemplo de que as Escrituras Sagradas não omitem a fragilidade dos eleitos de Deus. A Palavra de Deus expõe tanto a virtude como a fraqueza dos homens de fé. Se as Escrituras apresentassem apenas um Jó concentrado, calmo, paciente e esperançoso, ele seria inatingível do ponto de vista humano. Ele seria inaccessível à maioria dos mortais e, com certeza, seu testemunho nos envergonharia, pois ficaríamos decepcionados conosco por não conseguirmos reproduzir sua reação heróica.

Precisamos aprender a lidar com a nossa humanidade, pois é a nossa natureza; com os nossos erros, pois os come­temos; com as nossas dúvidas, pois as temos, afinal como disse Philip Yancey, "onde não houver espaço para dúvida, também não haverá espaço para fé". Precisamos entender que Deus não retira o seu favor quando não alcanço o ideal cristão de comportamento (se é que existe algum).A nossa forma de olhar para os nossos irmãos, infelizmente, ainda é católico-romana e não ju­daico-protestante. O catoli­cismo romano insiste na idéia de santos que viveram uma vida sem pecado enquanto estiveram na terra. A tradição judaico-protestante, no entanto, à luz das Escrituras, reconhece os modelos de fé sem, contudo, lhes tirar a humanidade, a fraqueza e a dúvida. O autor de Hebreus, por exemplo, no capítulo 11, não titubeia em apresentar um bêbado, um mentiroso, um trapaceiro, um covarde, um lascivo, um adúltero e assas­sino, uma prostituta (entre outros), como homens e mulheres de fé grandiosa, mas que em algum momento de suas vidas, por circunstâncias diversas, fracassaram na conduta moral, e, ainda assim, Deus os amava.

As Escrituras poderiam apresentar muito bem um Jó distante do sofrimento e imune a própria revolta, porém sendo "O Livro de Deus", o apre­senta como realmente é: santo e pecador; paciente e impa­ciente; resignado e descontro­lado; cheio de fé e esvaziado dela.

A vida de Jó mais do que um exemplo é um consolo, pois revela um Deus amigo e miseri­cordioso que compreende o destempero humano. É digno de nota que Deus, quando enfim entra no debate com Jó, não o acusa (38:2-41:34). Deus o repreende, mas não o con­dena. Apesar da explosão de ira e das acusações feitas por Jó, Deus não o maltrata, pois conhecia o seu servo querido, sabia que as duras palavras proferidas partiam de um coração cansado por tanta dor e desprezo. Deus conhece a nossa estrutura (Salmos 103:14).

Jó tentou, mas não conseguiu reagir com fé e temperança todo o período da crise. Ele falhou, mas Deus não se importou com suas falhas. A opinião de Deus a nosso respeito não muda quando fracassamos. É claro que a proposta de Deus para nós é uma vida de retidão; Deus não se agrada do pecado. Entretanto, quando erramos Ele está no mesmo lugar onde sempre esteve oferecendo perdão e a chance para recomeçar. Ele nos ama e o que nos basta é a sua graça (2 Co. 12:9). Fiquemos com o sábio conselho do jovem Eliú quando insistiu com Jó a confiar na maravilhosa graça e no perdão de Deus:

"Pequei e perverti o direito, mas não fui punido como merecia. Deus livrou minha alma de ir para a cova, e viverei para ver a sua luz. Tudo isto é obra de Deus, duas a três vezes para o homem, para desviar a sua alma da perdição para que a luz da vida brilhe sobre ele" (33:27-30).

Jó saiu de sua provação com uma nova impressão de Deus; o Senhor agora lhe era real: "com os ouvidos ouvira falar de Ti, mas agora te vêem os meus olhos. Por isso me abomino, e me arrependo no pó e na cinza" (42:5-6). Jó compreendeu pela experiência que Deus é a fortaleza dos fracos, o refúgio dos cansados; aprendeu que até os retos e íntegros também sofrem; aprendeu que mesmo que sejamos infiéis Ele permanece fiel; aprendeu que na nossa impaciência, Ele mantém sua paciência conosco; aprendeu que mesmo na dor podemos encontrar a Deus; aprendeu que é na escuridão que a luz de Deus mais faz sentido para nós e aprendeu que Deus propõe um caminho para o homem e que Ele não recua enquanto os seus não chegam do outro lado (42:2).

Tudo isto Deus faz com homens que nada mais são do que vasos de barro; podem ser de honra, como Jó, mais ainda assim, são de barro; que são de valor, como Jó, mas podem se quebrar, se rachar, se ferir, como Jó. Sim, vasos de barro. Sempre vasos de barro, "para que a excelência do poder seja de Deus e não nossa" (2Co. 4:7).

Amém!!!

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A Vida de Jesus nas pesquisas de John P. Meier

"Jesus de Nazaré nasceu - mais provavelmente em Nazaré, e não em Belém - por volta de 7 ou 6 a.C., alguns anos antes da morte do Rei Herodes, o Grande (4 a.C.). Após ter sido educado de forma convencional numa família devota de camponeses judeus da Baixa Galiléia, ele foi atraído para o movimento de João Batista, cujo ministério começou na região do Vale do Jordão, entre o final de 27 ou começo de 28 d.C.; batizado por João, logo Jesus seguiu seu próprio caminho, iniciando seu ministério ainda em 28, com a idade de 33 ou 34 anos. Regularmente ele dividiu sua atividade entre a região da Galiléia e Jerusalém (incluindo a área adjacente da Judéia), dirigindo-se para a cidade santa para as grandes festas, quando as grandes multidões de peregrinos lhe proporcionariam um público que, de outra forma, ele não conseguiria atingir. Seu ministério se prolongou por dois anos e alguns meses.

Em 30 A.D., estando em Jerusalém para a festa da Páscoa que se avizinhava, Jesus aparentemente sentiu que a crescente hostilidade entre as autoridades do templo e ele estava prestes a alcançar seu clímax. Jesus celebrou uma solene ceia de despedida com seu círculo mais íntimo de discípulos, ao anoitecer da quinta-feira, 6 de abril (pela nossa contagem atual), quando começava o décimo quarto dia de Nisan, o dia de preparação para a Páscoa (de acordo com a contagem litúrgica judaica). Preso em Getsêmani na noite de 6 para 7 de abril, ele foi primeiro inquirido por alguns funcionários judeus (pouco provavelmente por todo o Sinédrio) e depois entregue a Pilatos na madrugada de sexta-feira, 7 de abril. Pilatos prontamente o condenou à morte na cruz. Depois de flagelado e humilhado, Jesus foi crucificado no mesmo dia, nos arredores de Jerusalém. Morreu na sexta-feira, 7 de abril de 30, com a idade de 36 anos aproximadamente" (MEIER, J. P., Um Judeu Marginal. Repensando o Jesus Histórico. Volume Um: As Raízes do Problema e da Pessoa, Rio de Janeiro, Imago, 1993, pp. 401-402).

Os Magos

Segundo o historiador grego Heródoto (ap. 480-ap. 425 a.C.), os magos eram originariamente uma tribo dos medos que atuavam como sacerdotes e adivinhos sob os reis aquemênidas (séculos VI-IV a.C.). Diz Heródoto: "As tribos dos medos são as seguintes: os busos, os paretacenos, os estrúcatos, os arizantos, os búdios e os magos" (História I,101)... "Astiages relatou a visão que tivera em sonho aos intérpretes magos, e ficou apavorado ao ouvir as suas palavras" (História I,107)... "Astiages (...) para decidir a sorte de Ciros, mandou chamar os mesmos magos que, como dissemos, tinham interpretado seu sonho; quando eles chegaram Astiages lhes perguntou qual havia sido a sua interpretação da visão. Os magos lhe deram a mesma resposta anterior: disseram que o menino teria fatalmente reinado" (História I, 120)... "Dizendo essas palavras ele [Astiages] mandou primeiro empalar os magos intérpretes de sonhos, que o haviam convencido a deixar Ciros viver" (História I, 128)... "Sua maneira de sacrificar aos deuses é a seguinte (...) Depois de a carne ser arrumada dessa maneira um mago se aproxima e canta por cima dela uma teogonia (dizem que esse é o assunto de seu canto); ninguém tem o direito de oferecer um sacrifício sem a presença de um mago" (História I, 132).

O geógrafo grego Estrabão (ap. 64 a.C.-19 d.C.) diz que os magos oferecem libações e sacrifícios diante do altar do fogo: "Na Capadócia (pois ali a seita dos Magos, que são também chamados Pýraithoi ['acendedores de fogo'], é grande e neste país há também muitos templos dos deuses persas) o povo..." (Geografia 15.3.15). O escritor ateniense Xenofonte (ap. 430- ap.355 a.C.), em sua obra Ciropedia 4.5.14, faz a mesma afirmação sobre as libações.

Quando Cambises estava no Egito, lutando para conquistá-lo em 525 a.C., um mago chamado Bardiya/Smerdis, fazendo-se passar por irmão de Cambises, tomou o poder na Pérsia, sendo, em seguida, derrotado por Dario I. Na famosa inscrição no rochedo de Behistun, o impostor, também conhecido como Gaumata, é chamado por Dario, em Persa Antigo, de magush. Aliás, palavra de sentido incerto. Sugeriu-se que possa vir do Proto-Indo-Europeu magh- = "ser capaz de".

Os persas continuaram a usar derivações da palavra magush como uma palavra para "sacerdote" até o fim da era sassânida, por volta de 650 d.C. Um sacerdote comum era chamado mog e o sacerdote chefe era magupat, "senhor dos magos".

A relação dos magos com Zaratustra é controvertida, assim como a religião dos magos sob os aquemênidas. É possível que os magos medos tenham sido substituídos por Dario I pelos magos persas - que aceitavam o zoroastrismo - após a revolta de Gaumata. De qualquer maneira, em muitos escritos antigos, os magos aparecem associados ao zoroastrismo e a Zaratustra. Na época helenística os magos aparecem também cada vez mais associados à astrologia. E Zaratustra com eles.

Três reis magos: Melquior, Baltazar e Gaspar?

Os presentes dos magos em Mt 2,11 - ouro, incenso e mirra - representam para o evangelista as riquezas orientais. É possível que Mateus não visse aqui nenhum simbolismo especial na escolha de cada um deles.

Is 60,6 diz a propósito do esplendor de Jerusalém, glorificada por Iahweh, que recebe as riquezas vindas das nações pelas mãos de seus reis e de seus povos:

"Uma horda de camelos te inundará
os camelinhos de Madiã e Efa;
todos virão de Sabá
trazendo ouro e incenso
e proclamando os louvores de Iahweh".

O Sl 72,10-11 diz:

"Os reis de Társis e das ilhas vão trazer-lhe ofertas.
Os reis de Sabá e Seba vão pagar-lhe tributo;
todos os reis se prostrarão diante dele,
as nações todas o servirão".

Os presentes são, assim, também lidos à luz da Escritura por Mateus, embora indiretamente. O ouro de Ofir (algum ponto no sudoeste da Arábia), o incenso e a mirra do Iêmen (Sabá, na Bíblia) e da Somália eram muito apreciados na época bíblica.

Mas a tradição posterior desenvolveu toda uma estória sobre os magos a partir dos presentes.

Os Padres da Igreja, por exemplo: Tertuliano os chama de reis, Justino Mártir, Tertuliano e Epifânio, sabedores da origem dos presentes, dizem que eles vêm da Arábia... (embora outros Padres achem que eles vêm da Pérsia, como Clemente de Alexandria, Cirilo de Alexandria, São João Crisóstomo, Orígenes...).

Os Evangelhos Apócrifos expandem muito a tradição sobre os magos.

O Proto-evangelho de Tiago, o mais antigo deles (ca. 150) diz em 21,1-4:

1.Em Belém da Judéia houve uma confusão, porque vieram magos, dizendo: 'Onde está o nascido rei dos Judeus? Vimos sua estrela no Oriente e viemos adorá-lo'.

2. Ouvindo isso, Herodes se perturbou e enviou ministros aos magos; mandou também chamar os sumos sacerdotes e os interrogou, dizendo: "Como está escrito a respeito do Cristo, onde deve ele nascer?" Eles responderam: "Em Belém da Judéia, porque assim está escrito". Depois ele os dispensou. Interrogou também os magos dizendo: "Que sinal vistes a respeito do rei que nasceu?" Os magos responderam: "Vimos uma estrela grandíssima brilhando entre essas estrelas e obscurecendo-as, tanto que as estrelas não apareciam mais. Foi assim que ficamos sabendo que tinha nascido um rei em Israel e viemos adorá-lo". "Ide e procurai", disse Herodes, "e se o encontrardes, fazei-me sabê-lo, para que também eu vá adorá-lo". Em seguida, os magos partiram.

3. E eis, a estrela que tinham visto no Oriente precedia-os até que chegaram à gruta, e parou em cima da gruta. Os magos, vendo o menino com Maria, sua mãe, tiraram presentes de suas sacolas: ouro, incenso e mirra.

4. Tendo sido avisados por um anjo para não entrarem na Judéia, voltaram ao seu país por outro caminho.

Um texto siríaco do século VI, chamado A Caverna dos Tesouros, nomeia os magos como Hormizdah, rei da Pérsia, Yazdegerd, rei de Sabá e Perozadh, rei de Seba.

O Excerpta Latina Barbari, um manuscrito latino traduzido do grego, do século VI, conservado na Biblioteca Nacional de Paris, nomeia os magos como Bithisarea, Meliquior e Gathaspa.

Um tratado atribuído a Beda, O Venerável (monge do mosteiro de Jarrow, Inglaterra, ca. 673-735), chamado Excerpta et Collectanea chama os magos de Melquior, Gaspar e Baltazar. E foram estes os nomes que prevaleceram. Diz o texto:

Melquior, um homem velho com cabelos brancos e longa barba... ofereceu ouro para o Senhor como a um rei. O segundo, de nome Gaspar, jovem, imberbe e de pele avermelhada... honrou-o como Deus com seu presente de incenso, oferenda digna da divindade. O terceiro, de pele negra e de barba cerrada, chamado Baltazar... com o seu presente de mirra testemunhou o Filho do Homem que deveria morrer.

O Evangelho Armênio da Infância diz em V,10:

Um anjo do Senhor foi apressadamente ao país dos persas para avisar os reis magos que fossem adorar o menino recém-nascido. Eles, guiados durante nove meses pela estrela, chegaram no momento em que a Virgem acabava de dar à luz. Porque, nesse tempo, o reino dos persas dominava, por seu poder e suas vitórias, todos os reis que existiam nos países do Oriente. Os reis dos magos eram três irmãos: o primeiro Melquior (Melcon), reinava sobre os persas; o segundo, Baltazar, reinava na Índia; o terceiro, Gaspar, reinava no país dos árabes. Tendo-se reunido, por ordem de Deus, chegaram no momento em que a Virgem se tornava mãe. Eles tinham apressado a viagem e encontram-se lá no momento exato do nascimento de Jesus (...)

O Evangelho Siro-Árabe da Infância diz:

Nesta mesma noite, um anjo da guarda foi mandado à Pérsia e apareceu às pessoas do país na forma de uma estrela muito brilhante, a qual iluminou toda a terra dos persas. Ora, como no dia 25 do primeiro kanun - festa da natividade de Cristo - celebrava-se uma grande festa na casa de todos os persas adoradores do fogo e das estrelas, os magos, com grande pompa, celebravam magnificamente sua solenidade, quando, de repente, uma luz viva brilhou por cima de suas cabeças. Deixando seus reis, suas festas, todos os seus divertimentos e suas casas, saíram para apreciar o espetáculo. Viram no céu uma estrela brilhante em cima da Pérsia. Pelo seu brilho, ela se assemelhava a um grande sol.

E seus reis disseram aos sacerdotes em sua língua: "Que sinal é este que estamos vendo?" E eles, como por adivinhação, disseram: "Nasceu o rei dos reis, o deus dos deuses, a luz emanada da luz. Eis que um dos deuses veio anunciar-nos seu nascimento para irmos oferecer-lhe presentes e adorá-lo".

Levantaram-se então todos, chefes, magistrados, generais, e disseram aos seus sacerdotes: "Que presentes convém levarmos?" E os sacerdotes lhes disseram: "Ouro, mirra e incenso".

Então os três reis, filhos dos reis da Pérsia, tomaram, como que por uma disposição misteriosa, um, três libras de mirra, o outro, três libras de ouro, e o terceiro, três libras de incenso. Estavam revestidos de seus preciosos indumentos, a tiara na cabeça e seu tesouro nas mãos. Ao canto do galo, deixaram seu país, com nove homens que os acompanhavam, e partiram, precedidos da estrela que lhes tinha aparecido.

Nas pinturas, em alguns momentos os magos foram representados pelos cristãos como sendo doze, em outros quatro, em outros ainda dois... Acabaram tornando-se santos, como no famoso mosaico do século VI da igreja de Santo Apolinário Novo em Ravenna, na Itália, onde acima de suas figuras se lê SCS. (=Sanctus) Baltazar, SCS. Melquior, SCS. Gaspar.

Quando o veneziano Marco Polo (ca.1254-ca.1324) viajou para a Pérsia, as tumbas dos magos lhe foram mostradas, com seus corpos perfeitamente conservados...

Competindo com esta tradição, diz outra que o Imperador Zeno recuperou as relíquias dos magos em 490, em Hadramaut, na Arábia do sul. De Constantinopla elas foram para Milão. Quando o Imperador alemão Frederico I Barba-Ruiva (1152-1190) conquistou Milão, seu chanceler Reinald von Dassel, conseguiu levar as relíquias dos magos para sua cidade natal, Colônia. Assim, os magos, depois de tantas andanças, descansam em paz na famosa catedral gótica de Colônia, Alemanha, desde 1164.



segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Uma Breve Investigação Sobre o Jesus Histórico

A “Primeira Investigação”
Antes do XVIII século era opinião comum que os quatro Evangelhos narravam de forma história e quase literal a vida e palavras de Jesus. A cristologia de então partia de uma abordagem “alta, descendente”, da consideração de Jesus como o Cristo, o Filho de Deus, e a partir daí chegar à sua humanidade. Ao final desse século o protestantismo alemão se viu obrigado a responder ao racionalismo liberal iluminista. Os teólogos então começam a aplicar o método da crítica histórica aos textos bíblicos.

O primeiro foi Reimarus, que teve sua obra publicada por seu discípulo Lessing. Faziam uma distinção entre o projeto de Jesus e a intenção dos discípulos. Jesus pregou o reino dos céus e a conversão. Foi um messias político que visava libertar os judeus do jugo romano. Diante do fracasso de Jesus, os seus discípulos inventaram a ressurreição, apresentando-o como um messias apocalíptico que haveria de voltar.

Fazem parte desse “primeiro” racionalismo: Hess, Reinhard, Herder, Bahrdt e Venturini. Para Bahrdt, por exemplo, Jesus não foi mais do que um instrumento nas mãos dos essênios para minar o poder dos sacerdotes e dos fariseus. Seus milagres foram inventos desta seita. Para Venturini, Jesus foi um curandeiro.

Logo surge um período chamado “racionalismo clássico”. Paulus, seu principal expoente, apresenta em 1828 Jesus como um grande mestre de moral. Seus milagres são todos explicados de modo racional.

Scheilermacher faz distinção entre o Jesus da história e o Cristo da fé. Este, se vê no Evangelho de João; aquele, nos três sinóticos. Os milagres que não podem ser explicados racionalmente devem ser negados.

Para David Strauss os evangelhos são relatos míticos. Não são relatos frutos do engano, como dizia Reimarus, mas frutos de imaginação mítica que cria uma narração para transmitir uma idéia. Isso não afeta o núcleo da fé cristã: a humanidade de Deus, segundo ele. Os evangelhos são, portanto, dirigidos para a fé e não possuem fiabilidade histórica; é impossível reconstruir a vida de Jesus de Nazaré.

Surge nos anos seguintes a “questão sinótica”. A investigação passa do âmbito teológico para a crítica literária. Até então Mateus era considerado o evangelho mais antigo. Weisse, discípulo de Strauss, e Wilke propuseram a hipótese das “duas fontes” em 1838. Marcos não seria um resumo mas sim uma fonte, pois Mateus e Lucas coincidem entre si em ordem somente quando coincidem com Marcos. Há ainda uma fonte de ditos comuns (fonte “Q”, Quelle = fonte) a Mateus e Lucas, hoje perdida. Esta teoria determina o estudo dos evangelhos até hoje.

Ao mesmo tempo se desenvolve a escola liberal protestante (“Libertemo-nos do dogma e voltemos ao homem Jesus”, proclamavam) que confiam nos evangelhos como fontes históricas, principalmente as duas fontes, ao contrário da escola racionalista. Sobressaem Weiss, Harnack e Renan. Pretendiam traçar o itinerário psicológico de Jesus e libertar sua imagem dos retoques do kerigma (primeiro anúncio para a conversão). Jesus teria pregado uma religião interna, moralista e espiritualizante; morreu como mártir.Em 1901 Wrede vai contra a historicidade de Marcos dizendo que o segredo messiânico (Jesus proibia os curados de divulgar sua pessoa) era uma construção da comunidade primitiva, não de Jesus, que não tinha consciência messiânica.

Karl Schmidt demonstrou o caráter fragmentário e descontínuo dos evangelhos. Juntos, Wrede e Schmidt desbancam a escola liberal, levando toda a investigação sobre a pessoa de Jesus a um impasse.

Em 1892, Martin Kähler faz a distinção, que marcaria toda a pesquisa posterior, entre o Jesus histórico e o Cristo da fé. Jesus é o homem de Nazaré descrito pela crítica e Cristo é o salvador pregado pela Igreja. Este é o único real, pois do Jesus histórico pouco podemos saber.

Neste mesmo contexto de separação entre história e kerigma, surge Bultmann, teólogo protestante que radicaliza o programa de Strauss, Kähler e Wrede de separar Jesus do Cristo. Surgem também dois fatores importantes: a investigação baseada na história das religiões e a aplicação da história ou crítica das formas aos sinóticos.

Reitzenstein e Bousset traçam paralelos entre o cristianismo e as antigas religiões orientais, considerando que o helenismo e o gnosticismo influenciaram a teologia do Novo Testamento. Wellhausen, pelo mesmo caminho, conclui que os evangelhos tem valor histórico somente enquanto testemunho de fé da comunidade primitiva.

Schmidt havia descoberto a composição em unidades independentes nos evangelhos e que o marco narrativo foi criado secundariamente pelos evangelistas. Passou-se dos estudos das fontes para o estudo das tradições. Para a escola bultmaniana estas unidades de tradição oral não se originaram durante a vida de Jesus. A história das formas então conclui que os evangelhos não são biografias, mas testemunhos de fé; não são devidos a uma pessoa mas são compilações.

A “Nova Investigação”
A posição de Bultmann instiga o estudo do problema por parte de seus alunos e dos teólogos católicos. Käsemann, discípulo direto de Bultmann, dá novo rumo à pesquisa a partir de 1953, afirmando que o Jesus terreno e o Ressuscitado é o mesmo. Constata a continuidade entre a pregação de Jesus e dos Apóstolos.

A partir desta década, vários trabalhos são publicados no sentido de que a pessoa de Jesus é o fundamento do kerigma; não é possível afirmar nada em perspectiva cristológica que não se baseie no Jesus histórico. A cristologia deve se basear nas autênticas palavras e atos de Jesus, segundo J. Jeremias. O começo da fé não está no kerigma, mas na pessoa mesma de Jesus.

Neste momento da investigação, com a ajuda da crítica redacional, se vão fixando os “critérios de autenticidade histórica”. São quatro os fundamentais:
1. Critério de testemunho múltiplo.

2. Critério de descontinuidade ou dessemelhança. Quando não se pode reduzir a concepções do judaísmo ou mesmo da Igreja primitiva. Mostra a originalidade de Jesus.

3. Critério de dificuldade. Considera autêntico um texto que tenha gerado dificuldade de interpretação ou embaraço à Igreja primitiva.

4. Critério de coerência com os demais critérios.A “Nova Investigação” chegou às seguintes conclusões: é impossível e desnecessário fazer uma biografia de Jesus; os evangelhos são as únicas fontes de acesso a Jesus e neles estão unidos história e fé, acontecimento e interpretação; há continuidade entre a história e o kerigma; não se busca mera informação sobre Jesus, mas sua significação existencial para a compreensão do mistério humano.

A “Terceira Investigação”
A partir de 1980 se inicia um novo processo investigativo sobre Jesus marcado pelo deslocamento do mundo alemão, pelo caráter interdisciplinar, interconfessional e interreligioso e pelo grande volume de obras sobre o tema. Se tem chegado a alguns consensos:

- os Evangelhos, sobretudo os sinóticos, são as principais fontes históricas sobre Jesus.

- a importância da fonte “Q” e da literatura apócrifa, e das descobertas de Qumran e Nag Hammadi.

- a colocação de Jesus no ambiente e contexto sócio-histórico judeu de sua época, sobretudo da Galiléia.

As principais questões discutidas nessa investigação:
- a situação sócio-política da Galiléia do tempo de Jesus. Alguns pensam num momento conflitivo em que Jesus se apresenta como reformador social (Borg, Crossan, Horsley). Outros pensam numa situação tranqüila e Jesus como um profeta escatológico (Sanders, Meier).

- a compreensão de Reino de Deus. Muitos pensam os ditos sobre o Reino como criação da comunidade. Parece que a proximidade de tal Reino pertence à pregação de Jesus, mas resta esclarecer se se trata do fim da história (Sanders, Meier) ou uma transformação social do presente (Crossan, Mack).

Conclusão:
É possível reconhecer algo de certo através da evolução da crítica sobre o Jesus histórico. Pode-se dizer que a fé não nasce dela mesma. Por trás da pregação primitiva e da fé pós-pascal está um acontecimento histórico: Jesus de Nazaré.

É inegável a autenticidade do material evangélico. Recorrendo a esse abundante material se pode reconhecer alguns traços da personalidade de Jesus.

Toda a história da investigação sobre Jesus trata, e continuará tratando, de como conciliar fé e história.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Quando Tudo Dá Errado: O Exemplo de Jó


Imagine um dia que começa como qualquer outro. Você se levanta para ir ao serviço e, chegando na firma, encontra as portas lacradas. A firma fechou, sem aviso. Você, inesperadamente, ficou desempregado. Tendo obrigações para cumprir, você decide ir ao banco para sacar dinheiro e pagar algumas contas que estão vencendo. Mas, chegando ao banco, eles dizem que sua conta foi fechada, sem explicação, e que você não tem nenhum centavo. O dia já está piorando. Você resolve voltar para casa, ainda tentando entender o que está acontecendo. Chegando perto de sua rua, você percebe vários bombeiros e ambulâncias correndo por todos os lados. Suas vizinhas estão na rua, chorando inconsolavelmente. Antes de você chegar até sua casa, um dos vizinhos chama você e fala palavras que jamais esquecerá: "Aconteceu tão rápido", ele diz, "que não foi possível salvar ninguém. A casa, de repente, explodiu. Todos que estavam dentro morreram. Eu sinto muito. Todos os seus filhos estão mortos."

Alguns dias passam. Você acorda num lugar estranho. Olhando para seu redor, percebe que está num hospital. Você está sentindo dores terríveis, e uma coceira constante. Depois de algumas horas de sofrimento, a enfermeira avisa que está na hora de visita. No seu caso, várias pessoas serão permitidas entrar para visitá-lo. A primeira pessoa que entra no quarto é sua esposa. Precisando muito de uma palavra de consolo e de explicação, você olha para ela com tanta esperança, nunca imaginando o que ela vai falar. Ela chega perto da sua cama e começa a gritar: "Eu não entendo a sua atitude", ela diz. "Sua fé não vale nada. Você confia num Deus que fez tudo isso? Amaldiçoe o nome de Deus e morra!" Com essas palavras, ela sai do quarto.

Enquanto você procura entender tudo isso, chegam alguns amigos seus. São velhos amigos, sempre prontos para ajudar. Agora será consolado! Mas, eles entram no quarto, vêem seu estado crítico e seu corpo desfigurado pela doença, e não falam nada. Ficam com a boca aberta, olhando, mas não acreditam. Depois de um longo período de silêncio, um deles fala: "Você mereceu isso. Você deve ter feito alguma maldade muito grande, e Deus está te castigando. Ele tirou todos os seu bens e matou seus filhos. Ele causou esta sua doença. Ele fez tudo isso porque você é mau!" Você começa discutir quando um dos outros concorda com o primeiro, e depois outro também concorda com eles. Não adianta discutir. Para eles, você é um detestável pecador que deve sofrer mais ainda.

De repente, algumas crianças passam no corredor. Você se anima, porque crianças sempre trazem alegria e amor. Mas, estas crianças param na porta, vêem a feiura do seu rosto e corpo, e saem correndo. "Nunca vi nada tão feio", uma delas comenta.

Tudo ficção? Jamais aconteceria uma coisa tão terrível? Modifiquei os detalhes para ajudar você, o leitor moderno, sentir na pele o que aconteceu na vida de Jó. O livro de Jó é, possivelmente, o primeiro livro bíblico escrito. Um homem fiel e abençoado por Deus perdeu, num dia só, todas as suas posses e todos os seus filhos. Logo depois, foi atacado por uma terrível enfermidade. A própria esposa foi contra este homem de Deus, e disse: "Amaldiçoa a Deus e morre" (Jó 2:9). Os amigos o condenaram e discutiram com ele para provar a sua culpa (a maior parte do livro relata essas discussões, começando no 2:11 e continuando até 37:24). Todos os conhecidos dele, até as crianças, o desprezaram (19:13-19).

O livro de Jó trata de um dos assuntos mais difíceis na experiência humana: como entender e lidar com o sofrimento. É um livro rico e cativante que todos os servos de Deus precisam estudar. Um dia, mais cedo ou mais tarde, ele será útil na sua vida. Neste artigo, vamos considerar algumas lições claras e importantes desse livro.

Pessoas boas sofrem

Talvez o ponto principal do livro é o simples fato que pessoas fiéis a Deus ainda sofrem nesta vida. O primeiro versículo do livro já define, do ponto de vista de Deus (veja, também, Jó 1:8) o caráter de Jó: "Havia um homem na terra de Uz, cujo nome era Jó; homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desviava do mal." Enquanto entendemos que o sofrimento entrou no mundo por causa do pecado (Gênesis 3:16-19), aprendemos em vários trechos bíblicos que a dor e a tristeza atingem as pessoas boas e dedicadas. Jó, um homem íntegro, sofreu imensamente. Paulo, um servo dedicado ao Senhor, sofreu muito mais do que a grande maioria dos ímpios (2 Coríntios 11:23-27). Mesmo quando ele pediu a Deus, querendo alívio de algum problema, Deus recusou seu pedido (2 Coríntios 12:7-9). Mas, não devemos estranhar com isso, pois o próprio Filho de Deus sofreu na carne (Hebreus 2:9-10,18). Os que servem a ele sofrem, também.

O diabo quer nos derrubar com nosso sofrimento

O propósito de Satanás fica bem claro nos primeiros dois capítulos de Jó. Ele vê o sofrimento como uma grande oportunidade para derrubar a fé dos servos de Deus. Ele aceitou o desafio de tentar destruir a fé de um dos homens mais idôneos do mundo. Depois, ele foi tão ousado que desafiou o próprio Jesus, usando todas as tentações imagináveis para o vencer (Mateus 4:1-11). O diabo entende muito sobre a natureza humana. Ele sabe que pessoas que servem a Deus fielmente quando tudo vai bem na vida podem ser tentadas por meio de alguma calamidade pessoal. Problemas financeiros, a morte de um ente querido, alguma doença grave -- tais sofrimentos na vida são, freqüentemente, o motivo de abandonar a Cristo. Enquanto a mulher de Jó não prevaleceu na vida do próprio marido, o conselho dela (Jó 2:9) vem derrubando a fé de muitas outras pessoas que enfrentam dificuldades na vida. Jó não sabia a fonte de seu sofrimento (capítulos 1 e 2 contam a história para nós, mas ele não sabia de tudo que estava acontecendo entre Deus e Satanás). Às vezes, nós não temos noção da fonte das nossas dificuldades. Mas, podemos ter certeza que o diabo está torcendo para que tropecemos e afastemos de Deus.

Amigos nem sempre ajudam

Três amigos de Jó ficaram sabendo de seu sofrimento, "e combinaram ir juntamente condoer-se dele e consolá-lo" (Jó 2:11). Mas as palavras deles não ajudaram. Ofereceram explicações baseadas nas opiniões deles, e não na verdade que vem de Deus. Onde Deus não tinha falado, eles ousaram de falar. O resultado não foi consolo e ajuda, e sim perturbação e desânimo. A mesma coisa acontece hoje. Quando alguém sofre de um problema de saúde, outras pessoas tendem falar sobre algum caso triste de alguém que teve a mesma doença e morreu. Quando uma pessoa amada morre, muitas pessoas procuram confortar a família com palavras insensatas e até mentirosas. É melhor falar umas poucas palavras com compaixão do que falar muito e entristecer a pessoa mais ainda. Quando sofremos perda, é melhor procurar conselho na palavra de Deus e da boca de pessoas que a conhecem e que vivem segundo a vontade do Senhor.

Deus não explica tudo

Quando sofremos, é natural perguntar: "Por quê?". Jó fez isso (Jó 3:24). Habacuque fez a mesma coisa (Habacuque 1:3). Milhões de outras pessoas têm feito a mesma pergunta. É interessante e importante observar que Deus não responde a todas as nossas perguntas. Pode ler o livro de Jó do começo ao fim, e não encontrará uma resposta completa de Deus à pergunta do sofredor. Durante a boa parte da história, Deus deixou Jó e seus amigos a ponderar o problema. Quando o Senhor falou no fim do livro, ele não explicou o porquê. A partir do capítulo 38, Deus afrima que o homem, como mera criatura, não é capaz de entender muitas das coisas de Deus, e não é digno de questionar a sabedoria divina. Jó entendeu a correção de Deus, e respondeu humildemente:"Sou indigno; que te responderia eu? Ponho a mão na minha boca. Uma vez falei e não replicarei, aliás, duas vezes, porém não prosseguirei" (Jó 40:4-5). Jó pediu desculpas a Deus por ter duvidado da justiça e da bondade do Criador: "Na verdade, falei do que não entendia; coisas maravilhosas demais para mim, coisas que eu não conhecia....Por isso, me abomino e me arrependo no pó e na cinza" (Jó 42:3,6).

Depois do sofrimento, vêm as bênçãos

O sofrimento desta vida é temporário. O sofrimento de Jó foi intenso, mas não durou para sempre. É bem provável que ele lembrou, durante o resto da vida, daquelas experiências doloridas. Mas a crise passou, e a vida continuou. Deus restaurou as posses dele em porções dobradas. A mesma coisa acontece conosco. Enfrentamos alguns dias muito difíceis, mas as tempestades passam e a vida continua. Vivendo na época da nova aliança de Cristo, nós temos uma grande vantagem. Temos uma esperança bem definida de uma recompensa eterna no céu (Hebreus 11:13-16,39-40; 12:1-3; 13:14). Qualquer sofrimento é pequeno quando o colocamos no contexto da eternidade.

Fiéis no sofrimento

Nós vamos sofrer nesta vida. Pessoas que dizem que os filhos de Deus não sofrem são falsos mestres que ou não conhecem ou não aceitam a palavra do Senhor. Jó perdeu tudo. Jeremias foi preso. João Batista foi decapitado. Jesus foi crucificado. Estêvão foi apedrejado. Paulo sofreu naufrágio e prisões. Você, também, vai sofrer. Os problemas da vida não sugerem falta de fé, e não são provas de algum terrível pecado na sua vida. Às vezes, as provações vêm como disciplina de Deus (Hebreus 12:6-13); às vezes, não. Mas sempre são oportunidades para crescer (Tiago 1:2-4), e convites para adorar a Deus (Tiago 5:13; Jó 1:20).

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

O Melhor Presente

Certo jovem ia muito mal na escola. Suas notas e seu comportamento eram uma decepção para seus pais que, como bons cristãos, sonhavam em vê-lo formado e bem sucedido.

Um dia, seu pai lhe fez uma proposta:
"Se você, meu filho, se dedicar aos estudos e conseguir ser aprovado no vestibular para a Faculdade de Medicina, lhe darei então um carro de presente."

Por causa do carro, o rapaz mudou completamente; passou a estudar como nunca e a ter um comportamento exemplar. O pai estava feliz, mas sabia que no fundo a mudança do filho não era fruto de uma conversão sincera, mas apenas do interesse em obter o carro, e isto não era satisfatório! O rapaz seguia os estudos e aguardava o resultado de seus esforços.

Assim, o grande dia chegou ! Fora aprovado para o curso de Medicina. Como havia prometido, o pai convidou a família e os amigos para uma festa de comemoração. O rapaz tinha por certo que na festa o pai lhe daria o automóvel. Quando pediu a palavra, o pai elogiou o resultado obtido pelo filho e lhe passou às mãos uma caixa de presente.

Crendo que ali estavam as chaves do carro, o rapaz abriu emocionado o pacote. Para sua surpresa era uma BÍBLIA. O rapaz ficou visivelmente decepcionado e nada disse.

A partir daquele dia, o silêncio e distância separavam pai e filho. O jovem se sentia traído e, agora, lutava para ser independente. Deixou a casa dos pais e foi morar no Campus da Universidade. Raramente mandava notícias à família.

O tempo passou, ele se formou conseguiu um emprego em um bom hospital e se esqueceu completamente do pai. Todas as tentativas do pai para reatar os laços foram em vão. Até que um dia o velho, muito triste com a situação, adoeceu e não resistiu. FALECEU...No enterro, a mãe entregou ao filho, indiferente, a BÍBLIA que tinha sido o último presente do pai e que havia sido deixada para trás.

De volta à sua casa, o rapaz, que nunca perdoara o pai, quando colocou o livro numa estante, notou que havia um envelope dentro Dele. Ao abri-lo, encontrou uma carta e um cheque. A CARTA DIZIA:
"Meu querido filho, sei o quanto você deseja ter um carro. Eu prometi e aqui está o cheque para que você escolha aquele que mais lhe agradar. No entanto, fiz questão de lhe dar um presente ainda melhor: A BÍBLIA SAGRADA. Nela aprenderás o AMOR A DEUS e a fazer o bem, não pelo prazer da recompensa, mas pela gratidão e pelo dever de consciência".

Corroído de remorso, o filho caiu em profundo pranto. E A CARTA FINALIZAVA ASSIM:
"Como é triste a vida dos que não sabem perdoar. Isso leva a erros terríveis e a um fim ainda pior. Antes que seja tarde, perdoe aquele a quem você pensa ter lhe feito mal. Talvez se olhar com cuidado, vai ver que há também um cheque escondido".

I Corintios 13: "Eu poderia falar todas as línguas que são faladas na terra e até no céu, mas, se não tivesse amor, as minhas palavras seriam como o som de um gongo ou como o barulho de um sino.
Poderia ter o dom de anunciar mensagens de Deus, ter todo o conhecimento, entender todos os segredos e ter tanta fé, que até poderia tirar as montanhas dos seus lugares, mas, se não tivesse amor, eu não seria nada.
Poderia dar tudo o que tenho e até mesmo entregar o meu corpo para ser queimado, mas, se eu não tivesse amor, isso não me adiantaria nada.Quem ama é paciente e bondoso. Quem ama não é ciumento, nem orgulhoso, nem vaidoso.Quem ama não é grosseiro nem egoísta; não fica irritado, nem guarda mágoas.Quem ama não fica alegre quando alguém faz uma coisa errada, mas se alegra quando alguém faz o que é certo.Quem ama nunca desiste, porém suporta tudo com fé, esperança e paciência.O amor é eterno.
Existem mensagens espirituais, porém elas durarão pouco. Existe o dom de falar em línguas estranhas, mas acabará logo. Existe o conhecimento, mas também terminará. Pois os nossos dons de conhecimento e as nossas mensagens espirituais são imperfeitos.
Mas, quando vier o que é perfeito, então o que é imperfeito desaparecerá.
Quando eu era criança, falava como criança, sentia como criança e pensava como criança. Agora que sou adulto, parei de agir como criança. O que agora vemos é como uma imagem imperfeita num espelho embaçado, mas depois veremos face a face.Agora o meu conhecimento é imperfeito, mas depois conhecerei perfeitamente, assim como sou conhecido por Deus.
Portanto, agora existem estas três coisas: a fé, a esperança e o amor. Porém a maior delas é o amor."